04/04/22

O transporte do amor (64/90)

      “E eis que se levantou um certo doutor da lei, tentando-o, e dizendo: Mestre, que farei para herdar a vida eterna? E ele lhe disse: Que está escrito na lei? Como lês? E, respondendo ele, disse: Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todas as tuas forças, e de todo o teu entendimento, e ao teu próximo como a ti mesmo. E disse-lhe: Respondeste bem; faze isso, e viverás.” 
Lucas 10.25-28

      Quem seremos na eternidade? Seremos o homem espiritual que construímos dentro de nós aqui no mundo. A qualidade desse homem interior está diretamente relacionada a quanto praticamos os mandamentos de Deus. Jesus resumiu todos os mandamentos em um, amar a Deus, assim, construir o céu dentro de nós ainda neste mundo é amar a Deus. Quem ama a Deus, ama a si mesmo e ao próximo. Mas o que exatamente é amar a Deus? Entendemos o conceito espiritual disso ou confundimos com o apreço afetivo que temos por coisas físicas, pessoas, e mesmo por animais?
      O que nos vem de imediato à cabeça, quando pensamos no termo gostar, é aprovar. Se aprovamos alguém, gostamos desse alguém, do que ele faz, nisso pode estar incluído um relacionamento físico íntimo, assim, podemos gostar sem amar. Já amar podemos relacionar com um afeto maior. Um amigo, por exemplo, podemos amar ainda que não aprovemos tudo que ele faz. Mas com um companheiro afetivo, um cônjuge, é semelhante, ainda que não gostemos de tudo que ele faz, nós queremos continuar vivendo com ele, nos compartilhando fisicamente com ele, porque o amamos.
      Isso são manifestações emocionais e mesmo físicas de afeto, contudo, o amor espiritual que exercemos para Deus é algo mais. Nem estou falando de amor sacrificial, que também é uma alta expressão de afeto, que sofre pelo outro, que tem paciência mesmo com o desafeto do outro, que pode dar a própria vida pelo outro, como Jesus fez. Apesar disso ser uma expressão elevada de amor, ainda é amar no plano físico. Deus está no plano espiritual, ele não precisa que nos sacrifiquemos por ele, ainda que encarnado em Jesus tenha se sacrificado por nós, como espírito ele pode viver em nós. 
      Muitos cristãos percebem na prática o poder que tem o louvor, mas muitos não entendem o que de fato ocorre espiritualmente quando adoram Deus, Jesus e o Santo Espírito. Não são só palavras de aprovação por tudo que Deus é e faz que dizemos em hinos e cânticos, não é só o sentimento, que encharcado pelos dons espirituais entrega ao adorador um êxtase singular. Quem adora, ama, não se pode adorar sem amar. Amar um ser espiritual nos aproxima desse ser, mais ainda, nos coloca espiritualmente na posição espiritual que esse ser está, transporta-nos espiritualmente a um lugar. 
      Endemoniados são seres humanos que amam o mal, seja pelo que for que o mal se manifeste neles, vícios do corpo, ódio, inveja, lascívia. Quando amam o mal se colocam na mesma “frequência” espiritual de seres espirituais do mal. É simples, iguais se atraem, assim funciona no plano espiritual, por isso precisamos ter cuidado, gostar demais de algo que sabemos que nos afasta das virtudes morais lançadas sobre nós pela luz do Altíssimo, “endemonia-nos”, ainda que num grau menor, que não controle nosso corpo e nossa mente o tempo todo. O que adoramos nos possui. 
      Moisés ensinou e Jesus enfatizou, amar a Deus é o mais importante dos mandamentos. Eles não falaram só sobre o amor que sentimos no plano físico, uma preferência que temos por algo ou por alguém, é muito mais que isso. Há poder espiritual no amor, ele nos leva a adorar algo, assim nos coloca na mesma posição espiritual do objeto adorado. Se amamos a Deus naturalmente o adoramos. Isso é mais que palavras e emoções, é transporte espiritual para uma posição elevada, através de Jesus e pelo Espírito Santo. Nessa posição temos proteção, paz e luz, para resistirmos a todo o mal. 
      Por isso Paulo encerra o ensino sobre o amor em I Coríntios 13.13 dizendo, “agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três, mas o maior destes é o amor”. Na eternidade seremos confrontados pelo amor maior que chega a todos através da luz do Altíssimo. Quem já tiver o penhor do céu em si, subirá para a luz mais alta de Deus, sem medo, sem culpa, sem perturbação, não será surpreendido, se não para melhor. Quanto aos que não amaram os homens, porque não amaram a Deus no mundo, se sentirão desconfortáveis com a luz, se esconderão nas trevas infernais. 

Esta é a 64ª parte da reflexão
“Quem você será na eternidade?”
dividida em 90 partes, para melhor
entendimento leia toda a reflexão.

José Osório de Souza, março de 2021

03/04/22

Escolhas terminais (63/90)

      “Não erreis: Deus não se deixa escarnecer; porque tudo o que o homem semear, isso também ceifará. Porque o que semeia na sua carne, da carne ceifará a corrupção; mas o que semeia no Espírito, do Espírito ceifará a vida eterna.
 Gálatas 6.7-8

      Se a salvação está na persistência, primeiro para crer e depois para praticar, a perdição também está, na teimosia primeiro em pecar e depois em não pedir perdão pelo pecado. Nossa insistência define o que somos e o que levaremos para a eternidade. Ela é um processo que pode mudar até uma intenção, que a princípio era boa, já que com o tempo harmonizam-se intenção e prática. Quando a prática do pecado estabelece uma intenção de não se importar mais em pecar, a pessoa pode chegar a um ponto sem volta, onde será feita uma escolha terminal. Por mais que Deus ame a todos e tenha sempre a porta aberta de sua melhor vontade, ele respeita o livre arbítrio, que pode encerrar as chances que alguém tem neste mundo para mudar de vida. O amor de Deus desiste de alguém? Não, só a vontade do homem é que desiste de se arrepender e de seguir no melhor de Deus para sua vida.  
      Deus não tem limites, o homem tem. Uma escolha de reação emocional errada, mantida por tempo demasiado, pode instalar doenças emocionais, síndrome de pânico, depressão, ansiedades, que de mentais passam a ser doenças físicas, levando a dificuldades para dormir e outros males. Quando se trata de doenças emocionais não podemos cometer a irresponsabilidade de generalizarmos, várias são as causas, inclusive no sentido inverso, ao invés do emocional interferir no físico, um desajuste químico, que é físico, poder interferir no emocional. Mas seja como for, o homem tem limites, se não administrar bem corpo e mente, dores que começaram como eventos mentais, podem se tornar físicas, para quem lidou mal por muito tempo com pensamentos e sentimentos. Isso também é o poder, negativo, da fé, acabamos nos tornando o que cremos ser, seja para o bem, seja para o mal. 
      Por um bom tempo em nossas vidas ainda tentamos nos convencer, às vezes por estarmos frequentando igrejas onde ouvimos um ideal de Deus para nossas vidas e que constitui o único caminho para o céu. Dessa forma dizemos para nós mesmos, “cometo esse erro o tempo todo, mas não sou isso, Deus conhece minha sinceridade, sabe de minha intenção”, contudo, não conseguimos fazer isso para sempre. Quando existe essa incoerência um dia poderemos desistir de nós, e isso para podermos ter alguma sanidade mental, para que cesse o conflito dentro de nós, entre o que queremos ser e o que vemos que somos. Dessa forma acabamos assumindo o que a nossa prática, e não a nossa intenção, mostra que somos. Eis um momento crucial nas existências das pessoas, que define o motivo principal de porque estão neste mundo, assim como o que serão na eternidade. Pode ser um triste momento. 
      Como a depressão é algo que se instala em nossas cabeças, e que num determinado momento de nossas vidas pode ser de difícil cura, ainda que administrada com medicamentos, o inferno também é instalável em nossos espíritos, e num determinado momento de nossas vidas pode ser irreversível. Quando não queremos pensar sobre algo ou aceitar algo, temos a tendência de generalizar e jogar num extremo, assim, não entenda inferno como uma vida dominada pelos prazeres do corpo, na devassidão, em pecado, não, inferno não é só isso. Inferno é dor sem fim, e dor pode estar bem escondida em vidas que desistiram de anulá-la com fugas. Existe gente dentro de igrejas assim, controladas exteriormente (por remédios), socialmente resignadas, mas sendo “cavalos” de terríveis sofrimentos, muitos que de boca confessam o céu, mas que no coração já se condenaram a um inferno há algum tempo.
      A maneira de ver muitas coisas deste que vos escreve, não é melhor e acho que também não é pior que a maneira de outros cristãos, mas a maneira de ver deste espaço virtual é diferente. Geralmente sou levado pelo Espírito Santo a não tirar aquelas conclusões mais óbvias, tento ver aquilo que pode estar escondido, que a princípio pode parecer uma coisa, mas que se olharmos com atenção veremos que é outra. Penso que Jesus trouxe uma crítica assim para a religião tradicional de sua época, viu além do óbvio, discerniu o pecado não na aparência, mas na intenção, assim a minha interpretação do termo “carne” do texto bíblico inicial tenta ir além daquilo que muitos ensinam. A leitura que faço desse termo não se refere aos pecados dos prazeres do corpo, mas a uma disposição mais interior, que ainda que explicitamente não peque também não coloca Deus no melhor lugar do ser humano.
      Por que isso é relevante? Porque a abundância de igrejas e pregadores, principalmente na internet, com sites e canais de vídeos, popularizou o ensino evangélico. Hoje muitas pessoas conhecem a Bíblia, contudo, conhecem do jeito tradicional e superficial, assim só mais do mesmo. Muitos se acostumaram a pregar o que a maioria gosta de ouvir. Suponha, que em uma igreja pentecostal, onde vários pregadores podem usar o púlpito e não só o primeiro pastor, como acontece em igrejas protestantes tradicionais, fosse feito o desafio de durante um certo tempo não se pregar sobre os milagres de Jesus, a cura da mulher com o fluxo de sangue e outros. Acho que os pregadores teriam dificuldades para entregarem palavras diferentes, mesmo para olharem um Deus que faça coisas mais importantes que milagres físicos. Bem, esse é o jeito óbvio de se ver a palavra de Deus, tento ver diferentemente.
      Sobre o que temos semeado, sobre a carne ou sobre o Espírito? Todos precisamos trabalhar, mas até que ponto exageramos no esforço pessoal para não termos fé em Deus? Ambos os extremos são inadequados, não é sábio dependermos só do que é feito diretamente pelas nossas mãos, tanto quanto não é sábio só dependermos daquilo que vem das divinas mãos, é preciso equilíbrio, pés na Terra e olhos no céu. Quem chegou num ponto onde não acredita mais num Deus que tudo controla, e que conta com nossos esforços tanto quanto com o que não podemos fazer, quem acha que só depende do próprio trabalho, parou de olhar para o céu e semeia na carne. Muitos até respeitam Deus, mas se negam a depender dele pela fé, dependem só deles mesmos. O tempo, ainda neste mundo, mostrará os frutos de tal escolha, mas tenhamos cuidado, algumas escolhas podem ser irreversíveis e terminais. 

Esta é a 63ª parte da reflexão
“Quem você será na eternidade?”
dividida em 90 partes, para melhor
entendimento leia toda a reflexão.

José Osório de Souza, março de 2021

02/04/22

Qualidade da dor (62/90)

      “Amados, não estranheis a ardente prova que vem sobre vós para vos tentar, como se coisa estranha vos acontecesse; mas alegrai-vos no fato de serdes participantes das aflições de Cristo, para que também na revelação da sua glória vos regozijeis e alegreis. Se pelo nome de Cristo sois vituperados, bem-aventurados sois, porque sobre vós repousa o Espírito da glória e de Deus; quanto a eles, é ele, sim, blasfemado, mas quanto a vós, é glorificado. Que nenhum de vós padeça como homicida, ou ladrão, ou malfeitor, ou como o que se entremete em negócios alheios; mas, se padece como cristão, não se envergonhe, antes glorifique a Deus nesta parte.
I Pedro 4.12-16

      O que nos define espiritualmente é a qualidade de nossas dores, se entendêssemos isso entenderíamos o real motivo de vivermos no mundo. Os textos de Moisés deixam isso bem claro nos primeiros capítulos de Gênesis. Ainda que sejam entendidos só como mitos, e como tais podem ter significados ainda mais profundos que se entendidos só ao pé letra, Adão, o Éden, a árvore do conhecimento do bem e do mal, a serpente, o pecado original e as consequências desse pecado, mostram que a vida no planeta Terra pós-queda é de dor. A civilização evoluiu, a ciência permitiu confortos que não se tinha há quinhentos, mil anos atrás, mas a dor segue, só mudaram os motivos para que ela exista, nesse mundo continuará até o juízo. Na verdade as dores aumentaram, mesmo numa humanidade com tantas facilidades tecnológicas, hoje existem sofrimentos que não existiam no passado. 
      O homem não evolui sem sofrer, negar a dor é negar a evolução. Jesus lutou contra uma dor que sentia por ter que salvar a humanidade, não foi pelo remorso de um pecado cometido, pela culpa de um prazer do corpo desfrutado na hora, no lugar ou com a pessoa errada. Paulo sofreu na prisão (II Timóteo 4), abandonado por muitos companheiros, só por ter pregado o evangelho de amor do Cristo aos homens de seu tempo. Muitos cristãos atuais estão sofrendo por não fazerem conchavos sujos com homens, o que poderia lhes render mais prosperidade nos negócios, status e aprovação no mundo. Alguns sofrem por não conseguirem vencer vícios como tabagismo, alcoolismo e de outras drogas, contudo, muitos de nós sofremos só por não termos resistido a um sentimento de vingança, ou talvez só por termos assistido um vídeo impróprio ao invés de amarmos nossos cônjuges. 
      Por um amor fraternal que se sacrifica, ou por culpa por prazeres egoístas, o que nos causa dor? Medo ou culpa? Orgulho ou frustração? Quebra de alianças que fizemos com nós mesmos, com nossos corpos, com nossas saúdes físicas e mentais, ou quebra com aqueles compromissos que fizemos com Deus quando entendemos que viver melhor é ajudarmos os outros e não só satisfazermos a nós mesmos? A qualidade de nossas dores nos define muito mais que a qualidade de nossos prazeres, porque só a dor mais pura e altruísta nos dará direito ao melhor de todos os prazeres, o espiritual que agrada a Deus. Na eternidade seremos só isso, nossa intenção mais interior de agradar a Deus. Se ela existir teremos direito ao melhor céu, caso contrário, ainda que tenhamos sido bons cidadãos e ótimos religiosos no mundo, nossa intenção de só usufruirmos para o próprio deleite já construiu um inferno em nós. 
      Se sobre nós repousa o Espírito Santo do Altíssimo, e se somos verdadeiros e respeitosos com sua voz, sempre sofreremos por Deus. Quem sofre por si não sofre por Deus, se o sofrimento teve como causa sentimento de vitimização ou pecado, não há glória nele, só egoísmo ou efeito de erro. Mas no arrependimento sincero e no desejo de não se errar mais, existe uma dor que agrada a Deus, ainda que seja efeito de pecado nosso, pois nisso o Senhor vê que ainda que pequemos não queremos pecar, porque entendemos que isso desagrada a ele. O ímpio segue errando e errando, não sofre porque erra, joga a culpa de seus erros nos outros, na vida, no destino e até em Deus, não assumirá seus “b.o.s”, como se diz hoje. A dor de qualidade é a que vem não como efeito de pecado, mas como temor de algo que teremos que passar, e não nos negamos a isso por querermos agradar a Deus. 
      Não somos transformados da noite para o dia, não nos libertamos de vícios rapidamente, e com muitos vícios lutaremos por toda a vida. Por isso a dor é constante, mas temos que lutar contra o pecado, até o fim, e lutarmos com a arma certa. A arma certa é acostumarmos todo o nosso ser com o bem, com a paz, com o amor, com a confiança num Deus que nos conhece, cuida de nós e nos conduz em vitória. Damos início a isso com uma vida de oração no Espírito Santo, experiência que impressiona todo nosso ser, razão e emoção, corpo e espírito, só assim mudaremos nosso espírito diante de Deus, não só nosso corpo e nossa vida social, que exteriormente podem até estarem corretos diante dos homens. É a qualidade de nosso espírito que definirá nosso céu e nosso inferno, nosso melhor homem interior que será manifestado no plano espiritual e que seguirá conosco para novos céus e nova Terra. 

Esta é a 62ª parte da reflexão
“Quem você será na eternidade?”
dividida em 90 partes, para melhor
entendimento leia toda a reflexão.

José Osório de Souza, março de 2021

01/04/22

Poder da fraqueza (61/90)

      “E quando chegou àquele lugar, disse-lhes: Orai, para que não entreis em tentação. E apartou-se deles cerca de um tiro de pedra; e, pondo-se de joelhos, orava, dizendo: Pai, se queres, passa de mim este cálice; todavia não se faça a minha vontade, mas a tua. E apareceu-lhe um anjo do céu, que o fortalecia. E, posto em agonia, orava mais intensamente. E o seu suor tornou-se em grandes gotas de sangue, que corriam até ao chão. E, levantando-se da oração, veio para os seus discípulos, e achou-os dormindo de tristeza. E disse-lhes: Por que estais dormindo? Levantai-vos, e orai, para que não entreis em tentação.
Lucas 22.40-46

      Quando Jesus orou no Getsêmani até suar sangue, precisando da companhia de seus melhores amigos, que não resistiram ao sono da vigília e o deixaram só, Jesus sentiu toda a dor da fraqueza humana. Racionalmente ele sabia o que poderia passar, o que teria que passar, o que passaria, mas como homem encarnado, e não como Deus, ele fez o que qualquer um de nós, em sã consciência, lúcido e saudável, faria, ele tentou “negociar” com Deus. Procure entender certo o termo, não existe nada de errado nisso e mesmo referindo-se a Jesus. É o mecanismo de sobrevivência do homem tentando manter o corpo físico íntegro, e isso não é necessariamente pecado, covardia ou fuga. Deus espera de nós tal reação, ela é legítima se vivida em Deus, com o temor do Senhor que se coloca humildemente debaixo dele, ainda que procurando um jeito de escapar de sua inevitável vontade.
      Meus queridos, muitas vezes a dor de viver é enorme, insuportável, e todos passamos por ela. É a morte levando um ente querido, às vezes antes daquilo que achamos ser o melhor tempo e a melhor maneira, é a injustiça do poderoso que pode deixar mesmo crianças sem terem o que comerem, é a violência dos egoístas e devassos, que pensando só em seus prazeres e vaidades não se importam em machucar os outros. Contudo, também pode ser algo que pouco representa para os outros, mas que nos fere de maneira avassaladora. A dor pode parecer infinita e com tal potência que achamos que nos levará à morte, sentimos o lado esquerdo do peito comprimido, o coração descompassado, um gosto amargo na boca, achamos que a qualquer momento perderemos as forças e desfaleceremos, vencidos por algo que não temos controle. Jesus sentiu isso e mais, antes de ser preso e crucificado.
      O antigo testamento, a velha aliança, é a vitória do forte sobre o enfraquecido, que está fraco por estar longe de Deus, da força sobre a fraqueza, numa guerra física e externa. O novo testamento, contudo, a nova aliança, é o contrário, é a vitória da fraqueza sobre o forte que se sente enganosamente forte por não se conhecer nem a Deus, do fraco sobre si mesmo numa guerra espiritual e interna. Jesus pregou sobre isso em seu ministério, mas acima de tudo praticou isso, não só para viver como também para morrer. O evangelho ensina que a vitória está, não em reagir, ainda que se tenha razões legítimas para isso, mas em não reagir, não em usufruir, mas em sentir a falta, aceitar isso e ainda estar em paz. Não é só uma questão de ser masoquista, de achar que sofrer a dor nos oferece direito a algum crédito. Isso seria vaidade e pode ser muito mais transtorno psicológico que espiritualidade.
      Não é fácil para ninguém suportar a dor de viver, e viver é administrar uma dor constante. Na verdade, não vamos atrás de prazer, só tentamos fugir da dor, mas crescer espiritualmente é conseguir fazer isso construindo dentro de nós os melhores valores morais, nos libertando dos vícios do corpo, resistindo a toda espécie de vaidade. A luta ocorre todos os dias, e ainda que hoje experimentemos felicidade, amanhã nosso corpo e nossa alma se esquecerão disso e tornarão a sentir dor. “Mas aquele que perseverar até o fim será salvo” (Mateus 24.13), eis algo que temos que repetir para nós mesmos o tempo todo, pedindo perdão pelo pecado, não nos acostumando com o pecado ainda que ele teime em nos subjugar, tendo humildade para reconhecer sempre que pecar é uma escolha pessoal que fazemos, não é culpa dos outros, mas é responsabilidade nossa, tanto quanto é pedir perdão por isso. 
      E disse-me: a minha graça te basta, porque o meu poder se aperfeiçoa na fraqueza; de boa vontade, pois, me gloriarei nas minhas fraquezas, para que em mim habite o poder de Cristo” (II Coríntios 12.9), Paulo define o conceito “poder da fraqueza” usando experiência própria, e todos que forem amigos genuínos de Deus não só entenderão isso, mas também não terão receio de admiti-lo. Gloriar-se na fraqueza não é alegrar-se pelo prazer que o pecado entrega, não, pecado sempre tem que nos entristecer. Bem-aventurado os que se entristecem profundamente com o pecado, por mais que isso pareça contraditório. Experimentarmos a dor que vem da frustração por não agradarmos a Deus, é estarmos em comunhão com o Espírito Santo, e esse sempre nos diz “mas como é santo aquele que vos chamou, sede vós também santos em toda a vossa maneira de viver“ (I Pedro 1.15).

Esta é a 61ª parte da reflexão
“Quem você será na eternidade?”
dividida em 90 partes, para melhor
entendimento leia toda a reflexão.

José Osório de Souza, março de 2021

31/03/22

Uma chance de restauração (60/90)

      “E não sede conformados com este mundo, mas sede transformados pela renovação do vosso entendimento, para que experimenteis qual seja a boa, agradável, e perfeita vontade de Deus.” 
Romanos 12.2

      Um novo amigo é mais que uma oportunidade para conhecermos alguém, é chance para nos aceitarmos. Um novo amigo é uma nova oportunidade de perdão, tanto para nós como para o outro, e não por um erro que cometemos com esse amigo ou cometido por esse conosco. Às vezes, não podemos voltar ao passado e resolvermos certas coisas, consertarmos certos erros, mesmo obtermos certos perdões, assim, por mais que saibamos que temos que depender do perdão de Deus e não do homem, sermos aceitos por uma nova pessoa, quem quer que seja ela, nos consola.
      Uma nova amizade nos permite fazer as coisas de um jeito melhor, mostrarmos para alguém que somos bons, ou pelo menos, que nos tornamos bons, isso permite-nos resgatar nossa reputação, ter ao menos de uma pessoa uma boa opinião sobre nós. Respeite as pessoas, principalmente um novo amigo, ele pode estar buscando em você uma nova chance, que talvez não convença outros sobre o que ele é hoje, mas que se convencer você pode bastar para que ele se sinta melhor. Você pode ser a chance, e talvez a derradeira, que alguém está precisando para restaurar a si mesmo. 
      Qual a duração de nossas amizades? É fato que levados principalmente por carreiras profissionais, podemos nos mudar de cidade, de estado, até de país, isso quebra muitos laços afetivos valiosos. Mas mesmo numa só cidade, você tem amizades que já perduram por mais de cinco, dez, vinte anos? Infelizmente também é fato que muitas vezes nos distanciamos de alguém por algum mal entendido, assim podemos deixar para trás pendências, que nem são pecados, mas só coisas não resolvidas, e nem darmos conta que isso nos desconecta de relações preciosas. 
      Vivemos muitas vidas em uma, principalmente se não temos medo de nos desconstruir para novamente nos construirmos, se não tememos mudar de opinião, e isso leva-nos a migrar de certos círculos sociais para outros. Isso não deveria ser exceção, mas regra, nosso tempo encarnado na Terra precisa ser bem aproveitado, aproveitá-lo bem é nos desafiarmos a sermos melhores a cada dia. Quem não quer isso para si, por orgulhosamente achar que já está bom como é e não precisa mudar, também não verá essa necessidade nos outros, julgará mal e se distanciará de muitos. 
      Quem não vê necessidade de se desconstruir e se reconstruir verá no tropeço de alguém algo definitivo, a consideração que tinha pela pessoa até então não terá mais, porque se acha traído por uma leitura que fazia da pessoa que mudou. Não nos decepcionamos com os outros, a verdade é que não queremos admitir que não sabemos tudo, que fomos nós que nos enganamos fechando alguém numa caixa antes do tempo, se é que há tempo para fechar alguém. Mas se vermos a vida, não como uma, mas como várias vidas, com mortes e nascimentos, entenderemos melhor os outros. 
      Sabe aquela pessoa que você conheceu há vinte anos em uma igreja, e que depois, por algum motivo, que você não sabe bem porque nunca foi atrás para saber, se afastou da igreja e do teu convívio? Ela não é mais a mesma pessoa hoje, não ficou condenada ao inferno por um erro que cometeu, não necessariamente. Ela pode ter feito novas e melhores escolhas e mudado, de maneira extrema. Quem está convivendo com ela hoje pode nem ter ideia de quem ela foi e fez. Esse novo amigo da pessoa é uma nova chance que Deus deu a ela para se restaurar, mudar e ser alguém melhor. 
      Faça novos amigos, se puder, mantenha os antigos, mas se restaure, temos o melhor auxiliar para isso, o amigo Espírito Santo de Deus. Viver é se restaurar o tempo todo, quem acha que acertou depressa e que não precisa mais de reformas e por isso é melhor, engana-se, principalmente se se diz cristão. Alguns creem em reencarnação como meio de evolução espiritual, mas é muito mais efetivo vivermos várias vidas em uma, deixarmos morrer velhos egos, velhos vícios, velhos passados, e nascer novos espíritos no mesmo corpo, numa única e maravilhosa existência em Jesus Cristo. 

Esta é a 60ª parte da reflexão
“Quem você será na eternidade?”
dividida em 90 partes, para melhor
entendimento leia toda a reflexão.

José Osório de Souza, março de 2021

30/03/22

A eternidade revelará (59/90)

      “Eu sou a luz que vim ao mundo, para que todo aquele que crê em mim não permaneça nas trevas. E se alguém ouvir as minhas palavras, e não crer, eu não o julgo; porque eu vim, não para julgar o mundo, mas para salvar o mundo.” 
João 12.46-47

      Nem todos adquirem lucidez moral rapidamente, alguns demoram mais, assim a sensibilidade que temos para entendermos o que é errado e o quanto isso machuca-nos e aos outros, é obtida gradativamente. Eu creio num Deus poderoso, vivo, justo e sempre presente em amor nas vidas das pessoas. Ele permite provações para nosso crescimento espiritual, não nos engana impedindo de alguma maneira que os efeitos de causas erradas venham, mas também não cobra mais que cada ser humano pode fazer para não errar. 
      Por isso não devemos julgar ninguém, condenar, tão pouco, mas temer o Deus que tem com cada ser relação única que só ele e a pessoa sabem de fato como é. Devemos orar por todos, sim, ajudar com atenção e palavras, mas sempre com paciência, as pessoas não funcionam como você ou eu funcionamos, os tempos de crescimento e cobrança de cada um são diferentes. Alguém que podemos achar que se perdeu e que não tem mais jeito, pode só estar esperando o tempo de Deus, onde há providências que desconhecemos. 
      O certo é que muitas coisas que vivemos só as entendemos de fato muitos anos depois, e se é assim conosco isso é razão suficiente para exercermos paciência generosa com os outros, afinal, crescemos para isso, para aprendermos a amar mais e melhor os outros. Quanto aos orgulhosos, que usam suas falsas virtudes como referências para tudo, que medem os outros por aquilo que acham que são e têm, seguirão enganados, julgando e condenando, exigindo do fraco algo que ele não está ainda pronto para dar. 
      Vivi por algum tempo equivocado e incentivado a isso pelas igrejas que participava, julgando e me achando no direito disso. Muitos ainda vivem assim e muitos, com as quais eu convivi há mais de trinta anos atrás, ainda estão assim, julgando, inclusive a mim. Esses nunca me conheceram de fato, minha formação familiar, minha infância, as feridas abertas que eu tinha na alma naquele tempo, apenas criam que por eu fazer oficialmente parte de uma igreja, ser batizado e ter cargos, tinha a obrigação de ser perfeito. 
      Na verdade não era a mim e a outros que eles não conheciam, mas a eles mesmos, e parece que isso continua assim para muitos. Eles eram bons cristãos? Eram e continuam sendo, como cidadãos, com boa moral, fazendo bem ao próximo de maneira genérica, mas o problema é o entendimento errado que eles tinham e podem ainda terem do verdadeiro evangelho. Veem a experiência com Cristo como um ato mágico e instantâneo, que se não deixa alguém perfeito deixa-o capacitado para não cometer mais erros graves. 
      A vida não é simples, e se dentro de igrejas podemos ter a falsa impressão que Deus salva alguém e o transforma imediatamente, é porque alguém pode ter vindo já pronto por Deus para essa experiência, não podemos usar isso como regra. Pedro não negou Jesus três vezes, mesmo depois de andar por três anos com o mestre, sendo um de seus amigos mais íntimos, testemunhando milagres e atitudes de amor profundo? Somos semelhantes a Pedro, ninguém se engane sobre isso, nosso caminho só termina quando acaba.
      Só Deus sabe se não nos aguarda, na próxima curva da vida, um tropeção tal que nos fará perder o rumo, mas que será o único jeito de acordarmos de uma posição arrogante e covarde, posição que pode ter julgado por anos muitos fracos que Deus ama e continua cuidando, mesmo depois que os condenamos, paramos de amá-los e sequer tomamos alguma iniciativa para sabermos como eles estão. Essa palavra soa como mágoa? Pois ela é, eu assumo isso, e oro a Deus para que me dê amor pelos que me magoaram. 
      Mas eu tenho certeza em Deus de quem serei na eternidade, sei de todos os meus erros, mas também de meus arrependimentos e de minhas curas, verdadeiras e profundas através do Santo Espírito de Deus pelo nome de Jesus. Sei o que os anos fizeram comigo debaixo da graça e da misericórdia do Altíssimo, assim espero, sinceramente, ver homens e mulheres que ainda amo, que foram importantes para mim e ainda são, ainda que me julguem sem se darem ao trabalho de me conhecerem de fato, a eternidade revelará tudo. 

Esta é a 59ª parte da reflexão
“Quem você será na eternidade?”
dividida em 90 partes, para melhor
entendimento leia toda a reflexão.

José Osório de Souza, março de 2021

29/03/22

Andemos por fé, não por vista (58/90)

       “Porque sabemos que, se a nossa casa terrestre deste tabernáculo se desfizer, temos de Deus um edifício, uma casa não feita por mãos, eterna, nos céus. E por isso também gememos, desejando ser revestidos da nossa habitação, que é do céu; se, todavia, estando vestidos, não formos achados nus. Porque também nós, os que estamos neste tabernáculo, gememos carregados; não porque queremos ser despidos, mas revestidos, para que o mortal seja absorvido pela vida. Ora, quem para isto mesmo nos preparou foi Deus, o qual nos deu também o penhor do Espírito. 
      Por isso estamos sempre de bom ânimo, sabendo que, enquanto estamos no corpo, vivemos ausentes do Senhor. (Porque andamos por fé, e não por vista). Mas temos confiança e desejamos antes deixar este corpo, para habitar com o Senhor. Pois que muito desejamos também ser-lhe agradáveis, quer presentes, quer ausentes. Porque todos devemos comparecer ante o tribunal de Cristo, para que cada um receba segundo o que tiver feito por meio do corpo, ou bem, ou mal.
II Coríntios 5.1-10

      Quantos mistérios o texto bíblico inicial nos revela. A casa terrestre que Paulo se refere é nosso corpo físico, o edifício nos céus é nosso homem interior aperfeiçoado, nossa melhor forma de consciência e existência na eternidade. Paulo diz que o normal, enquanto estamos encarnados no mundo, é nos sentirmos desconfortáveis, contermos dentro de nós um gemido, baixo e constante, declarando que nosso espírito não está totalmente satisfeito no mundo e que deseja estar no outro mundo. Eis a primeira lição do texto, aceitarmos que nunca seremos plenamente felizes nesta vida, é certo que isso pode ser por muitos motivos, mas ainda que estejamos andando com Deus, como Paulo estava, sempre gemeremos desejando a eternidade, onde nosso espírito será livre. Não se desespere ao verificar uma angústia que nunca passa, ainda que esteja em paz com Deus, todos a sentimos. 
      Mas liberdade do espírito no céu tem um preço, nosso espírito será liberado para o céu só se estiver com roupa. A que roupa espiritual Paulo se refere? Lembra-se de Adão e Eva, logo após terem desobedecido a Deus? Eles tentaram se esconder do Senhor porque o pecado fez com que eles sentissem vergonha, por isso Deus fez para eles roupas (Gênesis 3.9-11, 21). A vergonha espiritual que eles provaram não seria mais sanada, só em Jesus haveria remédio, e ainda assim só para a eternidade, no mundo o homem sempre se sente moralmente nu na presença de Deus. O vestido que Paulo se refere, que será procurado em nosso espírito, é tudo o que Jesus representa, sua salvação, seu exemplo de conduta. Jesus veste o nosso espírito, se crermos que nele há perdão e que a partir disso podemos praticar obras de virtudes espirituais que construam o céu em nossos homens interiores
      O consolo que temos é o penhor do Espírito Santo, ele não deixa que a vergonha pelo pecado nos vença, que a insatisfação por estarmos encarnados no mundo nos derrote. Só uma comunhão íntima com o Espírito de Deus para fazer-nos olharmos para cima, para frente, para o futuro, para a melhor eternidade de Deus. O Espírito Santo nos faz desejar as virtudes espirituais da luz mais alta, e acharmos nisso o prazer maior, aquele que nos satisfaz e não tem fim. Quem é espiritual não se acostuma com o mundo, não se satisfaz com os prazeres da carne, mas deseja a liberdade da existência espiritual em direção a Deus na eternidade. Mas ainda que sabendo que aqui estamos longe da nossa vocação maior, vivemos pela fé, não pelo que vemos e sentimos, e pela fé conhecemos as virtudes espirituais e não nos escandalizamos com elas, pois sabemos que elas são verdades eternas. 
      No mundo nunca beberemos o suficiente, comeremos o suficiente, teremos relações íntimas o suficiente, isso tudo nunca bastará, nunca será plenamente satisfatório, mas deve ser assim porque o ser humano não é vocacionado para ser feliz neste mundo. Se assim fosse viveria eternamente no mundo, não teria seu corpo envelhecido, não morreria, mas estamos aqui de passagem, para sermos provados, aprovados e crescermos. Somos como viajantes a trabalho em terra estranha, que guardam no bolso a foto de sua terra de origem, para que olhando para ela sintam-se confortados. Nossa viva foto espiritual do céu é o penhor do Espírito Santo, sem ela não achamos sentido em trabalhar, dia após dia, nessa terra estranha e estéril. O que não possui essa foto, ou ainda que a tenha não olhe para ela regularmente, só sentirá o enfado da existência de vaidades do plano físico. 
      A roupa é espiritual, mas conquistada no corpo material, o juízo verificará isso, assim sigamos, desejando o que está por vir, não o que temos aqui, ainda que tenhamos muito, o mundo não é lugar para a melhor felicidade. Isso é assim, ainda que Deus nos permita momentos alegres, como o nascimento de um filho, sua formatura, seu casamento, o nosso casamento, a nossa formatura, o sorriso da pessoa amada, o abraço da mãe, a gargalhada gostosa daquele amigo que nos faz bem só por estar perto de nós. Mas não nos iludamos, e nem nos desesperemos, no mundo é só uma viagem, curta, não nos sintamos donos de nada aqui, assim também não nos frustemos se perdermos algo aqui, o que é nosso de verdade está lá no plano espiritual. Andemos por fé, não por vista, em todo o tempo, tiremos nossos olhos deste mundo e abramos nossos olhos espirituais para o outro mundo. 

Esta é a 58ª parte da reflexão
“Quem você será na eternidade?”
dividida em 90 partes, para melhor
entendimento leia toda a reflexão.

José Osório de Souza, março de 2021