11/08/25

Um diabo construído? (1/8)

      “Ainda não compreendeis que tudo o que entra pela boca desce para o ventre, e é lançado fora? Mas, o que sai da boca, procede do coração, e isso contamina o homem. Porque do coração procedem os maus pensamentos, mortes, adultérios, prostituição, furtos, falsos testemunhos e blasfêmias.Mateus 15.17-19

      Diabo e demônios quase não aparecem no antigo testamento, o inimigo era o outro ser humano, visível, objetivo, não seres invisíveis e espirituais. A “serpente”, da tentação do homem no Jardim do Éden, é uma figura misteriosa, mais esotérica que cristã. Um animal possuído ou sendo usado como médium? Um ser angelical caído? Ou só a representação de um lado do ser humano, cuja existência é necessária para que ele tenha livre arbítrio, livre arbítrio que é necessário que Deus entregue para não gerar escravos ou ignorantes, mas seres com direito a múltipla escolha, ainda que a consequência da escolha ruim seja o sofrimento. Bem, isso pelo menos é como entende a existência humana a teologia tradicional cristã. 
      Nos evangelhos, demônios aparecem às pencas. Seriam sinal dos novos tempos, de um ser humano mais maduro, pronto para entender, não leis extremas, mas nuanças das virtudes morais? O que poderia ter como efeito colateral negativo uma violência descontrolada, que geraria surtos psicóticos que foram chamados de possessão demoníaca por um homem ainda sem conhecimento psiquiátrico? Não que não tenha havido violência nos tempos do antigo testamento, mas um ser humano mais infantil não sofria tanto ao dizimar homens, mulheres e crianças de uma nação inimiga para possuir a terra. Quando não se sabe não se sofre, ter que escolher entre obedecer ou não uma lei não requer raciocínio mais sofisticado. 
      No século um a alma humana já estava crescida o suficiente para se sentir mal com a violência, e quando não a administrava do jeito melhor, com humildade e perdão, surtava. Seria isso? Sim, há jovens citados como endemoniados, mas esses mais ainda poderiam ser só doentes mentais. O diabo ganha seu auge com o catolicismo na idade média. Uma falácia usada para controlar um povo é criar um inimigo, e dar ao que quer ser controlador poder exclusivo sobre tal inimigo. Fora da igreja não há salvação, dizem os católicos, fora dela o ser humano é presa fácil de demônios e do inferno. Mas evangélicos atuais têm revivido o diabo, afinal creem num final dos tempos onde haverá um embate entre o mal e o bem. 
      Se o diabo existe, é espírito, só age através de uma escolha humana, primeiro na mente humana e depois com palavras e ações humanas entre outros seres humanos. Se anulássemos escolhas que dizemos que nascem em influências diabólicas nas nossas cabeças, o diabo deixaria de existir no mundo. Mas é o diabo que cria o mal e o disponibiliza em nossas mentes para sermos maus, ou o mal já existe dentro de nós e espíritos malignos só nos incitam a ele? Penso que as duas coisas ocorrem juntas, há mal dentro de nós e fora de nós, fisicamente e espiritualmente, mas somos nós, como indivíduos, que temos livre arbítrio para materializar o mal, ainda que seja só em nossos mundos mentais. Já foi dito, o diabo é o outro
      Sobre o texto bíblico inicial, poderia ter usado um versículo que cita seres espirituais malignos, como satanás e lúcifer, muitos podem achar que essas citações bíblicas são suficientes para provar que o diabo existe (Gênesis diz que o mundo foi criado em sete dias e não foi). Preferi usar um texto de Jesus que fala sobre a origem do mal, o Cristo não cita o diabo, mas o centro emocional humano, o subjetivo “coração”. A passagem é tão bíblica quanto outras, mas tem algo diferente em relação a outras, confronta-nos conosco, não com os outros, chama a atenção sobre nossa responsabilidade pessoal em superar o mal. Mateus 15.17-19 não foca na doença, mas mostra a cura, o remédio é nossa força de vontade em Deus.

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