domingo, outubro 31, 2021

Militou errado! (Íntegra)

      “Milita a boa milícia da fé, toma posse da vida eterna, para a qual também foste chamado, tendo já feito boa confissão diante de muitas testemunhas.” 
I Timóteo 6.12

      O apóstolo Paulo exorta Timóteo a militar a boa milícia, mas o que seria militância correta para o cristão hoje, existe militância errada? “Militou errado!”, um estudo divido em trinta e uma partes, uma reflexão sobre temas atuais, preconceitos, militâncias, ideologias, cristianismo e política, algumas perguntas são feitas. Que intenção nos leva a militar por uma causa? Recalque pessoal ou causa coletiva legítima? Quem nos lidera em uma militância? Homens, nosso ego, Deus? Que papel direita e esquerda política, mídia e cristãos, representam num Brasil atual em meio à pandemia da Covid 19? Refletiremos também em onze personagens bíblicos e suas diferenciadas relações com lutas e causas, Micaías, José, Moisés, Josué, Davi, Daniel, Jonas, Pedro, Judas Iscariotes, Paulo e Jesus. Esses são militantes? Sim, de alguma maneira. O estudo é constituído de partes independentes, mas se puder leia todo o texto para ter uma opinião melhor sobre toda a reflexão. 

01. Preconceito: mal a ser combatido 
02. Bandeira certa com intenção errada
03. Preconceito na história 
04. A luta é de todos 
05. Teoria de conspiração, grana e sexo
06. Hitler, arquétipo diabólico 
07. Quem é o anticristo? 
08. Servos não militam por si
09. Vocação para ser escravo??
10. Pela liberdade mais plena!
11. Militância materialista  
12. Quem milita pelo planeta? 
13. Sem limites para a estupidez humana
14. Cansados de ensinar 
15. “Não é problema meu”?
16. O mal não tem poder 
17. Batalha mental do diabo 
18. Golpe de direita?
19. “Meu exército”?
20. Deus não está nos extremos 
21. Micaías: coragem para militar só 
22. José: sonhos, tempo e destino 
23. Moisés, tempo certo para militar
24. Josué, escolheu o lado vencedor 
25. Davi, paciência para militar
26. Daniel militou certo
27. Jonas, profeta sem amor?
28. Judas e Pedro, inícios iguais, fins diferentes
29. Saulo e Paulo, diferentes militâncias 
30. Jesus: salvador e mártir  
31. O militante que Deus pode usar 
 
José Osório de Souza, março de 2021
 
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1. Preconceito: mal a ser combatido

      “O que come não despreze o que não come; e o que não come, não julgue o que come; porque Deus o recebeu por seu.” 
Romanos 14.3
      “E, chegando Pedro à Antioquia, lhe resisti na cara, porque era repreensível. Porque, antes que alguns tivessem chegado da parte de Tiago, comia com os gentios; mas, depois que chegaram, se foi retirando, e se apartou deles, temendo os que eram da circuncisão.” 
Gálatas 2.11-12

      O que a Bíblia registra em Romanos 14.3 é um preconceito, o de judeus contra gentios, quando judeus julgavam como menores aqueles que se convertiam ao cristianismo e não obedeciam às leis da religião judaica. Esse assunto é tão importante que motivou Paulo a escrever vários textos, exortando tanto sobre a superioridade da nova aliança sobre a velha aliança, como ensinando que ninguém era melhor que ninguém por exercer sua religião dessa ou daquela maneira, nem gentios convertidos seriam melhores que judeus convertidos por agirem de outra forma. Ação é importante, mas se não bate com a intenção fica desqualificada, essa Deus conhece bem, ainda que nós possamos esconder com perícia de outros homens. 
      O registro em Gálatas 2.11-12 sobre Pedro, refere-se ao mesmo assunto, sim, Pedro, aquele que a igreja católica diz ser o primeiro papa (e que como tal deveria ser infalível?), esse é repreendido por Paulo por agir de maneira preconceituosa. O registro é de um evento informal, Pedro comia com gentios, mas quando os judeus chegaram afastou-se dos gentios, com medo dos judeus, ele agiu por pura conveniência social. Como nós fazemos isso, muitas vezes de forma sútil, só para agradarmos a uns, que achamos que são mais importantes numa situação, em detrimento de agradarmos a outros, por considerarmos esses menos importantes, e consequentemente achando nós que agindo assim nos prejudicamos politicamente menos.
      Vivemos um momento especial no mundo, onde preconceitos têm sido desmascarados, principalmente no Brasil, onde costuma-se dizer que é um país onde não existem certos preconceitos, só desigualdade financeira por causa de injustiça social. Mas existe, sim, preconceitos, assim um homem hétero e branco tem mais oportunidades que uma mulher, que um homoafetivo ou que um afro-descendente, e se a pessoa tiver as três características, mulher, negra e não heterossexual, ela desce para o nível mais baixo de direitos. Nessa triste realidade, construída por séculos de injustiças e tratamentos desiguais em todo o mundo, é preciso lutar, todos precisamos lutar, o problema não é dele, mas meu, ou melhor, nosso. 
      Cristão, não vou tentar convencê-lo de nada neste texto, e você nem precisa mudar seu ponto de vista, aliás, se tentar, por exemplo, viver seu posicionamento, que acredita ser o da tradição cristã diante de homossexualidade, em amor verdadeiro, Deus e o tempo vão ensiná-lo a respeito. O que não pode, como cristão, é lutar pelo cristianismo sem amor, se não houver amor é melhor ficar quieto e não se envolver em questões que você não pode resolver, mesmo porque o cristianismo, mais que qualquer outra bandeira, é baseado no amor. Contudo, a questão nesta reflexão não é mudar ninguém para que possa se encaixar naquilo que o cristianismo prega como sendo o que dá direito ao céu, a questão aqui se refere ao mundo.  
      Dessa forma, logo de início informo aos cristãos, seja qual for o ensino da Bíblia que vocês desejam ensinar para o mundo, se fazem isso sem amor, militam errado! O ponto deste texto tem a ver com o mundo, com existência como cidadão numa sociedade, com direito à alimentação, casa, saúde, educação, infraestrutura de água, esgoto e energia, emprego, vida afetiva, divertimento, cultura, religião, tudo com liberdade de escolha e direito de ir e vir, indiferente da posição que a pessoa tiver sobre Deus e o mundo espiritual. O cristão não pode tentar se isentar disso, achando que tem uma causa mais alta para lutar, ele faz parte da sociedade, sobrevive nela e tem responsabilidades sobre ela, assim o bem de todos é o dele. 
      Postas essas palavras introdutórias, vamos ao assunto principal: quem tem direito de militar? Militar é uma palavra que está em moda, e não tem a ver com militar (substantivo) relativo a soldado, mas significa militar (verbo), lutar por uma bandeira, por uma ideologia. Os que defendem uma ideia, como “vidas negras importam”, fazem parte de uma militância, são militantes. Todos têm direito a militar por causas nas quais acreditam e que são relevantes para a sociedade, principalmente para grupos minoritários que são perseguidos e oprimidos por maiorias. O significado de minoria e maioria atualmente tem mudado, hoje, no Brasil, brancos não são mais maioria, e a tendência é que sejam cada vez menos no mundo.
      A população mundial migra de um lugar para outro mais facilmente atualmente, consequentemente a mistura entre raças e nacionalidades ocorre com mais facilidade e celeridade. A tendência é termos no futuro, uma população mundial parecida, onde africanos, chineses, indianos, árabes, europeus, americanos, e de demais origens, se misturem, as diferenças que tantas guerras já causaram e que têm sido motivos de tantas militâncias, podem desaparecer no futuro. Na verdade os corpos e suas aparências físicas, só vão refletir com mais exatidão os espíritos, e espírito não tem cor, não tem nacionalidade, não tem raça, não têm diferenças financeiras nem intelectuais, são todos iguais, distintos só pela moralidade.

2. Bandeira certa com intenção certa

      “Que aproveita a imagem de escultura, depois que a esculpiu o seu artífice? Ela é máscara e ensina mentira, para que quem a formou confie na sua obra, fazendo ídolos mudos? Ai daquele que diz ao pau: Acorda! e à pedra muda: Desperta! Pode isso ensinar? Eis que está coberta de ouro e de prata, mas dentro dela não há espírito algum. Mas o Senhor está no seu santo templo; cale-se diante dele toda a terra.” 
Habacuque 2.18-20

      Quem tem direito a militar? Talvez a pergunta melhor seja: quem tem a obrigação de militar? Todos têm, contudo, se questões pessoais e interiores não forem resolvidas, as pessoas poderão usar militâncias externas e coletivas como álibis para resolverem problemas dos outros, sem resolverem os seus problemas antes, colocando-se como heróis coletivos para compensarem feridas não curadas que são delas, não do coletivo. É por isso que vemos pessoas “militando errado”, porque trazem questões pessoais que precisam resolver sozinhas, como pautas de agendas coletivas, se alguém tem problemas com autoaceitação, autoestima, tanto fará a cor de sua pele, seria mais sensato resolver-se antes de lutar por causas.
      É claro que problemas pessoais podem ser causados por problemas sociais mais amplos, mas é preciso separar as coisas, alguém que sofreu bullying desde pequeno por ter tendência a engordar poderá até encorajar-se e se tornar um militante do grupo de pessoas com mais peso. Mas qual é o problema, então? O que torna alguém um militante errado? O coração. Antes da pele, do tamanho do corpo ou do sexo se tornar bandeira, o coração deve ser curado, aceitar-se, perdoar os que o oprimiu. Se não houver isso antes, a militância usará a vitimização como arma para agredir os opressores, e vítima que agride também é agressor. A diferença está, não na bandeira, nas palavras, mas na intenção, no interior. 
      O que o texto inicial tem a ver com este tema? Quem milita, ainda que por causas relevantes para a coletividade, mas com um coração cheio de ódio, de rancor, de inveja, de não respeito a si mesmo, e respeito na proporção correta, nem menos, levando à autocomiseração, e nem mais, levando à arrogância, milita, não por uma verdade espiritual alta, que é viva por si só, mas por um ídolo material, morto e vazio. Verdades espirituais não morrem, se impõe por si só, sobrevivem aos homens, mas ídolos são máscaras, mentiras, acabam em nada, não convencerão ninguém, e assim que aquele que fala por eles, mesmo com veemência, com boa oratória, com carisma, com o apoio da mídia, se calar, os ídolos se calam. 
      Escondidos dentro de alguém que milita por uma causa coletiva, podem estar questões pessoais não resolvidas. Quem verifica se uma pessoa trata mal o filho, quando ela se apresenta como feminista militante? Esse é o motivo de gostarmos de assistir reportagens sobre gente cometendo violências, quando uma referência extrema de um mal é apresentada, males menores perdem a relevância, diante de um serial killer assassino de crianças nossos erros ficam pequenos, com os holofotes sobre esses somos relevados. É essa covardia, que se esconde atrás dos erros dos outros, que dá legitimidade para alguém se achar paladino da justiça, e que conduz a linchamentos, sejam físicos ou verbais, ao vivo ou pela internet. 
      Sim, meus queridos cristãos, se as pessoas buscassem curas pessoais em Deus através do verdadeiro evangelho, ricos, pobres, brancos, negros, héteros, homoafetivos, homens, mulheres, eruditos, com menos instrução, os preconceitos, todos eles, desapareceriam. Contudo, não cabe a nós, mesmo sabendo por experiência própria, que o amor de Jesus é maravilhoso, desrespeitar o livre arbítrio que o próprio Deus respeita. Cabe a nós dar um testemunho genuíno, de misericórdia, de justiça, de humildade e acima de tudo de amor que não faz acepção de pessoas. Assim, nosso cristianismo deve ser o primeiro a dar exemplo de militância, não por essa ou aquela bandeira, mas pelo indivíduo, seja ele quem for. 
      Alguém pode argumentar, “mas por que eu preciso ter amor no coração para militar, quem me oprimiu e me oprime não teve e não tem nenhum amor por mim?” Porque senão, com o tempo, você, ainda que esteja defendendo hoje uma causa nobre, se não tiver a intenção correta pode se tornar um novo opressor, por ser motivado por ódio. Militantes, vocês querem justiça ou vingança? O que levará a esses objetivos diferentes é a qualidade, não da bandeira, mas da intenção no coração do militante. Percebemos com clareza, olhando nos olhos do militante e ouvindo o tom de sua voz, quando sua militância é feita por justiça social ou só por recalque pessoal, clamando por justiça em paz ou por vingança em ódio. 

3. Preconceito na história

      “Vós, servos, sujeitai-vos com todo o temor aos senhores, não somente aos bons e humanos, mas também aos maus. Porque é coisa agradável, que alguém, por causa da consciência para com Deus, sofra agravos, padecendo injustamente. Porque, que glória será essa, se, pecando, sois esbofeteados e sofreis? Mas se, fazendo o bem, sois afligidos e o sofreis, isso é agradável a Deus.” 
I Pedro 2.18-20
      “Peço-te por meu filho Onésimo, que gerei nas minhas prisões; o qual noutro tempo te foi inútil, mas agora a ti e a mim muito útil; eu to tornei a enviar.” “Porque bem pode ser que ele se tenha separado de ti por algum tempo, para que o retivesses para sempre, não já como servo, antes, mais do que servo, como irmão amado, particularmente de mim, e quanto mais de ti, assim na carne como no Senhor? Assim, pois, se me tens por companheiro, recebe-o como a mim mesmo.” 
Filemom 1.10-11, 15-17

      Um fator que temos que considerar, é que muitas violências e injustiças foram cometidas em outros tempos. O ser humano era diferente, tinha níveis de inteligência intelectual, moral, afetiva e social, inferiores aos de nosso tempo, estava contido num processo histórico que legitimava certos costumes. Escravidão foi parte da sociedade por séculos, ainda que a escravatura de africanos tenha características diferentes daquela praticada, por exemplo, por gregos e romanos. Uma sociedade pré-industrial crescia fazendo guerras, usando os derrotados como mão de obra, e nessa sociedade homens saiam, guerreavam e faziam o trabalho na terra, enquanto as mulheres tinham que ficar, gerar filhos, administrar família e casa.
      Por favor, não me entendam errado, mas tentemos ser mais lúcidos, em todos os tempos da humanidade existiram seres humanos maus e seres humanos bons, patrões cruéis e patrões justos, assim existiam fazendeiros de bem que mesmo num sistema de escravidão, que hoje temos consciência do quão injusto era, procuravam fazer seu trabalho com alguma humanidade. As pessoas se adaptam, as mulheres se adaptavam a uma sociedade onde o costume era os pais escolherem de antemão maridos para elas, e não pense que todas as mulheres eram extremamente infelizes por causa disso. Ocorre que chega um momento que a consciência evolui, e aí as coisas não podem mais seguir iguais, precisam mudar e para melhor. 
      Uma criança não é infeliz por ser tratada como criança, mas há maneiras justas e injustas de se tratar uma criança, contudo, se um adulto for tratado como criança, mesmo de maneira justa, ele não se sentirá bem, cada coisa para seu tempo e sempre do jeito adequado. Se estudarmos um pouco de história mundial veremos o quanto a humanidade mudou, quanto algumas coisas terríveis foram deixadas para trás, aqui no blog temos falado bastante sobre a história do cristianismo e todas as atrocidades que a igreja católica cometeu. Não pensemos que com isso a grande maioria da sociedade não era feliz, ela levava sua vida normalmente, a maioria nem tinha consciência que algo terrível estava sendo feito em nome de Deus. 
      Junto de militância outra palavra em voga é vitimizar, o grande problema de quem se vitimiza é que só vê o seu problema, mais nada, vitimização não é uma disposição justa, madura, mas infantil e egoísta. Uma coisa não exclui a outra, não é porque há vitimização por um motivo que não se deva militar pelo mesmo motivo, mas o que milita deve ter consciência da nobreza de sua causa, que ela vai muito além de uma dor pessoal. Contudo, é difícil, injusto e até desumano, exigir de quem sofre um preconceito que seja maduro para separar as coisas, a vitimização nesse caso é inerente. Talvez não sejam os oprimidos que devam ser prioritariamente melhores, mas humildemente os herdeiros dos opressores, como obrigação civilizatória.
      Tem gente militando errado? Mais por vitimização que por justiça, mais por vingança que para trazer um bem que beneficiará não só os oprimidos, mas toda a sociedade, não só os afrodescendentes, mas os brancos, não só as mulheres, mas os homens, não só os héteros, mas os de demais sexualidades? Sim! Mas é injusto exigir do doente que luta por direito de tratamento, que se porte com a mesma saúde que aqueles que estão sãos e fora do hospital. Não são os militantes que têm a obrigação de melhorar, são os outros, que desfrutam de situações privilegiadas, que não sofrem com preconceitos, e que por não serem opressores ativos, se sentem no direito de serem passivos na militância. O problema é nosso, não deles! 
      O texto inicial de Pedro é um exemplo bíblico de que nem personagens bíblicos iam contra os costumes de seus momentos históricos, mas a carta de Paulo a Filemon é exemplo de um testemunho pessoal disso. Fala sobre Onésimo, um escravo fujão, que convertido a Cristo precisava voltar a Filemon, seu senhor, que já era convertido e que recebe de Paulo orientação para aceitar o servo, agora não só como tal, mas também como irmão. Por ter se tornado cristão, Onésimo não ganhou direito de não ser mais servo, antes a obrigação de ser um escravo melhor. Esse conhecimento é relevante para que cristãos aceitem que a Bíblia não deve ser transportada ao pé da letra para a sociedade atual, principalmente em termos de costumes.
      Escritores do cânone bíblico não eram revolucionários ou militantes sociais e políticos, eram apenas homens de seus tempos com experiências com Deus. Por outro lado, não cristãos não devem tomar isso como exemplo da Bíblia apoiar escravatura, não é com o costume social que é respeitado, ainda que seja ultrapassado hoje, que devemos aprender, mas com o princípio moral, e esse é justamente o ponto que muitos hoje querem desprezar. Muitos querem liberdade e respeito, mas não querem ser humildes e misericordiosos, assim levantam bandeiras corretas, mas com os corações fragmentados. Bandeiras assim não se sustentam, não por falta de verdade nelas, mas pela fraqueza moral dos que as tentam empunhar. 

4. A luta é de todos

      “Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos” 
Mateus 5.6 
      “E qualquer que tiver dado só que seja um copo de água fria a um destes pequenos, em nome de discípulo, em verdade vos digo que de modo algum perderá o seu galardão.” 
Mateus 10.42
      “Veio o Filho do Homem, comendo e bebendo, e as pessoas dizem: “Eis aí um glutão e bebedor de vinho, amigo de publicanos e pecadores!” Mas a sabedoria é justificada por suas obras.” 
Mateus 11.19 (versão Nova Almeida Atualizada)

      A luta é de todos, o problema é de todos, todos devem lutar por uma sociedade ferida que considera alguns diferentemente de outros. Homens lutem pelas mulheres, brancos lutem pelos afro-descendentes, heterossexuais lutem por todos os que vivenciam outras sexualidades. Contudo, talvez devam lutar os que não sofrem opressão mais até que os que são oprimidos, simplesmente porque eles têm mais condições para isso. Isso não representa qualquer espécie de apropriação cultural, não deve ser encarado como motivo para vitimização orgulhosa, mas aceito humildemente como compaixão, como genuíno evangelho. O que mais mostrou o Cristo encarnado que luta por minorias? Por isso o crucificaram. 
      Jesus homem lutou por aqueles que sofriam preconceitos na sociedade judaica de seu tempo, globalizada pela ocupação romana, acolheu prostitutas, coletores de impostos, leprosos, marginalizados, enfraquecidos por um motivo ou outro. Muitos fracos estão em situações que devem ser administradas porque não podem ser mudadas, esses são todos os seres humanos na infância, os deficientes mentais, muitos sem-teto, que não estão preparados para competir com adultos produtivos e sãos, esses precisam ser amparados. Entretanto, muitos estão enfraquecidos pelas contingências da realidade no mundo, esses podem lutar, mas também precisam da ajuda dos outros para que suas situações mudem.
      O que muitos militantes precisam entender hoje em dia é que certas bandeiras são muito importantes, mais até que eles, e por isso são pesadas, se eles não tiverem força moral elas não ficarão de pé. Jesus, sozinho, empunhou a mais pesada e importante das bandeiras, aquela que libertaria e conduziria todos os seres humanos, de todos tempos, raças e posições, sejam financeiras, intelectuais ou religiosas, ao Altíssimo Deus. Cristo, contudo, só conseguiu empunhar essa bandeira, só pôde militar certo, e sem apoio de ninguém, visto que em seu último e crucial momento todos o abandonaram, até seus amigos mais próximos, porque tinha força moral e espiritual, adquirida em vida de íntima comunhão com Deus. 
      Quantos hoje acham legitimidade para militar porque podem se esconder no meio das massas, sim, “juntos somos mais fortes”, e a existência de grupos pode evidenciar a legitimidade de uma causa, mas será que muitos hoje se insurgiriam sozinhos contra uma injustiça? E nem estou dizendo que correndo o risco de exporem suas vidas à morte, não estou chegando a esse extremo, mas só por exporem um ponto de vista diante de uma sociedade virtual que cancela todos que discordam de seus pontos de vista. Eu sei que muitos precisam mais é serem cancelados (outro termo em voga), principalmente se militam errado, mas muitos de nós nos calamos, mesmo diante de injustiças, só para não ganharmos dislikes.
      A verdade é uma só, preconceito só se anula com amor verdadeiro, assim enganam-se os que acham que podem vencê-lo com boa educação que respeita direitos civis, isso pode até mudar palavras e ações, mas não mudará a intenção, o coração. Muitos se consideram sinceramente superiores aos outros por serem educados, por obedecerem a leis, por não exercerem violência ativa. Mas lá dentro, em seus corações, eles se acham melhores só por serem quem são, e por isso se sentem com mais direitos que os outros. Orgulho negro? Orgulho gay? Orgulho feminino? Ou orgulho branco, hétero e masculino? Antes de tudo isso, orgulho de ser humano, de ser indivíduo único, e mais, de ser espiritual, eterno e filho de Deus. 
      É nesse ponto que a humanidade deve chegar, e do jeito que vai, podemos ver isso, ainda que existam hoje tantos equívocos que mais desunem que unem. Antes se via dois tipos de sexo, depois passou-se a ver três, mas hoje se entende muitas sexualidades, assim a militância não será nem por grupos majoritários, nem por minoritários, mas pelo indivíduo, seu amplo livre arbítrio para ser o que escolher. Não é essa a bandeira que o verdadeiro Deus levanta e pela qual Jesus militou? Não, meus queridos, não é a bandeira do cristianismo oficial no mundo, representado pelo catolicismo e pelo protestantismo, mas a do Cristo genuíno, cujas palavras estão registradas num evangelho de amor e justiça, eis como militar certo!  

5. Teoria de conspiração, grana e sexo

      “Rogo-vos, porém, irmãos, pelo nome de nosso Senhor Jesus Cristo, que digais todos uma mesma coisa, e que não haja entre vós dissensões; antes sejais unidos em um mesmo pensamento e em um mesmo parecer.” 
I Coríntios 1.10

      Não creio em teorias de conspiração, em nenhuma delas, sejam de direita, de esquerda, de centro etc. Olhando todas essas militâncias atuais, muitos nelas veem teorias de conspiração, acreditam que bandeiras são levantadas com o objetivo de colocar grupos contra grupos, de maneira a lançar a sociedade em guerra. Para quê? Para gerar caos, e quando isso for feito “alguém” poderá tomar o comando, é mais fácil dominar uma sociedade desunida, assim, dividir antes para conquistar depois. Dividir para conquistar é um conceito antigo, foi utilizado pelo governante romano César (“divide et impera”), por Filipe II da Macedónia e pelo imperador francês Napoleão (“divide ut regnes”), dentre outros (veja mais no link).
       Quem as pessoas acham que pode dominar em um caos estabelecido? Muitos cristãos acham que será o anticristo, muitos da esquerda acham que será um ditador facista, muitos da direita acham que será o comunismo, enfim, existem teorias de conspiração para todos os gostos e ideologias. O que é mais sensato pensar de acordo com esse que vos escreve? Que o que ocorre no momento atual é só mais uma etapa da evolução humana no planeta Terra, com enganos, como ocorre sempre no início de novas etapas, mas como efeitos de necessidades legítimas, cujas bandeiras serão purificadas pelo tempo que darão, no momento certo, bons frutos. Deus é mais, está sempre no controle, não existe plano secreto do diabo, capice
      É preciso dizer algo sobre teoria de conspiração, ela nasce de uma necessidade íntima e sincera das pessoas, na verdade algo profundo e eterno que vem da essência espiritual do ser humano que clama por Deus. Por isso a curiosidade pelo desconhecido, a paixão pelos mistérios, a busca de respostas para aquilo que o homem não consegue entender, até aí tudo bem. Contudo, ao invés do ser humano buscar o Deus altíssimo, abrir diante dele o coração, persistir nessa busca para então receber respostas, todas elas, e de alguém que não mente, o homem assume que existem coisas que não podem ser perguntadas a Deus, ou que ninguém sabe mesmo, então, não querendo confiar no Senhor, confia em teorias de conspiração. 
      As artes, principalmente a literária e a cinematográfica, são construídas a partir dessa curiosidade humana, e se isso ficasse só aí, como imaginação para entretenimento, não haveria problema, o problema é quando os homens começam a acreditar nas teorias de conspiração, aí viram paranóia, doença mental. Entendamos uma coisas, no plano físico, abaixo do poder de Deus, existem dois poderes supremos, um é o do sexo, o outro é o da grana, se não existe Deus como foco, homens desejarão dinheiro e prazer sexual. Mesmo os que se acham espiritualizados, mas não buscam o Deus altíssimo, querem alguma espécie de poder, ainda que supersticioso, para serem ricos financeiramente e poderem ter na cama quem desejarem. 
      Papas buscaram esses poderes, assim como bruxos, imperadores, presidentes, donos de corporações, e homens comuns como eu e você, se não existe Deus, há grana e sexo na jogada. Assim, o grande plano do mal é seduzir as pessoas por esses poderes, é isso que conspira contra a humanidade, e isso esta dentro delas, não fora, para obtê-los, quem não tem Deus como prioridade, usará de todas as artimanhas, mesmo o mundo espiritual. Não é o diabo que manipula o homem, mas o homem que utiliza o diabo, que o inventa, que o empodera, para tentar satisfazer seu corpo físico com dinheiro e prazer sexual, o mesmo homem que depois culpa um demônio exterior pelos frutos amargos que, quem busca satisfação em mentiras, colhe. 
      Talvez a grande conspiração que exista, o mais eficiente plano secreto do mal, e eu disse do mal, que existe no interior do homem, não do diabo como ser externo, seja o homem acreditar que pode ser virtuoso sem Deus. Assim ele se ilude, achando que pode lutar por bandeiras elevadas, mesmo que não se quebrante diante do Senhor, sendo que na verdade só quer satisfazer a carne, esse plano nivela todos os seres humanos por baixo. O que isso tem a ver com militância ideológica? Se não há Deus no coração, mesmo lutas legítimas podem ser só jogo de poder. Por justiça? Não, justiça só há em Deus, mas jogo de poder por grana e sexo, ainda que iludidos muitos iniciem suas “jornadas” achando-se paladinos da justiça. 
      “Não erreis: Deus não se deixa escarnecer; porque tudo o que o homem semear, isso também ceifará” (Gálatas 6.7), o que semeia não são nossas palavras, nossas bandeiras, é a nossa intenção que realiza, é ela quem move e comunga com o plano espiritual, que escolhe que Deus abençoe ou que outros espíritos trabalhem. Ainda que sejam aparentemente boas, obras feitas fora da luz mais alta de Deus não prevalecem, ninguém se engane com relação a isso. Dividir para conquistar? Um plano secreto do diabo? Não, só teorias de conspiração enganosas, que escondem as maiores militâncias humanas, grana e sexo. Busquemos a Deus que ilumina quem o busca e o liberta do engano de todas as falsas militâncias.    

6. Hitler, arquétipo diabólico
 
      “O homem ímpio cava o mal, e nos seus lábios há como que uma fogueira. O homem perverso instiga a contenda, e o intrigante separa os maiores amigos. O homem violento coage o seu próximo, e o faz deslizar por caminhos nada bons.” 
Provérbios 16.27-29

      Militância de direita, eis uma bandeira que não foi levantada no Brasil, de maneira significativa, por um bom tempo, principalmente pelos remorsos deixados pela ditadura militar, e que permitiu à esquerda liderar politicamente, mas que ressurgiu e tem sido apoiada por muitos cristãos. Para entendermos melhor o perigo de se militar não só por homens, mas por homens que usam bandeiras divinas como meios de fortalecer suas causas e convencer as pessoas, que é o que ocorre com militância de direita atualmente no Brasil, refletiremos um pouco sobre o arquétipo de líder facista, o alemão Adolf Hitler, que levou o mundo à segunda guerra mundial. É fascinante a personalidade desse terrível personagem, que num momento certo achou num povo as condições adequadas para estabelecer seu intento. Cuidado, os que buscam salvadores da pátria, podem achar só falsos messias. 
      Quando eu pensava que já tinha assistido todos os documentários possíveis sobre a segunda guerra mundial, assisti um, na CNN Brasil, com depoimentos colhidos pela BBC de pessoas que viveram nas décadas de 1920 e 1930, especificamente sobre o carisma de Hitler. Hitler, fisicamente era descrito como um homem comum, que berrava com uma voz rouca e estridente, sua aparência externa não impressionava, mas ele tinha algo em seu interior que era lançado por seus olhos, por seus gestos e por suas palavras, que conquistava as pessoas. Hitler não chegou onde chegou por sorte ou ao acaso, ele construiu uma personalidade que se conectou com milhões, ele achou determinação para isso em uma convicção pessoal de que era alguém predestinado por aquilo que ele denominava como “providência”, uma força espiritual que chamou-o inicialmente e orientava-o nas decisões. 
      Adolf transformou seus limites, falta de talento para debates, argumentos fracos e cheios de ódio e preconceitos, e dificuldade em estabelecer vínculos afetivos, em vantagens, que muitos interpretaram não como fraquezas, mas como empatia. Ele não queria só dar uma vida decente para um país, ele queria colocar um povo como superior no mundo, dominando militarmente outras nações, e exterminando aqueles que considerava inferiores, ele pregava a superioridade ariana. Seja como efeito da condição de seu povo, ou usando essa condição para exaltar seu ego doentio, ele achou uma Alemanha derrotada na primeira guerra mundial, humilhada pelo Tratado de Versalhes e dentro de uma depressão econômica mundial, ódios principalmente pelos  judeus, e ressaltou temores, como pelo comunismo que despontava como solução para levantar os germânicos, isso tudo para construir uma intenção. 
      O que não faz um homem machucado e não resolvido, com carisma e achando outros em iguais condições que só precisam de um líder. A responsabilidade não foi só de Hitler pelo genocídio que houve, mas da maioria do povo alemão da época que lhe deu ouvidos. Eis fatores importantes nas mãos de um líder populista, conhecer as fraquezas de alguém, assim quando ele se levanta como líder, não é para lutar por interesses pessoais, como alguém que pensava só em si, mas como um paladino altruísta, que batalha pelos direitos dos fracos. Enfraquecer para liderar, eis outro princípio eficiente, e se alguém não está fraco o suficiente, enfatiza-se essa fraqueza com discursos apaixonados. Hitler desempenhou esse papel, sim, porque ele parecia isso, um ator encenando um papel e fazia isso o tempo todo, não só como líder político, mas como messias religioso. Dessa forma ele descobriu e potencializou as fraquezas de outros para depois se colocar como aquele que poderia livrar esses de suas fraquezas. 
      Há inteligência nessa estratégia, Hitler sabia o que queria desde o início, e mesmo em 1923, quando seu golpe de estado em Munique para tentar tomar o poder fracassou, resultando em sua prisão, durante a qual ele escreveu o manifesto político, Mein Kampf ("Minha Luta"), ele usou isso para firmar uma característica importante num messias, a de mártir. O “fühler” manipulou todo o ambiente, mostrou o problema, apontou a causa e conectou-se com a vítima, convencendo-a que sua solução era a melhor, e não fez isso com trabalho em grupo, mas como um personagem, que sozinho tinha todas as melhores respostas. A ele se juntaram outros homens, isso é certo, poderosos e competentes, na área militar e também na do marketing, e Hitler soube usar muito bem o marketing para criar a figura de um salvador. Mas ele deixava bem claro que a palavra inicial e a final eram dele, de mais ninguém, e ai dos que se levantassem contra isso. 
      Hitler não demonstrava a carência, que muitos líderes tiveram e têm, de necessidade de apoio dos outros para tomar decisões, ele se mostrava sempre seguro e todos viam nele uma rocha firme em quem podiam confiar, isso só mudou de fato em seus últimos dias. Adolf não se apresentava só como um homem, mas como um deus, mesmo parte da igreja cristã protestante alemã da época o apoiou. Um homem não acessa tanto poder e consegue se conectar a tanta gente usando só argumentos políticos, mesmo se aproveitando de uma situação econômica terrível. Os grandes líderes entendem que o mundo espiritual tem um apelo forte sobre os homens, assim constróem ambientes religiosos ao seus redores, templos para que sejam, não só obedecidos, mas adorados, e não só nesta vida, mas na outra. Hitler usou de vários meios para conferir legitimidade espiritual a seu império, enviando equipes pelo mundo para colher objetos aliados à magia e ocultismo, e praticando rituais mágicos (veja mais no link).
      Que fique bem claro que não estou fazendo aqui comparações, muito menos lançando indiretas. Aliás, seria injusto comparar Hitler com quem quer que seja, pela gravidade extrema e singular de seus atos na humanidade, especialmente para o povo judeu. Concordo que esta reflexão foi mais compartilhamento histórico que orientações morais, mas certas informações podem nos ajudar a entender certos mecanismos do mal espiritual, tentando prevalecer no mundo físico. Estar na luz de Deus é mais que amar o próximo e viver de trabalho honesto, isso é o mais importante, mas não é tudo, precisamos ser cidadãos realmente do bem, não como militantes políticos, mas como filhos do Altíssimo. É importante termos discernimento espiritual para percebermos a tempo a atuação de homens maus, que podem usar qualquer coisa para terem poder. Ninguém se engane, o falso pode não ser fácil de ser reconhecido, se fosse a Bíblia não diria, “porque surgirão falsos cristos e falsos profetas, e farão tão grandes sinais e prodígios que, se possível fora, enganariam até os escolhidos” (Mateus 24.24). 

7. Quem é o anticristo?

      “Filhinhos, é já a última hora; e, como ouvistes que vem o anticristo, também agora muitos se têm feito anticristos, por onde conhecemos que é já a última hora. Saíram de nós, mas não eram de nós; porque, se fossem de nós, ficariam conosco; mas isto é para que se manifestasse que não são todos de nós. E vós tendes a unção do Santo, e sabeis tudo.” 
I João 2.18-20
      “Respondeu Jesus: O meu reino não é deste mundo; se o meu reino fosse deste mundo, pelejariam os meus servos, para que eu não fosse entregue aos judeus; mas agora o meu reino não é daqui.” 
João 18.36

      Algumas coisas não são bem o que parecem ser, ter convicção, por exemplo, não significa estar certo, só ter fé não confere legitimidade para que se receba algo, pelo menos não de Deus. Seguir alguém que tem certeza do que é, quer e faz, pode parecer seguro, nos dar o foco que podemos não achar em nós mesmos, mas delegar escolhas para os outros nos colocará como escravos dos outros, assumiremos a responsabilidade de erros dos outros. Usar o nome de Deus não significa ter aprovação de Deus. Eis uma estratégia que líderes populistas de direita podem usar, colocar Deus na história, e quem coloca Deus de maneira errada numa causa, certamente colocará também o diabo, como seu antagonista e no lado dos inimigos de sua causa, na outra militância. Um conflito entre Deus e o diabo pode ser tudo que muitos cristãos equivocados necessitem para militarem por uma causa, esses podem pensar, “se Deus está envolvido devo me envolver, e do lado dele, com certeza se há Deus, a vitória é do lado dele”. 
      Isso é muito perigoso, pode ser usado para envolver cristãos em militâncias que eles não entrariam se vissem claramente que eram só conflitos entre ideologias humanas e políticas. Não estou comparando nenhum líder político brasileiro de direita ao “fühler”, longe disso, mesmo porque não acho que eles tenham, não só a maldade, mas também a inteligência do Adolf. Também não acredito que Deus tenha esse grau de provação para o povo brasileiro, contudo, precisamos ter cuidado (leia mais na reflexão anterior). "O poder tende a corromper, e o poder absoluto corrompe absolutamente, de modo que os grandes homens são quase sempre homens maus” (John Dalberg-Acton), por isso não é sábio cristãos se envolverem com militância política, querer estabelecer o reino de Deus no mundo é heresia (interpretando errado Deuteronômio 11.24-25 para os dias atuais e para o Brasil). Ainda assim é nessa tentação que muitos evangélicos têm caído, quando veem num político que se diz simpatizante de causas cristãs um salvador, ser simpatizante não significa ser cristão. 
      O que é um ídolo senão aquilo que está abaixo do céu mais alto e o homem põe o olhar buscando solução para sua vida para depois adora-lo? Um mito não é Deus, pode ser só uma fake news antiga que hoje parece verdade só por ser antiga, mas pode se transformar num diabo, ainda que apresentando-se como um profeta divino. Para um líder populista de direita é fácil defender causas cristãs convencionais, como não ao aborto, sexualidade binária, valores familiares tradicionais, Cristo como única verdade. Isso engaja multidões em sua militância, isso ganha eleições, mantém cargos políticos e lhe veneração a um líder. O engano é que causas ditas como de esquerda, como conceito mais amplo de sexualidade e casamento, não ao racismo, feminismo, defesa de minorias e de causas ecológicas globais, podem ser tomadas como bandeiras de uma militância demonizada pela direita, e isso ao pé da letra, a esquerda pode ser vista como militando por estratégias do diabo para corromper a sociedade e fortalecer o anticristo.  
      Em conflitos estabelecidos por líderes populistas não há espaço para o equilíbrio, o seu lado é do bem e o outro é do mal, e em se tratando da ótica de cristãos equivocados engajados, o seu lado é de Deu e o outro do diabo. Essa militância extremista não entende que a justiça está no meio, que existe o bem em coisas de ambos os lados, assim como existe o mal. Deus sempre se encontra no centro, não por ser isento, mas por amar a todos, e se revelar a todos que o querem conhecer, indiferente de ideologias políticas pelas quais lutem. É claro que por causa de todo um processo histórico, certas bandeiras se tornaram tradições de esquerda e outras de direita. A luta contra ditadores, por exemplo, parece ser mais pauta da esquerda, ainda que existam também ditadores de esquerda e bem violentos (é só estudarmos um pouco as histórias da Rússia, da China e da Coreia do Norte, por exemplo). Já o conceito de luta contra um anticristo, que representa todo o mal, é uma bandeira tradicional da direita cristã, ainda que para a esquerda um líder facista torturador seja uma espécie de “anticristo”. 
      Os anticristos, aos quais João se refere em sua primeira carta, são os gnósticos e seitas vertentes, desviados do evangelho de sua época, por isso ele diz no capítulo dois saíram de nós. Esses defendiam que “o conhecimento é superior à virtude, que o verdadeiro significado das Escrituras está no sentido não literal”, “que o mal no mundo impossibilita que Deus seja o criador, que a Encarnação é coisa incrível porque a divindade não pode se ligar a nada que seja material - tal como o corpo, e que não existe a ressurreição da carne”. Outra vertente “defendia que Jesus não era humano sob qualquer aspecto, mas uma teofania meramente estendida”, por isso a exortação, no capítulo quatro da mesma carta, Cristo veio em carne (leia mais em Comentário Bíblico Mood). Anticristo, termo tão usado hoje, não é bem o que parece ser, fez sentido para a época em que foi usado, aliás, engano que muitos que fazem estudos bíblicos comentem frequentemente, usarem textos antigos para defenderem assuntos atuais, que pouco podem ter a ver com o que motivou os escritores bíblicos a escreverem originalmente. 
      Mas o que de fato significa anticristo na prática para nós hoje? Algo que nega Cristo, que se apresenta como um opositor a tudo o que Jesus representa (I João 4.2-3). Mas o que Jesus representa? Podem ser coisas diferentes para pessoas diferentes. Os homens entendem relevâncias diferentes no evangelho de acordo com aquilo que acham importante para suas vidas, assim o conceito de anticristo pode não ser algo constante, novamente, algumas coisas não são bem o que parecem ser. O cristão que crê que deve ter prosperidade material no mundo e que pode colocar no governo um político que defenda sua religião, se forem transportados os objetivos que Deus tinha com a nação de Israel na velha aliança (conforme Deuteronômio 11.24-25) para a igreja da nova aliança, pode achar que anticristianimos é crer que no mundo temos que viver de maneira mais simples, que não temos que ser prósperos só por sermos cristãos, que não precisamos ter um presidente evangélico e nem nos envolvermos ativamente com militância política. 
      Por outro lado, o que vê o reino de Deus como algo que só será plenamente realizado no plano espiritual, entendendo dessa forma a palavra de Jesus (por exemplo em João 18.36), pode definir anticristianismo como tentar estabelecer um reino de Deus no mundo hoje. Os dois entendimentos têm embasamento bíblico, qual te representa? Que posicionamento você tem agora, após alguns anos de um governo que se elegeu apoiado por muitos cristãos e se dizendo defensor dos verdadeiros valores da tradição judaica-cristã? Contudo, talvez a pergunta que se deva fazer seja: qual a orientação de Jesus pelo vivo Espírito Santo ao homem do século XXI? O tempo mostra os frutos, é por eles que avaliamos as árvores, e para quem quer ver frutos já têm sido mostrados, basta enxergar as consequências de uma administração federal negacionista diante de uma pandemia. Mas ninguém se iluda com lados, há militantes errados na esquerda e na direita, só não caem em armadilhas os que se colocam no Deus verdadeiro, não em homens, sejam políticos, religiosos ou outros, homens sempre militam errado. 

8. Servos não militam por si
 
      “Nada façais por contenda ou por vanglória, mas por humildade; cada um considere os outros superiores a si mesmo. Não atente cada um para o que é propriamente seu, mas cada qual também para o que é dos outros. De sorte que haja em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, que, sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus, mas esvaziou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens; e, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz.” 
Filipenses 2.3-8

      Políticos não são donos de cidades, estados ou países, políticos são escolhidos pelo povo para servirem o povo, são nossos empregados, portanto, servos de todos, não senhores. Um empresário pode ser patrão, construiu em negócio que é seu, para seu benefício, ainda que tenha empregados e deva, como cidadão e como ser moral, respeitar os direitos desses empregados, entretanto, políticos não são donos de empresas e não têm direito de usar o que administram em benefícios próprios. O exército brasileiro, não é do presidente, de um governo, nem do de direita e muito menos do de esquerda, mas do Brasil, do povo brasileiro, assim como todas as instituições estatais, sejam nas áreas que forem. Por isso, acima de tudo, a consciência que deve haver na mente de políticos é a de um humilde servo com um emprego temporário.  
      Como tal ganha, e deve ganhar, um salário decente para ter tempo para poder desempenhar sua função, enquanto sustenta uma vida digna para si e para sua família, mas sua satisfação maior deve ser a alegria de ter a honra de poder representar por um cargo político, não seus interesses, mas os interesses de membros de uma nação, e tendo esses votado ou não no político. Isso nada tem a ver com religião ou com vida espiritual, mas com vida social civilizada, contudo, se políticos devem ter a consciência de que são servos, muito mais líderes religiosos cristãos, de todas as denominações e seitas, católicos, protestantes ou outros, se é que querem levar o nome de cristãos. Essa missão deve ser desempenhada por e em amor, não para dar sentido a uma vida pessoal não resolvida, se alguém quer servir como religioso deve se ajudar antes de ajudar os outros.
      Servo, o texto inicial define essa função com precisão, mas não são só líderes religiosos que devem servir ao próximo, todos nós, de alguma maneira, somos vocacionados para servir. Numa reflexão que pensa em tantos que parecem militar só para terem lugar de fala para se sentirem importantes e parte de algo maior que eles, para darem sentido a vidas muitas vezes não resolvidas e terem cargos políticos, entender o servo bíblico pode confrontar muitos com um conceito mais alto, e quiçá, fazê-los repensar o porquê de suas militâncias. Uma virtude que um servo chamado por Deus precisa ter é humildade, que não se acha dono de algo, mas só administrador temporário do que lhe é emprestado. Nossa existência no mundo é isso, com nada viemos e com nada sairemos, a não ser com as virtudes que conseguirmos fixar em nossos espíritos. 
      Mas mesmo desprendimento material, se for só isso, pode conduzir a uma missão equivocada, muitos são humildes, não querem ser donos de nada, mas vivem uma espiritualidade só para eles mesmos, militam só por si. O texto inicial diz mais sobre o exemplo maior de servo que a humanidade na Terra conheceu, Jesus, um servo serve, simples assim, mas não a si mesmo, aos outros, e faz isso até as últimas consequências se for necessário. Jesus serviu a mim e a você até à morte. Mas calma, não somos chamados para sermos cristos, não temos quilate moral para isso, Deus conhece nossos limites e sabe o que pedir de nós, de maneira que possamos servir com alegria e da melhor maneira que pudermos. Mas cada um de nós, se procurar em Deus dentro de si mesmo, saberá exatamente o que precisa fazer para ser útil para abençoar alguém. 
      Temos que ter algum cuidado, sempre que o conceito sacrifício se apresenta, temos a tendência de interpretar esse termo de jeitos errados. Podemos nos sacrificar, ou por medo de não conseguirmos dizer não a quem só quer nos explorar, ou para termos de alguns algum afeto, mesmo que a preço de sangue. Podemos exigir sacrifícios dos outros por colocarmos nos outros a culpa por problemas que são nossos, mas mesmo que nossos problemas tenham sido legitimamente causados por terceiros, podemos nos achar no direito, como vítimas, de exigir que alguns se sacrifiquem por nós. Quem se sacrifica desnecessariamente não é feliz, tentará ajudar os outros, mas não se ajudará. Quem exige sacrifícios dos outros também não é feliz, sempre achará que os outros lhe devem alguma coisa, assim não amará, não se sentirá amado e não conseguirá servir a Deus. 
      “Porque eu quero a misericórdia, e não o sacrifício; e o conhecimento de Deus, mais do que os holocaustos” (Oseias 6.6), muitas vezes nos sacrificamos simplesmente porque isso parece mais fácil fazermos que sermos misericordiosos, mas só somos misericordiosos quando provamos misericórdia e só provamos misericórdia quando somos humildes. “Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração; e encontrareis descanso para as vossas almas” (Mateus 11.29), que texto maravilhoso é esse, daqueles que vêm do centro do evangelho. Quer militar por uma causa que valha a pena? Comece militando por si mesmo, ache a paz e a segure, humildemente com todo o coração, seja curado, só depois você poderá entender o que é ser servo, e só um servo de verdade pode lutar uma militância legítima e por amor.     

9. Vocação para ser escravo??

      “Cada um fique na vocação em que foi chamado. Foste chamado sendo servo? não te dê cuidado; e, se ainda podes ser livre, aproveita a ocasião. Porque o que é chamado pelo Senhor, sendo servo, é liberto do Senhor; e da mesma maneira também o que é chamado sendo livre, servo é de Cristo.” 
I Coríntios 7.20-22

      Logo de início chamo a atenção para que ninguém julgue o título sem ler todo o texto, tanto que o coloquei como pergunta, não como afirmação. O texto bíblico inicial deve ser entendido em camadas, a primeira é a do contexto histórico em que Paulo o escreveu, essa pode ser polêmica nos dias atuais. Paulo diz que o que é escravo deve permanecer assim, e o que é senhor (de escravo) também deve continuar dessa maneira, e que ambos podem ser felizes em Cristo nisso. Será que tantos que leem o texto o entendem de fato? Ou só passam a vista e o aceitam, “afinal”, pensam muitos, “está na Bíblia e deve ser aceito”. 
      O texto define o conceito de vocação, ele não tem a ver só com aptidão física natural e dons espirituais recebidos, mas com a identidade interior do ser humano, que também vai além de sua formação social e emocional e sua ocupação profissional. Por isso Paulo diz que o que tem a vocação de servo deve continuar como tal, nisso não temos embasamento bíblico que incentiva escravatura, principalmente nos dias atuais, mas só a revelação que Paulo escrevia como homem de seu tempo para uma sociedade de seu tempo, ainda que fosse servo de Deus com conhecimento e prática do mais puro evangelho de Jesus Cristo. 
      O ponto desta reflexão não é confrontar militâncias legítimas com preconceito por cor da pele, ou por direitos de afrodescendentes, o ponto não é militâncias coletivas, mas pessoal, e que pode independer de características externas. Somos definidos espiritualmente pelo lugar e pela família na qual nascemos, fomos educados e por características e gostos intelectuais que temos? Não, e nisso também está implícito que ninguém é “burro”, aliás esse termo é inadequado sob diversas instâncias, todos podemos desenvolver habilidades e competências com o que temos nas mãos, se quisermos e nos esforçarmos para isso. 
      Todas as nossas especificações físicas, intelectuais, emocionais e sociais, são ferramentas para que nossos homens interiores evoluam, e isso precisa ser considerado assim porque na eternidade não fará diferença a graduação acadêmica, a sofisticação de nossos trabalhos, a fineza de nossas educações sociais. O que vai valer são as virtudes morais que tivermos em nossos espíritos, que foram construídas à medida que fizemos escolhas em fé e praticamos obras de amor com a vocação espiritual que recebemos de Deus. Eu já vi muitas discrepâncias nesta vida, desejo de aparentar que não se casava com a prática.
      Vi pessoas criadas em famílias pobres, que nem o português falavam direito, mas que se portavam socialmente com nobreza, com muita sabedoria, com uma delicadeza aristocrática, eram doutores em peles de trabalhadores braçais. Mas eu vi também o contrário, gente bem estudada, acostumada com luxos, com as melhores roupas e usufruindo de comidas sofisticadas, que viajaram pelo mundo, em profissões que só se relacionavam com gente do mesmo nível social, contudo, absolutamente estúpidas, insensíveis, comilões e beberrões viciados em prazeres baixos do corpo, sem nenhuma sensibilidade para tratar os outros. 
      A ótica simplista que muitos cristãos se acostumam a ter da humanidade, ensinados por suas tradições religiosas, não acha base na realidade, há algo a mais que simplesmente crer em Cristo e ganhar o céu. O que ocorre de verdade é que alguns Deus coloca no mundo para serem uma coisa, e não outra, e não serão felizes nem farão os outros felizes se não entenderem e viverem isso. Não somos definidos por ocupações, nem pelo meio, mas por nossas vocações espirituais, elas vêm conosco em nossos nascimentos, definem nossas identidades espirituais, e são elas que devem ser evoluídas neste mundo, não outras coisas.
      É essa lição que está meio que escondida de uma rasa e equivocada interpretação do texto inicial, o que o Espírito Santo pode nos ensinar não é aceitar escravidão física e social como sua vontade, não é isso, mas é entendermos que se formos chamados para servirmos como coadjuvantes, não acharemos paz sendo protagonistas, tomando a frente para liderar, se nossa vocação é sermos discretos, não teremos paz discursando, mesmo tendo coisas legítimas a dizer. Deus vocaciona para crescimento, assim poder mas não fazer para cumprir uma vocação, é tão eficiente quanto a princípio não poder mas se esforçar para fazer porque se é vocacionado. 
      A primeira e mais importante militância é a que precisamos fazer por nós como indivíduos, ela deve ser correta, de acordo com a vocação que Deus nos dá, mas só descobre essa vocação quem busca a Deus, e não só a religiões. Você sabe qual é a sua vocação? Seja qual for, ela pode ser executada com qualidade, de maneira que você receba ainda neste mundo retorno para ter uma vida digna e em paz. Mesmo o servo chamado por Deus, é livre, e ainda que seja senhor, tem o privilégio de a Deus servir, o segredo da paz não está em ser servo ou ser senhor, mas em estar em Deus, nisso conhecemos o Altíssimo e a nós mesmos. 
      Muitos militam errado, e mesmo por grandes e boas causas, porque não se aceitam como seres humanos, nesse conflito há uma insatisfação que o homem pode tentar satisfazer com militâncias coletivas. Visto como líder de uma militância importante, ele pode achar uma valorização que sente que não tem como indivíduo, mas se essa for a razão principal que o leva a militar ela é falsa, um dia o deixará na mão, só, fraco e infeliz. Resolva-se primeiro, antes de querer resolver problemas alheios, não se esconda atrás de bandeiras, você até poderá conquistar direitos para os outros, mas seu coração continuará sem paz. 

10. Pela liberdade mais plena

      “Estai, pois, firmes na liberdade com que Cristo nos libertou, e não torneis a colocar-vos debaixo do jugo da servidão.” 
Gálatas 5.1

      Luta pelas minorias, eis a bandeira principal de tantas militâncias, a fim de que todos os seres humanos possam ser aquilo que querem, onde e quando quiserem. Isso é lutar pela liberdade, mas a verdade é que em se tratando de humanidade, o conceito de minoria é ilimitado. Veja por exemplo o conceito de sexualidade, de dois sexos passou-se a três, depois a quatro, sete (LGBTQIA+), e hoje já se fala no conceito de não se ter conceito, onde não se é obrigado a fazer escolha definitiva, pode-se ser qualquer coisa e mesmo nenhuma. Mas será que são todos que não querem referências binárias? Para defendermos de fato a liberdade, nem a própria liberdade deve ser imposta, as pessoas precisam ser livres mesmo para escolherem não ser, isso porque o que uma pessoa acha ser liberdade pode não ser liberdade para outra.
      A bandeira mais inclusiva talvez não seja a da liberdade, mas a do individualismo, e não entendendo isso, muitos, achando-se paladinos da justiça social, são na verdade só autoritários ressentidos, querem obrigar os outros a serem o que eles querem ser e acham que são impedidos de ser. Só pode ser livre aquele que se liberta da carência de aprovação alheia, quem quer se algo, mas para exibir isso aos outros, para lançar na cara dos outros que é isso ou aquilo, tem necessidade, não de liberdade, mas de reconhecimento externo. Quem depende do outro para ser feliz nunca será, sempre será escravo de homem e esse é patrão injusto e nunca satisfeito, como vício, sempre quer mais. Mas quem quer ser para si, tem paz que não depende do que o outro pensa, é livre no espírito, e ao espírito nenhuma algema humana pode amarrar.
      O que há por trás da tal liberdade tão almejada hoje por tantos? Está um espírito encarcerado, e sendo assim não é liberdade física, afetiva ou intelectual que irá livra-lo. Isso, contudo, não impede um ser humano que não quer se aproximar do verdadeiro Deus de tentar. O que um homem longe de Deus acha querendo ter liberdade? Acha o caos, um abismo infinito para cair, e quem cai, cai para baixo, para mais longe de Deus. A real liberdade está em cima, no Altíssimo, essa não se alcança movendo-se para baixo, mas elevando-se, só sobe quem se livrou de todos os pesos e então, leve o suficiente, flutua e eleva-se. Mas os que tentam se livrar dos pesos dos preconceitos e das falsas moralidades não ficam leves o suficiente para subirem? Não, quem pesa é o espírito, e leveza espiritual só uma íntima relação com Deus confere. 
      Muitos pais modernos tentam criar filhos no caos e pensam estar fazendo a coisa certa, mas crianças em desenvolvimento físico, intelectual e afetivo, precisam de referências. Na matemática ninguém começa aprendendo física quântica, primeiro aprende-se operações aritméticas. É errado ensinar sobre dois sexos? Não, são as referências físicas mais comuns, ainda que não reflitam as interiores, estão ligadas a características do corpo, masculino e feminino. Depois, acompanhando em amor e com valores morais, os que criam devem verificar o processo, não impondo, não usando de qualquer espécie de violência, incluindo orientações religiosas. Pais sábios, respeitando especificações individuais, devem achar o equilíbrio entre a visão científica e sempre renovada da pedagogia, e a religião na qual criam filhos. 
      Pais que amam devem estar preparados para que filhos sejam totalmente diferentes deles, fazendo escolhas que mesmo eles não fariam. O ser humano deve ser educado para assumir o que ele é, indivíduo que sozinho veio ao mundo e sozinho voltará à eternidade, com todas as suas escolhas pessoais. Isso não significa não ensinar valores morais, criar mau caráter, mas principalmente nas áreas afetiva e sexual, significa deixar a pessoa ser aquilo que sempre foi, e que pode ter ficado meio escondido na infância. Pais cristãos precisam entender que identidade sexual é algo muito pessoal, não pode ser imposta, entretanto, só entendem isso pais que têm uma experiência com Deus, não só com o que é ensinado pela tradição religiosa, caso contrário ao invés de libertarem, encarcerarão e produzirão seres humanos infelizes. 
      Pais cristãos, estamos de fato criando os filhos que Deus nos permitiu, muito mais que fazer, ensinar, e isso ouvindo o Senhor? Ou queremos só fabricar clones, por orgulho, por medo ou por ignorância? Por orgulho, porque muitos querendo exibirem-se para os outros, provarem para esses que são bons evangélicos, querem filhos nos moldes daquilo que as igrejas cristãs ensinam, conhecedores de Bíblia, cantores nos cultos, falando e se vestindo no estilo evangeliques. Por medo, pois se creem que se não forem evangélicos irão para o inferno e cairão nas tentações do diabo e do mundo, o mesmo ocorrerá com seus filhos, e como existem pais incentivando filhos a se casarem o mais depressa possível e com crentes para não caírem em promiscuidades. Por ignorância, porque muitos cristãos não conhecem um caminho melhor. 
      Meus queridos irmãos e queridas irmãs crentes, o ser humano é muito mais complexo que aquilo que aprendemos dele nas igrejas, só Deus em seu amor para abraçar e orientar a todos, nós não temos poder de definir nossos filhos, e nem devemos, são espíritos livres enviados por Deus para que os auxiliemos por um tempo, e que depois devem seguir sozinhos. Muitos bons evangélicos e protestantes conseguem até criar novos bons evangélicos e protestantes, mas é só isso, clonam religiosos, mas não encaminham seres humanos melhores e que farão diferença positiva num mundo moderno e em constantes mudanças tecnológicas e sociais. Se tememos a Deus, o temamos ainda mais, assumindo nossas incompetências, e humildemente entendendo que liberdade de fato só Deus pode dar, o mundo não pode, nem a religião. 

11. Militância materialista

      “E dizia também aos seus discípulos: Havia um certo homem rico, o qual tinha um mordomo; e este foi acusado perante ele de dissipar os seus bens. E ele, chamando-o, disse-lhe: Que é isto que ouço de ti? Dá contas da tua mordomia, porque já não poderás ser mais meu mordomo. E o mordomo disse consigo: Que farei, pois que o meu senhor me tira a mordomia? Cavar, não posso; de mendigar, tenho vergonha. 
      Eu sei o que hei de fazer, para que, quando for desapossado da mordomia, me recebam em suas casas. E, chamando a si cada um dos devedores do seu senhor, disse ao primeiro: Quanto deves ao meu senhor? E ele respondeu: Cem medidas de azeite. E disse-lhe: Toma a tua obrigação, e assentando-te já, escreve cinqüenta...” 
      Quem é fiel no mínimo, também é fiel no muito; quem é injusto no mínimo, também é injusto no muito. Pois, se nas riquezas injustas não fostes fiéis, quem vos confiará as verdadeiras? E, se no alheio não fostes fiéis, quem vos dará o que é vosso? Nenhum servo pode servir dois senhores; porque, ou há de odiar um e amar o outro, ou se há de chegar a um e desprezar o outro. Não podeis servir a Deus e a Mamom.” 
Lucas 16.1-6, 10-13

      Nada deve ser imposto, ainda que se ache que se tenha bons argumentos, assim religião não pode ser imposta, ainda que se acredite que uma religião seja mais verdadeira que outra, e mesmo ciência - como religião, já que muitos a encaram assim - também não pode ser imposta. Ciência torna-se religião quando desconsidera Deus, e algo que se coloca no lugar de Deus se torna um deus, e como tal, uma religião. Eu não creio num gênesis interpretado ao pé da letra, considero a ciência para me ajudar a entender o que Moisés registrou, de acordo com a tradição oral que chegou até ele. Contudo, muitos materialistas querem impor a ciência desprezando a existência de um ser mais alto, mais poderoso, criador e eterno, com objetivos ativos de amor para a humanidade, cuja existência ou não, nem a ciência pode afirmar. 
      Atualmente existem pessoas, principalmente entre as com mais poder aquisitivo, bem formadas intelectualmente, que militam pelo bem do planeta e que defendem a ciência, mas que se portam como aqueles evangélicos extremistas, puritanos e usando roupas diferentes. Esses cientificistas se consideram sinceramente superiores a muitos cristãos, se acham mais lúcidos que esses, mas na prática afetiva de vida são bitolados, indisponíveis a diálogo e só confiam socialmente em pares. Eles querem impor uma liberdade que nem eles possuem, mas são adeptos de toda nova moda pedagógica que surge, doutrinados pela mídia e com muito medo de perderem empregos ou serem interpretados como ultrapassados por empresas, também administradas por empresários que são seus pares, adeptos da mesma idolatria materialista-científica. 
      Se existem extremistas tanto na religião quanto na ciência, a conclusão que chegamos é que o que diferencia o ser humano não é o nível acadêmico, a religião, ou a ausência de ambos, mas uma virtude, essa é a humildade. Ninguém tem culpa de ter nascido nesse ou naquele lar, de ter recebido essa ou aquela educação, de ter sido criado com ou sem religião, de ter sido informado com essa ou com aquela relevância de vida, dando valor seja a bens materiais, à intelectualidade, à religiosidade ou a outra coisa. Contudo, humildade é algo que podemos escolher ou não vivenciar, e humildade nada mais é que respeitar, a si mesmo, os outros e a Deus, seja ele quem for e onde estiver. É essa humildade que nos leva a ter o temor a Deus que a Bíblia ensina, ela é o segredo de uma vida feliz e sustentável, em todas as áreas, indiferente das outras escolhas de vida que se faça. 
      Muitas militâncias que a mídia veicula em novelas, filmes, músicas, jornalismo, redes sociais, são só modas burguesas, eis a verdade, a grande maioria da população, ocupada em trabalhar de manhã para pagar o almoço, e depois trabalhar à tarde para pagar o jantar, nem está preocupada com esses modismos. São relevâncias que importam a jovens de classe média alta, que querem salvar o planeta, mas que preferem criar pets que formar família e criar filhos. Esses burgueses não suportariam uma noite com um bebê chorando querendo mamar e tendo fraudas para trocar. Se tiverem um bebê delegarão a tarefa a pedagogos em escolas caras, achando que estão fazendo o melhor para o filho e para a sociedade. Temos que ter muito cuidado com aquilo que a mídia prega como o jeito melhor de se viver, ela não é tão pura como muitos pensam.  
      Que fique bem claro, este texto não é de forma algum uma crítica à classe profissional ligada à pedagogia, existem verdadeiros heróis e heroínas ajudando em creches de educação infantil, fazendo com muito amor e ganhando pouco, o trabalho que aqueles que colocaram tais crianças no mundo não podem ou não querem fazer, e na maior parte das vezes, não podem porque estão trabalhando pela sobrevivência básica. A crítica também não é a pessoas com mais poder aquisitivo, elas não têm culpa de serem o que são. Contudo, repito, humildade pode ser escolhida, e a vida nos confronta com ela à medida que vivemos, se é que vivemos e não fugimos de viver estudando e trabalhando demais, não para ter uma vida digna, mas só para satisfazer ao “deus” dinheiro e à “religião” materialismo. Ninguém pode escolher onde nasce, mas todos podem escolher serem humildes. 
      Numa sociedade ideal, o ser humano faria os primeiros esforços para poder sobreviver fisicamente, para poder pagar por moradia, alimentação e roupa. Depois, se estudasse mais e trabalhasse melhor poderia pagar entretenimento e artes, o ser humano também precisa de tempo livre para lazer e consumir expressões artísticas, isso não é luxo, é necessidade. Depois, se tivesse renda financeira maior, poderia se dedicar a causas filantrópicas e ecológicas, para ajudar os outros e o planeta. Infelizmente é nesse ponto que muitos preferem dedicar-se a si mesmos e mais que o necessário, por isso tantas academias, bares, restaurantes, resorts etc. E quanto à religião? Espiritualidade verdadeira está em todas essas coisas, viver com humildade, respeito, temor a Deus, dando prioridade a virtudes e ajudando o próximo. Todos, em qualquer lugar, podem servir ao próximo de algum jeito. 
      Temos uma ótica materialista da existência, achamos que se formos prósperos no mundo, administrando bem o dinheiro, seremos seres melhores, mas só isso pode representar não sermos fiéis no pouco. Sabe o que é o pouco no texto bíblico inicial? Este mundo, seus valores, e nada disso é nosso de verdade, é emprestado, achar que isso é o mais importante é não entender a vida, é não administrar bem o pouco. Na parábola, o mordomo, com medo de perder o emprego, não cobrou dos devedores o valor que seria justo, mesmos havendo juros justos, caso estivessem com pagamentos atrasados. Cobrar o justo e com juros representaria para muitos hoje em dia serem fiéis no pouco, administrarem com inteligência vida financeira, obterem lucros. Mas o mordomo fez o contrário, cobrou menos, para ficar bem com os devedores, pensando que se perdesse o emprego poderia ser ajudado pelos que ajudou. 
      O senhor, justo, que representa na simbologia Deus, não reclamou da atitude do mordomo, antes o elogiou, reconheceu em sua estratégia sabedoria, o mordomo não pensou no lucro imediato, mas numa relação cordial com as pessoas que poderia ajudá-lo no futuro. O muito da parábola está na eternidade, não em valores materiais, mas em valores espirituais, na eternidade seremos acordados para a luz mais alta de Deus, que nos revelará o que realmente tem valor em nossas existências eternas. Se existirem valores espirituais em nosso interior seremos conduzidos ao céu, senão, só deixará claro o que já existe dentro de nós hoje, o inferno. Se o mordomo tivesse cobrado o valor exato da dívida, poderia até ficar bem com um senhor materialista, mas fazendo amigos ele trouxe para si valores espirituais eternos. O mordomo militou pela militância mais elevada, não pelo materialismo. 

12. Quem milita pelo planeta? 

      “E a Adão disse: Porquanto deste ouvidos à voz de tua mulher, e comeste da árvore de que te ordenei, dizendo: Não comerás dela, maldita é a terra por causa de ti; com dor comerás dela todos os dias da tua vida. Espinhos, e cardos também, te produzirá; e comerás a erva do campo. No suor do teu rosto comerás o teu pão, até que te tornes à terra; porque dela foste tomado; porquanto és pó e em pó te tornarás.” 
Gênesis 3.17-19

      Que militância interessa a Deus? Todas interessam. Deus usa todos os seres humanos para harmonizar e evoluir o universo, aceite isso, cristão. Sabe aquele ateu materialista que está lutando pela ecologia? Pois Deus o está usando para fazer algo que muitos cristãos não fazem e que é muito importante para todos. Se todos nós, cristãos ou não, temos uma visão muito materialista da existência, evangélicos e protestantes, em grande parte, têm uma visão restrita da vida, uma pseudo interpretação do que são prioridades. Muito disso se deve a um entendimento apocalíptico equivocado da história da humanidade, entendimento que esteve presente em todas as fases do cristianismo, desde a igreja primitiva de Pedro e Paulo. 
      É claro que esse entendimento equivocado é conveniente para muitos, ainda que seja uma conveniência legítima. Tantos tentando sobreviver com tão pouco, não têm tempo para causas coletivas e globais, estão mais ocupados em trabalhar e se sustentarem, por isso acabam se ocupando com militâncias por ecologia e outras causas sociais, os de nível monetário e intelectual mais elevado. É assim no atual estágio de espiritualidade da humanidade. São também esses os que, confrontando ciência com fé, menos acham relevância em religião, pelo menos na cristã, já tão tradicionalmente aliada a perseguição da ciência e de outras bandeiras de iluminação social, principalmente através da instituição religiosa sediada no Vaticano. 
      Não estou generalizando, sei que existem cristãos engajados em causas ecológicas, lutando contra poluição de água e ar, defendendo animais e florestas, administrando ONGs, contudo, muitos cristãos parecem estar mais preparados para o fim do mundo que para deixarem um mundo material melhor para filhos e netos. Esse talvez seja o maior engano que o cristianismo comete, pois contribui na prática, com mais intensidade, para que a vida na Terra não melhore, consequentemente o papel mais proeminente de luz acaba sendo feito por muitos que o cristianismo coloca nas trevas. Mas o que de fato é luz? Interessante que a época em que o cristianismo mais dominou o mundo foi justamente a chamada de idade das trevas. 
      Eis uma discussão importante, que nos leva a enxergar de fato quem é trevas e quem é luz, sobre isso a Bíblia é clara, “pelos frutos os conhecereis” (Mateus 7.20), simples assim, e não adianta tentar esconder isso com argumentos. Fins não justificam os meios, mas obras sempre falam mais alto que crença. O que de fato fará diferença no homem interior de cada ser humano e que será manifestado na eternidade? Deus sabe, mas não julguemos mal ninguém e nunca, e nem bem antes do tempo. Tem muita gente fazendo o trabalho que cristãos não estão fazendo, por isso o cristianismo é odiado por tantos e outras religiões são tão respeitadas. Interessa é que o amor de Deus seja exercido, mesmo que por outras bocas (Lucas 19.40). 
      Uma revelação nos é feita no texto bíblico inicial, se pela queda da mulher e da “serpente” elas mesmas foram amaldiçoadas, no caso do homem quem foi amaldiçoada for a terra, ainda que por causa disso o homem colha sérias consequências. Isso é relevante principalmente numa visão de família e de sociedade onde a produção de recursos de sustento era desempenhada pelo homem, a mulher cuidava da criação de filhos e trabalhos do lar. Ao ser humano não cabe só se religar a Deus através do Cristo, para restabelecer uma conexão espiritual, Gênesis nos lembra que também é sua responsabilidade restaurar o mundo, ele faz isso com a ciência, criando tecnologias para proteção e administração do planeta e de suas intempéries. 
      Mas e os cristãos, eles têm responsabilidade nisso? Novamente precisamos dizer que existem muitos cristãos protestantes que valorizam estudos, que seguem como pesquisadores e que contribuem, sim, para melhorar o planeta. Contudo, uma grande quantidade de evangélicos, doutrinada para pensar que basta fé e pouco esforço, acha nas teorias conspiratórias do fim do mundo álibis para entregar os destinos do planeta nas mãos de opositores do cristianismo. Por isso políticos e diplomatas contra o globalismo, a favor de Israel e que se opõem a sistemas políticos comunistas, são apoiados por tantos cristãos, que acham que isso é militância cristã. Esse engano entregou a liderança do Brasil nas mãos de um maluco estúpido. 
      Muitos cristãos não percebem o quadro terrível que se arma, e tudo porque teimam em ler o momento atual como o início do final dos tempos. Nesse quadro muitos, chamados cristãos, se posicionam do lado do engano, do real anticristianismo, se de fato entendermos o que é o cristianismo verdadeiro  de Jesus, enquanto que outros, que não defendem nenhuma religião e só a ciência, se posicionam ao lado da sensatez. Por isso tantos cristãos sendo negacionistas dentro de uma pandemia mundial cuja solução não está na política, nem na religião, só na ciência. O que mais assusta é o nome de Deus sendo colocado do lado da insensatez, esse mau testemunho será cobrado na eternidade de cristãos militando equivocadamente. 

 13. Sem limites para a estupidez humana

      “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! pois que sois semelhantes aos sepulcros caiados, que por fora realmente parecem formosos, mas interiormente estão cheios de ossos de mortos e de toda a imundícia.” 
Mateus 23.27

      Soube de uma notícia que me assustou, pessoas que fazem tatuagens em seus animais de estimação, não só pequenas, mas grandes, em quase todo o corpo do animal. Isso além de submeter o pet a uma dor que ele não escolheu e nem precisa ter, visto que não é um acidente, põe a saúde do bicho, seja por dermatites ou outras doenças, em risco. Felizmente leis já estão sendo aprovadas para coibir isso, que crueldade de quem buscando uma identidade na aparência, egoisticamente submete inocentes à tortura, que obsessão o ser humano pode ter para ser diferente. Não duvido se levantaram-se pessoas militando pelo direito de se fazer isso, dizendo que impedir isso é ir contra algum tipo de liberdade de expressão.
      Mas temos outro exemplo do quanto a estupidez humana pode sempre nos surpreender, esse está acontecendo com as vacinas para a Covid 19 em meio à pandemia. Gente furando fila, vendendo vacina roubada ou falsa, e gente comprando essas vacinas ilegais ou falsificadas, geralmente pessoas de mais posses, muitas já acostumadas a fazerem prevalecer seus direitos através da maior das estupidezes humanas, o mal uso do dinheiro. Aqui também ocorre o equívoco de se tentar estabelecer uma identidade diferenciada baseada em valores externos, naquilo que o dinheiro mostra na aparência diante de pares, esse engano sempre dá mais importância ao homem que a Deus, gradua pela matéria, não pelo espírito.
      Duas coisas precisam ficar claras: as pessoas têm o direito de tatuarem suas peles, de usarem acessórios como brincos e piercings, assim como de usufruirem aquilo que um dinheiro ganho de forma honesta pode permitir. Não estamos aqui julgando ricos nem tatuados, essas coisas não representam em si mesmas problemas. Se você pode comer num restaurante mais caro ou usar uma roupa mais luxuosa, pagando com um recurso que é teu, problema teu. Se você quer estender tua identidade interior a marcas em tua pele e a objetos anexados a ela, também é uma questão tua. Não podemos julgar ninguém pelo exterior físico, tanto quanto ninguém se julgue melhor por ele, seja no luxo ou no exotismo. 
      Contudo, o ser humano sempre tende à obsessão e ao vício. Isso perde o controle se suas quatro áreas, física, emocional, intelectual e espiritual, não estiverem em harmonia em Deus. Quem não milita em Deus (e não necessariamente por Deus em uma causa espiritual ou religiosa, o que não tem nada de errado) militará fora de Deus e, consequentemente, por bobagens, colocando esta reflexão no contexto do estudo “Militou errado!”. Muitos que começam a se tatuar viciam-se nisso e acabam querendo marcar a ferro quente a maior área possível de seus corpos. O que foi inicialmente um reforço de identidade, acaba se tornando uma obsessão, e aí nem é mais para os outros verem, mas só para satisfação de vício. 
      Outros, que tendo um pouco mais de grana trocaram um restaurante bom por um mais sofisticado, acabaram num restaurante caríssimo, nem por necessidade alimentar ou para provarem algo diferente, mas só para mostrarem para pares que podem pagar por isso. O dinheiro é um deus egocêntrico, começa dizendo aos homens que tê-lo é poder desfrutar de bens e prazeres melhores, mas no final o único prazer que o homem terá é ter mais e mais dele, quanto ao resto que o dinheiro pode pagar, nem terá mais valor ou dará prazer, dinheiro se torna fim em si mesmo. A mais importante militância no mundo é pelo dinheiro, ninguém se iluda sobre isso, ele está por trás de tudo, mesmo de causas aparentemente puras.
      Esses direitos, pelos quais tantos militam, melhoram o ser humano no principal? Não, só o deixam mais estúpido, e de uma maneira que eles nem percebem a vergonha que estão passando. Você quer ter direito de se tatuar? Tudo bem, isso não representa um problema, mas antes lute pelo direito de buscar a Deus e conhecê-lo, sem filtros, sem as manipulações das tradições religiosas humanas. Se estiver imbuído nessa militância as outras não serão tão importantes, você não achará assim tão relevante aparentar luxo ou exotismo, isso tudo passa e fica neste plano. Na eternidade seremos trevas ou luzes, sem lugar para marcas ou graduações físicas. Espírito não se tatua, não para sempre, só se purifica e se ilumina. 
      Mas tem outro lado de quem gasta grana com vícios, obsessões e vaidades, desperdiçar um dinheiro que poderia estar ajudando outros, que não estão ocupados em mostrar aparência para pares, mas só em sobreviver, comer e beber o básico que lhes permita continuar vivendo no mundo e trabalhando. Ricos, sejam na área que forem, serão mais cobrados no juízo pelo qual os seres humanos passarão na eternidade, se tiveram condições de ajudar outros mas foram irresponsáveis com o que receberam e cruéis com os que não receberam. Sobrou dinheiro? Doe. Recebeu misericórdia? Ame. Tem conhecimento sobre algum área? Compartilhe, hoje com a internet coisa fácil é compartilhar o que se sabe, milite por causas nobres. 

14. Cansados de ensinar

      “E não nos cansemos de fazer bem, porque a seu tempo ceifaremos, se não houvermos desfalecido.
Gálatas 6.9

      As lutas contra preconceitos, como racismo e homofobia dentre outros, têm evoluído nos últimos tempos, contudo, nem sempre pelos melhores motivos. Uma frase temos ouvido bastante, “estamos cansados de ensinar”, para entendermos isso precisamos entender vários eventos no processo histórico das lutas. Uma luta começa no coração do que sofre o preconceito, lugar onde a dor é mais devastadora, ainda que silenciosa, quantos não sofrem por anos sem que alguém saiba? Quantos não sentem, quando entram num lugar, que são discriminados, desprezados, odiados, só por não fazerem parte daquilo que a sociedade daquele momento considerava normal? Não só negros, mas aqueles com mais peso, com alguma característica física diferente, na altura, na aparência, mesmo na maneira de se vestirem e de usarem os cabelos? Só sabe quem sofre a dor que se sofre só por se ser alguém que só quer ser alguém.
       Então, como sempre acontece na vida, semelhantes se reúnem, para compartilharem o que sentem, e como é forte uma união que liga por uma dor comum, principalmente se é uma dor que uma maioria deslegitimiza. Quando os afrodescendentes se uniram nos anos 1950, 1960 e 1970 nos E.U.A. e criaram o movimento Black Power, o estilo de cabelo grande e solto, não era só um gosto estético, era um instrumento de resistência e de divulgação cultural, a afirmação de uma identidade, hoje ainda deve ser visto assim. Portanto, quando alguém critica esse tipo de penteado, não apenas opina como tendo um gosto estético diferente, como não apreciando uma preferência, mas como um opositor a um movimento, a direitos de um grupo de seres humanos, isso temos que entender para que tomemos mais cuidado. A vida ficou complicada? Parece que hoje temos que tomar cuidados que antes não tínhamos que tomar?
      Respeitar todos os seres humanos com suas idiossincrasias, não classificando-os só como pertencentes a manadas e nivelando essas com privilégios diferenciados, finalmente a sociedade entendeu que isso é o que deve ser feito, e que quando não foi feito a humanidade cometeu um erro terrível, machucando seres humanos que são iguais a todos os demais seres humanos em direitos e liberdades. Esse cuidado fica amplificado com todo mundo postando sobre tudo e a todo momento nas redes sociais na internet. Privacidade parece ser um luxo que as pessoas abdicaram de ter para que pudessem ser famosas, ainda que só através de um post com muitos likes. Mas se aumentaram conhecimentos, aumentaram responsabilidades, infelizmente isso é algo que muitos não assumem, desejam o direito de falarem o que querem, mas não o dever de ouvirem o que podem não gostarem de ouvir como retorno disso. 
      O fato é que a civilização tem uma enorme dívida com afrodescendentes devido ao cruel sistema de escravos que foi usado por séculos para enriquecer principalmente a brancos, ponto final! A dor que se sente quando se é criticado por usar o cabelo de forma livre e natural é legítima, não é mimimi nem vitimismo, todos temos que aprender a tomar muito cuidado, a princípio com o que dizemos e escrevemos, mas principalmente com o que sentimos e somos. Não existe mais no mundo lugar para preconceitos por cor de pele, tipo de cabelo e tipo de sexualidade. Isso já está sendo dito há algum tempo, não muito, mas há algum tempo, e já é suficiente para que muitos afrodescendentes digam, “já cansei de ensinar”. No termo “ensinar” já existe um posicionamento diferente, não de guerra, não de oprimido destruindo opressor, mas de vítima ensinando ao agressor sobre como ele deve agir para não ser opressor.
      Isso representa uma evolução nas lutas, contudo, as lutas já estão em fases novas quando ouvimos que o “professor” está cansado, principalmente de ouvir que algo que o machucou não tinha a intenção disso. A verdade é uma só, só mudamos quando dói, e se não temos compaixão suficiente para sentir a dor do outro por amor, ou pelo menos por respeito, temos que ser impedidos de agredir com palavras, e senão resolver, com penalização legal. Não só deboches sobre a aparência, mas toda chacota com aqueles que não têm a sexualidade binária, que se dizia que era tradicional e que não é mais, tudo isso deve ser rejeitado com veemência. Isso deveria ser ensinado em púlpitos, ao invés de fazerem de conta que o assunto não existe, ou pior, seguirem insistindo na visão ultrapassada e sem amor que usa a Bíblia para apoiar preconceitos. Não devemos nos cansar é de amar, e em Deus sempre achamos forças para amar. 
      O penteado natural, grande e solto de africanos e descendentes, é mais que uma preferência que pode ou não ser apreciada, é símbolo de uma luta legítima, mas ainda mais que isso, é a coroa de príncipes e princesas, reis e rainhas, que ajudaram tanto quanto qualquer outros a construir o que temos de melhor na humanidade. Na música, nem precisamos dizer o quanto afrodescendentes espalhados pelo mundo fizeram e fazem, como músico tenho gostos e fundamentos assentados sobre o jazz, o blues, o samba, o reggae, os funks. Nos esportes, quantas marcas já foram quebradas por negros, épicas as medalhas de ouro de Jesse Owens nos Jogos Olímpicos de 1936 em plena Alemanha de Hitler, assim como a carreira e o posicionamento político de Muhammad Ali-Haj, eleito "O Desportista do Século". Mas também na literatura, nas ciências, enfim, diversidade é a expressão mais profunda da sabedoria e da beleza de Deus. Não nos cansemos de aprender!

15. “Não é problema meu”?
 
      “Portanto, não os temais; porque nada há encoberto que não haja de revelar-se, nem oculto que não haja de saber-se.
Mateus 10.26
      “Mas, quanto aos tímidos, e aos incrédulos, e aos abomináveis, e aos homicidas, e aos fornicadores, e aos feiticeiros, e aos idólatras e a todos os mentirosos, a sua parte será no lago que arde com fogo e enxofre; o que é a segunda morte.
Apocalipse 21.8

      Se muitos querem militar, mesmo sem saber, alguns preferem se ausentar, a bandeira desses é, “não é problema meu”. O que é pior, ser impulsivo ou ser tímido? O impulsivo, num golpe de sorte, em algum momento pode até acertar, e saberá disso, mas o tímido, ainda que acerte, não saberá. Quem tenta sabe onde chega, sai da zona de conforto, e pode ir para a luz, mas quem se esconde, ainda que num momento essa seja um boa opção, não saberá, quem se esconde sempre está em trevas. 
      O tímido tem motivos para ser assim, timidez é medo, mas o que é o medo? Receio de ser machucado por algo ou receio de mostrar para os outros que errou? Num medo existe covardia, no outro, orgulho, mas todo covarde é orgulhoso, tem medo de perder, por isso não se arrisca, seja a vida, seja a reputação. O ser humano, contudo, não é simples, não tem só uma coisa dentro de si, é um emaranhado de sentimentos e pensamentos, a diferença é que alguns conseguem esconder melhor a confusão. 
      Violência gera violência, o que sofreu violência será violento, ele, porém, tem uma escolha: ser violento com os outros ou consigo mesmo? O que é violento consigo vive com medo, não acha que tenha direitos, não acha que tenha forças, mas também não quer que os outros saibam disso, por isso se torna covarde e orgulhoso, ainda que introspectivo e discreto. O que é violento com os outros desabafa suas dores, coloca-as para fora, só que do jeito errado, para seguir forte se torna insensível. 
      O tímido pode convencer muitos que é sábio, mesmo humilde e pacífico, pois não reage à violência, entretanto, mata-se por dentro, pode construir sérias enfermidades, tanto físicas quanto psicológicas. Ele pode ser um bom religioso por muitos anos, enganar a muitos, mas principalmente a si mesmo, reprimindo sua dor faz sacrifícios pelos outros, o que lhe dá a impressão de ser caridoso, abnegado. Mas nada que é ruim se esconde para sempre, um dia dor não resolvida vem à tona de algum jeito. 
      O violento pode passar a impressão de ser corajoso, empreendedor, de fato dor gera energia que conduz a vitórias materiais, afinal, o mundo é cruel, só é conquistado à força. Contudo, violência é mãe da solidão, o violento tem servos que o temem, não amigos que o amam, não morrerá de enfermidades, hienas não sobrevivem em quartos vazios, mas sucumbirá à violência. O violento sempre acha alguém mais violento que ele, que ainda que a princípio diga que é seu companheiro, no final o trairá. 
      Um tímido mais um violento constituem uma relação fatal, mas comum por ser útil a ambos, quem gosta de sofrer sem reclamar é atraído por quem gosta de fazer sofrer e não se sente mal por isso e vice-versa, isso é uma doentia aliança sadomasoquista. Mas ainda que não seja numa relação afetiva, a sociedade sofre com esses dois tipos de doentes emocionais. Quando o violento machuca alguém e é visto por um tímido, o tímido tem a tendência de dizer, “não é problema meu”, esse é o ponto deste texto.  
      Por covardia ou orgulho podemos encobrir erros alheios, que se fossem coibidos a tempo não se tornariam erros ainda maiores. Isso não é tomar conta da vida alheia mas é impedir que inocentes ou que outros, reprimidos por algum motivo, sofram. Quando assistimos na TV uma reportagem sobre um adulto que espancou uma criança até morrer, precisamos entender que algo assim não acontece da noite para o dia, violência pode ser algo que ocorre há muito tempo e de forma gradativa. 
      Quantos já não viram, não souberam e mesmo experimentaram atitudes violentas de alguém que hoje está assassinando outro alguém? Muitos sabiam e nada fizeram porque disseram, “não é problema meu”, ou se calaram por outro motivo. Violências, assim como preconceitos, são problemas nossos, sim, não podemos nos abster só para não nos indispormos com alguém ou para não mancharmos nossa reputação, isso também é pecado que nos será cobrado, quem cala consente e torna-se cúmplice. 

16. O mal não tem poder

      “Vós tendes por pai ao diabo, e quereis satisfazer os desejos de vosso pai. Ele foi homicida desde o princípio, e não se firmou na verdade, porque não há verdade nele. Quando ele profere mentira, fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso, e pai da mentira.” 
João 8.44

      O mal não tem poder! Começo esta reflexão com essa primeira afirmação, assim, diabo, demônios, espíritos inferiores, não podem, por eles mesmos, prejudicarem ninguém, muito menos armarem um grande complô mundial para vencerem o cristianismo. Quem deseja, autoriza e executa o mal são os seres humanos! Com essa segunda afirmação deixo claro que o homem, pelo livre arbítrio, é senhor do início e do fim de seu destino, planta as causas e colhe os efeitos. Onde seres espirituais das trevas atuam? No meio disso, mediante legalidade do ser humano no mundo. Posto isso, vamos esmiuçar o assunto. 
      Para entender o que foi dito mais facilmente, é só colocar o raciocínio no sentido contrário, se o homem viver na Terra com temor a Deus, humildemente colocando Deus em seu caminho, em suas decisões, respeitando o planeta, seu corpo físico, suas alianças, os outros homens, em amor e justiça, o mal desaparecerá. Isso é possível? Sim, em Jesus, adquirindo-se a paz que existe em seu perdão e depois praticando boas obras, conduzindo a civilização com as prioridades corretas, primeiro a prática de boa moral, depois respeitando a ciência e por último interagindo com equilíbrio com os apetites físicos. 
      Nesse mundo ideal o mal não agiria? Agiria, na instância que sempre age, tentando os homens, uma guerra que ocorre no campo mental do ser humano, que se o homem vencer em sua origem, acabará aí, sem outras consequências. Eis o único poder do mal, oferecer uma opção errada em muitas questões, opções que tendem à matéria, ao ego, à injustiça, à violência, a manipular semelhantes para benefício próprio. Contudo, se o ser humano fizer outra escolha, anulado está o mal. Mas e se a opção do mal for escolhida? O ser humano colherá as consequências, os seres espirituais que fizeram a tentação seguirão ocultos. 
      Essa ótica precisa ensinar algo a muitos cristãos, a luta deles não é contra seres espirituais do mal, contra o diabo, mas contra escolhas erradas de outros seres humanos, não adianta só orar expulsando demônios, é preciso mudar o homem. Como o homem é mudado? Conhecendo a luz mais alta de Deus. Como isso é feito? Em primeiro lugar vendo o testemunho de outros que tiveram essa experiência e mudaram de vida. Mas por que muitos não querem Deus? Porque não querem, de um jeito ou de outro, mas também porque não veem nas vidas de autodenominados cristãos testemunhos verdadeiros da luz de Deus.
      O equivocado poder, que os próprios cristãos dão ao diabo, tem uma consequência ainda pior, a criação de uma teoria da conspiração que vê um plano sendo arquitetado pelo diabo, usando pessoas, instituições, corporações, governos, para dominar o mundo e destruir as religiões cristãs. Muitos não percebem, mas muitas das linhas satanistas, principalmente as mais explícitas, são o outro lado da moeda do cristianismo tradicional, elas creem nas mesmas teologias que os cristãos, definem um diabo com as mesmas características, a única diferença é que no ponto de vista delas, no confronto final, o diabo sai vencedor. 
      Uma estratégia comum em ideologias extremistas é criar um inimigo, diretamente oposto às suas ideologias, para arregimentar homens sempre seduzidos por confrontos entre polos, que não admitem um Deus de luz sem que haja um diabo de trevas. Assim, bem e mal ficam do lado de fora, o homem não tem responsabilidade por suas ações, não precisa pensar e fazer balanços para conhecer e se decidir, só precisa escolher um lado para amar e outro lado para odiar. Quem ganha com isso? Justamente o diabo empoderado pelo equívoco, não necessariamente por ganhar o confronto, mas por empatar com Deus.
       O que é mais fácil, orar com fé expulsando demônio ou viver uma prática constante de amor, principalmente com antagonistas, dando testemunho de Deus, o único de fato que tem poder, criou todas as coisas e cuida daqueles que o temem? Prática de amor não é fácil, mas é o único jeito de Deus ser vencedor no mundo, isso quem escolhe sou eu e é você. Mas Deus não age só porque o homem escolhe, Deus age em todo o tempo, livrando-o de perigos que ele não tem noção que existem, acreditando sempre que o homem pode melhorar, sendo fiel quando ele não é, perdoando-o sempre e atraindo-o para o seu amor eterno. 

17. Batalha mental do diabo

      “Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e perverso; quem o conhecerá?
  Jeremias 17.9

      O mal não tem poder, afirmar isso não é dizer que não existam seres espirituais que não se aproveitam do marketing diabo, do que foi aliado por mitologias, misticismos e superstições no decorrer das histórias de vários povos a esse título. O próprio homem se aproveita disso, usa para amedrontar, se promover, vender filmes e livros, para criar religiões, que ficam mais atraentes com o diabo no enredo. Contudo, na maioria das vezes, o efeito final da atuação desse ser limita-se à mente do homem, influenciando-o na tomada de decisões, ainda que em situações especiais o mal possa provocar até sinais físicos. 
      Diante das negativas feitas sobre o diabo, alguém pode perguntar: “e os textos bíblicos que falam sobre uma batalha final do diabo, dele levantar personagens do mal de liderança mundial, como o anticristo, a besta, o falso profeta, e dele finalmente ser lançado num inferno?” Em primeiro lugar, seres espirituais serão julgados no plano espiritual, em segundo lugar muitas coisas citadas na Bíblia são metáforas, não devem ser interpretadas ao pé da letra. Por último a nova aliança do evangelho não nos autoriza a fazer qualquer tipo de militância contra homens que escolhem o mal, a nós compete só dar bom testemunho.
      Alguém também pode dizer: “você diz isso porque não viu endemoniado rolando no chão, derrubando tudo e falando com uma voz horrorosa”. A resposta está em outra pergunta: por que uma simples palavra de autoridade, dita por alguém com vida correta, pode libertar um possuído? O homem pode criar personagens bem convincentes, motivado por transtornos mentais e mesmo por sintonia com seres espirituais do mal. Mas ainda isso, não é o diabo exercendo ativamente um poder, é só o homem permitindo-se ser usado como “cavalo” de entidades espirituais externas, o poder é do homem, ainda que mal usado.  
      Mas alguém também pode argumentar: “em rituais mágicos, objetos se movem e o pensamento humano pode desencadear eventos à distância”. Saiba que os que usam de protocolos mágicos e ocultistas, buscam controle sobre seres espirituais inferiores, que atendem pelos nomes de suas coletividades (legiões). Sinais no plano físico podem ser feitos com o auxílio desses seres, mas são os homens, por meio de “trocas” nada recomendáveis (pactos) que “controlam” esses espíritos, não o contrário. Quem se presta a essas práticas acaba tendo uma relação simbiótica com o diabo, assim ambos são usados por ambos. 
      Uma das coisas mais poderosas no homem é sua imaginação, com ela ele cria arte, escreve livros, produz filmes, compõe músicas, pinta quadros, esculpe estátuas, cria coreografias de danças, e faz tantas outras expressões artísticas. O imaginário humano cria coisas onde não existem e o homem faz isso porque é prazeroso, mesmo assistir filmes de terror, levar sustos, sentir a adrenalina lançada na corrente sanguínea, pode ser divertido. Assim, muito do que se pensa e se acredita sobre o diabo é pura ficção, obviamente incentivada pelo próprio, já que para um mentiroso mesmo propaganda enganosa interessa.  
      Para um ser cujo principal campo de batalha é a mente humana, nada mais interessante que a imaginação potencializada pela arte. Quando alguém se fecha num quarto escuro, desenha um pentagrama dentro de um círculo no chão, coloca símbolos dos quatro elementos em quatro pontas, se coloca na quinta ponta (éter) e por meio de evocações imagina um ser vermelho, de chifres, rabo e pés de bode, o diabo aparecerá? O que vai aparecer é o que ele imaginou, obviamente seres espirituais do mal, que por milênios têm conseguido alguma atenção dos homens por esse meio, se aproveitarão do terrível ritual.
      Mas cuidado, se o conceito Deus é único e claro, o diabo é tão abrangente quanto a humanidade, tudo cabe nele, e ele abraça a todos que não quiserem seguir pelo estreito caminho de Jesus Cristo. Muitos, que se consideram cristãos e acham que lutam por Deus, estão lutando pelo mal, primeiro porque Deus não precisa que ninguém lute por ele, não no plano físico, aqui Deus só chama testemunhas, não advogados. Em segundo lugar porque o que muitos consideram militância, na verdade é derrota, visto que se colocam, ainda que no polo oposto, iguais a seus oponentes. Deus está muito acima disso, dos dois polos. 

18. Golpe de direita?

       “Como águas profundas, são os propósitos do coração do homem, mas o homem de inteligência sabe descobri-los.” 
Provérbios 20.5

      Vi recentemente, no programa #Provoca do genial Marcelo Tas na TV Cultura, uma entrevista com o fotógrafo e correspondente de guerra André Liohn que me chamou a atenção, que estava no momento da entrevista no Brasil fotografando a pandemia. Um profissional acostumado com cenário de guerra documentando uma doença no Brasil, por quê? Uma pandemia não deveria ser uma guerra, o corona vírus não é um ser inteligente, não pode escolher lutar, não faz decisões morais, ele age por instinto.
      Contudo, um presidente com uma má formação militar, e isso precisa ser dito para não generalizarmos os militares nivelando-os por esse “capitão”, é insensível com a morte de tantos, opinou o fotógrafo, deixando que pessoas morram quando não dá orientações para conter a pandemia, como uso de máscara e isolamento social, e não decide a tempo pela compra de vacinas. Parece que ele intencionalmente quer levar o país ao caos, decretar um estado de guerra, para poder agir como se pode agir nesse estado. 
      O presidente se isenta das mortes quando diz que existe uma pandemia, que não adianta fazer lockdown porque muitos morrerão de um jeito ou outro, e que a culpa é do vírus, não dele. Mas seria isso para que o país se desestabilizasse e ele pudesse agir, como algumas vezes já ameaçou fazer dizendo “tudo tem limite” e com o que ele chama de “meu exército”, com o argumento que não está fazendo o que quer, mas o que precisa fazer, para controlar o caos social provocado pelo desemprego e crise econômica? 
      Não é justo afirmarmos sem termos mais conhecimento que algo é intencional, e muito mais sério é julgarmos o presidente da república de nosso país, seu cargo merece de todo brasileiro pleno respeito. Contudo, como se diz, quando algo cheira como um gambá, tem cor de gambá, se move como um gambá, tem tamanho de gambá, é muito provável que seja um gambá. Tomara que não seja isso que esteja acontecendo em nosso país, tudo já está sendo muito triste e não tem que ficar pior ainda. 
      Sabemos que grande parte da mídia é contra o atual presidente, sabemos que muitas de suas militâncias são bandeiras de evangélicos e esses sempre são odiados por muitos, sabemos que de um jeito ou de outro ele teria dificuldades, principalmente propondo-se fazer uma administração sem corrupção. Nem vou fazer a narrativa se ele é ou não corrupto, mas pergunto, por que ele tem tanta necessidade de ser beligerante? E sua violência não é só deselegância ou falta de educação, mas conduta inapropriada ao cargo. 
      Mas ainda que estivesse pensando na economia do país, por que é tão negacionista com relação à ciência? Para agradar seus eleitores? Mas ainda assim ele podia ter levado mais a sério a pandemia, principalmente em seu início, enquanto que o que ele faz é profetizar o caos. Mas ele quer evitar o caos ou incita-lo? Contudo ele não nega só a ciência, se põe também contra a ecologia, populações indígenas, importantes parceiros econômicos do Brasil, como a China por causa do sistema político dela.
      O que nos deixa estarrecidos são os movimentos que o atual presidente faz colocando militares em muitos cargos, assim como sua militância a favor de porte generalizado de armas e dos CACs. Nunca houve dúvidas que a eleição desse presidente era agenda de militares, que estavam com direitos relegados a segundo plano nos últimos governos de esquerda. Isso foi feito de forma democrática? Sim. Mas quando tentamos entender tudo isso não podemos negar que nos vem à mente um cenário de golpe de direita. 
      Essa teoria diz que pode haver uma intenção por parte do atual presidente, de levar o país ao caos, para que ele tenha um álibi para um golpe militar como único jeito de se controlar esse caos, onde, então, o atual presidente poderia permanecer no cargo por tempo indeterminado. Isso interessa a alguém? Infelizmente interessa a muitos brasileiros. São maioria? Não, e depois de muitos, que até votaram nele, terem visto o que ele fez em seu mandato essa quantidade diminuiu, mas poucos podem fazer muito barulho. 
      Mas como opinou o corresponde de guerra citado no início dessa reflexão, a solução é não permitirmos o caos, fazemos isso sendo cristãos verdadeiros, ajudando os necessitados e não sendo “exército” de ditador. Contudo, se nós permitirmos sermos envolvidos nessa militância estúpida que está ocorrendo principalmente nas redes sociais, correremos o sério risco de sermos manipulados e concorrermos para o caos. Eu não posso dizer com certeza qual é a intenção do atual presidente, você pode? 
      A verdade é que sabemos que existem muitos interesses que se opõem a muitos outros interesses, de todos os lados, quem está sendo, ou não, manipulado por quem é difícil dizer. Mas cristãos, isso nem nos interessa, é coisa do mundo, só serão enganados os que escolherem fazer parte desse jogo sujo. Eu não quero fazer parte, meu lado não é na esquerda e nem na direita, mas em Deus, Deus sempre tem o melhor para nós e da melhor forma, sem confusão, quanto à intenção no coração do homem, Deus sabe.   

19. “Meu exército”?
 
      “Ainda que um exército me cercasse, o meu coração não temeria; ainda que a guerra se levantasse contra mim, nisto confiaria. Uma coisa pedi ao Senhor, e a buscarei: que possa morar na casa do Senhor todos os dias da minha vida, para contemplar a formosura do Senhor, e inquirir no seu templo.” 
Salmos 27.3-4

      “Não vos prendais a um jugo desigual com os infiéis; porque, que sociedade tem a justiça com a injustiça? E que comunhão tem a luz com as trevas?” “Estai, pois, firmes na liberdade com que Cristo nos libertou, e não torneis a colocar-vos debaixo do jugo da servidão.” 
II Coríntios 6.14 e  Gálatas 5.1

      Este texto é uma reflexão sobre a atualidade social e política de nosso país, não é uma crítica à classe militar. Não é preciso dizer que para se chegar a cargos de oficiais, seja no exército, na marinha ou na aeronáutica, homens e mulheres se preparam muito. Líderes militares de alta patente são brasileiros estudados e experientes, com visões lúcidas sobre várias áreas da sociedade, preparados para manterem a democracia, a autonomia e a paz da nação. Isso não significa que não existam nesse meio seres humanos “humanos”, como existem em qualquer meio, contudo, pela importância estratégica que têm na manutenção da ordem pública, militares são decisivos em certas situações. 
      Ao meu ver, a função de militares na nação pode ser definida assim: pertencem à nação, servem ao povo, podem interferir, mas em relação ao povo que servem sem violência e para dar liberdade, não representam um poder como os três que compõem a república. Também não são posse de políticos, que são inquilinos do poder, não donos dele, que não possuem nada a não ser um período de tempo para servirem o melhor possível à nação. Dessa forma, a frase “meu exército”, dita por um presidente da república, achando-se dono da classe militar, é inapropriada e deplorável, deve ser combatida, em nome da democracia, do povo e de uma classe militar legítima. 
      Que insanidade pode existir na afirmação “meu exército”? Eis um tema relevante à reflexão “Militou errado!”. O que nos vem à mente quando pensamos no termo exército, não necessariamente relacionando-o às forças armadas? Um poder que se prevalece pela quantidade, onde não existem iniciativas individuais, cuja força está na união de muitos conduzidos pela autoridade de um para se impor sobre outros. Um exército pode ser usado para fins equivocados? Sim, isso ocorre quando identidades pessoais são anuladas, não em prol das necessidades de muitos, mas no interesse de um líder, que seduz muitos por carisma estúpido e por argumentos rasos para exaltar seu ego. 
      Nesse caso, os que não se deixarem ser manipulados pelo líder serão seus inimigos, esses só devem ser derrotados, a qualquer custo, esses também não são respeitados como indivíduos, mas como um exército, o exército inimigo. Irônico nisso tudo é que muitos, acreditando estarem lutando por liberdade e direitos, não percebem que quando se colocam debaixo de alguém que os chama de “meu exército”, perdem justamente a liberdade e os direitos. A missão de vida desses passa a ser a visão de mundo, de sociedade e de homem do “dono” do exército, não discernirão luz de trevas, e farão qualquer coisa para obedecerem aquele que pode até se dizer enviado de Deus. 
      Cuidado com o homem que se diz profeta de Deus, isso é a porta que conduz ao maior dos enganos, a um homem que se acha um deus. O Deus de verdade não usa profetas, não mais, e muito menos tornará a encarnar como homem, os tempos estão muito mais para falsos profetas e anticristos, e esses não virão de meio religioso qualquer, mas do meio cristão para enganar principalmente a cristãos. O engano não vem para ludibriar os que já estão ludibriados, mas para enganar aqueles que tendo a luz preferiram as trevas, tendo o Espírito de Deus, preferiram um ídolo ideológico construído até com conceitos bíblicos da tradição religiosa cristã, mas ainda um falso deus. 
      Usando o termo exército não estou me referindo necessariamente aos fardados, existem outros grupos sociais que se portam assim, principalmente na religião, e muito num cristianismo desviado que se baseia equivocadamente nos conceitos do velho testamento para empoderar sua causa. Cristãos, conforme o evangelho do Cristo, vocês não são um exército, nem de Deus, não para imporem sua verdade no mundo. A verdade não se impõe, muito menos com apoio de uma classe tão corrupta como a política. Somos uma irmandade, sim, de amor e de luz, para humildemente fazermos diferença no mundo como indivíduos, não como coletivo, e isso basta ao evangelho de Jesus. 
      Jesus e tantos outros personagens do novo testamento não precisaram de um exército para fazerem diferença, militaram sozinhos e muitos sozinhos morreram, incluindo o Cristo. Para que somos chamados: para imitar e obedecer um líder político ou a Jesus? Quem se coloca em jugo desigual com homem, de homem se faz escravo, e meus queridos, isso não é de Deus, Deus nos chama para a liberdade. Não tenhamos medo do mundo e de homens, nem se muitos que se dizem cristãos se colocarem como exército do engano, nos refugiemos no templo de Deus, que não é igreja física, mas a posição espiritual mais alta em Cristo, nesse lugar estamos protegidos. 
      Quem pela violência prevalece por ela será destruído, insanos atraem insanos, se Deus estivesse do lado de exércitos a igreja católica teria prevalecido, nem Israel, o povo com o plano mais antigo de Deus para mostrá-lo ao mundo, prevalece pela guerra, não mais. Sim, existe um combate, mas não é mais de homens contra homens no plano físico, os que creem nisso serão presas do engano e perderão a guerra inútil que travam, sendo humilhados no final. O combate é espiritual, virtudes morais contra o materialismo, seja o científico mal usado, seja o dos prazeres do corpo, e isso é responsabilidade pessoal, ninguém queira se esconder em fileiras de exércitos deste mundo. 

20. Deus não está nos extremos
 
      “A minha alma espera somente em Deus; dele vem a minha salvação. Só ele é a minha rocha e a minha salvação; é a minha defesa; não serei grandemente abalado.” 
Salmos 62.1-2

      Eu poderia listar aqui dezenas de nomes de especialistas em suas áreas científicas, gente bem graduada, reconhecida no Brasil e no mundo, que tem uma posição comum sobre a pandemia da Covid 19, homens e mulheres, muitos deles, sem posicionamento político para direita ou para esquerda, pessoas de todas as religiões. Contudo, muitos ainda escolhem duvidar desses especialistas e acreditarem em mentiras, apoiadas tanto por gente sem conhecimento, como por gente, que ainda que tenha conhecimento, tem posições influenciadas não pela ciência, mas por ideologias políticas e religiosas. 
      Nesse contrassenso incentiva-se o negacionismo científico, que sempre foi danoso, mas que assume proporções trágicas nos dias atuais da pandemia causada pelo Corona vírus, pondo vidas em risco e sendo responsável por tantas mortes no Brasil. Triste é ver cristãos, principalmente evangélicos e protestantes, que deveriam ser e se dizem ser mais esclarecidos espiritualmente, sendo uma parte significativa desse “exército” que apoia o negacionismo científico. Muitos cristãos se acham mais preparados para os últimos tempos crendo dessa maneira, mas até quando militarão por uma causa insana? 
      Quem não é sensato para achar a solução no equilíbrio, deita-se num polo e coloca aqueles que têm opiniões diferentes no outro polo, não querendo ver que é possível se colocar no meio, que há quem não concorde inteiramente consigo, mas também não tem posição totalmente oposta. Com relação ao lockdown, por exemplo, extremistas do negacionismo dizem, “lockdown leva um país à falência econômica e traz caos à sociedade”, mas isso é necessário, e se tivesse começado antes teríamos tido condições de liberar o confinamento para que muitas coisas voltassem a funcionar antes.  
      Todos podem parar de trabalhar e ficarem em casa? Não, nem precisam, o que é necessário é que seja feita uma orientação equilibrada pelo governo federal, ao invés de ficar posicionando-se num extremo. Contudo, pessoas mal intencionadas, querendo só destruir o lado oposto, exageram em considerar seus argumentos e em desconsiderar os argumentos dos opositores. A mídia, tradicionalmente de esquerda, querendo destruir um governo de direita, toca o terror, é certo que nesse caso ela tem fatos e ciência a seu favor, mas quem quer, vê, o ranço ideológico por trás de muitos telejornalistas. 
      Já o governo de direita pousa-se de vítima, tendo como álibi uma mídia que sempre foi criadora de um tipo muito sútil de fake news, que ainda que não diga algo notadamente mentiroso, faz as pontuações nos lugares errados, conta as notícias em ordens diferentes, para que o bom pareça mau e o mau, bom. Sempre houve parcialidade na mídia, ocorre que agora, antagonista de um governo equivocado, ela tenta pousar-se de imparcial, mas isso não  é verdade. Será que é tão difícil entender que tem gente que não acredita na Globo tanto quanto não crê no atual presidente e que não é de esquerda? 
      Parece que o mundo atual obriga-nos a sermos extremistas, parece que não existe lugar para o meio termo, isso ficou fora de moda, ser equilibrado tornou-se sinônimo de se isentar. Mas não podemos ser acuados dessa maneira, principalmente se somos verdadeiros amigos do Altíssimo. Temos que ter coragem e ficar do lado de Deus, de ninguém mais, mesmo que signifique não termos apoio de nenhum dos extremos, mesmo que signifique ficarmos sozinhos. Muitos cristãos não percebem que querendo fazer parte de “exércitos” só se acovardam, é mais fácil gritar e bater em grupo que sozinho. 
      O pior é que muitos cristãos estão tendo como correligionários neo-nazistas, orgulho branco, anti-semitas e outras porcarias extremistas e violentas, não aceitam que o mesmo presidente que apoiam administra um governo, não para beneficiar o Brasil, mas para agradar a esses brasileiros insanos e poder ter um eleitorado que o mantenha no poder na próxima eleição. Essa escolha de posicionamento do atual presidente é antes de tudo burra, ele poderia ter continuado defendendo certas causas, mas não negar a ciência num momento onde a única salvação que Deus está dando é pela ciência. 

21. Micaías: coragem para militar só

      “Disse mais Jeosafá ao rei de Israel: Peço-te, consulta hoje a palavra do Senhor. Então o rei de Israel reuniu os profetas, quatrocentos homens, e disse-lhes: Iremos à guerra contra Ramote de Gileade, ou deixarei de ir? E eles disseram: Sobe; porque Deus a entregará na mão do rei. Disse, porém, Jeosafá: Não há ainda aqui algum profeta do Senhor, para que o consultemos? Então o rei de Israel disse a Jeosafá: Ainda há um homem por quem podemos consultar ao Senhor; porém eu o odeio, porque nunca profetiza de mim o que é bom, senão sempre o mal; este é Micaías, filho de Inlá. E disse Jeosafá: Não fale o rei assim.” 
      “E o mensageiro, que foi chamar a Micaías, falou-lhe, dizendo: Eis que as palavras dos profetas, a uma voz, predizem coisas boas para o rei; seja, pois, também a tua palavra como a de um deles, e fala o que é bom. Porém Micaías disse: Vive o Senhor, que o que meu Deus me disser, isso falarei.” “Então disse ele: Vi a todo o Israel disperso pelos montes, como ovelhas que não têm pastor; e disse o Senhor: Estes não têm senhor; torne cada um em paz para sua casa. Então o rei de Israel disse a Jeosafá: Não te disse eu, que ele não profetizaria de mim o que é bom, porém sempre o mal?
II Crônicas 18.4-7, 12-13, 16-17

      Quem está certo? A mídia, os políticos ou os cristãos? A mídia não é nem de esquerda, nem de direita, apesar de muitos de direita acharem que ela é de esquerda e muitos de esquerda já terem achado que ela era de direita. Apesar da mídia estar se opondo a um presidente de direita, a própria Rede Globo apoiou o golpe de 1964 e nunca apoiou o líder mais proeminente de esquerda que o Brasil teve. Mas hoje ela é humanista, diz estar do lado do povo, saída esperta, governos mudam, mas sempre haverá seres humanos para consumirem novelas, futebol, carnaval, fast-food e refrigerantes.
      A direita, que se manteve calada sob o remorso da ditadura militar, acordou, mas está mal representada hoje no Brasil, isso estabeleceu um embate que vai continuar. Já a esquerda, de mais cinquenta anos de luta e de três mandatos e meio de presidentes (sem contar dois centro-esquerda), se calou por causa da corrupção, mas ela tem um passado histórico anticristão. Isso leva muitos cristãos a se posicionarem contra a esquerda e a favor de qualquer direita, mesmo de uma extrema. A pandemia da Covid 19 é uma terrível realidade, e quem está certo é a ciência, a única que poderá curá-la. 
      Quanto a eu e você não podemos ser manipulados por ninguém, mesmo que muitos cristãos achem legitimidade na fala de um presidente que se diz contra a globalização, a China e a mídia, porque diz que essas são ferramentas nas mãos do anticristianismo preparando um golpe apocalíptico contra os cristãos. Não, meus queridos, repito, precisamos reavaliar apocalipse e final dos tempos, as coisas não acontecerão como muitos acham que acontecerão, ainda que muitos poderão ser enganados por falsos cristos. O humilde achará na luz mais alta de Deus o discernimento para seguir.
      Uma coisa é certa, haverá um grande engano no final, e nem digo no final do mundo, mas no final de uma fase do mundo. Muitos cristãos acham saber o que será esse engano, mas se soubessem ou não seria um engano ou estariam prontos para ele, mas não estão, e se preparam para a guerra errada. Que profeta estava certo no antigo testamento, quando a nação de Israel tinha se afastado de Deus e por isso estava sendo disciplinada em um cativeiro, o profeta que dizia que Israel teria vitória se fosse à guerra ou o que dizia, ainda que temendo pela própria vida, que Israel seria derrotada e humilhada?
      O Brasil já vinha numa situação de queda moral, de corrupção política, de guerra do tráfico e de milícias, assim, apesar da grande quantidade de cristãos nos templos, o país não estava agradando a Deus. Com o agravante da pandemia não pode haver vitória, não quando muitos cristãos escolheram como líder alguém que representa, não a vontade de Deus, mas a intenção desviada de seus corações, que quer um reino de Deus no mundo e não no céu. Não, meus queridos, esse presidente não conduziu um exército à vitória, mas à derrota, isso já está claro desde o início de seu mandato. 
      Precisamos de coragem para militar por Deus e em Deus, como o profeta Micaías. Esse, a princípio até tentou enganar o rei Jeosafá (II Crônicas 18.14-15), deu a profecia que o rei queria ouvir com medo de morrer e de ir contra a opinião de tão grande maioria de homens que se diziam profetas. Mas sua reputação o precedia, o rei sabia que Micaías era profeta de verdade, mas penso que o rei também não havia crido nos quatrocentos, já devia ter sentido que por não andar certo não tinha aprovação de Deus e não seria vitorioso. Então Micaías disse a dura verdade, Israel não venceria a peleja. 
      Talvez, como nunca antes tenha acontecido, vivamos um momento em que temos que ajudar os outros, não podemos depender só de planos do governo. Muitos, ainda que numa situação difícil, estão com mais condições de viverem vidas mais controladas para poderem ajudar quem não tem nem o que comer. Não tem outro jeito de sairmos da situação, em que a pandemia nos levou, com alguma dignidade. Mas também precisamos nos posicionar, não a favor de políticos, mas do bom senso, mostrando com amor que o problema é sério e que o governo precisa parar de militar errado! 

22. José: sonhos, tempo e destino

      “Bem sei eu que tudo podes, e que nenhum dos teus propósitos pode ser impedido.” Jó 42.2

      Algumas pessoas fazem de tudo para aparecerem como militantes, principalmente nos dias de hoje, quando causas estão em moda, celebradas pela mídia, contudo, talvez a militância mais verdadeira seja aquela que se faz, não porque se quer, porque se escolhe, mesmo por se gostar ou por se estar preparado para fazê-la. A melhor e mais eficiente luta por uma causa é aquela que nos é imposta pelo destino, mas mais ainda que isso, vocacionada por Deus, é algo que nasce conosco, ainda que não saibamos a princípio e que tudo o mais tente conspirar contra por muito tempo. A Bíblia relata várias histórias com características de sofisticadas obras de ficção, verdadeiros romances literários, mas não é assim toda mitologia? Trabalhada por anos nas cabeças das pessoas que ouvem e recontam até que se transformem em contos épicos? Mas a Bíblia é bem mais que mitologia. 
      Moisés, Davi e Daniel têm histórias assim, mas a de José, em minha opinião, é a mais esplêndida, além de ter suma importância na transformação de um simples clã familiar num povo, pronto para ser uma nação. Há algo interessante na história de José, não é que o pressentimento, ainda que maldoso de seus irmãos lá no início, de que esse queria escravizá-los, acabou se realizando? Depois de José ter sido invejado pelos irmãos, vendido por esses aos ismaelitas, levado ao Egito, comprado e já honrado por um homem rico, mas cobiçado pela mulher desse homem que o caluniou, então preso por isso, decifrado o sonho do faraó egípcio, ganhado desse um cargo de muita importância, e por ter essa posição podido trazer sua família ao Egito num momento de fome na região, e finalmente morrido, depois de tudo isso os descendentes dos irmãos de José se tornaram escravos. 
      A primeira lição da história de José é sobre o tempo, cuidado com ele, ele pode surpreender. O que parece uma coisa no início lá na frente pode se mostrar outra totalmente diferente, ou não, a mesma coisa, só que com proporções maravilhosamente maiores. A segunda lição é sobre o destino, que a princípio pode parecer de tragédia, José parecia alguém que não era nem para ter nascido. Foi o último filho de Jacó já na sua velhice, depois parecia ser uma criança que não era para continuar viva, odiado e invejado por nada menos que pelos próprios irmãos. Depois, ainda que recebendo alguma honra e em terra estrangeira, longe da família, foi novamente cobiçado e injustiçado, sua sina parecia ser morte e prisão no esquecimento. Ah, meus caros, o homem pode ser injusto e se esquecer, mas Deus não se esquece de alguém, muito menos de honra-lo. Deus pode virar a história de cabeça para baixo. 
      Parece até que alguém sabia do final de José e queria de todo jeito impedi-lo. Seria o “diabo” ou só provações para evoluí-lo? Mas há uma terceira lição dessa história, é a importância de se sonhar em Deus, de se ter uma vida espiritual além da realidade física (refletimos sobre isso em “O que há em nossas cabeças?”). José foi, desde o início, um sonhador, não alguém embriagado por ilusões, mas com uma comunhão íntima e especial com Deus, que permitiu a ele ver além do tempo e além de um falso e trágico destino. Deus sempre nos equilibra, se experimentamos algo muito duro, muito cruel, muito injusto, ele nos dá algo especial que nos consola, que nos protege e nos dá condições de seguirmos vivos e com determinação rumo ao melhor de seu plano. José acabou protegendo toda a sua família, fez isso só sendo ele mesmo e pagando os preços por isso. Deus sonha o homem e o realiza. 
      Quem pode impedir as intenções divinas? Ninguém, e acima da inveja dos irmãos e de uma trajetória em que José parecia não escolher, não ser seu próprio protagonista, mas só ir colhendo as escolhas, ruins e boas, que outros faziam por ele, Deus cumpre um plano muito mais alto, transformar uma família numa nação. Israel foi moldada no trabalho duro, servindo os outros, pagando preços altos, Deus em sua onisciente sabedoria sabia que esse era o único jeito, e acreditem, quando Deus faz de um jeito, ainda que pareça difícil, é porque é o único jeito para que no final nós colhamos o melhor. Tempo, destino, sonhos? Deus é mais, nele nossas existências lutarão por militâncias que valham a pena, que terão um objetivo que podemos nem imaginar qual será, mas que será especial, e que ninguém mais poderá executar, só nós, os Josés amados de Deus. Testemunho que tem sido assim comigo. 

      “E Israel amava a José mais do que a todos os seus filhos, porque era filho da sua velhice; e fez-lhe uma túnica de várias cores. Vendo, pois, seus irmãos que seu pai o amava mais do que a todos eles, odiaram-no, e não podiam falar com ele pacificamente. Teve José um sonho, que contou a seus irmãos; por isso o odiaram ainda mais. E disse-lhes: Ouvi, peço-vos, este sonho, que tenho sonhado: Eis que estávamos atando molhos no meio do campo, e eis que o meu molho se levantava, e também ficava em pé, e eis que os vossos molhos o rodeavam, e se inclinavam ao meu molho. Então lhe disseram seus irmãos: Tu, pois, deveras reinarás sobre nós? Tu deveras terás domínio sobre nós? Por isso ainda mais o odiavam por seus sonhos e por suas palavras.” 
Gênesis 37.3-8

      “Depois disse Faraó a José: Pois que Deus te fez saber tudo isto, ninguém há tão entendido e sábio como tu. Tu estarás sobre a minha casa, e por tua boca se governará todo o meu povo, somente no trono eu serei maior que tu. Disse mais Faraó a José: Vês aqui te tenho posto sobre toda a terra do Egito. E tirou Faraó o anel da sua mão, e o pós na mão de José, e o fez vestir de roupas de linho fino, e pós um colar de ouro no seu pescoço. E o fez subir no segundo carro que tinha, e clamavam diante dele: Ajoelhai. Assim o pós sobre toda a terra do Egito. E disse Faraó a José: Eu sou Faraó; porém sem ti ninguém levantará a sua mão ou o seu pé em toda a terra do Egito.” 
Gênesis 41.39-44

      “Faleceu José, e todos os seus irmãos, e toda aquela geração. E os filhos de Israel frutificaram, aumentaram muito, e multiplicaram-se, e foram fortalecidos grandemente; de maneira que a terra se encheu deles. E levantou-se um novo rei sobre o Egito, que não conhecera a José; o qual disse ao seu povo: Eis que o povo dos filhos de Israel é muito, e mais poderoso do que nós. Eia, usemos de sabedoria para com eles, para que não se multipliquem, e aconteça que, vindo guerra, eles também se ajuntem com os nossos inimigos, e pelejem contra nós, e subam da terra. E puseram sobre eles maiorais de tributos, para os afligirem com suas cargas. Porque edificaram a Faraó cidades-armazéns, Pitom e Ramessés.
Êxodo 1.6-11

23. Moisés, tempo certo para militar

      “E nunca mais se levantou em Israel profeta algum como Moisés, a quem o Senhor conhecera face a face; nem semelhante em todos os sinais e maravilhas, que o Senhor o enviou para fazer na terra do Egito, a Faraó, e a todos os seus servos, e a toda a sua terra. E em toda a mão forte, e em todo o grande espanto, que praticou Moisés aos olhos de todo o Israel.” 
Deuteronômio 34.10-12

      Enquanto existem pessoas que inventam causas para militar para terem identidade que não precisam ter, e outras que militam por causas equivocadas, temos um exemplo bíblico de homem que tinha uma causa legítima para militar, com autorização de Deus, mas que tentou fazer isso no tempo errado. Moisés era israelita de nascimento, mas por causa da perseguição do faraó contra seu povo, foi lançado num rio ainda bebê por sua mãe de sangue para protegê-lo. Depois foi achado pela filha do faraó que o criou com a formação intelectual e religiosa, mais os luxos, da corte egípcia. 
      “O nome Moisés é tradicionalmente traduzido como "tirado das águas", embora um estudo linguístico aponte que tenha origem egípcia e signifique simplesmente "filho", já que o fonema "séis" é a representação de "filho de" em egípcio, assim como Ramessés” (Fonte). Irônico como quando alguém tenta com violência fazer fracassar o plano de Deus, poder ser usado pela própria providência divina para que o plano original tenha sucesso. O faraó, achando que matando mais um bebê enfraqueceria um povo, acabou fortalecendo um líder que comandaria todo o povo para libertar-se dele. 
      Eis uma lição para todos que se sentem injustiçados, se confiamos em Deus ele cumpre seu plano maior, de um jeito ou de outro. Ninguém pode frustrar os planos de Deus, se ele quer usar, mesmo um frágil bebê condenado à morte como líder de um povo, ele usará. Para isso Deus fará o impossível diante dos homens, mesmo criar um filho de escravo como filho de um rei. Deus faz isso no tempo certo, o conceito de tempo certo, contudo, era algo que um Moisés, já na faixa dos quarenta anos, idade que um homem já pode estar maduro e saber discernir as coisas, não entendia. 
      Moisés achou-se preparado porque tinha a intenção certa, a sensibilidade de perceber o sofrimento do oprimido, e tinha também um meio poderoso, a posição privilegiada de príncipe egípcio, mas na verdade não tinha ainda noção de qual eram os meios divinos para executar sua intenção. Que lição essa para todos nós e para tantos militantes, que acham que podem fazer qualquer coisa pelo fato de lutarem por uma causa legítima. A coisa não funciona assim, não se quisermos agir sincronizados com Deus, a única coisa que nos dá direito de termos a proteção, a capacitação e ao aval de Deus. 
      Se Moisés tinha quarenta, teve que esperar mais quarenta anos, para que sua impulsividade de querer fazer justiça com as próprias mãos desse lugar à mão de Deus, e que mão poderosa de Deus provou Moisés depois de amansado por quarenta anos pastoreando ovelhas no deserto, longe da luxuosa corte egípcia. O que Deus fez na vida de Moises foi desconstruir uma identidade e reconstruir a original, aquela que ele já possuía quando bebê e que tinha sido esquecida, quando viveu como privilegiado com os opressores. Moisés precisava de identidade de oprimido, sentir na pele o sofrimento alheio. 
      Essa é a história de todo servo genuíno de Deus, não dos que acham serem servos, mas dos que são em verdade, esses precisam sofrer para entenderem e executarem suas chamadas adequadamente. Por isso não podemos aliar sucesso com quantidade, com tempo neste mundo, se forem necessárias décadas de preparo para um ano de execução da chamada de Deus, que seja, em primeiro lugar o homem deve salvar a si, para depois salvar os outros. Infelizmente muitos constróem reputações, profissionais e ministeriais, como o Moises de só quarenta anos de idade, com imposição humana. 
      O que é imposto pelo homem, mesmo que não seja por violência, mas com algum artifício de falsidade, boa lábia, como se costuma dizer, não permanece de pé. Quando os próprios israelitas disseram a Moisés, “quem te tem posto a ti por maioral e juiz sobre nós? pensas matar-me, como mataste o egípcio?, penso que ele se sentiu muito humilhado. Mas aquilo não foi seta de inimigo, foi a disciplina de Deus mostrando ao homem que a força do homem de nada vale, aquilo foi o bofetão não cara que Moisés precisava para acordar para a importante chamada divina que tinha a desempenhar. 
      Cuidado, não interprete as coisas erradamente, você pode estar achando que está sendo desrespeitado pelos homens, que não estão reconhecendo tua chamada, quando na verdade é Deus mostrando que é você que não está reconhecendo a importância de tua chamada, e a está tentando desempenhar do jeito errado, no lugar errado ou no tempo errado. Precisamos dar o devido valor à chamada que Deus nos dá, até Jesus só começou seu ministério após seus trinta anos de idade. Por que muitos, às vezes recém formados, querem já desempenhar e colher frutos de algo que ainda nem sabem bem o que é? 
      Por outro lado, e foi o caso de Moisés, estarmos amadurecidos em muitas áreas, pode não conferir legitimidade à nossa chamada, principalmente se for ministerial, basicamente espiritual, e não na área secular ou profissional. Amadurecimento espiritual se ganha com muita oração, depois com prática de amor em humildade, e depois com muito mais oração, que vence o protocolo de pedir e agradecer pelo que se recebeu na área material e se aventura na luz do Altíssimo para conhecer os mistérios do plano espiritual. Será que queremos de fato exercer chamadas de Deus ou só matar uns egípcios? 

      “E aconteceu naqueles dias que, sendo Moisés já homem, saiu a seus irmãos, e atentou para as suas cargas; e viu que um egípcio feria a um hebreu, homem de seus irmãos. E olhou a um e a outro lado e, vendo que não havia ninguém ali, matou ao egípcio, e escondeu-o na areia. E tornou a sair no dia seguinte, e eis que dois homens hebreus contendiam; e disse ao injusto: Por que feres a teu próximo? O qual disse: Quem te tem posto a ti por maioral e juiz sobre nós? Pensas matar-me, como mataste o egípcio? Então temeu Moisés, e disse: Certamente este negócio foi descoberto. Ouvindo, pois, Faraó este caso, procurou matar a Moisés; mas Moisés fugiu de diante da face de Faraó, e habitou na terra de Midiã, e assentou-se junto a um poço.” 
Êxodo 2.11-15 

      “E, quando completou a idade de quarenta anos, veio-lhe ao coração ir visitar seus irmãos, os filhos de Israel.” “E, completados quarenta anos, apareceu-lhe o anjo do Senhor no deserto do monte Sinai, numa chama de fogo no meio de uma sarça.” 
Atos 7.23, 30

24. Josué, escolheu o lado vencedor

      “E falaram a toda a congregação dos filhos de Israel, dizendo: A terra pela qual passamos a espiar é terra muito boa. Se o Senhor se agradar de nós, então nos porá nesta terra, e no-la dará; terra que mana leite e mel. Tão-somente não sejais rebeldes contra o Senhor, e não temais o povo dessa terra, porquanto são eles nosso pão; retirou-se deles o seu amparo, e o Senhor é conosco; não os temais.” 
Números 14.7-9

      Ninguém vive sem lutar por uma causa, causas na verdade têm essências religiosas, não no sentido de nos religar ao divino, mas em nos fornecerem valores para respeitarmos e pelos quais militarmos. Podem ser militâncias mais pessoais, mais privadas, ou mais coletivas, religiosas, políticas, científicas, enfim, ninguém enfrenta a realidade da existência neste mundo sem ter na mão alguma bandeira. Ela é mais que uma capa, é uma consciência, que nos dá a convicção interior de não estarmos aqui sem motivos, ou só para sofrer, mas por uma missão útil. 
      Uns correm atrás de suas profissões, estudam, estudam mais, mudam de empresa, de cidade, até de país, em busca de evolução em sua área, melhores salários, promoções. Outros correm atrás de um amor, passam a vida procurando um relacionamento afetivo satisfatório, isso parece que é mais importante que qualquer outra coisa para eles. Alguns escolhem uma causa e vão com ela até o final, e isso não significa que essa causa seja a melhor ou a melhor para eles, outros demoram para escolher a causa certa, mudam de bandeira por muito tempo até acharem uma que seja sua. 
      Outros, contudo, escolhem a militância correta, para eles e para as pessoas com as quais convivem, e ainda que muitos se coloquem contra, que muitos revezes ocorram, permanecem firmes. Josué é um exemplo bíblico de alguém assim. Ele não era qualquer um em Israel, quando Moisés mandou espias olharem a terra que a nação de Israel possuiria, ele foi escolhido como representante da tribo de Efraim (Números 13.8, 16), mas junto de Calebe, representante da tribo de Judá, foram os únicos espias que não temeram o que viram e confiaram que Deus conduziria Israel em vitória. 
      A conduta incrédula da maioria dos espias deve servir-nos de alerta, caso sejamos escolhidos como representantes de Deus em uma causa, não usemos isso para contrariarmos a causa ou invés de defendê-la. Os espias rebeldes, ao invés de incentivarem a nação de Israel e de compartilharem com ela as virtudes do que Deus estava lhe dando, mostraram as dificuldades e as exacerbaram. Viram gigantes mas não viram o Deus que é maior que tudo, isso inflamou Israel e levou a nação a receber uma terrível punição de Deus, que às portas de Canaã deu meia volta e andou em círculo por décadas. 
      Nem o pedido de Moisés fez Deus mudar de ideia, nem o próprio Moisés deixou de ser punido, só Calebe e Josué foram salvos e entraram em Canaã, de todos os de sua geração, os demais morreram no deserto sem ver a terra prometida. Mas não foi Deus que foi duro e inflexível, foi o povo que foi teimoso e incrédulo por quarenta anos, a palavra de Deus não foi uma determinação, mas uma profecia, assim creio. Como deve ter sido a vida de Josué tendo que pagar um preço por algo que ele não merecia, sabendo que o melhor existia mas que tinha que esperar para usufruir? 
      A história de Josué ensina que escolher a militância certa tem um preço alto, mas que vale a pena se nosso objetivo é agradar a Deus e não aos homens. Josué teve sua recompensa, se tornou o primeiro juiz de Israel em Canaã, substituiu o líder Moisés. Isso é glorioso? Mas caro, ninguém queira lutar por uma causa, principalmente se envolver de forma direta o nome de Deus, sem estar pronto para pagar um preço caro. A Bíblia ensina em mais de um exemplo que a coisa funciona assim no plano de Deus, Josué escolheu o lado vencedor mas teve que esperar o tempo de Deus.

      “E todos os filhos de Israel murmuraram contra Moisés e contra Arão; e toda a congregação lhes disse: Quem dera tivéssemos morrido na terra do Egito! ou, mesmo neste deserto! E por que o Senhor nos traz a esta terra, para cairmos à espada, e para que nossas mulheres e nossas crianças sejam por presa? Não nos seria melhor voltarmos ao Egito?” 
      “E Josué, filho de Num, e Calebe filho de Jefoné, dos que espiaram a terra, rasgaram as suas vestes. E falaram a toda a congregação dos filhos de Israel, dizendo: A terra pela qual passamos a espiar é terra muito boa. Se o Senhor se agradar de nós, então nos porá nesta terra, e no-la dará; terra que mana leite e mel. Tão-somente não sejais rebeldes contra o Senhor, e não temais o povo dessa terra, porquanto são eles nosso pão; retirou-se deles o seu amparo, e o Senhor é conosco; não os temais. 
      Mas toda a congregação disse que os apedrejassem; porém a glória do Senhor apareceu na tenda da congregação a todos os filhos de Israel. E disse o Senhor a Moisés: Até quando me provocará este povo? e até quando não crerá em mim, apesar de todos os sinais que fiz no meio dele? 
      E disse Moisés ao Senhor: Assim os egípcios o ouvirão; porquanto com a tua força fizeste subir este povo do meio deles.” “E se matares este povo como a um só homem, então as nações, que antes ouviram a tua fama, falarão, dizendo: Porquanto o Senhor não podia por este povo na terra que lhe tinha jurado; por isso os matou no deserto. Agora, pois, rogo-te que a força do meu Senhor se engrandeça; como tens falado, dizendo: O Senhor é longânimo, e grande em misericórdia, que perdoa a iniqüidade e a transgressão, que o culpado não tem por inocente, e visita a iniqüidade dos pais sobre os filhos até à terceira e quarta geração. Perdoa, pois, a iniqüidade deste povo, segundo a grandeza da tua misericórdia; e como também perdoaste a este povo desde a terra do Egito até aqui. 
      E disse o Senhor: Conforme à tua palavra lhe perdoei. Porém, tão certamente como eu vivo, e como a glória do Senhor encherá toda a terra. E que todos os homens que viram a minha glória e os meus sinais, que fiz no Egito e no deserto, e me tentaram estas dez vezes, e não obedeceram à minha voz, não verão a terra de que a seus pais jurei, e nenhum daqueles que me provocaram a verá.” “Neste deserto cairão os vossos cadáveres, como também todos os que de vós foram contados segundo toda a vossa conta, de vinte anos para cima, os que dentre vós contra mim murmurastes; não entrareis na terra, pela qual levantei a minha mão que vos faria habitar nela, salvo Calebe, filho de Jefoné, e Josué, filho de Num.
      “Então disse o Senhor a Moisés: Toma a Josué, filho de Num, homem em quem há o Espírito, e impõe a tua mão sobre ele. E apresenta-o perante Eleazar, o sacerdote, e perante toda a congregação, e dá-lhe as tuas ordens na presença deles. E põe sobre ele da tua glória, para que lhe obedeça toda a congregação dos filhos de Israel.

Números 14.2-3, 6-11, 13, 15-23, 29-30, 27.18-20
 
25. Davi, paciência para militar

      “E disse a Davi: Mais justo és do que eu; pois tu me recompensaste com bem, e eu te recompensei com mal. 
I Samuel 24.17

      Quando muitos verificam uma causa que precisa ser defendida, uma necessidade de militância, isso parece já ser tudo que precisam para saírem militando, a existência do problema é suficiente para que se dê uma solução, imediatamente, mas nem sempre deve ser assim. A história de Davi é bem conhecida, um exemplo de que saber-se a vontade de Deus para sua vida, mesmo ter recebido desse uma palavra profética clara de que se tem algo a fazer, pode não ser o suficiente para que se desempenhe uma missão apressadamente. 
      A lição do início da história de Davi é sobre paciência, do homem e de Deus. Deus é paciente com todos, foi com Davi, mas também foi com Saul, esse não foi retirado do trono logo após ter pecado e perdido o direito a ele, ele teve um tempo, para quê? Para se arrepender? Isso seria possível? Deus sempre espera o arrependimento do homem, sempre, isso é o amor mostrando sua principal característica. Deus é paciente e não guarda mágoas, ainda que nos sujemos e nos sujemos ele sempre nos recebe e torna a nos limpar.  
      Mas para Davi, esperar tinha um objetivo, mesmo sabendo que aquele que ocupava um lugar que Deus já havia lhe dado estava em pecado e numa frágil posição, onde ele poderia resolver o problema imediatamente e do seu jeito. A bênção pode estar lá no fundo, exigindo que nós cavemos com esforço e por um bom tempo para alcançá-la, por quê? Porque o objetivo principal de Deus não está no final, mas no processo, no final recebemos algo e pronto, mas no processo nosso caráter é moldado com trabalho. 
      É o que aprendemos no processo que irá conosco para a eternidade e fará diferença, não a bênção que recebemos no final de um processo no mundo. No final pode haver, por mais maravilhoso que seja entre os homens, só algo material e passageiro, no caso de Davi um reinado, mas no processo há virtudes morais que fazem o nosso espírito mais iluminado, e isso é para sempre. Quando você acha que Davi mais cresceu como ser humano, quando assentou-se no trono pela primeira vez ou quando se negou a matar Saul? 
      A bênção maior neste mundo não está no usufruto da vida, mas na negação da morte, e a morte nos confronta o tempo todo, seja em nossa vida ou nas vidas dos outros. Negar a morte é negar o que conduz à segunda morte, a morte do espírito e das virtudes morais. Isso não é fácil, principalmente na situação de Davi, que tinha motivos legítimos para matar alguém. Dois pontos sobre a passagem bíblica (no fim da reflexão) a serem ressaltados, o primeiro é sobre o termo ungido do Senhor e o segundo sobre o temor ao Senhor e a confiança em Deus de Davi.   
      O que muitos não se dão conta, quando usam a passagem para dizerem que é errado revelarmos líderes em pecado, é que o líder ao qual a Bíblia se refere como ungido do Senhor é alguém em pecado e com dias contados para ser julgado publicamente. A lição é que de fato não temos que pesar a mão sobre alguém que recebeu de Deus uma posição na igreja e está em pecado, Deus faz isso, do jeito e no tempo certo. O termo não é orientação para que pastor nunca seja repreendido, mas só para que esperemos a repreensão de Deus.
      Mas isso não significa que nós não possamos ser usados por Deus para repreender alguém em posição de liderança, podemos, sim, mas se for o caso deverá ser feito com temor a Deus, amor e do jeito correto, como orientado em Mateus 18.15-17. O mais sábio é levarmos a questão à liderança e não sairmos falando do assunto por aí, um líder precisa ser protegido, e não por ele mesmo, ele tem responsabilidades que serão cobradas, mas pelos outros, principalmente pelos novos na fé que são alimentados por ele e veem nele um exemplo. 
      Interessante como homens sem amor e sem sabedoria gostam de colocar palavras na boca de ninguém menos que o próprio Deus, “então os homens de Davi lhe disseram, eis aqui o dia, do qual o Senhor te diz, eis que te dou o teu inimigo nas tuas mãos, e far-lhe-ás como te parecer bem aos teus olhos”. Esses são os que militam errado e pior, que tentam achar legitimidade para suas causas em Deus. Que pecado terrível é esse, se não estivermos vigilantes poderemos ser levados por esses a grandes e estúpidos erros. 
      O segundo ponto que ressaltamos da passagem bíblica são as virtudes de Davi, a primeira é seu temor a Deus, ele chora por ter humilhado Saul diante de seus homens quando cortou a orla de seu vestido, num impulso ele até fez o que estava fácil para fazer, mas depois se arrependeu. Será que eu e você choramos por vermos humilhado alguém que nos odeia e que ocupa um lugar que deveria ser nosso? É por isso que Davi foi o maior líder de Israel, que colocou o povo de Deus como uma nação forte no mundo, e que é a raiz do próprio Cristo. 
      Confiança em Deus é a segunda virtude de Davi, fica clara quando ele diz, “julgue o Senhor entre mim e ti e vingue-me o Senhor de ti”. Temos tal confiança para deixarmos que Deus seja nosso árbitro, escolha entre nós e um rei em uma nação como Saul? Davi conhecia o Deus em quem cria, conhecia a legitimidade de sua chamada, mas temia a Deus o suficiente para esperar, quando desempenharia um papel único na história. Davi teve paciência e fez a mais excelente das militâncias, cumprir uma missão de Deus. 

       “Então tomou Saul três mil homens, escolhidos dentre todo o Israel, e foi em busca de Davi e dos seus homens, até sobre os cumes das penhas das cabras montesas. E chegou a uns currais de ovelhas no caminho, onde estava uma caverna; e entrou nela Saul, a cobrir seus pés; e Davi e os seus homens estavam nos fundos da caverna. Então os homens de Davi lhe disseram: Eis aqui o dia, do qual o Senhor te diz: Eis que te dou o teu inimigo nas tuas mãos, e far-lhe-ás como te parecer bem aos teus olhos. E levantou-se Davi, e mansamente cortou a orla do manto de Saul. Sucedeu, porém, que depois o coração doeu a Davi, por ter cortado a orla do manto de Saul. E disse aos seus homens: O Senhor me guarde de que eu faça tal coisa ao meu senhor, ao ungido do Senhor, estendendo eu a minha mão contra ele; pois é o ungido do Senhor.
      “Depois também Davi se levantou, e saiu da caverna, e gritou por detrás de Saul, dizendo: Rei, meu senhor! E, olhando Saul para trás, Davi se inclinou com o rosto em terra, e se prostrou. E disse Davi a Saul: Por que dás tu ouvidos às palavras dos homens que dizem: Eis que Davi procura o teu mal? Eis que este dia os teus olhos viram, que o Senhor hoje te pós em minhas mãos nesta caverna, e alguns disseram que te matasse; porém a minha mão te poupou; porque disse: Não estenderei a minha mão contra o meu senhor, pois é o ungido do Senhor. Olha, pois, meu pai, vê aqui a orla do teu manto na minha mão; porque cortando-te eu a orla do manto, não te matei. Sabe, pois, e vê que não há na minha mão nem mal nem rebeldia alguma, e não pequei contra ti; porém tu andas à caça da minha vida, para ma tirares. Julgue o Senhor entre mim e ti, e vingue-me o Senhor de ti; porém a minha mão não será contra ti.
      “E sucedeu que, acabando Davi de falar a Saul todas estas palavras, disse Saul: É esta a tua voz, meu filho Davi? Então Saul levantou a sua voz e chorou. E disse a Davi: Mais justo és do que eu; pois tu me recompensaste com bem, e eu te recompensei com mal. E tu mostraste hoje que procedeste bem para comigo, pois o Senhor me tinha posto em tuas mãos, e tu não me mataste. Porque, quem há que, encontrando o seu inimigo, o deixaria ir por bom caminho? O Senhor, pois, te pague com bem, por isso que hoje me fizeste.

I Samuel 24.2-6, 8-12, 16-19
 
26. Daniel militou certo
 
      “E disse o rei a Aspenaz, chefe dos seus eunucos, que trouxesse alguns dos filhos de Israel, e da linhagem real e dos príncipes, Jovens em quem não houvesse defeito algum, de boa aparência, e instruídos em toda a sabedoria, e doutos em ciência, e entendidos no conhecimento, e que tivessem habilidade para assistirem no palácio do rei, e que lhes ensinassem as letras e a língua dos caldeus. E o rei lhes determinou a porção diária, das iguarias do rei, e do vinho que ele bebia, e que assim fossem mantidos por três anos, para que no fim destes pudessem estar diante do rei. 
      E entre eles se achavam, dos filhos de Judá, Daniel, Hananias, Misael e Azarias; E o chefe dos eunucos lhes pós outros nomes, a saber: a Daniel pós o de Beltessazar, e a Hananias o de Sadraque, e a Misael o de Mesaque, e a Azarias o de Abednego. E Daniel propôs no seu coração não se contaminar com a porção das iguarias do rei, nem com o vinho que ele bebia; portanto pediu ao chefe dos eunucos que lhe permitisse não se contaminar. Ora, Deus fez com que Daniel achasse graça e misericórdia diante do chefe dos eunucos.” 
Daniel 1.3-9

      Daniel foi o homem certo, ainda que num lugar errado, mas que sempre achava o tempo certo para militar não por ele, e mais até que por seu povo, mas por Deus. Daniel pode representar o arquétipo da militância mais coerente do cristão com o momento histórico atual, por ele entendemos que certas coisas no mundo externo não vão mudar, e nem precisam, não mais, o que deve ser transformado é o homem interior do ser humano. Daniel era acima de tudo um servo de Deus, não de militâncias, e se quisesse militar teria razões bem fortes para isso, por seu povo que estava sendo escravizado. Mas ele mantinha os olhos onde Deus queria que ele os mantivesse naquele momento, no futuro, por isso não sofria mais que o necessário, não lutava em guerras inúteis e era cuidado por Deus de forma especial. Segue texto extraído da reflexão “Três justos” aqui do blog, que avalia três personagens bíblicos em tempos internos diferentes.
      “Daniel era um escravo de luxo, digamos assim... nas sociedades clássicas, grega, romana, e nos tempos bíblicos, os escravos eram espólio de guerra, isso é, os perdedores nas mãos dos vencedores num embate, ou aqueles que se endividavam e não podiam mais pagar suas dívidas. Assim, eles não tinham certos direitos sociais, de ir e vir, de participação política, mas podiam desempenhar atividades em várias áreas profissionais, incluindo algumas bem nobres. Esse era o caso de Daniel, era escravo na corte do rei Nabucodonosor, rei da Babilônia, que havia vencido Judá em batalha e levado seu povo em cativeiro... (Vemos pelo texto inicial) que Daniel era um jovem especial que seria usado em tarefas especiais, que seria tratado de forma especial, mas que ainda assim era um escravo... Daniel estava numa situação ruim que não mudaria, seu cativeiro e de seu povo.  
      Ele seria provado várias vezes, seja com privilégios, seja com privações, seja com honras, seja com calúnias, para que não ficasse confortável com a situação de escravo de luxo e continuasse fiel a Deus. Daniel foi fiel, mas outro adjetivo que o define é sensível.... Sensível suficiente para desvendar mistérios espirituais, só João o evangelista recebeu de Deus (e registrou) mais revelações que Daniel, não só sobre seu povo, mas como sobre todo o mundo e para tempos futuros. Foi através de sua sensibilidade espiritual que Daniel foi ganhando a confiança da monarquia babilônica e conquistando posições políticas importantes. Com Daniel aprendemos que às vezes, o homem que Deus quer que sejamos, é alguém que mantenha-se fiel, vivo e sensível mesmo numa situação que temos certeza que não mudará para melhor a curto prazo, aliás, eis outra característica de Daniel, visão espiritual longa, por isso Deus revelou a ele tantos mistérios sobre o futuro.
      Militâncias por não ao racismo, ao trabalho infantil e ao feminicídio, pelos diretos da mulher e respeito às diversas expressões de sexualidade e às religiões, são legítimas, são causas do presente e de todos, mas é importante que entendamos o que Deus quer exatamente de nós como indivíduos, que pode não ser o geral que a maioria está fazendo. O que segue a Jesus deve enxergar a relevância de ser exceção, não regra, deve ser feliz em uma vocação pessoal, e deve entender quem é seu Senhor, Deus, não os homens. Mas não é fácil ser exceção, alguns até gostariam de ser, mas só se percebem assim por terem visões distorcidas de si mesmos e da realidade, causadas por doenças emocionais não curadas. Existe muito doente mental em igrejas evangélicas, pregando e profetizando, que na verdade precisariam de tratamento psiquiátrico, não de púlpitos. 
      Outros preferem ser regra, para fazerem parte de algo grande que lhes dê objetivo de vida e contrabalanceie seus recalques, mas tanto os que se acham especiais do jeito errado quanto os que querem ser regra por medo, precisam buscar a Deus e entender melhor suas chamadas, senão serão só manipuláveis por seus equívocos e por agendas alheias. Não pense que isso diminui seus “itinerários”, Deus tem tudo em suas mãos e de tudo sabe, algo que pode começar pequeno e desconhecido hoje pode se tornar no futuro algo importante no plano maior do Altíssimo, que abençoará mais que um indivíduo, mas muitos. Se formos fiéis e sensíveis, como foi Daniel, poderemos ter essa experiência, Daniel não devia saber que as orações, que fazia por si e pelo seu povo, conteriam, na resposta de Deus, profecias para o futuro da humanidade.

27. Jonas, profeta sem amor?

      Jonas é o exemplo de um homem que recebeu de Deus uma causa para militar, mas que teimou em não aceitar. Qual o motivo principal que o levou a desobedecer a Deus? Muitos acham legitimidade em qualquer coisa, se empoderam e partem para a luta, mas justamente alguém, que tinha Deus ao seu lado, fugiu da luta, por quê? 

      “E veio a palavra do Senhor a Jonas, filho de Amitai, dizendo: Levanta-te, vai à grande cidade de Nínive, e clama contra ela, porque a sua malícia subiu até à minha presença. Porém, Jonas se levantou para fugir da presença do Senhor para Társis. E descendo a Jope, achou um navio que ia para Társis; pagou, pois, a sua passagem, e desceu para dentro dele, para ir com eles para Társis, para longe da presença do Senhor.” Jonas 1.1-3

      O barco, fuga para dentro do mundo. 
      Um homem que foge de Deus pode equivocadamente procurar esconder-se em dois lugares, o primeiro deles é o mundo, o barco simboliza isso. O mundo é como as águas do mar, muitas possibilidades são apresentadas, simulando a liberdade que só existe na água viva do Espírito Santo, mas diferentemente do Espírito, que nos faz voar e subir, para mais perto da vida eterna, o mar do mundo é traiçoeiro, em algum momento nos submergirá, conduzindo-nos à morte. 
      Seremos lançados para as profundezas, traídos por aqueles falsos companheiros de viagem, maldito o homem que confia no homem (Jeremias 17.5b), enquanto o homem ganha alguma coisa conosco, pode até dizer que é nosso amigo, mas quando o perigo se aproximar, ele nos lançará ao mar, para salvar a si mesmo. Pior ainda se aquele que foge no mundo dos homens for um chamado rebelde de Deus, por esse, menos respeito ainda terão aqueles que sempre caminharam longe do Senhor. 

      “E levantaram a Jonas, e o lançaram ao mar, e cessou o mar da sua fúria.” “Preparou, pois, o Senhor um grande peixe, para que tragasse a Jonas; e esteve Jonas três dias e três noites nas entranhas do peixe.” Jonas 1.15, 17

      O peixe, fuga para dentro de si mesmo. 
      Quando o mundo desampara aquele que tenta, equivocadamente, fugir de Deus, como se isso fosse possível, o profeta rebelde tentará fugir para dentro de si mesmo, numa disposição de solidão e descrença de tudo, isso é o que o grande peixe simboliza. Se no mundo ainda existem fugas, prazeres, algum espaço para termos alguma liberdade, ainda que amarga, nas entranhas do peixe o espaço é restrito, o coração do que foge de Deus vai se apertando cada vez mais, deixando o rebelde mais e mais torturado. 
      Lugar terrível é esse, ninguém consegue ficar muito tempo nele, e os que insistem em fugir para dentro de si mesmos podem chegar à insanidade, onde não se tem mais luz moral e intelectual para existir, onde não se vê nada, nem a ninguém, só o próprio reflexo dizendo que se é covarde e medroso, que se está fugindo de sua principal razão de existir, da presença do Deus Altíssimo. 

      “E orou Jonas ao Senhor, seu Deus, das entranhas do peixe.” “Falou, pois, o Senhor ao peixe, e este vomitou a Jonas na terra seca.” “E veio a palavra do Senhor segunda vez a Jonas, dizendo: levanta-te, e vai à grande cidade de Nínive, e prega contra ela a mensagem que eu te digo. E levantou-se Jonas, e foi a Nínive, segundo a palavra do Senhor. Ora, Nínive era uma cidade muito grande, de três dias de caminho.” “E Deus viu as obras deles, como se converteram do seu mau caminho; e Deus se arrependeu do mal que tinha anunciado lhes faria, e não o fez.” “Mas isso desagradou extremamente a Jonas, e ele ficou irado” “E disse o Senhor: Fazes bem que assim te ires?”  Jonas 2.1, 10, 3.1-3, 10, 4.1, 4

      Obediência? Não. 
      Dentro do peixe o profeta rebelde ora, ele não tem outra saída, e um Deus sempre amoroso atende à oração e livra o profeta, então, quase que sem pensar direito, ainda com as lembranças das entranhas do peixe na cabeça, o profeta obedece a ordem inicial de Deus. Entretanto, se o coração não for transformado por amor, o medo não o mudará, ainda que o leve a fazer coisas certas permitindo que Deus cumpra sua vontade com os outros. Mas ordem obedecida com intenção errada não traz paz, logo o profeta rebelde se arrependerá do que fez, a bênção dos outros não sensibilizará seu coração sem amor. 
      Sem amor nada faz sentido, seja família, religião, caridade, amizade, sem amor tudo é desgosto, egoísmo, que exige mas não dá, que critica os outros mas não se avalia, que desobedece mesmo ao Deus Altíssimo. Não nos iludamos com certos cristãos, podem até serem usados por Deus para abençoar os outros, mas se tiverem no coração a intenção errada não abençoarão a si mesmos. No final poderão ser escândalo, para aqueles que falaram do amor de Deus, porque falaram, mas não praticaram. 

      “E fez o Senhor Deus nascer uma aboboreira, e ela subiu por cima de Jonas, para que fizesse sombra sobre a sua cabeça, a fim de o livrar do seu enfado; e Jonas se alegrou em extremo por causa da aboboreira. Mas Deus enviou um verme, no dia seguinte ao subir da alva, o qual feriu a aboboreira, e esta se secou. E aconteceu que, aparecendo o sol, Deus mandou um vento calmoso oriental, e o sol feriu a cabeça de Jonas; e ele desmaiou, e desejou com toda a sua alma morrer, dizendo: Melhor me é morrer do que viver. Então disse Deus a Jonas: Fazes bem que assim te ires por causa da aboboreira? E ele disse: Faço bem que me revolte até à morte.” “E disse o Senhor: Tiveste tu compaixão da aboboreira, na qual não trabalhaste, nem a fizeste crescer, que numa noite nasceu, e numa noite pereceu; E não hei de eu ter compaixão da grande cidade de Nínive em que estão mais de cento e vinte mil homens que não sabem discernir entre a sua mão direita e a sua mão esquerda, e também muitos animais?” Jonas 4.6-9, 10-11

      Falta de amor! 
      A hipocrisia pode levar o homem a levantar muitas bandeiras, a militar por muitas causas, pelo planeta, pelos animais, contra preconceitos e injustiças, Jonas, que não queria aceitar a ordem de Deus e militar por pessoas, caiu no ridículo, militou por uma aboboreira, é assim mesmo que pode acontecer com todos nós. Como existem pessoas, que teimando contra a vontade de Deus, que virando as costas para uma chamada verdadeira do Senhor, e toda chamada sempre existe pelo amor de Deus e deve ser realizada no amor de Deus, acabam lutando por qualquer coisa, militando por tolos e estúpidos, sendo manipulados por homens gananciosos e vaidosos. 
      Por que Jonas se negou a obedecer a Deus? Não foi por medo da missão que recebeu, mas foi simplesmente por falta de amor, ele não achou que os ninivitas merecessem seu esforço. Um coração que não aprende a amar e que não se permite ser amado, e Deus amou muito a Jonas, não se apaixonará pela causa maior, pela mais nobre das militâncias, levar a palavra de amor de Deus aos homens. Cuidado, não milite por aboboreiras, um pequeno verme, se for enviado por Deus, pode matá-las, por maior que elas sejam, por mais que elas pareçam dar ao rebelde proteção contra o Sol e o vento, não podem resistir à vontade maior de Deus. 
      O livro de Jonas termina com a pergunta que Deus faz no final do capítulo quatro, versículos dez e onze. Pelo registro bíblico, apesar da oração de arrependimento que Jonas fez no capítulo dois, não sabemos qual foi a posição do profeta depois que ele se revoltou pela aboboreira. Teria ele entendido porque lhe era difícil obedecer a Deus? De fato se tornou alguém melhor com a prova, mesmo que os ninivitas tenham recebido a palavra de Deus e mudado de vida? Não podemos dizer com certeza. Fica uma lição para todos nós, uma causa não é totalmente legítima por ser uma militância relevante, nem mesmo por ser aprovada e ordenada por Deus, mas por ser executada com amor.

28. Judas e Pedro, inícios iguais, fins diferentes

      “O homem bom, do bom tesouro do seu coração tira o bem, e o homem mau, do mau tesouro do seu coração tira o mal, porque da abundância do seu coração fala a boca.” 
Lucas 6.45
 
      Judas Iscariotes é um exemplo bíblico de quem milita por si mesmo, para ganhar algum dinheiro ele achou meio e incentivo nas intenções maliciosas de líderes religiosos judeus que tinham o objetivo de calar a militância do Cristo. Quando alguém tem os motivos errados sempre acha simpatizantes, que podem ter intenções muito piores que o usam como fantoche, Judas militou covardemente e só alcançou seu objetivo escondido no meio dos oficiais mandados para prender o salvador. Mas ele já tinha interesse em fazer parte de algo maior quando se tornou um dos doze apóstolos, ser do grupo seleto de discípulos de um mestre que se colocava contra a religião vigente revela sua face militante. Sua intenção desde o início era trair Jesus? Talvez não, e quando resolveu fazê-lo podia pensar que Jesus não saberia, mas Jesus sabia e penso que esperou até o fim que Judas mudasse de atitude, não consigo aceitar que o Cristo passivamente aguardasse que Iscariotes irrevogavelmente o traísse, o amor de Deus não funciona assim.
      Sob alguns aspectos Pedro era parecido com Judas, um deles era a necessidade de militar, o outro aspecto era uma agressividade não resolvida no coração. Contudo, enquanto Judas resolveu isso da pior maneira, entregando à morte aquele que talvez revelasse a ele seu lado pior e que ele não queria aceitar, Pedro tentou fazer justiça com as próprias mãos agredindo um daqueles que tentava prender o líder no qual acreditava. Ambos eram militantes, homens que não querem ser só mais um, mas que tomam partido e lutam por uma causa, ainda que por motivos e para fins distintos, ambos tiveram experiências ruins que revelaram o entendimento equivocado que tinham de suas ideologias. O final de Judas foi pior, o suicídio, proporcional a seu erro, o de Pedro foi parte do plano de Deus para discipliná-lo e melhorá-lo, mas foi amargo, negou por três vezes o Cristo que disse que seguiria até à morte.
      “Alguns pesquisadores acreditam que, assim como Judas Iscariotes, Pedro tenha sido um zelota, grupo que teria surgido dos fariseus e constituía-se de pequenos camponeses e membros das camadas mais pobres da sociedade. Este supostamente estaria comprovado em Marcos 3:18, assim como em Atos 1:13, no entanto, o certo "Simão, o Zelote" é na realidade uma pessoa distinta dentre as nomeações descritas nas referidas citações” (Fonte), eis outra semelhança entre Pedro e Judas Iscariotes? Pode ser. Todas as militâncias são provadas e só prevalecerão se forem aprovadas, assim, cuidado com o começo de certas lutas, um homem apaixonado munido de uma causa que parece legítima pode brilhar de maneira convincente. Contudo, é preciso mais que uma causa certa, é preciso lutar por ela com as ferramentas corretas e não ser seduzido por trocas que o mal possa apresentar. 
      O comunismo parecia uma causa boa, que tiraria o povo russo do despotismo do império Romanov que beneficiava alguns e fazia muitos sucumbirem na miséria. Contudo, milhões foram assassinados pelos bolcheviques e pelo partido comunista, para se impor uma causa. Será que se não fosse desse jeito o comunismo teria resistido por tanto tempo na União Soviética? Militância que vence pela violência não tem fundamento moral elevado, como tal só continuará existindo com mais violência, nunca tendo apoio de homens de bem e de Deus, é assim na China e na Coréia do Norte até hoje. Algumas militâncias são pesadas, podem sangrar as mãos enquanto são conduzidas, e colocá-las no cano de uma metralhadora pode torná-las aparentemente mais leves, mas aí serão só álibis para matar e destruir, tornando militantes originalmente vítimas que reagem a injustiças em agressores cruéis. Quem diz que décadas depois os que foram originalmente vítimas não se tornarão opressores piores que seus opressores originais? Quando algo começa com violência será mantido assim e assim existirá até o fim, não nos enganemos.  
      O final de Pedro foi dar a vida pela causa em que acreditou, mas antes ele cumpriu sua missão, pregou o evangelho de Cristo no mundo em que viveu, deixou frutos que atravessaram os séculos e que abençoaram milhões. “A tradição da Igreja Católica Romana afirma que depois de passar por várias cidades, Pedro haveria sido martirizado em Roma entre 64 e 67 d.C. Desde a Reforma, teólogos e historiadores protestantes afirmaram que Pedro não teria ido a Roma; esta tese foi defendida mais proeminentemente por Ferdinand Christian Baur, da Escola de Tübingen. Outros, como Heinrich Dressel, em 1872, declararam que Pedro teria sido enterrado em Alexandria, no Egito ou em Antioquia. Hoje, porém, os historiadores concordam que Pedro realmente viveu e morreu em Roma. O historiador luterano Adolf Harnack afirmou que as teses anteriores foram tendenciosas e prejudicaram o estudo sobre a vida de Pedro em Roma. Sua vida continua sendo objeto de análise, mas o seu túmulo está localizado na Basílica de São Pedro, no Vaticano, o qual foi descoberto em 1950 após anos de meticulosa investigação.” (Fonte). 

      “Tendo, pois, Judas recebido a coorte e oficiais dos principais sacerdotes e fariseus, veio para ali com lanternas, e archotes e armas. Sabendo, pois, Jesus todas as coisas que sobre ele haviam de vir, adiantou-se, e disse-lhes: A quem buscais? Responderam-lhe: A Jesus Nazareno. Disse-lhes Jesus: Sou eu. E Judas, que o traía, estava com eles.

João 18.3-5
      “Então Judas, o que o traíra, vendo que fora condenado, trouxe, arrependido, as trinta moedas de prata aos príncipes dos sacerdotes e aos anciãos, dizendo: Pequei, traindo o sangue inocente. Eles, porém, disseram: Que nos importa? Isso é contigo. E ele, atirando para o templo as moedas de prata, retirou-se e foi-se enforcar.

Mateus 27.3-5
      “Então Simão Pedro, que tinha espada, desembainhou-a, e feriu o servo do sumo sacerdote, cortando-lhe a orelha direita. E o nome do servo era Malco. Mas Jesus disse a Pedro: Põe a tua espada na bainha; não beberei eu o cálice que o Pai me deu? Então a coorte, e o tribuno, e os servos dos judeus prenderam a Jesus e o maniataram.” “E Simão Pedro e outro discípulo seguiam a Jesus. E este discípulo era conhecido do sumo sacerdote, e entrou com Jesus na sala do sumo sacerdote. E Pedro estava da parte de fora, à porta. Saiu então o outro discípulo que era conhecido do sumo sacerdote, e falou à porteira, levando Pedro para dentro. Então a porteira disse a Pedro: Não és tu também dos discípulos deste homem? Disse ele: Não sou.

João 18.10-12, 15-17
      “Pedro, porém, pondo-se em pé com os onze, levantou a sua voz, e disse-lhes: Homens judeus, e todos os que habitais em Jerusalém, seja-vos isto notório, e escutai as minhas palavras.” “E com muitas outras palavras isto testificava, e os exortava, dizendo: Salvai-vos desta geração perversa. De sorte que foram batizados os que de bom grado receberam a sua palavra; e naquele dia agregaram-se quase três mil almas

Atos 2.14, 40-41
 
29. Saulo e Paulo, diferentes militâncias

     “Procura vir ter comigo depressa, Porque Demas me desamparou, amando o presente século, e foi para Tessalônica, Crescente para Galácia, Tito para Dalmácia. Só Lucas está comigo. Toma Marcos, e traze-o contigo, porque me é muito útil para o ministério. Também enviei Tíquico a Éfeso. Quando vieres, traze a capa que deixei em Trôade, em casa de Carpo, e os livros, principalmente os pergaminhos. Alexandre, o latoeiro, causou-me muitos males; o Senhor lhe pague segundo as suas obras. Tu, guarda-te também dele, porque resistiu muito às nossas palavras. Ninguém me assistiu na minha primeira defesa, antes todos me desampararam. Que isto lhes não seja imputado.
II Timóteo 4.9-16

      Paulo sempre foi um militante. Lendo as primeiras menções bíblicas sobre ele, ainda citando-o com o nome de Saulo, podemos achar que ele era só um vilão, perseguidor de cristãos, ligado ao violento assassinato de Estêvão que pregava o evangelho. Mas será que Saulo se via assim, como um opressor? Penso que não, ele se achava um militante, e por uma causa justa, ele era só um enviado de autoridades judias e romanas, que zelava pela religião oficial e pela ordem do império. Alguém que é mais que um funcionário recebendo ordens, que defende algo em que acredita como sendo o melhor para a sociedade, que faz isso mesmo que não seja só por retorno financeiro, não se vê como vilão, mas como justiceiro, ainda que usando de violência. 
      Militantes, revolucionários, políticos, pelo menos a princípio, são pessoas que acreditam em algo e querem levar isso a outros. Um cristão é um militante, e mais que os adeptos de outras religiões, ele não só vivencia uma experiência de mudança de vida, como também quer compartilhar isso com os outros. Isso é feito adequadamente? Nem sempre em se tratando de um cristão, que se diz ligado a uma religião baseada no amor de Deus aos homens por Jesus, onde o compartilhamento dessa experiência deveria ser também através do amor, não por qualquer espécie de imposição ou violência. Infelizmente o cristianismo foi corrompido desde o início, não nos iludamos sobre isso, homens reconheceram o poder dele, e por isso quiseram usá-lo para manipular outros homens. 
      O poder do cristianismo é o Cristo, não as poderosas instituições que foram construídas sobre e não pelo Cristo, que de tão pesadas e pomposas acabaram deixando o humilde e simples Cristo esquecido e distante. É exatamente isso que sentimos quando assistimos certos ritos cristãos, que até falam da verdade, mas que é situada tão longe que faz com que as pessoas respeitem por medo, não por interagirem intimamente com ela. Assim era a religião judaica que Saulo defendia, e por ser instituição de homens, muito distante de Deus, não teve a sensibilidade espiritual para ver e aceitar que o que Estêvão e outros defendiam e pelo que morriam, era o verdadeiro e prometido Jesus, o cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo.
      Talvez seja difícil acreditar, mas mesmo nas perseguições em que Paulo era protagonista, havia sinceridade, mal direcionada, mal usada, mas havia e Deus viu essa sinceridade. O militante errado sempre cai do cavalo, sua causa é enganosa, não se sustenta, um dia ele perceberá que sua militância só o está conduzindo para o lado errado, não esta beneficiando ninguém, só está exercendo injustiça, justamente o oposto daquilo que ele queria fazer no início de sua empreitada. O homem é cego, mesmo com as melhores intenções poderá cometer erros absurdos, se não tiver um coração quebrantado na presença de Deus. Foi justamente isso que transformou o Saulo, perseguidor de Jesus, em Paulo, pregador do evangelho, caiu do cavalo sem poder ver.
      Paulo se converteu por volta do ano 34 d.C., pouco tempo após a morte de Jesus, com aproximadamente vinte e nove anos de idade, sua morte pode ter ocorrido por volta do no 67 d.C, dessa forma trabalhou pelo evangelho por mais ou menos trinta e três anos. Foram três viagens missionárias até sua segunda prisão em Roma, onde acredita-se que tenha sido degolado. O texto da segunda carta a Timóteo é revelador, uma de minhas passagens preferidas da Bíblia, que diferença o Paulo em seu final de vida, depois de ter fundado várias igrejas pelo mundo de sua época e escrito a base teológica das igrejas cristãs, do jovem e poderoso Saulo, que estudou com o famoso rabino Gamaliel, que entrava e saía de onde queria, perseguindo e encarcerando.
      O último capítulo da segunda epístola a Timóteo não precisa de muita interpretação, é explícita a tristeza de Paulo descrevendo sua solidão, mesmo detalhes de alguns que não estavam com ele quando ele mais precisava, traições, displicências, mesmos mau-caratismo, por exemplo quando cita Demas e Alexandre o latoeiro. Mas o que me chama a atenção é o pedido que ele faz ao jovem Timóteo: “quando vieres traze a capa e os livros, principalmente os pergaminhos”, isso era tudo que Paulo tinha na vida? Se tivesse mais roupas ou como comprá-las não pediria que lhe trouxesse uma simples capa. Que diferença de tantos pastores atuais, que fazem careira usando o evangelho e por isso se acham no direito de terem vidas materiais prósperas. 
      Estamos preparados para ser militantes como o velho Paulo? Ou só queremos ser o jovem Saulo, exercendo truculência sobre aqueles que discordam de nossas bandeiras. Meus queridos, não é isso que muitos evangélicos estão fazendo no Brasil hoje? Apoiando uma ideologia política que é a favor de armas, de volta ao militarismo, que demoniza outras religiões e que se acha no direito de agredir por se achar militando por Deus? Deus nada tem a ver com isso, infelizmente muitos evangélicos e protestantes não percebem que se desviaram tanto no engano, que o próprio Deus permitiu que o engano encarnasse num líder político. Oremos para que após a vergonha que isso trará, esses se humilhem, se arrependam e voltem ao Deus verdadeiro. 

      “E Estêvão, cheio de fé e de poder, fazia prodígios e grandes sinais entre o povo. E levantaram-se alguns que eram da sinagoga chamada dos libertinos, e dos cireneus e dos alexandrinos, e dos que eram da Cilícia e da Ásia, e disputavam com Estêvão. E não podiam resistir à sabedoria, e ao Espírito com que falava.” “E, expulsando-o da cidade, o apedrejavam. E as testemunhas depuseram as suas capas aos pés de um jovem chamado Saulo. E apedrejaram a Estêvão que em invocação dizia: Senhor Jesus, recebe o meu espírito.“ 
      “E também Saulo consentiu na morte dele. E fez-se naquele dia uma grande perseguição contra a igreja que estava em Jerusalém; e todos foram dispersos pelas terras da Judéia e de Samaria, exceto os apóstolos. E uns homens piedosos foram enterrar Estêvão, e fizeram sobre ele grande pranto. E Saulo assolava a igreja, entrando pelas casas; e, arrastando homens e mulheres, os encerrava na prisão.” 
      “E Saulo, respirando ainda ameaças e mortes contra os discípulos do Senhor, dirigiu-se ao sumo sacerdote. E pediu-lhe cartas para Damasco, para as sinagogas, a fim de que, se encontrasse alguns daquela seita, quer homens quer mulheres, os conduzisse presos a Jerusalém. E, indo no caminho, aconteceu que, chegando perto de Damasco, subitamente o cercou um resplendor de luz do céu. 
      E, caindo em terra, ouviu uma voz que lhe dizia: Saulo, Saulo, por que me persegues? E ele disse: Quem és, Senhor? E disse o Senhor: Eu sou Jesus, a quem tu persegues. Duro é para ti recalcitrar contra os aguilhões.” “E Saulo levantou-se da terra, e, abrindo os olhos, não via a ninguém. E, guiando-o pela mão, o conduziram a Damasco.
 Atos 6.8-10, 7.58-59, 8.1-3, 9.1-5, 8

30. Jesus: salvador e mártir

      “Verdadeiramente ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e as nossas dores levou sobre si; e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus, e oprimido. Mas ele foi ferido por causa das nossas transgressões, e moído por causa das nossas iniqüidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados. Todos nós andávamos desgarrados como ovelhas; cada um se desviava pelo seu caminho; mas o Senhor fez cair sobre ele a iniqüidade de nós todos.” 
Isaías 53.4-6

      Cuidado, não crie falsos mártires, isso transforma líder corrupto em santo, também não acredite em falsos salvadores da pátria, isso empodera líder desonesto só por ter uma bandeira honesta na mão. Jesus é o exemplo genuíno de mártir e salvador. Ele defendia uma causa justa, o amor de Deus pelos homens e o amor desses por seus semelhantes, ele vivia o que pregava, sua maior ferramenta de convencimento era sua prática de vida. Ele não fazia propaganda de suas boas obras, não buscava aprovação de homens, não se expunha irresponsavelmente, não usou a perseguição que sofria como marketing para conferir legitimidade à sua missão. Se suas palavras e seu exemplo de vida não tivessem poder genuíno, ele só seria lembrado como um judeu do século um crucificado pelas autoridades por ter ensinado heresias. 
      A obra do Cristo tem o aval do tempo porque ele teve uma vida correta e lutou com amor o tempo todo, mesmo pelos que não entenderam bem seu amor, ainda que andassem com ele e fossem seus amigos, e pelos que desprezaram seu amor, ainda que tenham experimentado milagres dele na própria carne, e mesmo pelos que o odiaram e o perseguiram, ainda que nunca tenham sido agredidos por ele. Aos que bateram em uma de suas faces, ele ofereceu a outra para ser agredida, e ainda que tivesse aprovação de Deus não usou a autoridade de Deus para punir os que o perseguiam. Carregou sua cruz até o fim com humildade e serenidade, ainda que sozinho e agoniado, porque Jesus também temeu, mas não pecou, sentiu em seu corpo dor terrível, mas não negou sua missão, ele não foi um falso mártir, nem um falso salvador.  
      Tantos militam por causas, e por não terem aprovação de Deus em suas lutas tentam usar subterfúgios para lançarem holofotes em suas militâncias, poucos não sucumbem à tentação de se fazerem de vítimas, de mártires, para convencerem as massas que o problema está nos outros, enquanto que eles só tem a solução melhor. Outros não se importam de serem estúpidos por acharem que suas causas falam por si mesmas, que se são certas eles não têm obrigação de as conduzirem com qualquer delicadeza, não entendem que as únicas causas que sobrevivem ao tempo são aquelas que mudam as pessoas, e que eles devem ser os primeiros a darem o exemplo de mudança. Quem não muda a si mesmo não pode mudar os outros, temos que ser os primeiros a dar testemunho daquilo em que dizemos crer e pelo que lutamos. 
      Como massas políticas, as pessoas têm memória curta, facilmente se esquecem do mal que alguém fez se esse sofrer mal semelhante, da mesma maneira relevam meios errados, se acham que as causas iniciais foram certas. Falsos mártires podem ser exaltados, assim como estúpidos salvadores da pátria podem ser mantidos, porque as pessoas não querem mudar de opinião e assumirem que apoiam pessoas que no momento estão erradas. Loucos, contudo, são tanto os que tornam homens maus em mártires, quando esses na verdade só sofrem as consequências de seus atos e não por serem vítimas, quanto os que apoiam estúpidos que ainda que lutem nos discursos por causas corretas, na ação são insensatos. Contudo, é melhor quem errou se arrepender e mudar, que quem começou certo seguir fazendo do jeito errado. 
      As pessoas querem ser mártires, mas sobreviverem para usufruírem dos direitos de serem mártires, entendem tudo errado, mártir de verdade não sobrevive e morre injustamente, o que vive é a bandeira verdadeira defendida por pessoas que praticam o que acreditam e pelo qual dão a própria vida. As pessoas querem ser salvadoras da pátria, mas não querem salvar a si mesmas, assim militam sem amor, se defendem o tempo todo, mas não lutam pelos outros, não se colocam no lugar dos que sofrem, não entendem que os verdadeiros salvadores dão a própria vida pelos outros. Olhem para Jesus, falsos mártires e pseudos salvadores, não queiram ser ele, nem falar em seu nome, esses direitos não lhes foram outorgados, vocês não são deuses, mas homens, tenham alguma humildade, talvez assim suas militâncias resistam ao tempo.
      “Ele foi oprimido e afligido, mas não abriu a sua boca; como um cordeiro foi levado ao matadouro, e como a ovelha muda perante os seus tosquiadores, assim ele não abriu a sua boca. Da opressão e do juízo foi tirado; e quem contará o tempo da sua vida? Porquanto foi cortado da terra dos viventes; pela transgressão do meu povo ele foi atingido. E puseram a sua sepultura com os ímpios, e com o rico na sua morte; ainda que nunca cometeu injustiça, nem houve engano na sua boca.” (Isaías 53.7-9). A frase, que mais chama a atenção nesse texto de Isaías, com exatidão profética cirúrgica sobre Jesus, é “não abriu a sua boca”. Um mártir e salvador de verdade tem essa virtude, não milita por discursos, em sua boca não há engano, mas pela prática de uma vida que se sacrifica pelo outro, cala, mas sofre e ama, até o fim.

31. O militante que Deus pode usar

      “Porque para mim o viver é Cristo, e o morrer é ganho. Mas, se o viver na carne me der fruto da minha obra, não sei então o que deva escolher. Mas de ambos os lados estou em aperto, tendo desejo de partir, e estar com Cristo, porque isto é ainda muito melhor. Mas julgo mais necessário, por amor de vós, ficar na carne.
  Filipenses 1.21-24

      Não quero me proteger de você, eu quero te proteger de mim
      Se muitos militantes pensassem dessa maneira seriam mais eficazes em suas lutas. Esse raciocínio demonstra humildade e autoconhecimento, essas são as referências básicas para que alguém possa sugerir soluções para os problemas dos outros, ter achado e praticado soluções para seus próprios problemas. Contudo, muitos atualmente, por levantarem bandeiras coletivas, por minorias que foram historicamente oprimidas, acham que não precisam olhar para si, basta-lhes indicar, com o dedo na cara, o problema que o outro causa, para que a solução de outros aconteça.
      Não confundamos passividade com paz
      Estar em paz não é ser passivo, paz não é distância do problema, mas resolução dele, para resolver tem que se aproximar, conhecer de perto a questão, sentir na pele uma dor, e isso pode ser feito mesmo por brancos que lutam contra preconceito contra negros. Isso não é apropriação ideológica, como podem até dizer oprimidos orgulhosos, é compaixão, que pode ser experimentada por quem ama e quer ajudar, ainda que por alguém com um problema que originalmente não o atinja diretamente. Paz pode ser conseguida só com luta, mas lutar civilizadamente não violentando.
      O mal está em mim e esse mal compete a mim resolver
      O mal do outro pode ser impedido de se manifestar como violência a outros, pode e deve, mas acabar de vez com o mal é só através de uma escolha de vontade do que retém o mal. A solução não é destruir o que carrega um mal, mas o mal, é assim que uma sociedade civilizada funciona, quanto ao que carrega o mal, esse precisa ser reabilitado com amor. Ensina com amor quem se coloca no lugar do ensinado, não acima, com prepotência e se achando no direito de usar o papel de “mestre” para oprimir só porque se é vítima. Oprimido que oprime também é opressor.  
      O coletivo não pode ser maior que o indivíduo
      Isso não significa que uma bandeira coletiva não deva ser levantada por um indivíduo com problemas, principalmente se seu maior problema for o preconceito contra o qual a bandeira milita. Mas o indivíduo não deve se esconder atrás de uma bandeira, ter identidade nela e não ter identidade como indivíduo, se for assim o indivíduo pode resumir-se a uma dor, e não a um conjunto de escolhas virtuosas. Se colocar como alguém que sofre e que só faz isso, é celebrar mais a opressão que a libertação dela, é gloriar-se de ser oprimido, não de ter vencido a opressão do jeito correto. 
      Seja inútil e será útil para Deus
      O evangelho vê tudo de maneira diferente, ele prepara o homem para o plano espiritual, não só para o físico. No mundo pode prevalecer o mais forte, o que fala mais alto, o que tem mais dinheiro, ou então, vendo pela nova ordem, o que tem a causa mais legítima para militar, o que possui a ideologia mais abrangente, que contempla principalmente as minorias, e não só as maiorias tradicionais. Contudo, tem gente que se acha útil demais, importante demais, é preciso se ver inútil, ainda que com todas as capacidades e direitos, para ser útil de fato, não só para o mundo, mas para Deus. 
      Quero militar por você enquanto você milita por mim. 
      O apóstolo-teólogo Paulo tinha esse entendimento, servir a Deus e aos outros, não a si mesmo, por isso não dava a esta vida e a este mundo mais valor que têm, mas também não desejava a morte antes do tempo, ainda que certo do céu. Paulo amava e quem ama quer ser útil para os outros, se todos vivêssemos assim ninguém teria falta, eu não perderia por lutar por você pois você lutaria por mim e não perderia nada por isso. Mas que importa se os outros nos valorizam? Numa visão mais alta da existência, importa é obedecermos a Deus e esperarmos só dele recompensas. 
      Não militar também é uma militância, a pior delas. 
      Não existe posição em cima do muro, um local privilegiado onde se pode espiar tudo e não se comprometer. Quem tenta se isentar apoia quem está errado e deixa de apoiar quem está certo, não anula o voto, vota duas vezes. Isso pode parecer interessante ao tímido, mas é visto como conveniente por ambos os lados. Nossa eternidade será definida por um posicionamento nosso por Deus, andando com Deus um dia teremos que nos posicionar diante de homens. Jesus andou com sabedoria, não provocou ninguém, só amou, mas quando chegou o momento deu a vida pela maior das causas, nossa salvação.

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