segunda-feira, outubro 31, 2022

Existência Espiritual (livro original)

      “Existência Espiritual”, um livro original em noventa e duas partes, reflete o coração da chamada profética do “Como o ar que respiro”. Não leia como verdade final, mas como reflexão de um ser humano, que confronta teoria com prática dentro do cristianismo protestante do século XXI, em uma sociedade já esclarecida cientificamente, lutando contra intolerâncias e preconceitos e preparada para sair da infância moral e espiritual na qual foi presa por séculos. Se quiser pode juntar essa opinião às de outros e à tua, colocar tudo diante de Deus e saber dele a palavra final, aquela que você quer praticar e está pronto para saber. 
      Deus é para todos o todo-poderoso, ilimitado em espaço, tempo, matéria, espírito e virtudes mais altas de bem, amor e justiça, e enviou Jesus e depois o Espírito Santo para auxiliarem o ser humano a posicionar-se nas regiões espirituais mais elevadas. Contudo, Deus não se revela da mesma forma a todos, principalmente havendo coragem para se libertar de religiões de homens e do cristianismo do mundo. Depende só de você achar a verdade mais alta, desse modo as reavaliações de textos como este podem ajudá-lo, se de fato assumir que tradições não lhe deram todas as respostas. Esforcemo-nos, os tempos urgem! 

1. Por que somos cristãos?
2. Para que viemos ao mundo?
3. Onde está a felicidade?
4. Começa na Bíblia e no louvor
5. Anjos e demônios
6. Responsabilidade e retidão
7. Pessoal e intransferível
8. A Voz do Senhor
9. Experiência individual
10. Vemos o que queremos ver
11. Limpos de coração
12. Vaidade, pecado maior
13. Vício ou restrição?
14. Vício: culpa e ansiedade
15. Vício sexual: tabu?
16. Santidade sempre!
17. As coisas do alto
18. O invisível no escuro
19. O que é espiritualidade?
20. Instantânea ou gradativa?
21. Dimensões de Deus
22. Não acredite em tudo
23. Jesus diz a verdade
24. O soberbo vive por si
25. O justo vive pela fé
26. Testemunho de milagre
27. Milagre: o que é?
28. Superação pela fé
29. Fé e foco
30. O mistério da fé
31. Crer sem saber
32. Acreditar é confiar
33. Fé: cega ou inteligente?
34. Não sabemos tudo!
35. O poder da grana
36. Deus não precisa da política
37. Política não precisa do cristão
38. Quando Deus usa o errado
39. Do Senhor é o Brasil
40. Oremos pelos governantes
41. Conservador ou progressista?
42. Espírito progride sempre
43. A quem queremos convencer?
44. Gideão e sua incredulidade
45. Israel não aprendeu a lição
46. Paz pelo perdão
47. Salvação pela fé
48. Humildade para compartilhar
49. Obra de Deus, não de homens
50. Esotérico ou exotérico?
51. Leia, ore e viva melhor
52. Sincera religiosidade: até quando?
53. O que se faz, não com o quê (I)
54. O que se faz, não com o quê (II)
55. Mente, mãos e coração
56. Disciplinas e julgamentos
57. Você crê em céu e inferno?
58. Qual a religião da eternidade?
59. O amor de Deus é eterno
60. Ressureição e corpo espiritual
61. Arrebatamento e batismo pelos mortos
62. Paciência e fé dos santos
63. Muito para crescer
64. Profundo e escondido de Deus
65. “Porque está na Bíblia”, é resposta?
66. Os segredos do coração
67. Reina o Senhor, regozije-se a terra
68. A luz difunde-se para o justo
69. Deus fala por parábolas
70. Questionar não é pecado
71. Bíblia, palavra de Deus?
72. Verdades sobre a Bíblia
73. Para quem é a Bíblia?
74. Que poder teremos no céu?
75. Está funcionando pra você?
76. Será que funciona pra seus filhos?
77. Resolvamos pendências aqui
78. Onde tesouros não são consumidos
79. A vida é espiritual
80. Salvação se perde?
81. Penitência, indulgência, purgatório
82. Que fim do mundo eu quero?
83. O fim revela o que sou
84. Responsabilidades com quem sofre
85. Todos responsáveis por todos
86. O poder dos símbolos
87. Acima dos símbolos
88. Quem é Deus senão o Senhor?
89. Conhecemos a luz verdadeira?
90. Só outra teoria de conspiração
91. Adivinho, profeta, médium
92. Espírito e espíritos

José Osório de Souza, 31/10/2022 

 1. Por que somos cristãos?

      “Porém o Senhor disse a Samuel: Não atentes para a sua aparência, nem para a grandeza da sua estatura, porque o tenho rejeitado; porque o Senhor não vê como vê o homem, pois o homem vê o que está diante dos olhos, porém o Senhor olha para o coração.” I Samuel 16.7

      Iniciando hoje, noventa e duas reflexões sobre espiritualidade, santidade, fé, mundo, eternidade, temas que cumprem o objetivo maior da chamada profética do espaço “Como o ar que respiro”. Por que falarmos sempre disso? Talvez a pergunta seja: por que somos cristãos se não for para entendermos e vivermos tudo isso? A não ser que estejamos querendo com o cristianismo só mais uma religião, se for isso fatalmente seremos presas de homens, não livres em Deus, manadas de líderes humanos, não rebanho espiritual de Jesus. O que de fato queremos como cristãos, indo a igrejas, lendo Bíblia, cantando louvores e orando? 
      O cristianismo é lugar bem adequado para quem quer só uma religião, principalmente na católica, com suas pomposas liturgias, com suas catedrais carregadas de história e de tradições, com cultos padronizados por sacramentos e dogmas. Quem não se sente num lugar digno de respeito quando está num templo católico? Parece museu, pede seriedade e austeridade por si só, mesmo que não esteja havendo uma missa. Isso é ruim? Não necessariamente, sou protestante desde os dezesseis anos, hoje tenho sessenta e dois, mas ainda sinto algo religiosamente instigante quando estou numa dessas velhas construções católicas. 
      Tive uma experiência significativa aos dezoito anos, quando fazia faculdade na P.U.C. de Campinas. No intervalo fui até à capela da universidade, uma sala comum, com cadeiras e um altar resumido à frente, me ajoelhei e me pus a orar. Um padre então entrou e me exortou duramente, disse ele, “como você se coloca de costas para o altar?”, intimidado saí do local. Eu estava de joelhos, de frente para uma cadeira, mas de costas para a frente da capela, isso escandalizou o sacerdote. Não  importou a ele o fato de eu estar falando com Deus, mas só o fato de eu ter inflingido algum protocolo, nem quis saber se eu era católico ou não. 
      Seria injusto de minha parte fazer qualquer generalização, dizer que todos os sacerdotes católicos agem assim, nem estou me eximindo de ter desobedecido alguma regra importante para alguém, mas ele poderia ter me perguntado se eu conhecia a regra. Aquilo poderia ser uma oportunidade dele me evangelizar, afinal deve ser mais fácil para alguém que está orando dentro de uma capela querer a Deus que outras pessoas. Mas como eu disse foi uma experiência significativa, revelou uma faceta icônica do cristianismo católico, a importância que ele dá a símbolos, rituais e tradições, mais que ao vivo Espírito Santo do Deus altíssimo. 
      Sei que critico o catolicismo, e também critico o protestantismo, mas critico como instituições, já o ser humano católico ou evangélico, sincero e cheio de fé, não deve ser julgado. Deus ouve todos os que o buscam, estejam onde estiverem, e muito mais em catedrais e templos, que ainda que carregados de tradições e mesmo de doutrinas adicionadas ao puro evangelho, recebem quem ora ou reza em nome do Cristo. Mas isso também não me desobriga de instar sobre a necessidade de experiências espirituais mais diretas e profundas com Deus, e para isso nem é necessário muito do que o cristianismo do mundo exige. 
      Um perigo da religião é nos acomodarmos a ela e acabarmos achando que ela é Deus, usando o exemplo acima, se eu não rezar de frente para o altar estarei pecando. Esse tipo de entendimento já deveria ter ficado claro para todos nós que é errado, baseado nas reações que Cristo homem teve diante dos religiosos judeus do primeiro século, quando exortou sobre a relevância do interior sobre a aparência, do espírito sobre a matéria, do amor sobre protocolos religiosos. Contudo, fazem mais ou menos dois mil anos que Jesus esteve no mundo e religiosos ainda não entenderam o que é a religião que de fato agrada a Deus. 
      Reflitamos um pouco mais, não em como somos vistos como religiosos no mundo, não em como a sociedade nos vê como católicos, batistas, presbiterianos, assembleianos ou outros. Os homens veem o exterior e podemos passar vidas inteiras nos esforçando para exibirmos bons exteriores religiosos para eles, mas o que de fato há em nosso interior só Deus sabe. O que levaremos para a eternidade? Nossos espíritos, o que está dentro de nós, as aparências todas ficarão neste mundo. Que tenhamos coragem de vencer o orgulho e a vaidade de querer mostrar, não ser, e ser para Deus, não para padres, pastores ou outros. 
      O texto bíblico inicial relata a chamada de Davi, quando seu pai tentou apresentar ao profeta Samuel outros de seus filhos, porque achava que esses agradariam mais, mas Deus disse que escolheria conforme o coração, não pela aparência externa. Muitos se fiam em igrejas pela grandiosidade que elas têm no mundo, sentem-se seguros de estarem agradando a Deus porque, afinal de contas, são membros fiéis de instituições estabelecidas, como a milenar igreja católica, ou mesmo protestantes seculares. Mas mesmo denominações evangélicas e pentecostais mais novas, inspiram confiança em muitos por terem grandiosos templos.
      Grandioso é o engano de muitos, mas é ele que impede tantos de buscarem mais direta e profundamente a Deus. A busca verdadeira requer aprovação só de Deus, não de homens, exigirá consagração e oração solitárias, sem o suporte luxuoso de templos e ministérios. Isso não significa sair de igrejas, de forma alguma, mas significa colocá-las em seus devidos lugares, locais para reuniões sociais e um conhecimento mais exotérico de Deus, bom para crianças e novatos na fé, eis a verdade, e não interpretem isso como algo arrogante. Não é arrogância, é humildade, quem busca mais a Deus não faz propaganda, guarda para si. 
      Será que os outros irmãos de Davi, apresentados orgulhosamente pelo pai a Samuel, suportariam toda a perseguição que Davi recebeu diretamente de Saul, o rei deposto por Deus e que não aceitava isso? Davi teve que viver como pária por algum tempo, até ter a honra de ser entronizado rei de Israel. Quem quer a vaidade de parecer bom religioso para homens não suporta as provas da busca da espiritualidade mais alta, provas para a humildade e a santidade mais puras. Por que somos cristãos? Se somos para Deus nada nos impedirá de sermos, nem nossos egos, nem os homens, nem os demônios, nem o mundo, nem a religião. 

2. Para que viemos ao mundo?

      “Bem-aventurado o homem que acha sabedoria, e o homem que adquire conhecimento; porque é melhor a sua mercadoria do que artigos de prata, e maior o seu lucro que o ouro mais fino. Mais preciosa é do que os rubis, e tudo o que mais possas desejar não se pode comparar a ela. Vida longa de dias está na sua mão direita; e na esquerda, riquezas e honra. Os seus caminhos são caminhos de delícias, e todas as suas veredas de paz. É árvore de vida para os que dela tomam, e são bem-aventurados todos os que a retêm.” Provérbios 3.13-18

      Certas coisas não precisam ser ditas, melhor serem mantidas em segredo, entre nós e Deus. Alguns pecados confessados e perdoados são assim, muitos costumam nos condenar pelos restos de nossas vidas por algumas coisas que fizemos, mesmo que tenham sido corretamente resolvidas em Deus. Evangélicos são os que mais cometem esse engano, justamente eles que pregam perdão em Cristo. Mas muitos deles pensam que as pessoas têm que estar prontas depois que entram em igrejas, assim podiam até errar antes de se tornarem membros oficiais dessas, mas depois não mais. Muitos cristãos não entendem que Deus usa muitas coisas e muito tempo para aperfeiçoar os homens, incluindo idas, saídas e voltas a igrejas. 
      Dessa forma, às vezes é melhor deixarmos certos assuntos só entre nós, Deus e pouquíssimos amigos verdadeiros, mais que irmãos oficiais de igrejas, mas gente que realmente nos ama. Mas o ponto aqui é manter em segredo não erros, mas acertos, e não me refiro à qualquer promoção profissional onde se tem algum aumento de salário, e tem gente, incluindo crente, que tem esse pensamento. Muitos não gostam de falar de prosperidade material, acham que isso atrai inveja, que bobagem, ainda que se deva ter sabedoria nesse assunto, inveja é problema de quem inveja. Alcançarmos nossas vitórias deve nos fazer mais humildes, mas não mais medrosos ou desconfiados. Esta reflexão também tem a ver com humildade.
      O título foi “para que viemos ao mundo?”, você já entendeu qual é tua chamada principal nesta vida? Tenho visto gente com chamada clara, não só para viver, mas para divulgar vida com Deus, Bíblia, ou de maneira genérica, alguma religião. Parece que muitos desses começam bem, compartilham verdades recebidas de Deus e as vivem, não há neles hipocrisia nem invenções, mas num determinado momento a coisa fica estranha. As pessoas se acomodam com um nível alcançado, e com o respeito que esse nível confere a elas diante de outras pessoas, então, se acham com capacidade e no direito de falarem mais que o necessário, não só coisas certas na hora errada, mas coisas erradas, fugindo de suas chamadas iniciais. 
      A vaidade, sempre ela, se não derruba no início, derruba no fim, e não duvidem, todos são tentados por ela. Não sei de alguém, que não seja Cristo homem, que não tenha vencido plenamente a vaidade. Se não podemos vencê-la, convêm-nos ficar longe das situações que nos expõem a ela, o que mais nos expõem a ela é vida pública. Somos seres humanos, como tais precisamos de vida social, nossa identidade é construída na sociedade, não no isolamento. Mas retiros espirituais podem ser úteis e orientados por Deus, não só temporários, mas definitivos, a partir de um momento de nossas vidas. Isso não é fugir para o mato e ficar lá, mas focar na busca espiritual mais profunda, melhor anonimato com Deus que fama com homens. 
      Como já dissemos outras vezes aqui, o caminho do justo é definido pelo fim, não pelo início, e se pode começar bem, deveria terminar ainda melhor. Qual o melhor fim para todos nós? É aquele que prioriza o motivo principal de termos vindo a este mundo, conhecimento de Deus. Pelo que tenho aprendido, é mais conveniente buscarmos mais profundamente esse conhecimento de maneira secreta, evitando compartilhá-lo em púlpitos, sejam físicos ou  virtuais. Isso é para quem entende que o melhor que podem ter neste plano físico é espiritualidade, não riquezas e fama. Na intimidade do Senhor há verdade e paz, no aplauso do mundo há falsidade e dor. Felizes os chamados à humildade, acharão provisão e proteção do Altíssimo. 
      Deus nos usa para abençoar os outros, feliz o que perde para dar ao próximo, contudo, ganharmos a nós mesmos sempre é prioridade. Muitos, querendo ser vistos como altruístas, trabalhadores, espirituais, tentam ganhar o mundo e acabam se perdendo. Há os humildemente arrogantes, os sinceramente falsos, os estupidamente sábios, os termos são antagônicos, impossíveis de serem vividos ao mesmo tempo, mas muitos tentam, por vários motivos. Vaidade é o principal, mas ela conduz à incredulidade e ao desvio do plano original de Deus para nós. Muitos um dia entenderam o evangelho, mas sucumbiram à vaidade do mundo, assim tentam o impossível, serem honrados por Deus e pelos seres humanos ao mesmo tempo. 
      O texto bíblico inicial fala sobre sabedoria, uma característica do sábio é apurada percepção de tempo, ele sabe exatamente quando chegar, quando ficar e quando sair. Se o cristianismo exige chegada com fé, se crescermos dentro de igrejas e religiões requer que permaneçamos olhando para Deus não para homens, conhecimento mais profundo do Altíssimo pede retirada de meios sociais. No mundo atual, distanciamento de redes sociais na internet, é algo sábio a ser feito, mas isso só por quem não tem mais a insegurança de querer prevalecer em polêmicas, nem a vaidade de se exibir como vencedor e feliz. A verdade é que hoje nos apresentamos com menos cuidado na internet, que ao vivo, em igreja, trabalho, escola e família. 
      O final do texto me chama a atenção, “todas as suas veredas (são) de paz, é árvore de vida e são bem-aventurados todos os que a retêm”. Paz, vida e felicidade, mas para os que a retêm, assim, se no início é preciso sabedoria, muito mais no fim. É no final de nossas vidas, já com corpos físicos cansados e limitados para novos empreendimentos no mundo, que precisamos avaliar o que somos. Atingimos aquilo para o qual viemos? Cuidado, não use referências de homens, nem de homens religiosos, os homens não sabem aquilo que de fato precisamos vencer para chegarmos melhores no final. Muitos acham que somos perdedores na área financeira, mas não sabem o preço que pagamos para nos tornarmos moralmente limpos.
      Viemos ao mundo para melhorarmos, isso necessariamente não se evidencia em vida religiosa ou em riquezas materiais. Não julguemos ninguém, mas respeitemos todos, se entendemos para que viemos ao mundo e conseguimos viver isso, também administraremos os outros com amor. O que puder fazer, faça, o que não puder, não faça, mas não seja cobrador do próximo. Confie em Deus que sustenta o que não tem quem o auxilie, e que conduz à humildade o que não precisa de ajuda de homens, para que não se exalte por isso. Saiba quando parar de correr atrás de dinheiro, busque mais a Deus, se a vida é incerta, a morte não é. Adquira a sabedoria mais alta, o bem maior que achamos neste mundo e que poderemos levar ao outro. 

3. Onde está a felicidade?

      “Porque para mim o viver é Cristo, e o morrer é ganho. Mas, se o viver na carne me der fruto da minha obra, não sei então o que deva escolher. Mas de ambos os lados estou em aperto, tendo desejo de partir, e estar com Cristo, porque isto é ainda muito melhor. Mas julgo mais necessário, por amor de vós, ficar na carne.” Filipenses 1.21-24

      Deus não impõe ao homem buscá-lo, não de fora para dentro. Os que tentam essa busca porque uma religião que lhes foi ensinada pelos pais lhes impõe isso, ou que a fazem por se sentirem obrigados pelo remorso, achando que se não buscarem a Deus cairão em desgraça, não buscam com intenção correta. O que a busca de Deus tem a ver com felicidade? Para muitos nada, muitos não creem no que a ciência não comprova e são materialistas felizes. Será que são mesmo? Talvez tanto quanto os que buscam felicidade só na religião. Somos felizes? Sermos cristãos em igrejas, nos faz felizes, pelo menos mais que os outros? 
      Uma das razões de muitos não serem felizes é acharem que devem ser felizes. Ninguém é feliz, não o tempo todo. Isso não significa que não podemos achar a paz e momentos de alegria. A felicidade não está no sentimento que existe após uma exaltação, mesmo que essa exaltação seja por algo benigno e positivo, toda exaltação passa. A felicidade está na serenidade que se experimenta na humildade, quando se aceita do jeito correto que mesmo que nada aconteça se está em paz. Felicidade não se prova com força, mas com descanso, não no clímax, mas na calma que existe mesmo sem ter havido clímax. Felicidade está na morte.
      Como assim, morte? Mas não somos ensinados o tempo todo, inclusive nas igrejas, que felicidade é vida e eterna? Sim, mas existe vida neste mundo? Não, a matéria existe para morrer, lutar contra isso é o que nos deixa infelizes, assim aceitar a morte inexorável é ser feliz. Isso não é dar um tiro na cabeça, nem viver moralmente de forma irresponsável, mas é aceitar certas finitudes como seres humanos, não nos achando eternos e poderosos como deuses. Felicidade é a morte da matéria para que o espírito viva, esse é o ensino do Sermão da Montanha. Parece, contudo, que o homem atual não quer morrer de jeito algum.
      Não que não se reconheça que o pecado causal é o do interior, e que o exterior é só efeito, como ensina o evangelho. A ciência também é ouvida, buscando-se melhorar qualidade de vida para que se viva mais e num planeta mais bem cuidado. Mas até que ponto essas bandeiras são só desculpas para negar a morte da matéria e não priorizar a vida eterna do espírito? Porque a humanidade, ainda que com valores mais altos e direitos mais amplos que há tempos atrás, segue materialista, o cristianismo o é, a eternidade se torna cada vez mais mera fábula. Dessa forma nega-se a morte, glorifica-se a matéria e esquece-se de Deus. 
      Na obsessão de se querer ser feliz a todo custo não se é, amor à existência neste mundo leva à morte, em achar que o ser humano e a ciência podem tudo só há a tentativa de matar o espírito imortal. A busca de Deus não nos é imposta de fora, mas de dentro, de dentro de nós mesmos, é nosso espírito que clama por Deus, ainda que não seja ouvido. Felicidade maior está em buscar e achar Deus, isso só é possível com ferramentas espirituais. Enquanto isso administramos o mundo e nossos corpos da melhor maneira possível, com inteligência e ciência, mas sempre colocando isso em seu devido lugar, no plano material. 
      No texto bíblico inicial Paulo nos apresenta um nobre dilema, e que inveja “santa” nos dá desse dilema. Se morrer é estar com Cristo, viver é amar as pessoas, ah, meus queridos, como estamos distantes desse alvo. Queremos justamente o oposto, viver sem Cristo e para nossos egos, e morrermos para nos livrar das pessoas e da dor. Quem não sabe viver, não morre bem, mas quem vive certo, está preparado para a morte, ainda que não a busque. Esforcemo-nos, façamos nossa parte para termos vidas dignas aqui, cuidemos também do planeta, nossos filhos e netos precisarão dele para se prepararem bem para a eternidade. 
      Uma boa maneira de olharmos o mundo é vê-lo como sala de aula, ninguém quer estudar num lugar ruim. Queremos ambiente arejado, protegido das intempéries, mas também com clima social de igualdade e respeito. Como alunos estamos o tempo todo trabalhando, o estudo é nosso trabalho, assim temos responsabilidades. O professor não é a ciência, ela ajuda a manter a sala e os alunos bem, mas só dá o suporte, quem nos ensina é um Deus espiritual. Por mais que o recreio seja gostoso, não está nele nossa felicidade maior, essa teremos quando passarmos pela prova final e formos aprovados, só na eternidade. 

4. Começa na Bíblia e no louvor

      “Porque assim diz o Senhor à casa de Israel: Buscai-me, e vivei.” Amós 5.4

      Tudo começa na Bíblia e no louvor, entretanto, para muitos, tudo também acaba aí. A Bíblia contém textos sagrados especiais, Deus se revelou ao povo judeu de maneira especial. Textos hinduístas e budistas contêm ensinos bem interessantes, se aprofundando em alguns temas de maneira que nem a Bíblia se aprofunda, se você nunca os leu, eu recomendo, mas a Bíblia entrega uma simplicidade viva e atemporal única. Os textos tidos como registrados em sua maior parte por Davi e Salomão, nos consolaram e nos consolarão sempre (leia em especial Salmos 40.1-4).
      Um salmo pode nos permitir catarses emocionais, nos representa a confidência íntima que o escritor faz de sua experiência, detalhando as percepções  de sua alma. Muitos salmos mostram o autor se sentindo preso e sufocado num buraco, cercado por inimigos, mas a confiança em Deus retira o salmista do cárcere, dá-lhe forças para vencer o que achava impossível vencer e depois, leve como um pássaro, bem acima do problema, o vemos no templo de Deus, adorando-o pela bênção. Nenhum livro religioso entrega palavra assim, parecendo ter sido escrita só para nós.
      Tantos desprezam a Bíblia e só perdem com isso, incluindo religiosos e espiritualistas. Olham para o cristianismo desviado do mundo, prendem-se a interpretações ao pé da letra de certas passagens bíblicas, a óticas fora de contexto e preconceituosas, e se privam de beber da água e comer do pão que o Espírito Santo nos dá através do cânone bíblico. Nunca despreze a Bíblia, Deus tem mudado o mundo, a minha e a tua vida por ela, só dê ao mesmo Espírito que inspirou escritores bíblicos, a prioridade que tem como fonte original, fresca e eterna da palavra de Deus. 
      Existe um motivo do porquê o louvor ter ganho tanta relevância nos cultos, principalmente nos últimos trinta anos, pelo menos no que eu acompanho as igrejas protestantes e evangélicas no Brasil. Ele é o meio mais rápido e eficiente de se estabelecer comunhão emocional, física e espiritual com o Deus Altíssimo. Não, não são só belas melodias, letras passionais, ritmos contagiantes, tudo com arranjos instrumentais que têm se tornado cada vez mais profissionais, mesmo em igrejas pequenas. Deus é tocado com essa música e as portas do mundo espiritual são abertas.
      Muitas vezes estou no início da madrugada, quando esposa e filhas já estão dormindo, assistindo algum telejornal, e minha boca simplesmente se “enche” de línguas espirituais, algo poderoso de cima para baixo me puxa para adorar a Deus. Ter uma experiência assim e constante exige de nós andar em Espírito, manter a mente limpa, estar com ouvidos e olhos espirituais sempre atentos, mas como é maravilhoso. Orar não se torna peso, sacrifício, difícil, mas é natural, fácil, e nos leva a ter mais e mais experiências com o mundo espiritual. Somos todos chamados a isso. 
      Tanto na leitura correta da Bíblia quanto no objetivo maior do louvor está a pessoa do Espírito Santo, um procedimento tão importante de Deus após a subida de Jesus ao céu, mas que muitos não entendem, não buscam entender e não vivem. A maioria dos cristãos prefere religião, sentar-se nos bancos, assistir experiências de outros, experimentar êxtases no louvor, mas para aí, não dá seguimento àquilo que o Espírito Santo tem para dar. Se há alguma consagração diferenciada é só enquanto se aguarda solução de uma contingência, depois volta-se ao início. 
      Até quando? Não por muito tempo mais, os dias urgem, uma passagem de era ocorrerá, o velho não poderá mais entregar o novo, só o novo entregará o novo. Essa mudança ocorre na própria alma humana, que está enjoando do velho, mesmo com boa música e estudos bíblicos com cara de novidade, o espírito sente que o velho não alimenta mais. O xeque-mate está ocorrendo com o velho cristianismo apoiando um lado negro da política do mundo, o que a igreja católica fez por séculos, evangélicos querem continuar fazendo, estabelecer o reino de Deus na Terra. 
      Ore mais a Deus, santifique-se mais, busque os dons espirituais, fale em línguas espirituais, profetize, peça sonhos e visões, enfim, viva o chamado sobrenatural de Deus e em Deus. Se na vida deste planeta boas faculdades, boas leituras, conhecimento de outros idiomas, uma visão mais ampla do mundo, abrindo-nos mesmo para estudarmos, trabalharmos e vivermos fora do Brasil, é crescimento, na vida espiritual quem nos leva é o Espírito Santo e experiências profundas com os dons espirituais. Creia, Deus nos chama para mais, busquemos mais a Deus e vivamos! 

5. Anjos e demônios

      “E, finalmente, sede todos de um mesmo sentimento, compassivos, amando os irmãos, entranhavelmente misericordiosos e afáveis. Não tornando mal por mal, ou injúria por injúria; antes, pelo contrário, bendizendo; sabendo que para isto fostes chamados, para que por herança alcanceis a bênção. Porque que  quer amar a vida, e ver os dias bons, refreie a sua língua do mal, e os seus lábios não falem engano. Aparte-se do mal, e faça o bem; busque a paz, e siga-a. Porque os olhos do Senhor estão sobre os justos, e os seus ouvidos atentos às suas orações; mas o rosto do Senhor é contra os que fazem o mal.” I Pedro 3.8-12

      A humanidade construiu formas físicas para seres espirituais, anjos, arcanjos, demônios, diabos, querubins e outros. Os primeiros homens que tiveram experiências reais com seres espirituais, os interpretaram em suas mentes com determinados formatos, conforme suas culturas e religiões. Podiam ter formas humanas, formas animais, misturas de ambas. Mas será que seres espirituais realmente têm essas formas? Talvez, mas não necessariamente e isso nem é relevante, seres espirituais são espíritos, como Deus. Não precisam de membros para se moverem ou manusearem as coisas, nem de rostos para verem, ouvirem e falarem. Os homens, contudo, no plano físico, fazem ajustes, aproximações, para entenderem e memorizarem as experiências, facilitando interações mentais.  
      Se você, cristão, não aceita isso, se acha, por exemplo, que o diabo é um ser vermelho, com chifres, rabo, cascos, num corpo parte humano, parte animal, aceite, essa imagem é só um estereótipo da civilização europeia, baseada no deus Pã grego (Fauno para os romanos). O mesmo ser espiritual também é conhecido por japoneses, africanos ou hindus, e para esses o formato físico do ser no papel do diabo é outro, tenhamos cuidado com formatos físicos de seres espirituais. É importante que entendamos também a irrelevância do formato, o que vale é a intenção espiritual dentro dos homens, não importa o que eles imaginem e para onde olham, para reforçar a imaginação, se querem estabelecer contato com o diabo espírito, estabelecerão, acredite, o mesmo vale para outros ídolos, entidades ou espíritos.
      O formato físico que aliamos a seres espirituais da luz pode ser mais adequado com o que eles são. Enquanto aliamos a seres das trevas imagens que criamos em nossas mentes impressionadas pelo medo, por coisas ruins e desconfortos emocionais e morais, por isso “vemos” rostos assustadores, monstruosos, ainda que sejam, para nós no plano físico, só borrões negros disformes, aliamos aos seres da luz asas e vestidos. Não conseguimos olhar direito para a luz forte, vemos reflexos, raios multicoloridos que saem do centro formando estrelas, assim imaginarmos vestidos que se abrem na parte inferior e asas que se expandem na parte superior é explicável. O bem está na concentração de energia perto de Deus, o mal no vazio distante do melhor de Deus, o bem é luz virtuosa e o mal, escuridão moral. 
      O ponto desta reflexão é uma pergunta: o que na prática são anjos e demônios? Eles têm importância pelo que são ou pelo que fazem? Podem estar numa posição em que seus corpos são espirituais, não materiais, assim a substância de seus corpos é diferente da substância de nossos corpos como seres humanos no mundo, mas em relação ao que fazem não são muito diferentes de nós. Gostamos de colocar a culpa nos outros, e se cremos em seres eternamente e absolutamente maus, temos alguém bem adequado para eleger como culpado. Mas será que o diabo e os demônios são mais maus que os homens? Não, nem têm mais influência que eles. Apesar de estarmos presos à matéria nossas intenções e ações podem tanto prejudicar quanto abençoar tanto quando seres espirituais das trevas e da luz. 
      Quando nos colocamos para orar temendo a natureza moral elevada de Deus, humildemente submetendo-nos à capacidade do Espírito Santo, não à nossa, respeitando o livre arbítrio dos seres humanos, pacientemente esperando que todos se aproximem do Altíssimo, quando isso ocorre mais que um diálogo acontece. Orar não é só pedir e agradecer pelo que se recebe, é se permitir ser canal de ligação entre Deus e outros seres, refletindo a luz divina em todos os que estão ao nosso redor, materiais e espirituais, e principalmente aos que citamos nominalmente em oração. Quem realiza essa interação é o Espírito Santo e os seres espirituais de luz, que não fariam esse trabalho se nós não tivéssemos orado a Deus do jeito certo. Deus atua com poder, mas nos concede ser participantes dessa ação. 
      Há seres no plano espiritual em posições morais extremas, mais maus que nós e mais bons que nós, mas no plano físico, ainda que amarrados a corpos materiais, podemos exercer decisões até mais abrangentes. Exércitos celestes são movidos pela nossa intenção, tanto os da luz quanto os das trevas. No plano físico temos livre arbítrio para decidir o que queremos fazer, uma escolha nossa pode ter atuação mais decisiva que a de seres espirituais. Por mais poder que seres da luz tenham, não farão tudo o que podem se nós não autorizarmos. Por outro lado, seres das trevas, ainda que atuem sempre tentando os seres humanos no mundo, têm ação potencializada quando queremos fazer o mal aqui. O diabo e os demônios, por exemplo, não podem matar fisicamente alguém, tragicamente nós podemos.
      Apesar de nossas existências no mundo serem curtas e frágeis, são especiais em relação à eternidade puramente espiritual, ninguém menospreze suas responsabilidades, suas escolhas e seu papel, principalmente quando se coloca em comunhão com Deus para fazer sua vontade. “A oração feita por um justo pode muito em seus efeitos” (Tiago 5.16b), não nos esqueçamos das orações de Elias (I Reis 17.1) e de Daniel (Daniel 10.12-13), esses se colocaram como seres de luz, anjos de Deus, no mundo material. Contudo, quando nos portamos como julgadores do mal, condenando, invejando, maldizendo, odiando, nos fazemos demônios, talvez até piores que os puramente espirituais. Não joguemos a culpa no diabo quando podemos ser até piores, o mundo tem hospedado verdadeiros diabos encarnados.
      Tenhamos cuidado em como vivemos neste mundo, muitos não percebem, mas ainda que dentro de igrejas e sendo cidadãos decentes, desempenham espiritualmente papéis de demônios, e segue um mistério, e poderão continuar assim na eternidade. Demônio não tem direito ao céu, já traz o inferno dentro de si. Outros, contudo, no sofrimento, na falta, não na perfeição, porque ninguém neste mundo o é, mas lutando dia a dia contra seus demônios interiores e prevalecendo, são anjos de luz. Amam sem interesses, buscam a paz com todo o coração, intercedem junto a Deus mesmo pelos que se colocam como seus demônios. A escolha é nossa, a culpa não é do diabo, a responsabilidade é nossa, nós decidimos se queremos ser demônios, Deus atrai todos à sua luz, sejamos anjos, aqui e na eternidade.

6. Responsabilidade e retidão

      “Porque o Senhor Deus é um sol e escudo; o Senhor dará graça e glória; não retirará bem algum aos que andam na retidão.” Salmos 84.11

      Responsabilidade pessoal significa assumir culpas e obrigações como deveres pessoais, não cobrando de outros dívidas que são nossas, nem tornando os outros encarregados por trabalhos que nos cabem. A definição parece simples, mas nós, seres humanos, somos especialistas em agir de maneira irresponsável, deixando de executar tarefas que competem a nós e a mais ninguém. Isso nos traz vários problemas e em várias áreas, mas em se tratando das áreas emocional e moral, nos impede de crescer espiritualmente e de ter uma comunhão plena com Deus. 
      Ainda que sejamos cidadãos civilizados, trabalhadores e honestos, podemos ser irresponsáveis, isso se percebe em existências que evitam o caminho reto. Uma linha reta sai de um ponto e chega a outro ponto usando a menor distância, sem curvas ou zigue-zague, sem ir e retroceder ou pausar, mas sempre indo, à frente, direto ao ponto. No caminho reto sabemos que só temos um opositor, nós mesmos, e que sempre temos um auxílio, de Deus, assim, podemos até ir mais devagar, mas sem confusão ou enrolação, sabemos quem somos, onde queremos chegar e quem está conosco.
      Isso não significa caminharmos sozinhos, aliás, nossas existências têm uma característica inerente, elas nunca estão sós. Sim, fisicamente podemos fazer muitas coisas sozinhos, nos denominarmos socialmente solteiros, mas a solidão talvez seja justamente a dor, não de estarmos sós, mas de nos sentirmos sós. Quem se acha só sofrerá de solidão mesmo casado, mesmo no meio de uma grande família, entre muitos amigos ou cercado por irmãos num templo. O que não nos deixa nunca estar sozinhos, é todo um mundo espiritual invisível ao nosso redor. Acredite, você nunca está sozinho.
      Termos Deus e todo um exército de seres espirituais de luz conosco, é o que nos capacita para sermos responsáveis. Não precisamos culpar os outros ou bajular os outros para dividirmos erros ou obtermos favores, nossas culpas Deus perdoa e nossa força vem de Deus, que move exércitos a nosso favor. Uma característica de Deus, que podemos demorar um tempo para entender, e que muitos nunca entendem, é que Deus não perde tempo com culpas e bajulações. Deus é reto, por isso nos orienta num caminho reto, não existe condenação ou cobrança no melhor de Deus, só existe longe desse melhor.
      Sim, há disciplina em Deus, mas na disciplina se exerce trabalho honesto, para que vençamos certas coisas, aprendamos outras coisas, e sigamos no caminho reto em direção à luz mais alta de Deus. Se gastamos tempo em autocomiseração, em remorsos, em iras e invejas, é porque queremos, não é o Espírito de Deus que nos tortura, somos nós e seres espirituais das trevas que “vibram” numa “frequência” baixa que nós mesmos produzimos. Se dermos ouvidos a Deus seremos levantados pelos anjos de luz, limpos pelo nome de Jesus, e “vibraremos” nas altas “frequências” pelo Santo Espírito. 
      Desculpe-me por usar os termos “vibrar” e “frequências”, você pode tomá-los como metáforas para se colocar pela fé numa posição espiritual, mas penso que eles nos ajudam a entender a oração, em que estabelecemos um contato mental com um Deus espiritual. Conhecer a Deus é aprender a ser responsável, se pecamos, sofremos, mas não precisamos ficar perdendo tempo na culpa, Deus não perde. Pela fé e sempre pela fé podemos nos levantar imediatamente, isso faz com que nos acostumemos com a luz para não sairmos dela tão facilmente, culpa pode fazer mais mal que o erro em si. 
      Neste mundo, quem “gosta” de inferno é quem se posta como demônio, e gosta porque é orgulhoso demais para admitir que sua escolha só o faz perder tempo. Não nos postemos como demônios, mas como anjos, amemos a luz e permaneçamos nela. Deus não tem prazer em nos deixar em infernos, e eis um mistério, no inferno damos trabalho aos anjos, mas no céu ajudamos os anjos em seus trabalhos. Sejamos aqueles que humildemente assumem suas responsabilidades, sozinhos na culpa, mas acompanhados no perdão, e rápidos para nos erguermos no caminho reto para o Altíssimo.

7. Pessoal e intransferível

     “Os ímpios fogem sem que haja ninguém a persegui-los; mas os justos são ousados como um leão.”
      “Os homens maus não entendem o juízo, mas os que buscam ao Senhor entendem tudo.”
      “O que encobre as suas transgressões nunca prosperará, mas o que as confessa e deixa, alcançará misericórdia.”
      “O homem fiel será coberto de bênçãos, mas o que se apressa a enriquecer não ficará impune.”
Provérbios 28.1, 5, 13, 20

      Responsabilidade é pensar nas consequências ruins e não fazermos o que possa causá-las, nesse caso responsabilidade está relacionada com amor. Se nos amamos de fato evitaremos o que ainda que traga prazer imediato pode prejudicar nosso corpo, nossa mente e nosso espírito depois. Se amamos os outros poderemos evitar mesmo coisas que parecem não nos prejudicar, mas aos outros, isso é crescer no amor. Mas não fazermos um monte de coisas porque seus efeitos podem prejudicar nossa comunhão com Deus, ou mais, podem dar a outros, seres humanos no mundo ou espirituais, um mal testemunho de alguém que já assumiu ser luzeiro de Deus, isso é espiritualidade mais alta. 
      Toda causa tem efeito e efeitos ruins agridem alguém de alguma maneira, ainda que seja o testemunho que nos comprometemos dar das virtudes de Deus. Responsabilidade é entender que não estamos sozinhos, e que se não é correto desprezarmos alguém, muito menos é agirmos irresponsavelmente com quem nos ama. O caminho reto consiste em escolhas responsáveis, os que andam nele são seres iluminados no mundo, Deus e seus exércitos cuidarão deles e eles serão poderosamente úteis para abençoarem os outros. Responsabilidade é pensar nas consequências, nos outros, mas é mais que fazer escolhas racionais, é achar prazer em fazer o que é certo porque isso agrada a Deus. 
      O que precisamos entender é que responsabilidade pessoal não pode ser transferida, ainda que num comodismo mais intelectual que moral autorizemos religiões e ideologias políticas a pensarem por nós. Deus, que é justo e verdadeiro, avalia essas autorizações como escolhas pessoais. Dessa forma não poderemos usar a desculpa que não tínhamos controle sobre as intenções de instituições e de líderes, utilizando a justificativa tão comum, “no mundo nada é perfeito”. Não é perfeito porque nós somos imperfeitos, mas Deus é perfeito e nos chama a ele, ainda que tenhamos que conviver com padres, pastores e políticos, cabe a nós, individualmente, saber até onde seguir debaixo de homens. 
      Seremos responsabilizados por dar crédito a fake news e teorias de conspiração, e por passar isso à frente como verdades, calúnia é uma espécie de homicídio, é assassinato de reputação. Não poderemos alegar que cremos porque estava na internet ou vindo de fonte de alguém famoso e importante, os tempos mudaram, assim como os crimes e as responsabilidades. Espaços virtuais precisam de melhores legislações, principalmente para que se possa separar liberdade de expressão de veiculação irresponsável de informação, mas “Deus está vendo”. Ainda que não existam leis humanas adequadas, o Espírito Santo sempre orienta os que o buscam e mostra o que é certo e o que não é. 
      Só depende de nós parar de perdermos tempo com a mentira, que não desembaraça, só confunde e amarra, e decidirmos em fé pela verdade. Qual é a verdade? A simples, que leva ao equilíbrio e que não pende para extremos, que traz paz imediata que permanece, que ainda que não responda tudo, porque a verdade mais alta não fecha, abre, deixa-nos livres para seguirmos questionando e conhecendo, em santidade e humildade. Só a responsabilidade pessoal conduz à verdade e com efeito só ela deixa a paz que independe do mundo, de homens, de coisas aparentes, de vaidades, mas se firma totalmente em Deus. Você é responsável por você e por muitos outros, assuma isso e seja bênção! 
      Na responsabilidade há retidão e no caminho reto há a luz de Deus, que nos conduz em segurança e nos faz conhecer os mistérios. “Os ímpios fogem sem que haja ninguém a persegui-los, mas os justos são ousados como um leão”, “o que encobre as suas transgressões nunca prosperará, mas o que as confessa e deixa, alcançará misericórdia”, enquanto o ímpio anda confuso em suas próprias mentiras e pecados não perdoados, o justo não foge de perigo real, nem encobre seu pecado. Busca rapidamente o perdão do Senhor, confia prontamente em seu Deus, e por isso é imediatamente perdoado e protegido pelo Altíssimo. Na reta responsabilidade há uso eficiente de tempo e espaço. 
      Na irresponsabilidade de seus caminhos, os ímpios podem até achar que sabem muitas coisas, por isso gostam de falar para tentar convencer a si mesmos enquanto acham que podem convencer os outros. “Os homens maus não entendem o juízo, mas os que buscam ao Senhor entendem tudo”, “o homem fiel será coberto de bênçãos, mas o que se apressa a enriquecer não ficará impune”, os justos não andam perdidos e sem conhecimento, mas ainda que discirnam tudo não caem na vaidade de tentar convencer os tolos. Os justos serão supridos porque têm as prioridades certas, não têm pressa de serem ricos e importantes no mundo, mas de exercerem reta responsabilidade diante de Deus. 

8. A Voz do Senhor

      “Dai ao Senhor, ó filhos dos poderosos, dai ao Senhor glória e força. Dai ao Senhor a glória devida ao seu nome, adorai o Senhor na beleza da santidade. 
      A voz do Senhor ouve-se sobre as suas águas; o Deus da glória troveja; o Senhor está sobre as muitas águas. A voz do Senhor é poderosa; a voz do Senhor é cheia de majestade. 
      A voz do Senhor quebra os cedros; sim, o Senhor quebra os cedros do Líbano. Ele os faz saltar como um bezerro; ao Líbano e Siriom, como filhotes de bois selvagens. 
      A voz do Senhor separa as labaredas do fogo. A voz do Senhor faz tremer o deserto; o Senhor faz tremer o deserto de Cades. A voz do Senhor faz parir as cervas, e descobre as brenhas; e no seu templo cada um fala da sua glória. 
      O Senhor se assentou sobre o dilúvio; o Senhor se assenta como Rei, perpetuamente. O Senhor dará força ao seu povo; o Senhor abençoará o seu povo com paz.”
Salmos 29
 
     Tenho falado bastante aqui sobre ter uma experiência espiritual mais profunda com Deus, mas até que ponto muitos cristãos entendem o que é uma experiência espiritual mais profunda? Se fizermos pesquisa numa versão bíblica em computador ou celular, para identificarmos os termos “voz do Senhor” ou “falou o Senhor”, acharemos dezenas de citações, isso significa que profetas e outros homens e mulheres, que andaram com Deus principalmente nos tempos do antigo testamento, ouviam a voz de Deus. E quanto a nós hoje, ouvimos essa voz? Se personagens bíblicos tinham essa experiência então ela não era efeito de algum transtorno mental de ouvir “vozes”, era um diálogo direto com o Altíssimo, onde se fala e se ouve. 
      Não estou dizendo que não existam doenças psiquiátricas que levam as pessoas a ouvir vozes, que apesar de muitos acharem que são de outros seres (humanos ou espíritos), são só ecos de suas próprias mentes, essa experiência é danosa, maléfica, pode e deve ser tratada com orientação profissional médica e remédios. Contudo, num tempo em que a bênção da ciência beneficia a humanidade com tantos cuidados, muitos cristãos usam referências científicas, apesar de por formas antagônicas, de maneira equivocada. Alguns negam a ciência e impedem que ela seja ferramenta da providência para cura e educação, e outros a usam como desculpa para não provarem experiências profundas com o Santo Espírito.
      A fé não sabe tudo, muito menos a ciência sabe, no equilíbrio os simples acham sabedoria. No início desta reflexão separei o Salmo 29 porque ele cita sete vezes “voz do Senhor”. Esse texto, contudo, reconhece a voz de Deus em eventos materiais e grandiosos, percepção típica do homem que andava com Deus no tempo do antigo testamento, na natureza, nas águas, no fogo, no deserto, nos animais, enfim, nas manifestações de vida e clima do planeta Terra. Mas em outras muitas passagens a voz do Senhor é ouvida orientando as nações, abençoando e disciplinando, concedendo vitória e decretando derrota, novamente a visão beligerante do homem antigo testifica sobre as ações de Deus que são relevantes a suas vivências. 
      Houve mudanças no novo testamento em relação ao antigo, da nova aliança em relação à velha, da Lei para o evangelho, de Moisés para Cristo. Mas entre essas duas visões de relacionamentos com Deus, houve a passagem da bênção coletiva para a pessoal, de uma nação para o indivíduo, indiferente da nação que o indivíduo faça parte. Assim, a voz de Deus também passou a ser mais específica, principalmente porque agora não é mais a tribo física dos levitas a responsável pela religiosidade, mas o Espírito Santo enviado por Jesus habitando nos homens. Não que Deus não falasse a indivíduos sobre assuntos pessoais, mas o foco era vitória de Israel sobre outras nações, e o indivíduo era especial por ser fisicamente circuncidado.
      Sim, Deus sempre olhou a intenção do coração, isso é claro nos textos de Davi e em muitas exortações dos profetas, mas o Altíssimo não podia falar a meninos sobre coisas de adultos, esses não poderiam entender. Contudo, a igreja católica e mesmo muitas evangélicas, seguem querendo repetir um modelo de relacionamento que Deus já deixou para trás, insistem em estabelecer no mundo um cristianismo nos moldes da nação física de Israel dos tempos do antigo testamento. Obviamente que numa visão herege assim, o Espírito Santo deve ser calado, e isso foi a primeira coisa que uma igreja, recém saída da igreja primitiva dos apóstolos originais e dos primeiros discípulos, fez para criar o politeísmo católico dos santos. 
      A reforma protestante não deu voz livre ao Espírito Santo, só simplificou as vozes dos homens, e mesmo o pentecostalismo, de muitas das chamadas igrejas evangélicas atuais, tem no melhor das circunstâncias uma experiência infantil e primária com a voz de Deus pelo Espírito Santo, deseja o êxtase emocional inicial da experiência e não o conhecimento espiritual mais profundo que ela permite. Muitas “manifestações” são só clichês de palavras proféticas veo-testamentárias, eis novamente homens limitando a palavra individual para que seja coletiva e mais facilmente manipulada a favor de seus interesses materialistas de poder no mundo. É preciso coragem para seguir e ouvir a voz de Deus, missão solitária. 

9. Experiência individual

      “Assim diz o Senhor dos Exércitos, o Deus de Israel: Ajuntai os vossos holocaustos aos vossos sacrifícios, e comei carne. Porque nunca falei a vossos pais, no dia em que os tirei da terra do Egito, nem lhes ordenei coisa alguma acerca de holocaustos ou sacrifícios. Mas isto lhes ordenei, dizendo: Dai ouvidos à minha voz, e eu serei o vosso Deus, e vós sereis o meu povo; e andai em todo o caminho que eu vos mandar, para que vos vá bem. Mas não ouviram, nem inclinaram os seus ouvidos, mas andaram nos seus próprios conselhos, no propósito do seu coração malvado; e andaram para trás, e não para diante.” Jeremias 7.21-24

      Ao conhecimento espiritual mais profundo temos acesso sem encantamentos ou êxtases, com muita santidade e serenidade, com tempo e trabalho mental que abre mão de preconceitos e imaginações para ouvir a voz de Deus pela fé e sem apoio de religiões. Sei que tanto as igrejas evangélicas como a católica, mesmo com todos os seus defeitos, têm desempenhado uma missão de auxílio aos homens, viciados em drogas, pobres e tantos carentes de paz e esperança acham nas catedrais e templos conforto e libertação. Creio que a maior parte da humanidade ainda necessita do trabalho dessas igrejas e denominações, e para a grande maioria é suficiente o que essas são, para que o amor de Deus aja a favor dos seres humanos. 
      A intenção deste espaço, entretanto, e ir além, se alguém quer uma palavra em consonância com as doutrinas tradicionais cristãs, aqui não é o lugar, nem perca tempo aqui se for esse seu interesse, não será bênção para você tentar entender muito do que aqui se compartilha. Não tenho interesse de escandalizar ninguém, só de falar a quem quer ouvir. O ir além que me refiro é simples, nele não há mistério ou novidade: ore mais! Fale mais com Deus, mas principalmente peça a Deus que você possa discernir sua voz. Depois você poderá saber de coisas que até agora não soube porque não buscou resposta em quem tem as verdadeiras respostas, o Espírito Santo, e isso não é só ter curiosidade saciada, mas receber vida eterna. 
      Muito significativo o texto bíblico acima, veja que o profeta diz de forma clara que o objetivo inicial de Deus para a nação de Israel não era que ela tivesse uma religião baseada em holocaustos e sacrifícios. Isso pode mudar a opinião que muitos cristãos e leitores habituais da Bíblia têm sobre a velha aliança de Israel, e mesmo sobre o papel da nova aliança de só substituir sacrifícios repetitivos e imperfeitos de animais pelo sacrifico único e perfeito de Jesus. A vontade principal de Deus, que pode “salvar” o homem, é que esse ouça sua voz e obedeça-a. Me atrevo a fazer uma suposição, será que Deus não permitiu o sistema de sacrifícios pelo mesmo motivo que permitiu um rei, porque Israel queria ser como as outras nações?
      Se for isso, é só Deus, mais uma vez agindo como um pai que cede à teimosia de filhos imaturos que invejam povos que não temem o Deus verdadeiro, que desejam ser o que não precisam ser. A palavra profética chega a ser dura, mesmo irônica, “ajuntai os vossos holocaustos aos vossos sacrifícios e comei carne”, em outras palavras, “façam um churrasco com vossa religiosidade, isso é mais proveitoso para vocês, para mim nenhuma serventia tem”. Quando vamos entender que muitas coisas são só símbolos? Símbolos são necessários para os que não estão preparadas para a verdade, mas só para interpretações facilitadas dela. O homem tem dificuldade para entender que no mundo o plano espiritual se prova pela fé.
      Ainda assim muitos precisam de esculturas e imagens, assim como de rituais e dos chamados “atos proféticos” (encenações de eventos bíblicos) para crerem, hoje, no século XXI, quase dois mil anos depois que o Espírito Santo foi dado à humanidade. Queridos católicos, Deus aceita vossos símbolos porque ele ama vocês, e evangélicos, não confundam de maneira maldosa os ídolos construídos sobre imaginações de espíritos malignos do antigo testamento com os “santos” católicos, não são a mesma coisa. Contudo, quando todos nós vamos crescer? Deixarmos as interpretações facilitadas, os reforços físicos para fé, que é o que são esculturas e imagens católicas, e termos uma comunhão espiritual direta e pura com Deus? 
      É fácil nos sentarmos em bancos e cadeiras, em catedrais e templos, e “assistirmos” uma missa ou um culto, como quem assiste um filme, mas ainda que haja sinceridade e boa intenção para saber a vontade de Deus, é pouco, comparado com o que Deus tem para nós. Pode-se dizer, “tenho uma vida vitoriosa e em paz sendo religioso”, eu acredito nisso, mas e o resto, o mundo, o Brasil? Se essa religiosidade, que aceita calada o que de fato a Igreja Católica e tantas igrejas evangélicas fazem, ou pior, que não fazem, resolvesse, não estaríamos vivendo o momento que vivemos. Ninguém se iluda, as coisas vão melhorar, são tempos finais de uma era e decisivos para a humanidade, e mudará à medida que ouvirmos a genuína voz de Deus.

10. Vemos o que queremos ver

     “Porque qualquer que pede recebe; e quem busca acha; e a quem bate abrir-se-lhe-á.” “Pois se vós, sendo maus, sabeis dar boas dádivas aos vossos filhos, quanto mais dará o Pai celestial o Espírito Santo àqueles que lho pedirem?” Lucas 11.10, 13

      As pessoas veem o que querem ver, quem procura significado em algo, acha. Podemos entender várias coisas nessas afirmações, que revelam muito sobre a dupla identidade humana, material e espiritual. Quem procura acha, e se não acha de verdade pode inventar que achou, nenhum de nós, de alguma maneira, escapa disso. O que mais você quer ver? O que mais você procura? O que você tem necessidade mais forte e mais profunda de ver e provar, ainda que não admita a ninguém? 
      Ninguém está isento disso, nenhuma pessoa consegue passar por este mundo sem ter uma dúvida principal, ainda que tente negar a si mesmo, buscando responder tal questão com coisas inadequadas, coisas que talvez agradem aos outros, mas não a ela mesma. Mas mesmo assim, ainda que fuja de si mesmo e consiga fazer isso com muita eficiência, um dia, a verdade virá à tona e aquilo que a pessoa de fato sempre quis ver ela verá, achando nisso o significado maior para sua vida. 
      Já ouvi gente dizer, “vivi uma vida para os outros, passei os anos servindo às necessidades alheias, nunca vivi para mim”. A primeira coisa a dizer dessas pessoas é que se de fato viveram para servir os outros e fizeram isso em amor e de forma espiritual, parabéns a elas, cumpriram o objetivo maior de todo o ser humano neste mundo. Se fizeram isso do jeito certo devem ser felizes, não infelizes, colherão na eternidade os frutos gloriosos de uma existência material mais excelente. 
      Esse tipo de afirmação é mais comum em pessoas de gerações passadas, já que de algumas gerações para cá poucos pagam o preço para servirem os outros, todos querem servir a si mesmos, usufruírem prazer e depressa. Não importa se um filho foi feito, um casal não permanece junto, porque na verdade nunca foi um casal, só dois seres egoístas buscando prazer rápido, assim o pai ou a mãe fica sozinho com o filho, o que na maior parte das vezes significa que avós criarão a criança. 
      Mas para aqueles que dizem que viveram para os outros e não fizeram isso do jeito certo, na verdade eles fizeram exatamente o que queriam, mostrar para os outros que podiam ajudá-los. Esses não acharam outra maneira de sentirem-se úteis, se tivessem tido coragem teriam achado um jeito para se conhecerem e serem de fato felizes. Às vezes é preciso desapontar algumas pessoas para não nos desapontarmos, e isso não significa ser egoísta e irresponsável, só independente e maduro. 
      Muitos pagam o preço e acham aquilo que procuram, de um jeito ou de outro. Mas esses não devem reclamar no final, se aquilo que quiseram ver não lhes for suficiente para lhes trazer felicidade. Os que querem se ver no topo profissional, nos níveis sociais e financeiros mais altos, para serem aclamados como prósperos e vitoriosos, verão esse sonho realizado. Mas que companhia isso lhes dará no final, de gente que lhes ama ou só de pessoas materialistas que só valorizam dinheiro? 
      Se você quer grana, tudo bem, é escolha tua, você terá essa grana, mas lembre-se que grana não compra amor e respeito. Riquezas só recebem honra de quem tem riqueza e valoriza a riqueza dos outros, não é a pessoa e suas virtudes morais que são valorizadas. O ser humano, contudo, é especialista na hipocrisia e em jogar a culpa de seus erros nos outros, passa a vida buscando coisas erradas e no final ainda se faz de vítima, quando na verdade ele só recebeu o que sempre quis ter. 
      Sempre há tempo para mudar, se for teu caso, ache tempo e dê o melhor que precisa receber, construa relações baseadas em respeito desinteressado. Festas de finais de ano são bons critérios para sabermos no que temos investido nossas vidas, e muitos, após um ano fazendo e acontecendo, para terem aparências, passam esses momentos sozinhos. Natal numa família humilde, com comida e bebida simples, mas onde há amizade e alegria sincera, é melhor que festas luxuosas mas frias. 
      Vemos o que queremos ver, isso nos diz muito não só sobre coisas naturais, mas também sobre as espirituais ou sobrenaturais. Quem quer ver um o.v.n.i. um dia verá, quem quer ver fantasmas, um dia verá, quem busca milagre, um dia receberá, quem procura significado em teorias de conspiração um dia achará uma que dará sentido à sua vida. O ser humano tem aptidões que desconhece, como aquilo que elas podem lhe dar, imaginação é aptidão poderosa, principalmente para coisas espirituais.
      As coisas mais malucas podem fazer sentido para quem procura nelas significado, isso não significa que façam sentido para outras pessoas, assim como não significa que por causa disso não sejam legítimas e úteis de alguma forma para uma pessoa. Já foi dito que deveria haver tantas religiões quanto são os habitantes do planeta, uma para cada um, mas na verdade é assim mesmo que funciona, ainda que centenas de pessoas estejam em um templo participando do mesmo culto. 
      Se soubéssemos o que se passa na cabeça de cada pessoa sentada no banco de uma igreja enquanto um culto é realizado, cantos até orações podem ser semelhantes, mas não as intenções. Quantas descrenças e quantas crenças distintas, só Deus para contemplar a todos, amar a todos, respeitar a todos e responder a todos, de acordo com cada idiossincrasia. Ainda que imaginemos coisas diferentes, a verdade espiritual é só uma, adaptando-se humildemente ao entendimento de cada ser. 
      O espírito não pode ser visto pelo homem encarnado, e hoje entendemos que sua aparência mais pura é luz, ou uma energia, mas Deus, em sua misericórdia nos permite ver formas mais humanas. Assim vemos varões de vestidos brancos e asas ou entidades escuras e encolhidas, outros veem seres mais antropomórficos, o que é de fato verdade? A verdade é que Deus revela o mundo espiritual aos que buscam com sinceridade e estão preparados para ele, seja da maneira que for. 
      O que é imaginação e o que é verdade? O que é verdade usa a imaginação, entendamos isso, aquilo que nossa mente vê são ferramentas para que o mundo espiritual se comunique conosco nesse mundo. Quando é imaginação são apenas memórias, mas quando é o espiritual usando nossas mentes outros sentidos são impressionados além da visão e da audição. Sentimos um êxtase sem igual quando permitimos que o Espírito Santo manifeste seus dons através de nós, um prazer inefável.
      Mas não menospreze arrepios e medos, podem não ser frio, reação a filme de terror ou outra coisa, se estamos no Espírito essas percepções podem ser indicadores de proximidade de seres espirituais. Deus é espírito mas se comunica com seres físicos através de sentidos físicos. Experiência espiritual é algo que se aperfeiçoa com o tempo, com o uso dos dons, com intimidade com Deus, com  consagração e oração, ela é real, poderosa e útil, muitos perdem batalhas porque desprezam a arma. 
      Uma boa orientação é saber discernir o conteúdo da forma, a verdade da maneira como a pessoa interpreta a verdade. Deus fala com pessoas diferentes por jeitos diferentes, dependendo de seus preparos e de suas experiências. Assim, sejamos sábios e não liguemos a qualquer imaginação humana, mas não desprezemos o fato que muitas pessoas têm experiências espirituais, Deus as avisa, consola e ensina, ainda que de maneiras diversas, usando as ferramentas mentais de cada pessoa. 
      Vê o mundo espiritual quem olha para ele, quem não olha não o vê, ainda que ele esteja gritando à sua volta. Contudo, não é porque alguém está olhando que vê, imaginação prega peças no incrédulo e no crédulo, e até mais no crédulo, já que esse quer ver. Quem quer ver vê, mas precisa provar se o que está vendo é verdadeiro, experiência espiritual não é uma coisa só, mas conjunto de coisas, e em se tratando de Deus, de bons frutos objetivos que permanecem após a experiência subjetiva. 

11. Limpos de coração

      “Bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus” Mateus 5.8

      A primeira coisa que nos vem à mente quando lemos o termo limpo de coração é alguém que não está em “pecado”. As primeiras ideias que fazemos de “pecado” é a satisfação de desejos do corpo físico e de forma descontrolada, assim quando pensamos num limpo de coração pensamos em alguém que não adultera, que não fuma, que não ingere bebidas alcoólicas (pelo menos não excessivamente), que come com equilíbrio, enfim, que não tem vícios. A conclusão sobre o versículo inicial, então nos parece fácil: vê a Deus quem não adultera, que não fuma, que não bebe ou come sem limites, enfim, que tem controle sobre coisas materiais que entram em seu corpo físico. 
      Podemos entender “pecado” em duas camadas, e em ambas como ações, pensamentos, sentimentos e palavras que nos separam de Deus de alguma forma. Algo que precisamos dizer antes de tudo, é que o que separa uma pessoa de Deus pode não ser o que separa outra pessoa de Deus, o que alguém considera “pecado” pode não ser considerado “pecado” por outra pessoa, ainda que de maneira geral “pecado” seja “pecado” para todos, existem nuanças. A primeira camada do “pecado”, e que não pode ser relevada, refere-se às “tentações” do dia a dia, ou menos mais pontuais, mas que dizem respeito ao que dissemos acima, satisfação fácil de prazeres do corpo físico. 
      Precisamos ter limpeza não só moral, mas também física no que se refere à primeira camada, contudo, precisamos entender, e é por não entender isso que muitos cometeram e cometem sérios erros sobre o que é “santidade”, que só essa primeira condição não basta. Nos acharmos “santos”, limpos de coração, só porque não nos corrompemos com sexo errado, ou não tentamos nos satisfazer com prazeres do corpo além das necessidades básicas, ou não temos vícios com drogas ou outros elementos que alterem nossa consciência, não basta. Podemos estar limpos assim e não sermos limpos de coração, podemos parecer não pecar e sermos pecadores dentro de nós. 
      Os “pecados” da primeira camada podem ser limpos mais rapidamente e com oração sincera, ainda que libertação plena de vícios exija mais tempo. São os “pecados” da segunda camada que de fato sujam nosso coração e nos impedem de ver Deus. Desses não nos livramos facilmente, podem ser necessários anos para entendermos e sermos limpos desses. Entendamos “coração” como o centro racional e emocional de nossos seres, nossa mente, percepções sensoriais interiores, e mais, nosso espírito. Assim, o “pecado” que nos impede de ver a Deus suja, não nosso corpo ou nossos sentimentos e pensamentos e só por algum tempo, mas nossos espíritos e de forma mais duradoura. 
      No meio pentecostal, onde é mais provável que as pessoas busquem dons espirituais, já ouvi gente dizendo, “faço tudo certo, jejuo, me consagro, não peco, mas não recebo dons espirituais”, esses talvez se limpem na primeira camada, mas não se purificam na segunda, o coração. Não estou dizendo que quem recebe dons espirituais está totalmente limpo de coração, não existem fórmulas para experiência espirituais, só Deus sabe quem merece, está preparado e recebe sua intimidade, não nos cabe julgar. A humanidade ocidental passou séculos, na maior parte, aquela doutrinada pelo catolicismo, sendo ensinada a se limpar só na primeira camada, e assim vendo religião, não Deus. 
      Podemos reinterpretar o versículo inicial dessa maneira: muito felizes os limpos de espírito, porque terão experiências profundas com Deus. Mas o que seriam esses “pecados” da segunda camada? São muitos, mas podem se resumir a um: a vaidade. Parece estranho vaidade estar aliada a busca espiritual? Mas acredite, muitos buscam experiências espirituais por vaidade, justamente porque sabem da relevância de espiritualidade, como superior a bens materiais, posições sociais ou a belezas e prazeres do corpo. Contudo, pensam, “se não posso ser rico e bonito ou se já sou isso e ainda não estou satisfeito, quero ter experiências espirituais, talvez assim serei feliz”.
      “E ele disse-lhes: Assim também vós estais sem entendimento? Não compreendeis que tudo o que de fora entra no homem não o pode contaminar, porque não entra no seu coração, mas no ventre, e é lançado fora, ficando puras todas as comidas? E dizia: O que sai do homem isso contamina o homem. Porque do interior do coração dos homens saem os maus pensamentos, os adultérios, as prostituições, os homicídios, Os furtos, a avareza, as maldades, o engano, a dissolução, a inveja, a blasfêmia, a soberba, a loucura. Todos estes males procedem de dentro e contaminam o homem.” (Marcos 7.18-23). Não são os males que entram no corpo os piores, mas os que saem do coração.

12. Vaidade, pecado maior

      “Vaidade de vaidades, diz o pregador, vaidade de vaidades! Tudo é vaidade.” Eclesiastes 1.2

      Para ver a Deus é preciso viver paradoxos: desejar sem querer, ser sem mostrar, crer sem expectativas, se esforçar sem sofrer, saber sem falar, estar vazio e cheio. São esses paradoxos que nos purificam da vaidade, que nos ensinam a ter paciência, que nos preparam para receber algo muito precioso. Desejar sem querer é ter o desejo profundo de experimentar algo, mas sem obsessão que leve a fazer sacrifícios por si e não ser misericordioso com os outros. Ser sem se mostrar é ser para Deus, como louvor a ele, não para se exibir aos homens ou como louvor a si mesmo. Crer sem expectativas é não ser obcecado nem por coisas espirituais, nada justifica ansiedade e falta de paz.
      Se esforçar sem sofrer é dar o máximo de si, mas não para obter créditos que dão direito de se receber algo de Deus, é ver no trabalho um bem em si mesmo, não para acumular privilégios para se fazer exigências. Saber sem falar é vencer a necessidade de se justificar ou de convencer os homens que sabemos ou somos. Finalmente, estar vazio e cheio é estarmos vazios sem nos sentirmos em falta, mas satisfeitos com aquilo que Deus nos dá agora, ainda que crendo que pode nos dar mais depois, sem a acomodação da satisfação e sem a ansiedade da insatisfação. Viver sem vaidades é ter os pés na Terra e o coração no céu, feliz por viver e mais feliz por saber para onde vai no além.
      Abrir mão de vaidades é trabalho constante, ainda que tenhamos aberto mão de valores materiais para alcançar um nível espiritual, logo após termos alcançado seremos novamente tentados pela vaidade. Agora não será mais para ter riquezas ou posições, mas para sermos mais espirituais, e nesse momento mesmo espiritualidade se torna vaidade. Por isso é importante vivermos os paradoxos compartilhados acima, e são paradoxos porque nos levam sempre a desafiar o óbvio, a viver espiritualidade na matéria, algo impossível mas que devemos almejar até nossos últimos instantes neste mundo. Ser e não ser, para que Deus seja, perder para ganhar e ganhar para perder. 
      À medida que nossa espiritualidade evolui, nossa vaidade também fica mais sofisticada, por isso grandes líderes religiosos, pregadores e pastores reconhecidos e que fundaram poderosos ministérios se corrompem. O personagem bíblico Lúcifer é arquétipo disso, um ser que era grandioso no reino espiritual não se contentou com isso, quis mais, o lugar do próprio Deus e caiu de sua elevada posição. Eis a vaidade corrompendo mesmo os grandes, como diz John Milton, personagem de Al Pacino no filme “Advogado do diabo”, “a vaidade é, definitivamente, meu pecado favorito”. Muitos vencem muitas tentações, mas caem na vaidade, e a pior das vaidades é a espiritual. 
      Mas quem vê a Deus ainda neste plano, depois de pagar todos os preços e se preparar pacientemente em santidade e humildade, é corrompido pela vaidade? Esse deseja se exibir como mais espiritual para os outros? Não, ao contrário, se torna ainda mais humilde. Ocorre que o caminho para isso é longo, e se desviar-se no meio dele poderá ver outros seres ou poderes espirituais, que oferecem opções mais fáceis. A experiência “desviada” também exige uma busca persistente, não é para qualquer um, mas ela conduz à vaidade mais perigosa. É isso que muitos, que a princípio podiam até estar buscando a Deus, provam em espiritualidades como do ocultismo, da magia, do esoterismo etc. 
      Muitos que começam querendo ver Deus acabam vendo o “diabo”, porque não persistem nos valores morais mais altos e são presas da vaidade. O que significa ver a Deus? Significa ter experiências mais profundas com ele neste mundo, mas significa principalmente ter a melhor eternidade de Deus no outro mundo. A intenção de Deus está em nos aperfeiçoar durante o processo, sendo assim seu objetivo pode não ser constante, mas variável de acordo com o que nos tornamos no processo. Dessa forma, não seria nosso céu definido pelo nosso caminhar no mundo? Ou será que é lugar igual para todos? Mas será que todos estão preparados para ver Deus na mesma proximidade?
      “Quem subirá ao monte do Senhor, ou quem estará no seu lugar santo? Aquele que é limpo de mãos e puro de coração, que não entrega a sua alma à vaidade, nem jura enganosamente. Este receberá a bênção do Senhor e a justiça do Deus da sua salvação.” (Salmos 24.3-5). Esses versículos podem conter mais que orientação para se ter direito moral de se estar num templo religioso físico, podem mostrar o caminho para o céu mais elevado na eternidade. O direito não é ganho só pela fé, mas por prática de santidade genuína, sem vaidades, assim pode não ser absoluto e pode dar acesso a posições espirituais que variam conforme a pureza do coração, meditemos seriamente nisso. 

13. Vício ou restrição?

      “E, se a tua mão te escandalizar, corta-a; melhor é para ti entrares na vida aleijado do que, tendo duas mãos, ires para o inferno, para o fogo que nunca se apaga” “E, se o teu pé te escandalizar, corta-o; melhor é para ti entrares coxo na vida do que, tendo dois pés, seres lançado no inferno, no fogo que nunca se apaga” “E, se o teu olho te escandalizar, lança-o fora; melhor é para ti entrares no reino de Deus com um só olho do que, tendo dois olhos, seres lançado no fogo do inferno” Marcos 9.43,45,47

      Nesta e nas duas próximas postagens refletiremos sobre vícios, causas e efeitos, falaremos como testemunhas, não como profissionais. Se você tiver ou conhecer alguém que tenha problemas sérios com vícios, com drogas ilícitas, bebidas alcoólicas, mesmo com sexo e gula, procure alguém da área médica e instituições especializadas na questão. Se possível abra-se com sua família, com amigos de confiança, não viciados, com seu líder religioso, mas leve a sério o problema e creia, há cura para o humilde.
      Vício é perder o controle, é ser controlado por algo e não controlar algo. Isso leva à segunda definição de vício: fazer algo exageradamente. Assim, mesmo algo que não faz mal quando feito com equilíbrio, pode fazer mal se for vício, se for feito descontroladamente. O que mais vicia são coisas, que pelo menos a princípio, dão prazer, assim repetimos para ter mais prazer. Ocorre que quando repetimos algo sem controle não fazemos mais por prazer, mas para saciar a falta do prazer, abstinência se torna uma nova dor. 
      O viciado não usa o que o viciou para dar a ele satisfação, mas para não ficar mais insatisfeito, já que a dor inicial que o levou a se viciar continua, só que adicionada agora a uma segunda dor, a da falta daquilo em que ele se viciou. Nas primeiras vezes o que vicia até consegue anular a dor inicial e dar prazer, mas depois não, assim o viciado não resolve um problema, cria um novo. A solução seria ele ter resolvido o problema inicial, não buscar anular esse problema com algo que depois se torna um problema ainda maior. 
      Para não nos tornarmos viciados precisamos impedir que permaneçam em nós questões não resolvidas, que podemos manter tentando até nos convencer que não são problemas e que não existem. Contudo, ainda que nossa consciência seja enganada, nosso corpo e nossa alma não são, assim esses buscarão paliativos. Nossos instintos sempre tentam fugir da dor e achar prazer, ainda que sejam prazeres caros para nossos corpos e nossas mentes. Quando a dor não resolvida se instala é que estamos mais frágeis a vícios. 
      Jovens se viciam em coisas piores mais facilmente, como drogas ilícitas, porque além de passarem por um período de descobertas, de dúvidas, de encantamentos, de ausência de referências em primeira mão, também podem trazer sérios problemas não resolvidos, principalmente de famílias desestruturadas. Pode haver mais dor que ele consiga administrar, assim é construído ambiente propício para instalação de vícios. Infelizmente a sociedade, principalmente a brasileira, oferece facilidades para aquisição de vícios. 
      Há vícios que usamos para anular dores, mas alguns vícios adquirimos só por nos darem prazer, mesmo que não precisemos deles. Creio que almas satisfeitas não se viciam, mas há coisas que são boas, aprovadas pelo meio social em que vivemos, e até incentivadas por esse meio, que podem depois tornarem-se vícios e, consequentemente, algo que nos controla e que nos faz mal em algum momento. Por mais contrassenso que pareça, coisas que podemos usar a princípio para nos livrar de vícios podem ser tornar vícios. 
      Você, cristão, seja evangélico ou católico, já fez o “teste do Fantástico”? Vou explicar o que é esse teste. Tente passar um domingo à noite em casa sem ir à igreja, assistindo TV, e nem precisa ser assistindo o “Fantástico”. Você verá que só pensar nessa possibilidade pode deixar muitos cristãos deprimidos, muitos acharão que o arrebatamento vai acontecer naquela noite e eles não serão arrebatados, só porque não foram à igreja. Pois é, quem se sente assim pode não ser um cristão dedicado, mas só um viciado religioso. 
      A realidade é que alguns se viciam de maneira muito grave, assim trocar um vício terrível por outro mais leve, pode ser solução, não problema. Muitos de nós fazem isso, trocam um vício por outro, um vício que levaria à morte, por outro que só limita um pouco a liberdade de agir e de pensar, trocam presídios por prisões domiciliares e depois por tornozeleiras eletrônicas. Nem todos conseguem ser plenamente livres, assim para terem vidas com alguma qualidade precisam de restrições, senão morrem. 
      O texto bíblico inicial fala sobre usar uma mão, não duas, andar com um pé, não com dois, enxergar com um olho, não com dois, isso é viver com restrições. Por não querer isso é que muitos fazem, andam e veem o que não precisariam, assim sofrem e depois se viciam. Aceitar as próprias restrições é viver com humildade, Deus permite limites para que ainda que o corpo padeça, o espírito cresça. À eternidade não irão corpos mutilados, mas espíritos aperfeiçoados, dessa forma devemos dar prioridade a eles. 

14. Vício: culpa e ansiedade

      “O homem que anda desviado do caminho do entendimento, na congregação dos mortos repousará. O que ama os prazeres padecerá necessidade; o que ama o vinho e o azeite nunca enriquecerá.” Provérbios 21.16-17
      “Digo, porém: Andai em Espírito, e não cumprireis a concupiscência da carne. Porque a carne cobiça contra o Espírito, e o Espírito contra a carne; e estes opõem-se um ao outro, para que não façais o que quereis.” Gálatas 5.16-17

      A lei de Moisés e o evangelho de Cristo não são só duas propostas religiosas para uma nação, antes resumem dois caminhos espirituais para humanidades de tempos diferentes. A velha aliança de Moisés evidencia o efeito do pecado, proibindo a prática do fruto, enquanto que a nova aliança de Cristo mostra a causa do pecado, propondo a retirada da raiz antes de crescer e dar o fruto. Pelo evangelho aprendemos que o problema não é comer demais, mas viver com dores morais que buscam na gula uma reparação. 
      As dores mais perigosas que levam a vícios podem ser as mais desnecessárias: a culpa e a ansiedade. Não que essas não sejam legítimas, mas podem ser, em grande parte das vezes, inúteis. Depois que erramos, para que culpa? Inicialmente é útil para reconhecermos o erro e tentarmos não errar mais, mas precisa parar aí. Sobre ansiedade, uma coisa é preocupação responsável pela vida, mas se for maior que a capacidade de vivermos bem é só ansiedade inútil. Às vezes é melhor sermos pragmáticos e só seguirmos. 
      Culpa, ansiedade, cobrança, são as causas, o processo de vencer tudo isso inicia-se com uma decisão racional, precisamos decidir mentalmente que queremos cura para essas coisas. Só sem esses males teremos paz e só em paz não acharemos legitimidade para vícios, os efeitos finais. Mas é preciso entender que causas coexistem com efeitos, assim temos que curar as causas e cessar os efeitos. As causas são morais e espirituais, se resolvem com vida com Deus, mas os efeitos, como vícios de sexo e de gula, são físicos. 
      Pode ser difícil saber o que podemos vencer só com Deus, e o que poderemos precisar da ajuda de profissionais da área de saúde e de remédios. Para não sermos irresponsáveis, se você estiver em algum tratamento, compartilhe sua religiosidade com os médicos, eles são sensatos, ainda que pela ciência, não desprezarão oração e fé. Entretanto, só posicionamentos morais podem não substituir orientação médica e remédios, assim tenhamos sabedoria para receber várias formas de ajuda, Deus usa a ciência. 
      Tendo em mente que você já procurou ajuda da ciência, e que já se aprumou com Deus, assumindo erros, pedindo perdão e se apossando da paz, a questão é como seguir em frente sem recaídas. Vícios não acabam assim num passe de mágica, principalmente se forem os mais leves, e esses podem ser os mais difíceis de ir embora, como os citados, sexo e gula. A frase “um dia de cada vez” tem um sentido importante na cura, liberta-nos da ansiedade de temer o futuro e nos dá paz no que conquistamos hoje. 
      Vícios nos acostumam com um modo de vida, com uma maneira de termos forças para viver, assim livrar-nos deles requer que nos acostumemos com um modo diferente de vida, deixarmos velhos costumes e existirmos com outros. A cura começa na mente porque ela é porta para tudo, o pecado não está nos olhos, nas mãos, no estômago ou nos genitais, mas em nosso interior subjetivo de pensamentos e emoções. Pecado não é material, é espiritual, se não fosse, após a morte, sem corpos físicos, todos iriam para o céu. 
      Como diz o ditado, mente vazia é oficina do diabo, assim uma orientação sempre válida é não ter tempo para bobagens, use momentos livres para coisas boas. Exercícios físicos e boas leituras são atividades que ocupam mente e corpo com ações produtivas e positivas, não adianta ficar na frente da TV ou passando o dedo na tela do celular e achar que estará forte para vencer vícios. Por isso coisas que podem até ser costumes meio obsessivos, como estudo de música e artes, podem ajudar-nos a vencer vícios mais graves. 
      O ideal é acharmos serenidade plena, onde mesmo não fazer nada não nos deixa fracos, só substituir uma coisa por outra um dia não resolverá mais. Essa serenidade se conquista com equilíbrio de todo nosso ser, corpo físico, mente, coração e espírito. Nela nos alimentamos certo, fazemos exercícios físicos, temos o afetivo resolvido, indiferente se estamos sozinhos ou acompanhados, crescemos intelectualmente com uma relação lúcida com estudos e área profissional, e praticamos uma comunhão espiritual crescente com Deus. 
      Andai em Espírito, e não cumprireis a concupiscência da carne, até que ponto entendemos isso? Novamente dizemos, vida espiritual começa na mente, se muitos cristãos soubessem disso entenderiam porque religiosos orientais dão importância à meditação e restrições alimentares, ainda que muitos desses não tenham experiência direta com Jesus espiritual, aprenderam que espiritualidade começa no controle da mente. Cristãos ocidentalizados dão mais relevância a ações e palavras que a pensamentos e sentimentos.
      Contudo, auto-controle só é plenamente possível no Espírito Santo, não basta nos esvaziarmos do mal e nos esforçarmos para permanecermos limpos, é preciso deixar Deus nos encher. Assim repito outra ênfase do “Como o ar que respiro”, temos que ter uma experiência espiritual com um Deus espiritual através de dons espirituais, não somente entendendo intelectualmente textos bíblicos ou procurando interpretações mais atuais para eles. Como têm aparecido estudiosos bíblicos falando coisa velha com aparência nova. 
      “Mas agora temos sido libertados da lei, tendo morrido para aquilo em que estávamos retidos; para que sirvamos em novidade de espírito, e não na velhice da letra.” (Romanos 7.6), a única novidade que nos revigora, nos alimenta, nos satisfaz e nos livra de toda espécie de vício é o Espírito Santo de Deus. Meus queridos e minhas queridas que me leem, busquemos essa intimidade de Deus, peçamos os dons espirituais, nos libertemos das vãs religiões de homens, tenhamos experiências em primeira mão com o nosso Deus. 

15. Vício sexual: tabu?

      “Ou não sabeis que o que se ajunta com a meretriz, faz-se um corpo com ela? Porque serão, disse, dois numa só carne. Mas o que se ajunta com o Senhor é um mesmo espírito. Fugi da prostituição. Todo o pecado que o homem comete é fora do corpo; mas o que se prostitui peca contra o seu próprio corpo. Ou não sabeis que o vosso corpo é o templo do Espírito Santo, que habita em vós, proveniente de Deus, e que não sois de vós mesmos? Porque fostes comprados por bom preço; glorificai, pois, a Deus no vosso corpo, e no vosso espírito, os quais pertencem a Deus.” I Coríntios 6.16-20

      Culpa e ansiedade são as causas mais comuns de dores não resolvidas, mesmo quando desnecessárias, mas traumas também são difíceis de serem enfrentados, e os mais comuns são os domésticos, advindos de criação violenta ou ausente. Tudo isso se resume numa palavra: cobrança. Nos sentirmos cobrados o tempo todo dói, como nos faz cobrar outros injustamente, assim também pode nos isolar. Sofrendo e sozinhos somos facilmente viciáveis, ainda que no vício mais barato e eficiente de todos, sexo a um, ou masturbação.
       A vida moderna com internet e celulares baratos e acessíveis, disponibiliza sexo para quem quiser, em qualquer lugar ou hora, assim uma legião de viciados em sexo solitário é mantida no mundo. Isso é um problema, precisa ser encarado como tal e cura deve ser buscada. Muitos cristãos, bons cristãos, têm esse vício, que se tornou tão comum que muitos nem chamam de vício, alegam que são só coisas das pessoas, particulares, que elas fazem em suas vidas privadas, ninguém fica sabendo e não prejudica ninguém. 
      Mentira, prejudica sim, é só efeito de causa não resolvida, menosprezada e por isso tão útil nas mãos do mal espiritual. Muitos vivem pesados e amarrados por causa desse vício, faz sofrer e assim é porta para outros vícios, num loop maldito. Sexo de maneira geral pode ser vício, e como tal precisará de cada vez mais “artifícios” para ser prazeroso, por isso fetiches e tantos desvios. Isso nada tem a ver com sexualidade emocional, seja ela qual for, tem a ver com prazer físico, por isso sem afeto, sem respeito, só pelo clímax. 
      Um aspecto precisa ser considerado sobre esse assunto, aliás, um tema demonizado por pastores que não o enfrentam com maturidade e realismo. Como se comportam pessoas sem vida sexual com outras pessoas, tendo organismos sadios e libidos normais? A posição “oficial” de muitas igrejas evangélicas é que não se comportam, solteiros não devem praticar sexo. Nem vou refletir sobre o aspecto moral de sexo e casamento, não é tema desta reflexão, mas algo precisa ser dito sobre o funcionamento de nossos corpos.
      Pessoas com boa saúde física e emocional, num ideal de vida onde buscassem espiritualidade, controlariam desejos sexuais que não podem ser saciados na fonte, em suas mentes, não precisariam consumir pornografia na internet ou outras coisas para as excitar. Aconteceria com elas o que é comum com adolescentes, polução noturna, ou mesmo o êxtase de maneira rápida e natural durante o banho, por exemplo. Por que pessoas adultas dificilmente provam isso? Porque seus corpos não têm tempo para isso. 
      Muitas pessoas estão tão viciadas em masturbação, e como vício é algo bruto que mais machuca que relaxa, que só saciam suas tensões sexuais provocadas não pelo funcionamento normal de seus corpos mas por excitação forçada, com imaginações imorais. Isso é vício mental. O desejo não pode simplesmente sumir, se a pessoa tem boa saúde ele existirá, mas pode ser resolvido com mais naturalidade, sem que se torne vício que fira o corpo, suje a alma e esfrie o espírito. A cura está em manter a mente limpa.  
      Sexo não é pecado, o melhor dele é provado de forma ao mesmo tempo leve e intensa, é assim quando compartilhamos intimidade física e afetiva com alguém que amamos, e como nos sentimos limpos depois. Mas creiam, solteiros focados em espiritualidade verdadeira também podem conviver com sexualidade sem peso e sem violência, insisto num ponto que não vejo pastores evangélicos falando a respeito. A maioria considera sexo problema sem solução para solteiros e simplesmente finge que o assunto não existe. 
      Sexo solitário como vício leva as pessoas a terem vidas duplas, uma vida temendo encontrar a outra, ambas existindo dentro da mesma alma. Isso nos enfraquece, já que mantemos em nós um conflito desnecessário, mas também enfraquece casamentos, ainda que muitos viciados nunca tenham coragem de viver adultérios reais, só virtuais. Há psicoterapeutas que dizem que isso é sadio, que as pessoas devem ser incentivadas a essa prática, mas vício nunca é bom, porque é efeito de algo pior escondido e não resolvido.
      Nos dias de hoje muitos dizem, “se te dá prazer e não prejudica ninguém, faça”, mas isso considera o ser humano só como matéria e emoção, desconsidera espírito e a finalidade maior desse, ter comunhão com um Deus espiritual e moralmente santo. Quando sabemos a importância da mente em nossa comunhão com Deus, da relevância da limpeza moral, e do quanto o mal espiritual é atraído por mentes sujas, entendemos que não é só questão de satisfação física, tem a ver com nossa essência eterna e com um Deus de amor. 
      Pode-se usar o texto bíblico inicial para alegar que masturbação não é pecado visto que não realiza conjunção carnal com profissionais de prostituição, ainda que meretrizes, homens ou mulheres, não sejam só quem troca favores sexuais por dinheiro. Mas pelo evangelho entendemos que forçar um orgasmo sozinho requer imaginação, isso suja nossas mentes, nossa essência interior, portanto nosso espírito. É justamente sobre isso que o texto fala, de sujar o templo do Espírito Santo com presenças inadequadas. 
      Case-se bem, eis uma boa solução para sexualidade, mas não se apresse. Muitos, querendo se casar a qualquer custo, só para terem sexo legítimo como cristãos, se casam e como o problema principal não era sexo, não se resolvem, continuam sofrendo e susceptíveis a vícios. Após um tempo casados voltam ao vício do sexo solitário. Tenha Deus como amigo, um amigo nos entende, sabe de nossos segredos e nos ajuda sempre, contudo, aceite, vida espiritual precisa ser prioridade e ela não é fácil neste mundo, para ninguém.

16. Santidade sempre!

      “Bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus” Mateus 5.8

      Santidade, a virtude que a maior parte dos homens entende como o efeito principal de quem quer ser espiritual, mais até que o amor. Santidade, por mais preciosa que seja, é vista como uma virtude que cresce no insulamento, muitos acham que ela melhora se viverem mais longe dos homens, e isso porque ela está muito relacionada ao controle do desejo sexual na cabeça de muitos. Já o amor requer o contrário, que se conviva socialmente servindo ao próximo. A principal característica do amor é paciência, já que com pressa não se ama, se julga olhando o outro com olhos sujos, não santos.
      Mas se amor é fazer, mais que sentir ou falar, santidade é simplesmente ser, e sem santidade não se pratica o amor verdadeiro. Por ela, entretanto, muitos cometem equívocos, limitando-a a ausência de prazeres físicos e aliando-a a isolamento social. Não se conhece a Deus porque se tem limpeza moral, não no sentido que essa limpeza seja um fim em si mesma, muitos cuidam do corpo e da mente e não são santos. Contudo, quando se ama a Deus ele nos atrai para amá-lo mais, nisso a santidade acha lugar em nós de maneira natural, queremos ser santos para agradar a Deus. 
      Assim, santidade é efeito de quem conhece o Senhor e então se torna causa para que ele seja conhecido ainda mais. Muitos, contudo, interpretam santidade de forma errada, por medo do inferno e da culpa tentam dominar seus corpos físicos pelas próprias forças, carne tentando controlar carne para que haja espiritualidade. Santidade é experiência espiritual, não física, e quando vivida traz paz e liberdade, não dor e aprisionamento, santidade alegra o coração, na verdade é a maior felicidade que o ser pode experimentar porque coloca o ser na íntima presença de seu santíssimo criador. 
      O homem pode criar religiões, pode buscar coisas e lugares diferentes para focar sua fé, pode achar o divino de maneiras distintas, mas uma relação genuína com o verdadeiro Deus sempre implica em santidade, em abrir mão dos prazeres do corpo e do ego, em pureza moral e em se posicionar direto e reto no Deus altíssimo. Muitos se perdem, incluindo pregadores e cantores famosos de grandes ministérios, porque acham que não há mais necessidade de santidade, que lhes basta o carisma humano, o talento e a experiência na palavra e no canto, a facilidade para seduzir os homens. 
      No caminho para conhecer o Senhor podemos abrir mão de muitas coisas, incluindo posições e serviços dentro de igrejas que muitas vezes podem se tornar só vaidades e jugos pesados de homens. Todavia, aquele que ama a Deus, que teme o Senhor, que deseja com humildade fazer sua vontade, nunca abrirá mão da santidade, ele entendeu que um Deus santo se agrada de filhos santos, e a esses nada nega. Mas não se é santo para se ter créditos para se ganhar coisas de Deus, ou por se ter medo que ele castigue caso não seja santo, se é santo por amor a Deus, um amor desinteressado. 
      Você quer uma prova se tua vida está de acordo com a vontade de Deus, se tuas ações e escolhas têm agradado ao Senhor? Verifique se está andando numa santidade que permanece, que representa a maior parte do tempo de seus dias. Quem desobedece a Deus, por mais que seja esforçado em muitas áreas, no trabalho, mesmo na participação ativa de ministérios nas igrejas, não conseguirá ser santo, não na sua vida mais íntima, aquela que só a pessoa e Deus conhecem. Muitos passam vidas como cristãos, assíduos em cultos, estudando Bíblia, sem nunca conseguirem vitória sobre pecado. 
      Deus não santifica ocioso, e com ocioso não me refiro a vagabundo que não trabalha secularmente, me refiro a não fazer a real vontade de Deus. Muitos trabalham e trabalham e permanecem ociosos, porque desobedecem a Deus, fazem tudo, menos o que de fato Deus quer deles, esses nunca provarão santidade. Deus limpa instrumento útil para que seja mais útil, “toda a vara em mim, que não dá fruto, a tira, e limpa toda aquela que dá fruto, para que dê mais fruto” (João 15.2), assim, se estiver sobrecarregado e não conseguir ser santo não jogue a culpa no trabalho, mas em tua teimosia. 
      Superar ansiedade, gula, sensualidades, traições, invejas e vícios, é santidade. Ter paciência com as pessoas, suportar suas fraquezas, não querer fazer justiça com as próprias mãos, é santidade. Não segurar pensamentos sujos e violentos, de autocomiseração e de orgulho, é santidade. Acalmar os sentimentos e os pensamentos, buscar todos os dias uma experiência viva de oração, quando se ouve uma palavra do Senhor e então pode-se repousar em paz, é santidade. Não se acomodar com o pecado, persistir nisso até o final, ser puro mesmo se ninguém vê, é santidade que pode ver a Deus.

17. As coisas do alto

      “Portanto, se já ressuscitastes com Cristo, buscai as coisas que são de cima, onde Cristo está assentado à destra de Deus. Pensai nas coisas que são de cima, e não nas que são da terra; porque já estais mortos, e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus.”
      “Mortificai, pois, os vossos membros, que estão sobre a terra: a prostituição, a impureza, a afeição desordenada, a vil concupiscência, e a avareza, que é idolatria;” “despojai-vos também de tudo: da ira, da cólera, da malícia, da maledicência, das palavras torpes da vossa boca.” 
      “Revesti-vos, pois, como eleitos de Deus, santos e amados, de entranhas de misericórdia, de benignidade, humildade, mansidão, longanimidade; suportando-vos uns aos outros, e perdoando-vos uns aos outros, se alguém tiver queixa contra outro; assim como Cristo vos perdoou, assim fazei vós também. E, sobre tudo isto, revesti-vos de amor, que é o vínculo da perfeição.
      E a paz de Deus, para a qual também fostes chamados em um corpo, domine em vossos corações; e sede agradecidos. A palavra de Cristo habite em vós abundantemente, em toda a sabedoria, ensinando-vos e admoestando-vos uns aos outros, com salmos, hinos e cânticos espirituais, cantando ao Senhor com graça em vosso coração.”  
Colossenses 3.1-3, 5, 8, 12-16

      Coisas que são de cima, o que entendemos com isso? A primeira coisa que nos vem à mente é santidade, pensar nas coisas do alto, nas coisas de Deus, não nas de baixo, do mundo, portanto, coisas espirituais, santas. O que entendemos como coisas santas? O senso comum alia santidade à abstinência ou controle dos prazeres e dos impulsos do corpo físico, como não fumar, não consumir bebidas alcoólicas, não usar drogas ilícitas, não adulterar, não se prostituir, não matar, não roubar, dentre outros pecados. 
      Apesar de quase dois mil anos do evangelho de Cristo no mundo, ainda temos uma visão da velha aliança de Moisés, da Lei judaica, dos dez mandamentos, sobre santidade, assim, uma ótica dos efeitos externos e não das causas interiores. Dessa forma pensar nas coisas de cima seria não pensar nos prazeres do corpo e pensar em Deus, principalmente louvando-o. Mesmo muitos que exercem os dons do Espírito, preferem adoração que palavras de sabedoria, acham que ser santo é adorar a Deus, não conhecê-lo.
      Vida de consagração e oração é vista pela maioria basicamente como louvar a Deus, por isso música como louvor tem feito tanto sucesso nas últimas décadas em cultos evangélicos, mais até que o estudo da Bíblia. Esse entendimento é transportado para a eternidade, para muitos o céu será um espaço para adoração, assim, a vocação mais alta de Deus aos homens é para serem eternos coristas num coral celestial. Mas será que as coisas que são de cima, que santidade, que a eternidade, são de fato isso, ou só isso? 
      De maneira alguma estamos menosprezando a importância do louvor, principalmente porque junto do amor, gratidão é a maior virtude que podemos expressar, amor e gratidão terão poderosa utilidade mesmo na eternidade. “Perseverai em oração, velando nela com ação de graças” (Colossenses 4.2), louvor a Deus é importante como preparação e vigilância, assim, antes de receber a palavra de Deus, louve-o, e depois de receber, continue louvando. Adoração nos mantém em conexão com o Deus Altíssimo pelo Espírito Santo.
      Contudo, uma visão errada limita, e é errada porque usa referências das coisas de baixo, do mundo, ainda que confessando o nome do pai, do filho e do Espírito. Por isso muitos veem eternidade como os períodos de excelência dedicados a Deus na Terra, missas e cultos, só que mais duradouros. Para católicos a eternidade pode ser uma missa eterna, para protestantes tradicionais, um longo estudo teológico, para evangélicos, um período de louvor sem fim, para carismáticos, êxtases ilimitados em línguas estranhas.
      A verdade é que o homem não tem capacidade para acessar as “coisas do alto”, e muitos que tentam o fazem usando referências de religiões, que se desviaram do evangelho original calando o Espírito Santo ou experimentado-o limitadamente. Acessar as coisas de cima só o Espírito Santo pode, assim nós podemos se entramos em sintonia com o Espírito. Se sozinhos não podemos nos mover para Deus, pegamos “carona” no Espírito, que nos leva a Jesus e que nos dá acesso ao Altíssimo, nenhum outro “espírito” pode fazer isso.
      Só depois que entendemos o “como” é que podemos entender o “o quê”. O que o Espírito Santo nos permite buscar e pensar das coisas lá de cima? Não são “nãos”, mas “sins”, ser santo não é saber o que não se pode fazer, mas entender o que se pode fazer e estar tão satisfeito com isso que o que não se pode fazer perde a graça. Posso beber uma dose de scotch doze anos envelhecido? Posso, não é pecado. Mas quando nos posicionamos pelo Espírito Santo nas coisas que são de cima achamos prazer nisso? Não. 
      Uísque foi só um exemplo, poderia citar outros prazeres deste mundo, ocorre que entendendo coisas do alto como “nãos”, muitos lutam contra os prazeres e perdem. Não se pode vencer algo que é agradável aos nossos sentidos físicos, o que se pode é provar algo melhor, o melhor está lá em cima, com Deus por Jesus e através do Espírito Santo. A única coisa que vence a morte é a vida, a matéria existe para morrer, só no Espírito Santo há vida, que nos liberta das coisas de baixo e nos posiciona nas coisas de cima. 
      As coisas que são de cima na verdade são uma única coisa: a palavra de Deus. Essa não importa como chega a nós, pela Bíblia, por um testemunho, por uma música, por línguas estranhas, por profecia, por uma visão, por um sussurro inexprimível, por um sentimento inefável, mas que depois nossa mente esmiuça o significado, no nível intelectual que cada um de nós tem. Esse conhecimento, que começa puramente espiritual e acaba racional, nos vivifica, consola, cura, apazigua nossa alma de maneira singular. 
      Nós, protestantes, costumamos ter uma noção, que não digo que é errada, mas que é limitada do que seja a palavra de Deus, pensamos que é só a Bíblia. O termo é citado no antigo testamento, mas aos homens daquele tempo significava a Lei de Moisés, por outro lado o termo é citado no novo testamento, mas escrito num tempo que não se tinha em mãos a Bíblia que conhecemos hoje. Palavra de Deus é a pessoa do Espírito Santo, que inspirou escritores bíblicos, mas que nos fala ao vivo hoje quando paramos e ouvimos.
      Sim, meu querido, você pode buscar e pensar nas coisas que são de cima da tua maneira, do jeito que você sabe e se sente melhor, mas entenda que pedidos e agradecimentos não são o fim, andar por uma pista de mão única, mas o começo, só parte do processo. Há uma outra via, com mão contrária, e se tua busca e tua intenção forem humildes, sinceras e crédulas, Deus te responderá pelo Espírito Santo. Então, você achará a vida eterna espiritual maior, que te dará as condições melhores para vencer as coisas de baixo.
      A primeira parte do processo é humana, exige esforço emocional e limpeza moral, que depois conduz ao silêncio de alma que espera com olhos e ouvidos espirituais abertos. A segunda parte é divina, nessa recebemos a “palavra viva de Deus”. Essa “palavra” não é só palavras e frases racionais, é vida eterna, que desce até o homem como um poderoso facho de luz muito clara e pura, emanada diretamente do Altíssimo. Essa é a coisa do alto que entrega ao homem santidade verdadeira, de dentro para fora, de cima para baixo.

18. O invisível no escuro

      “Assim como o cervo brama pelas correntes das águas, assim suspira a minha alma por ti, ó Deus! A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo” Salmos 42.1-2b

      Ter uma experiência eficiente de diálogo com Deus permite respiração espiritual de forma profunda, que renova o corpo e nivela o espírito com o melhor de Deus. Esse tema tem que ser falado aqui sempre, já que muitos perdem a luta contra as diárias tentações do pecado, assim como nunca superam as provações existenciais mais importantes, simplesmente porque não são alimentados adequadamente em bons períodos de orações com Deus. 
      Procure um lugar escuro e silencioso, pare, se acalme, se limpe e preste atenção, olhe o invisível, Deus pode ser visto mais claramente nele. O mundo espiritual se vê com olhos espirituais, anulando-se o máximo possível distrações e interferências materiais e morais. Fechando os olhos podemos fazer isso, mas de olhos abertos é ainda melhor. Os antigos faziam isso à noite e sobre os montes, buscar o Senhor assim é uma experiência libertadora. 
      Muitos cristãos amam a Deus, o adoram, oram a ele, mas são crianças em experiências espirituais, porque não se dão ao trabalho que outros homens se dão. Isso não impede a humanidade de ter comunhão e ser abençoada por Deus através do cristianismo, mas entrega uma experiência espiritual menor, que se fosse expandida traria aos seres humanos paz e elevação moral superior. A aventura de ver o invisível no escuro é poderosa. 
      Enquanto espera Deus falar, adore o Senhor, mas discretamente, sem estressar seu corpo, descansando-o, deixando que suas emoções e pensamentos adquiram leveza e se deitem. Isso elevará teu espírito, permitirá que ele voe nas asas do Santo Espírito até às regiões espirituais mais altas em Cristo, então chegue à mente de Deus. Se fizer certo, em santidade e humildade, no momento aprovado por Deus, verá o invisível no escuro e será iluminado. 
      Antropomorfizando Deus, algo não totalmente adequado, mas metaforicamente didático, entendemos que o “coração” de Deus ama todos sempre, suas “mãos” acolhem os humildes que o buscam, seus “pés” pisam as regiões, terrestres e celestes, e tomam posse daquilo que é para ser nosso, mas sua “mente”, como num corpo humano, é o lugar mais alto. Na “mente” de Deus temos acesso aos  pensamentos do Altíssimo, conhecimentos exclusivos. 
      Não pense que esses conhecimentos são revelações de mistérios do universo, até são, mas esses pensamentos não são fáceis, nem para todos. Para mim e para você, em nosso dia a dia, podem ser palavras simples, uma frase curta, que num momento de angústia, onde achamos que a solução de um problema é impossível, dizem somente, “descansa e espera”. Parece pouco? Mas se forem palavras que vêm da “mente” do Senhor bastarão.
      Receberemos esse conhecimento embebido de uma unção tão forte que nos dará paz imediata, porque contém a vontade direta de Deus para aquele momento de nossa vida. Ah, se pudéssemos ver todos os “anjos”, seres espirituais de luz, que se aproximam de nós para nos consolar, limpando nossas mentes, libertando nossas emoções. Nesse momento os “braços” do Senhor nos abraçam, com um afeto que ninguém pode nos dar. 

      “Ora, ao Rei dos séculos, imortal, invisível, ao único Deus sábio, seja honra e glória para todo o sempre. Amém.” I Timóteo 1.17 

19. O que é espiritualidade?

      “Mas, como está escrito: As coisas que o olho não viu, e o ouvido não ouviu, e não subiram ao coração do homem, são as que Deus preparou para os que o amam. Mas Deus no-las revelou pelo seu Espírito; porque o Espírito penetra todas as coisas, ainda as profundezas de Deus. Porque, qual dos homens sabe as coisas do homem, senão o espírito do homem, que nele está? Assim também ninguém sabe as coisas de Deus, senão o Espírito de Deus.”
      “Ora, o homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente. Mas o que é espiritual discerne bem tudo, e ele de ninguém é discernido. Porque, quem conheceu a mente do Senhor, para que possa instruí-lo? Mas nós temos a mente de Cristo.”
  I Coríntios 2.9-11, 14-16

      Para a doutrina cristã protestante espiritualidade é a pessoa do Espírito Santo nos homens, permitida pela conversão a Cristo salvador, para se tornar meio para acessar Deus pela porta que é Jesus espiritual no céu. Jesus é começo e fim, o Espírito Santo é o único meio, Deus é tudo em todos e suas virtudes mais altas são o objetivo da espiritualidade cristã. O texto inicial diz que quem sabe de Deus é seu Espírito, assim não é a religião ou costumes religiosos que fazem de um ser humano possuidor de espiritualidade, mas a liberdade que o Santo Espírito tem nele para conectá-lo a Deus. 
      O texto diz mais, sem o Espírito de Deus o homem é um ser “natural”, toda a humanidade está originalmente nessa condição, nela o ser é incompatível para entender a espiritualidade mais elevada de Deus, ainda que tenha conexão com “outros” espíritos, porque só o Santo Espírito nos dá a “mente de Cristo”. Não basta o corpo, os sentimentos e mesmo os pensamentos experimentarem conhecimentos espirituais, o homem precisa provar uma metamorfose que transforma sua mente natural em “mente de Cristo”, só assim poderá conhecer a verdadeira espiritualidade e praticá-la. 
     Espiritualidade, termo usado por pessoas e religiões diferentes para referirem-se a coisas semelhantes, mas não exatamente iguais. De maneira geral o termo refere-se a valores espirituais, uma parte do ser humano que opõe-se à matéria, que não pode ser percebida puramente pelos sentidos físicos, que não pode ser provada cientificamente, que é eterna, que dialoga com o divino. Refere-se também a capacidades e talentos que seres humanos têm para se comunicarem com o plano espiritual, e nisso pode não existir qualidade moral, já que no mundo espiritual podem existir deuses, divindades, entidades, potestades, anjos, arcanjos, demônios, e como creem muitos, espíritos de pessoas mortas, dentre outros seres espirituais. 
      O cristianismo tradicional usa o termo espiritualidade para definir a boa espiritualidade, já que para ele só com essa é autorizado ao homem ter comunhão especificamente com Deus pai, Deus Espírito e Deus filho, Jesus Cristo. Para a doutrina protestante os seres humanos não devem tomar iniciativa de fazer conexão mesmo com anjos, os bons seres espirituais. Para a doutrina cristã protestante em espiritualidade implica contato com bons seres espirituais, assim o termo está ligado a boa moral, virtudes morais, santidade, justiça, amor etc, já vícios e pecados estariam ligados à ausência de virtudes e moralidade, assim para o meio cristão se não há Deus, não há espiritualidade, quem não tem moral não é espiritual.
      A religião espírita, o kardecismo ou espiritismo, é mais humanista, entendendo espiritualidade como elevação moral do indivíduo, dependendo dele construir sua graduação espiritual, assim ser espiritual é adquirir virtudes e virtudes expressas em obras. Para o espiritismo ser espiritual está mais ligado ao que o homem faz do que ao que ele crê, não se é espiritual porque se é cristão e se adora a Deus, mas porque se tem uma vida prática de caridade, justiça e santidade, e principalmente de caridade, servindo o próximo em amor. Se para o cristão tradicional ser espiritual é relacionar-se com Deus pela fé, para o espírita relacionar-se com o próximo em amor é o que de fato evidencia espiritualidade, e isso não é mais fácil, é mais difícil. 
      Não vou refletir sobre outras críticas que o cristianismo tradicional faz ao kardecismo, não é o ponto deste texto. Contudo, é justamente aquilo que o protestantismo considera falta de espiritualidade, ou seja, comunicação com mortos e reencarnação, vendo um como contato com anjos caídos e o outro como negação da salvação gratuita pela fé em Cristo, que o espiritismo considera pontos de espiritualidade, ou seja, mediunidade que ensina e evolução por mérito próprio. Será que os evangélicos não deveriam considerar o fato de que muitos que eles acham ter ligações com Satanás, possuirem em suas vidas práticas virtudes morais e obras reais de amor, para então reavaliar seus conceitos de espiritualidade?
      Esse entendimento do que é espiritualidade foi introdução para o ponto desta reflexão, que é uma pergunta: qual é a essência de Deus? Muitas linhas religiosas ou metafísicas, entendem Deus como uma luz, ou como uma frequência muita alta, como uma onda, ou mais, como uma energia. Nem vou afirmar que Deus não possa ser percebido pelos nossos sentidos físicos, impressionados por nossos espíritos, dessa maneira. Como não podemos ver e ouvir Deus diretamente por nossos sentidos físicos, que recebem um eco daquilo que nossos espíritos percebem e tentam fazer uma interpretação grosseira disso, quando oramos ao invisível podemos sentir o Espírito Santo como uma luz, como um som, mesmo como uma energia. 
      Apesar de crer que a humanidade chegará num tempo onde muita coisa que se considera parte do mundo espiritual poderá ser comprovado pela ciência, um momento onde religião e ciência não serão mais oponentes, mas amigas, pessoalmente não considero adequado considerar as coisas espirituais como elementos e eventos inteligentes mas desprovidos de virtudes morais. Ainda que possamos perceber Deus como uma luz claríssima, é uma luz provida de amor, santidade e principalmente de extrema empatia com o ser humano, por isso Jesus homem é e sempre será a expressão mais completa de Deus que a humanidade conheceu. Se Deus se mostrou como Jesus, ter espiritualidade é ser como Jesus, não como uma energia. 
      Ainda que sinceros e bem intencionados, os que tentam ver Deus, seres espirituais e comunicações com esses, só como um estudo científico, se possível para obterem comprovações materiais, mapeando as partes invisíveis do ser, alma, espírito, perispírito, fluídos espirituais etc, podem até conhecer a Deus, mas só seu “corpo”, não seu “espírito”. Um médico pode definir o ser humano como ossos, nervos, veias, órgãos, membros, carne e pele, mas todo esse conhecimento não curará depressão e insanidade, contudo, alegria, esperança, paz, podem harmonizar não só o corpo físico, mas também o espirito. Deus está em todo o universo, visível e invisível, conhecer isso é bom, mas só tem vida eterna quem conhece sua essência.
      Deus nos atrai com amor, para que sejamos santos respeitando nossas idiossincrasias, isso é um contato pessoal e afetivo buscando nosso aperfeiçoamento moral. Não é como o de um transmissor de ondas para um receptor, como de uma emanação de luz para uma área escura, de um raio do céu para um campo vazio, mas como o apelo carinhoso de um pai para um filho, respeitando todas as imperfeições desse filho. Não precisamos entender intelectualmente como isso acontece, por isso a fé é tão enfatizada no evangelho, basta-nos crer, e isso qualquer ser humano, indiferente de sua cultura, educação ou posses, pode fazer. A espiritualidade mais elevada se manifesta com simplicidade, traz paz e nos faz seres humanos melhores.

20. Instantânea ou gradativa?

       “Disse-vos isto por parábolas; chega, porém, a hora em que não vos falarei mais por parábolas, mas abertamente vos falarei acerca do Pai. Naquele dia pedireis em meu nome, e não vos digo que eu rogarei por vós ao Pai; pois o mesmo Pai vos ama, visto como vós me amastes, e crestes que saí de Deus. Saí do Pai, e vim ao mundo; outra vez deixo o mundo, e vou para o Pai.” João 16.25-28
 
      “Aquele que perseverar até ao fim será salvo” (Mateus 24.13), essa afirmação é repetida várias vezes no novo testamento, entendemos por ela que salvação ou espiritualidade não é algo que se obtém instantaneamente, mas através de persistente trabalho. “Crê no Senhor Jesus Cristo e serás salvo” (Atos 16.31a), nesse texto, contudo, podemos entender diferentemente, que quem crê é instantaneamente salvo, assim possui salvação ou espiritualidade baseada numa decisão inicial de fé, não por contínuas obras no tempo. Seriam salvação e espiritualidade a mesma coisa para o cristianismo tradicional? Isso pode ser concluído quando se entende que só o salvo terá direito eterno ao céu, efeito final daquilo que o cristianismo considera espiritualidade. 
      A Bíblia possui ensinos contraditórios, apesar de muitos teólogos não admitirem, e nisso nada há de excepcional, como poderiam homens de tempos, lugares e níveis intelectuais diferentes, interpretarem espiritualidade da mesma forma? Prefiro entender que Deus permite ensinos em alguma instância distintos, para que não se use a Bíblia como leis, que devem ser obedecidas ao pé da letra, mas para que o homem atual, e do futuro, possa aprender com experiências dos antigos sob interpretação viva do Espírito Santo, conhecendo a verdade com questionamentos racionais e perseverante vida de oração. Fé é trabalho constante, o tempo todo nossa fé é confrontada, largamos mão dela e voltamos a senti-la com fervor mais vezes que assumimos.
      O texto bíblico inicial ensina-nos alguns princípios importantes sobre a espiritualidade verdadeira, não necessariamente a das religiões, mas a de Deus. Um deles é que Deus revela-nos espiritualidade de forma gradativa, assim Jesus disse verdades eternas, mas muitas delas, por causa dos níveis moral, intelectual e espiritual do homem do primeiro século, assim como de muitos homens dos séculos futuros a esse e mesmo do século atual, através de parábolas. Comparemos essas parábolas às estórias que contamos a crianças, existe uma interpretação ao pé da letra dessas estórias, benéfica para a criança e que ela entende sem muitos esforços, mas existe uma interpretação mais profunda que ela só entenderá quando crescer e amadurecer.
      Por trás de chapeuzinho vermelho, da floresta, do lobo, do caçador e da vovozinha, existe muito mais que um conto de fadas infantil (pesquise na internet e achará muitas interpretações desses simbolismos), assim há muito mais por trás das parábolas de Jesus. Mas Cristo disse que na hora certa não usaria mais de parábolas, porque não precisaria usar mais, para que ele não precisasse usar mais esse recurso duas coisas tinham que acontecer, o ser humano estar preparado e uma ferramenta mais adequada para isso estar disponível. Essa ferramenta não poderia ser Jesus, seu ministério como homem foi curto, a ferramenta é o Espírito Santo, que permite mesmo no mundo, que Deus fale ao ser humano de maneira mais profunda.
      Por não aceitar que espiritualidade é experiência gradativa (já refletimos em Uma espiritualidade gradativa), é que religiões são criadas e que homens são amarrados a conhecimentos iniciais, ainda que tenham direito à espiritualidade mais alta. Por isso textos bíblicos são idolatrados, quem não tem a viva palavra do Espírito precisa de leis em papel para ter um guia, mas é também por isso que dogmas e tradições são construídos, prendendo os homens a uma liberdade restrita que não deixa o Espírito Santo agir e que não coloca em risco o poder de manipulação dos líderes. Não é só na religião que essa estratégia é usada, pela política também se mantém pessoas com pouca escolaridade na sociedade para que não saibam votar certo.
      Mas no texto bíblico inicial é na seguinte parte que algo importante sobre espiritualidade é revelado, “não vos digo que eu rogarei por vós ao Pai, pois o mesmo Pai vos ama, visto como vós me amastes”. Pode-se interpretar esse texto simplesmente entendendo que se referia só aos discípulos que andaram com Cristo no mundo, que Jesus só estava dizendo que não poderia mais interceder por eles, como fazia, porque morreria, mas que continuaria fazendo isso no plano espiritual. Contudo, podemos entender algo mais profundo, e de uma forma mais ampla, que homens de todos os tempos chegarão a níveis espirituais onde terão acessos mais diretos a Deus, quando poderão nem necessitar de certas ajudas de Deus. 
      Jesus diz que não pedirá a Deus pelos homens, mas Deus os responderá pelo amor que eles deram a ele como filho de Deus. Jesus será sempre um meio único para nos achegarmos a Deus, “naquele dia pedireis em meu nome”, mas não da maneira que muitos acham que é. Levanto uma questão: Jesus é o meio, por nos mostrar como fazer, ou por ter feito por nós? Na verdade é as duas coisas, ele fez o que não poderíamos fazer colocando-se numa posição espiritual que nos dá acesso a Deus de forma exclusiva, mas isso é só o primeiro passo da espiritualidade. Os outros passos, usando a força que o primeiro passo dá, que nos permite ter a paz dos perdoados (Romanos 5.1), são para trabalharmos neste mundo e crescermos. 
      Paz é fundamental, já que muitas vezes o que nos impede de prosseguir para construir um futuro melhor, é a culpa pelo que fizemos no passado. Jesus nos dá perdão de Deus no presente, retira a condenação da lei que mostra onde erramos, mas não nos capacita para acertar. Contudo, trabalhar para sermos alguém melhor no mundo é algo que depende só de nós, nisso não estamos sozinhos. Está conosco hoje no mundo o Espírito Santo, é esse em nós que nos dá a possibilidade de nos movermos espiritualmente e diretamente para a porta, que é Jesus, para termos acesso a Deus. Fé não transforma, nos posiciona nas virtudes espirituais mais altas de Deus para que nos transformemos neste mundo através de boas obras.
      Por qual razão sinto de Deus que é tão importante entendermos isso? Porque uma doutrina, no mínimo infantil e no máximo mal intencionada, tem mimado os cristãos, acomodando-os e limitando-os, o resultado é uma grande maioria de cristãos imatura espiritualmente, escravizada a superstições e presa fácil de heresias e de homens maus. Aceitar algumas coisas só pela fé pode alimentar e legitimar preconceitos, como por exemplo achar que quem crê vai para o céu, e que quem não crê vai para o inferno, extremos opostos e eternos, desconsiderando prática de vida, e só levando em consideração aceitação de um credo religioso pela fé. Será que isso basta para salvar e condenar para sempre, para definir espiritualidade? 
      Um filho que recebe uma enorme herança não se esforçará para trabalhar, para quê? Já tem tudo o que precisa de graça? É isso que falsas doutrinas evangélicas têm feito por séculos a muitos homens, e não venham com o argumento que enaltece a graça e a misericórdia de Deus. Nenhum pai se alegra com filhos que crescem no corpo, mas não na responsabilidade, que não adquirem independência para saírem do lar paterno para terem seus próprios lares, por que Deus desejaria isso para seus filhos? Mas a Igreja Católica e as denominações protestantes e evangélicas querem filhos infantis para que possam controlar e usar. Tenhamos, pois, coragem para romper com cordões umbilicais, então adquirirmos espiritualidade. 

21. Dimensões de Deus

      “Tenho posto o Senhor continuamente diante de mim; por isso que ele está à minha mão direita, nunca vacilarei.” Salmos 16.8
      “Levantarei os meus olhos para os montes, de onde vem o meu socorro. O meu socorro vem do Senhor que fez o céu e a terra.” Salmos 121.1-2

      Deus tem dimensões? Comprimento, largura, altura, podemos ver Deus assim? Na verdade Deus não pode ser medido, ele é infinito em todos os sentidos, mas podemos interagir com Deus olhando-o assim. O comprimento é a dimensão que mais usamos, ele é horizontal assim o experimentamos principalmente quando buscamos de Deus coisas materiais, para nossos corpos neste mundo. Para isso cremos que Deus é todo-poderoso para nos dar algo, que é dono de tudo e que por isso não precisamos temer homem, mesmo que seja proprietário de muitas coisas e que se considere grande e rico. 
      É mais fácil para nós enxergarmos o comprimento da atuação de Deus, porque é uma dimensão que para nós se manifesta no plano físico, ainda que seja expulsando seres espirituais do mal (o diabo e os demônios) de regiões espirituais. Enxergarmos uma largura na atuação de Deus também não é algo difícil para a maioria dos seres humanos, ainda que seja menos experimentado por muitos. Se no comprimento há coisas materiais no presente, a largura envolve o futuro, assim, não só matéria, mas tempo, contudo, ainda assim a maioria crê num Deus largo e Senhor do tempo para ter coisas materiais. 
      Vermos a largura de Deus é entender que ele não faz e não dá-nos coisas aqui e agora, mas que pode fazer isso mais à frente, no futuro, e isso com uma finalidade melhor para nós. Temos mais dificuldades para esperar, para administrar tempo, somos ansiosos, imediatistas, míopes para ver um pouco adiante de nossos olhos físicos, isso nos impede de crescer numa das virtudes que mais nos amadurecem, a fé. Acreditar num Deus que pode tudo e nos dá agora não exige tanta fé, mas ter que aguardar, confiar que Deus nos dará algo depois e que enquanto isso temos que esperar em paz requer mais fé. 
      Para ver o comprimento basta olharmos à direita e à esquerda, para vermos a largura olhamos para frente (ou para trás), mas uma experiência com a terceira dimensão requer olhar para o alto. Altura é a dimensão mais espiritual, nela não só fé é pré-requisito, mas também maturidade espiritual, que abre mão da matéria e deseja uma experiência moral com Deus. Na velha aliança, Israel tinha mais experiências com o comprimento e a largura da atuação de Deu neste mundo, mas na nova aliança do evangelho de Jesus, a Igreja é chamada para conhecer a altura espiritual e eterna de Deus. 
      Assim chegamos ao ponto desta reflexão, uma pergunta: qual a altura do teu Deus? Se ela for baixa, ainda que entendamos e queiramos um Deus espiritual, nossa vida estará presa aos valores deste mundo, e em termos espirituais práticos poderemos estar mais susceptíveis a relações com seres espirituais inferiores, do mal. Fica difícil o Esprito Santo atuar em templos humanos que não elevam seus olhos para o alto, que até creem em Deus, mas vivem focando seus espíritos em coisas, valores, regozijos baixos, deste plano. Somos levados para onde nossa fé olha, limitados por ela, não por Deus.
      Quando somos vencidos por tentações inferiores, aquelas que todos em todos os lugares sofrem, nosso olhar espiritual está colocado num ponto baixo do gradiente espiritual, assim os desejos físicos mais baixos e instintivos nos dominam com facilidade. Esses desejos não são errados em si mesmos, mas devem ser dominados, para sabermos quando, como e com quem, se for o caso, devem ser saciados. Isso se refere aos apetites do corpo de maneira geral, como fome, sede e sexo, mas também outros elementos que se consumidos nos dão alguma sensação de bem estar, como drogas e bebidas alcoólicas.
      Outra espiritualidade baixa que pode nos aprisionar atua diretamente em nossos pensamentos, além de fantasias sobre os desejos básicos falados anteriormente, estão também devaneios de ódio, vingança, ciúmes, e nesses podem agir sobre nós diretamente seres espirituais do mal, que pegam carona nas tendências de pensar bobagens que todos nós temos. Não se engane, ninguém que esteja com a cabeça cheia de sensualidades e de homicídios, será templo do Espírito Santo, mesmo que a boca fale de Bíblia sua “unção” será carnal e maligna, capacitada por demônios, não por Deus. 
      Por outro lado, e isso digo principalmente a cristãos tradicionais cheios de preconceitos, a mesma coisa que Jesus disse a líderes religiosos judeus do primeiro século (João 10.19-21). Casa limpa abriga o Espírito Santo, e se além disso as palavras forem sábias e as obras forem de amor, como dizer que os olhos espirituais não estão focados nas regiões espirituais mais elevadas? Colocando alguém em contato com Deus e sendo instrumento dele, ainda que não seja protestante ou evangélico? Podemos até não entender certas coisas, crermos diferente, mas nesse caso é melhor nos calarmos que julgarmos.
      Não nos enganemos, assim como Deus pode estar longe de muitos pregadores e cantores em púlpitos, ainda que obedeçam à risca protocolos de uma igreja, Deus pode ser amigo íntimo de outros religiosos, que muitos cristãos aliam ao diabo. Que altura tem meu Deus? A altura de Jesus, essa é a resposta, quem colocar os olhos realmente em Jesus estará protegido de todo engano, de toda potestade e principado do mal. Eis a razão do cristianismo permanecer útil à humanidade por tanto tempo, mesmo em meio à tanta corrupção do catolicismo. Deus não despreza quem chega a ele por Cristo. 
      Quando orar erga teu rosto, ainda que esteja num pequeno quarto, no escuro ou com os olhos fechados, imagine-se olhando para as regiões espirituais mais altas, e creia, isso não é só uma questão de fantasia mental, mas é uma postura espiritual que foca os olhos espirituais no Altíssimo. Isso tira de nós uma atitude corajosa de fé, que já nos posta, ainda que com humildade e temor e Deus, como vitoriosos, isso ergue nossos pensamentos e sentimentos de coisas baixas, de ressentimentos, de pecados, de descrenças, e nos posiciona em Deus. Faça isso tendo no espírito as palavras, “em o nome de Jesus”.

22. Não acredite em tudo

      “E olhei eu para todas as obras que fizeram as minhas mãos, como também para o trabalho que eu, trabalhando, tinha feito, e eis que tudo era vaidade e aflição de espírito, e que proveito nenhum havia debaixo do sol. Então passei a contemplar a sabedoria, e a loucura e a estultícia. Pois que fará o homem que seguir ao rei? O mesmo que outros já fizeram. Então vi eu que a sabedoria é mais excelente do que a estultícia, quanto a luz é mais excelente do que as trevas.” Eclesiastes 2.11-13

      Reputações são construídas e destruídas, conforme a conveniência de alguns, assim, não acredite nem em santos, nem em fascínoras, poucos de fato são tão bons como dizem ou tão maus como afirmam. Os seres humanos têm a tendência de acreditarem em extremos, isso tem a ver com a necessidade legítima que eles possuem de ter comunhão com Deus, o único ser de fato absoluto. Contudo, mal resolvida essa necessidade, saímos pelo mundo à caça de quem possa ocupar lugares extremos dentro de nós. 
      Quem muito idolatra, muito odeia, e quem idolatra e odeia demais é porque não ama corretamente a Deus. Amar a Deus é remédio para muitos males. Isso não deveria ser opcional, ainda que o próprio Deus dê livre arbítrio aos homens para isso, mas deveria ser imprescindível, cura para não se amar ou se odiar extremamente quem não merece nem uma coisa, nem outra. Idolatrar e odiar não são só consequências de falta de amor a Deus, é ser manipulado por quem inventa mentiras para que acreditemos e lucre com isso. 
      Contudo, amamos e odiamos equivocadamente não só porque cremos em mentiras, mas também porque muitas vezes julgamos só pela aparência. Você já deve ter tido a experiência de ver uma pessoa pela primeira vez e não se simpatizar com ela, mas depois, conhecendo-a melhor, perceber que ela é, na verdade, profunda e confiável. Por outro lado, muitos que amamos à primeira vista, depois vemos que são pessoas superficiais, pouco confiáveis. Precisamos de tempo para não julgar alguém equivocadamente.
      No mundo atual temos que tomar muito, mas muito cuidado com a internet, no afã de quererem divulgar novidade, novidade vende mais, muita mentira é inventada. Saber de fato o que é verdade é difícil no mundo virtual, e isso muda de um dia para o outro. A humanidade sempre foi assim, no Egito antigo, quando um novo faraó tomava o poder, ele destruía o legado do anterior, caso fosse seu inimigo, novos deuses eram eleitos, novos monumentos eram erguidos, uma nova memória era construída.
      Quem frequentou os ensinos fundamental e médio na década de 1970, lembra-se da matéria “Educação, Moral e Cívica”, onde aprendíamos sobre símbolos e heróis nacionais. Eram os heróis eleitos pelo governo federal vigente, militar e de direita, muitos nomes que ficaram em nossas memórias hoje sabemos que não eram tão heróis assim. Os heróis de hoje são os vilões de amanhã e vice-versa, a história não é uma ciência exata e é sempre contada pelos vencedores, ou os que detêm principalmente o poder econômico. 
      O autor de Eclesiastes está certo quando diz que tudo é vaidade, passageiro, não confiável. Verdades maiores não têm prazos de validade, uma molécula de água, por exemplo, é composta por dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio, isso não vai mudar. E as pessoas, o que elas são? Aí é mais complicado, nem elas sabem o que são, passamos a vida tentando descobrir quem somos, e muitas vezes enganamo-nos e aos outros com muita habilidade. Por isso não se pode santificar uns e demonizar outros, em tudo há exageros. 
      Não acredite em tudo que você vê, ouve, lê ou assiste, creia em Deus, mas ainda assim saiba, a verdade maior de Deus se conhece aos poucos e com perseverança. A insistência faz com que nos preparemos, que mudemos por dentro, para que sejamos moralmente confiáveis para que Deus possa nos revelar mistérios. Contudo, algo é certo, conhecer a Deus é amá-lo cada vez mais, quem ama confia, obedece e não trai, quem conhece a verdade maior do Senhor não perderá tempo idolatrando ou odiando quem quer que seja.

23. Jesus diz a verdade

      “E perguntou-lhe um certo príncipe, dizendo: Bom Mestre, que hei de fazer para herdar a vida eterna? Jesus lhe disse: Por que me chamas bom? Ninguém há bom, senão um, que é Deus. Sabes os mandamentos: Não adulterarás, não matarás, não furtarás, não dirás falso testemunho, honra a teu pai e a tua mãe. E disse ele: Todas essas coisas tenho observado desde a minha mocidade. E quando Jesus ouviu isto, disse-lhe: Ainda te falta uma coisa; vende tudo quanto tens, reparte-o pelos pobres, e terás um tesouro no céu; vem, e segue-me. Mas, ouvindo ele isto, ficou muito triste, porque era muito rico.” Lucas 18.18-23

      Por várias vezes tenho me surpreendido com discursos de maus políticos, por mais que saibamos que são fatos seu crimes, envolvendo corrupção e no governo atual desprezo à ciência, falando em palanques tentam dar argumentos convincentes e emocionados que não erraram. Pegam a exceção e tornam regra, e mesmo que tenham acertado só depois de terem sido muito cobrados, dizem que faziam isso desde o início. É mau caracter ou insanidade? Ambos, falam tanta mentira que acabam acreditando que é verdade.
      Algo que nos protege de egocêntricos gananciosos é não cairmos na armadilha do carisma e da oratória. Não só políticos usam esses dons, advogados e líderes religiosos também podem usar. Essa armadilha foca na forma e não no conteúdo, em como é dito e não no que é feito, na sedução de mostrar e falar o que queremos ver e ouvir, e não aquilo que quem mostra e fala realmente faz. Carisma e oratória em si nada têm de errado, o problema é usa-los para vender mentiras, que beneficiam quem fala, não quem ouve. 
      No texto bíblico inicial, o homem que se apresenta a Jesus é claramente alguém que queria viver religião para se exibir aos homens, não por amar a Deus. Sua intenção errada, assim como uma possível idolatria por Jesus, são delatadas quando ele bajula o mestre, que prontamente discerne isso e o repreende, não se deixando envaidecer pelo elogio do príncipe. Bom, só Deus! Se Cristo não aceitou bajulação, mais ainda nós e mortais que idolatramos podem aceitar. Amemos mais a Deus e deixemos para lá os fakes. 
      Jesus não foi deselegante com quem parecia querer honra-lo, mas ele conhecia o coração do homem, e naquele momento a verdade precisava ser dita porque ela era importante para resolver o principal problema do homem. A clareza de Jesus é certeira, ele foi no ponto e sem perder tempo, o Espírito Santo age assim conosco hoje. Quem tiver ouvidos espirituais, após perguntar a Deus ouvirá uma palavra, ela será imediata e atingirá o alvo, responderá, não necessariamente o que queremos ouvir, mas o que precisamos.
      Não foi Jesus quem procurou o homem, foi o homem quem tomou a iniciativa, mas penso que ele não queria uma orientação, ele queria um reforço para seu comportamento, uma aprovação para seu modo de vida, no fundo ele achava que fazia o suficiente para ser bom. Mas quem quer agradar o homem faz tudo, menos o principal, ele obedecia a lei porque isso os religiosos aprovavam, mas ele tinha um ponto fraco, suas riquezas. O Senhor é especialista em trazer à tona o que escondemos no fundo de nossos corações. 
      Sou a favor de elogio pelas boas ações, penso que ele incentiva as pessoas a seguirem fazendo as coisas certas, ainda que muitos digam que elogio envaidece e pode ser arma do mal. Mas creio que é melhor administrarmos a vaidade, que um elogio legítimo pode trazer, que carência e insegurança, que a ausência do elogio deixa, principalmente em crianças e jovens. Mas na passagem bíblica, o elogio do homem a Jesus revelava algo que não era simplesmente dar honra a quem merece, era algo que não era verdadeiro. 
      Quem elogia inadequadamente quer elogio ilegítimo, o príncipe elogiou Jesus porque queria “confete”. Mas como aprovar modo errado de vida? Jesus não fez isso, ele sempre age com verdade com quem o busca, ainda que isso doa. Jesus não aceitou ser chamado de bom pois quem o disse queria ser chamado assim sem merecer, eis a intenção atrás do elogio do príncipe. Jesus não creu na aparência, nas palavras, nem no elogio, não havia verdade nisso, só na verdade existe o bem e Jesus só queria o bem do homem.

24. O soberbo vive por si

      “Eis o soberbo! Sua alma não é reta nele; mas o justo viverá pela sua fé.” Habacuque 2.4

      O versículo inicial é um que citamos com certa constância aqui, segue mais uma reflexão sobre ele. Para um entendimento melhor, recomendo leitura dos dois primeiros capítulos do livro de Habacuque. No primeiro capítulo o profeta apresenta a Deus sua indignação diante de um povo, seu povo, que vive em desobediência à vontade do Senhor, e ainda assim, aos seus olhos, parece que nada acontece, que nenhuma ação ocorre para que o povo seja disciplinado e mude de atitude. Assim, o texto fala sobre gente vivendo errado, construindo uma prosperidade falsa, baseada em injustiças, mas não sofrendo nada por isso. No capítulo dois está a resposta de Deus para a indignação do profeta revelada no primeiro capítulo. 
      Habacuque 2.4 apresenta dois tipos de pessoas, o soberbo e o justo. O soberbo, ou orgulhoso, é o que confia em si mesmo e em ídolos. Atualmente ídolo pode ser coisas bem diversas, não é só a estátua ou a imagem de um santo, como os evangélicos gostam de dizer. Uso constantemente aqui o termo “ídolo ideológico” para definir um ídolo, não feito de gesso, pedra, madeira, ou desenhado num papel ou em outro material, relacionado a uma pessoa morta que teve alguma relevância numa religião. Ídolo atualmente também não é só estátua ou desenho de entidades espirituais, como os deuses do afroespiritismo, não necessariamente isso, que podem nem ser falsos deuses, podem não ser Deus, mas não são falsos. 
      “Ídolo ideológico” é um ser criado por ideias, nem sempre verdadeiras, muitas vezes só mistificações e superstições, que não tem forma física, mas que é bem definido nas cabeças e nos corações humanos. Esses ídolos podem ser construídos mesmo com ensinos bíblicos, com conceitos aliados até ao Cristo, mas que não são o Jesus espiritual verdadeiro que habita as regiões celestiais mais elevadas e que envia seu Santo Espírito à Terra para ensinar, consolar e guiar os que o buscam. Não que muitos que comecem buscando ídolos não achem o Jesus verdadeiro, Deus é misericordioso, ouve a todos, busca a todos e responde mesmo linhas não tão retas de comunicação. Mas algo é certo, o arrogante quer ídolos, não Deus.
      A obsessão por ter ídolos revela um lado bom do ser humano, sua necessidade de Deus, contudo, se torna algo ruim quando se busca um substituto falso para o verdadeiro Deus, que ao menos aplaque essa necessidade legítima. A sede existe, se não puder ser saciada com água pura e fresca será com qualquer líquido que se achar, mesmo água suja e quente. O arrogante não quer Deus porque sabe que esse lhe mostra verdades que ele não quer assumir, mas ele precisa adorar alguma coisa, todo mundo precisa, por isso que não existe ateu genuíno, só existem idólatras, ainda que sejam da ciência. Coisas físicas resolvem problemas físicos, como a ciência, mas coisas físicas não solucionam questões espirituais ou morais. 
      Sem Deus, ainda que alguém comece moralmente correto, um dia agirá incorretamente, não verá problemas maiores em ser egoísta ou imoral, mesmo que se ache civilizado. Quando não subimos para Deus caímos longe dele, quem acha que não quer Deus porque não quer estar preso a algo que não pode provar materialmente, acaba ficando solto para cair no caos onde não existem referências morais ou espirituais, nem luz mostrando o caminho, só trevas. Dessa forma o soberbo errará e não se dará conta que está errando, verá o coração cauterizar, o espírito gelar, a mente tomada por falsos deuses. Quem idolatra político ou artista se afastou de Deus um dia, assim um ídolo só ocupa um espaço que está vazio.
      O soberbo não vive por fé, mas isso não significa que ele seja desonesto ou vagabundo, ao contrário, ele pode ser mais esforçado e exigente até que o justo. A diferença é que ele vive pelas próprias forças e pelos próprios méritos, assim, ainda que diga crer em Deus, seus frutos serão para sua honra, e ele, soberbo, orgulha-se disso. O soberbo tem dificuldade para amar, para respeitar, ele não tem paciência, mas exige dos outros o que exige de si mesmo. Contudo, o soberbo poderá ser levado a uma queda fatal, que o deixará dependente dos outros e pobre materialmente, para aprender o caminho da humildade, o caminho do amor, o caminho da fé que confia em Deus, glorifica a Deus e se prepara para viver com Deus na eternidade. 

25. O justo vive pela fé

      “Visto que a justiça de Deus se revela no evangelho, de fé em fé, como está escrito: O justo viverá por fé.” Romanos 1.17

      O versículo inicial fala do justo, alguém que antagoniza com o soberbo, citado em Habacuque 2.4. Enquanto o soberbo é materialista, o justo tem uma característica essencialmente espiritual, fé. Viver pela fé não é fácil, é escolha que Deus nos dá num determinado momento de nossas vidas de forma clara, assim todos seremos questionados pelo Senhor se queremos seguir pela fé nele ou sozinhos. Como vimos antes, sozinho ninguém segue, se não se quer Deus, adota-se ídolos. Alguns, dentro de boas igrejas, que iniciaram suas jornadas com sinceridade, num determinado momento são confrontados por Deus com a pergunta: “de agora em diante realmente terá que viver pela fé, você quer?”. Infelizmente muitos respondem não quero.
      Entenda que viver pela fé não se refere necessariamente a dependência de Deus na área material, principalmente para aqueles com chamadas ministeriais. Ocorre também que muitos dizem não, mas não assumem isso, nem para eles mesmos, continuarão em igrejas, se dizendo cristãos, falando e se vestindo como tais, defendendo Bíblia e o cristianismo, mesmo sendo pastores, pregadores, professores, teólogos. Esses são os que constróem “ídolos ideológicos” com cara de Deus, com boca de Deus, com corpo de Deus, mas só ídolos mortos e vazios, sem o Espírito de Deus. Para se viver pela fé tem que ser provado em provas em que não se terá outra saída que não seja crer em Deus, mesmo sem ver, sem ouvir e sem saber.
      O justo viverá pela fé! Por que a virtude justiça está aliada à fé? Podemos dizer, então, que injusto é o que não crê, ainda que tenha outras virtudes. Justiça é respeitar direitos, dar o bem a quem faz o bem e punição a quem não faz, mas mais que isso, o justo faz o bem a todos, e entrega o mau nas mãos de Deus para que faça justiça, não ele. Esse é o conceito de justiça do novo testamento, mas nesse caso alie-se o conceito de justificado por Cristo, assim ainda que não se tenha feito algo certo, se houver fé em Jesus pode-se ser livrado da justiça de Deus. Isso não implica em não colher em alguma instância efeito material ruim de uma causa ruim, ainda que o Senhor em sua misericórdia atenue a disciplina sobre o crente. 
      Mas o mistério por trás de “o justo viverá pela sua fé” de Habacuque 2.4 está em revelar a um povo do antigo testamento a importância da fé sobre as obras. Em outras palavras Habacuque diz, “o justo não é justificado por sua religião, pelos sacrifícios que faz no templo, por obedecer protocolos da Lei de Moisés”, não só por essas obras, mas principalmente por sua fé em Deus. Essa palavra é profética, Habacuque prenuncia o evangelho que oferece salvação pela fé em Jesus, o escritor da carta aos Romanos (Paulo?) estuda minuciosamente essa doutrina, inclusive citando Habacuque. Fé é o início, depois vêm as obras como efeitos dela, ela justifica para que pratiquemos obras, não obras religiosas, mas de virtudes morais. 
      Mesmo muitos cristãos sinceros e crentes, que já provaram ações (aparentemente) extraordinárias de Deus porque creram, não entendem o principal objetivo do Senhor em nos levar a viver pela fé. Deus não pede fé para que tenhamos coisas materiais que não podemos ter, mas para que conheçamos o mundo espiritual mesmo que encarnados no plano físico. O objetivo da fé é vida no Espírito e vai muito além de recebermos um benefício financeiro ou uma cura do corpo, ainda que essas coisas sejam relevantes para nós, e que o Senhor conceda-nos com amor. Quem se “inicia” no caminho da fé experimentará mistérios e terá acesso a conhecimentos especiais, reservados para os que aprendem a usar olhos e ouvidos espirituais. 
      O que nos leva a subir os degraus é a fé, para que atingindo uma posição trabalhemos para anexarmos aos nossos espíritos virtudes morais. Mas depois, novamente, seremos impulsionados por Deus para subirmos para um degrau mais alto, e novamente nos apropriarmos de novos valores morais, assim nos leva o evangelho, de fé em fé. Enquanto o soberbo se acomoda com as riquezas materiais que conquistou no mundo, com as próprias forças e para sua glória, o justo sabe que o caminho é infinito para quem quer espiritualidade eterna. Se a vaidade do mundo amarra, entedia e nunca satisfaz, a aventura espiritual é cada vez mais instigante, o objetivo da fé é cada vez mais elevado e iluminado, o que é bom sempre fica melhor. 

26. Testemunho de milagre

      “Mas tu, quando orares, entra no teu aposento e, fechando a tua porta, ora a teu Pai que está em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará publicamente. E, orando, não useis de vãs repetições, como os gentios, que pensam que por muito falarem serão ouvidos Não vos assemelheis, pois, a eles; porque vosso Pai sabe o que vos é necessário, antes de vós lho pedirdes.” Mateus 6.6-8

      Milagre pode não ser o que se recebe, mas o quando e o como se recebe. Minha família teve recentemente uma experiência abençoada, uma renda que eu tinha estava diminuindo, assim, uma solução viável seria aumentar a renda de minha esposa, para que pudéssemos manter nossa vida financeira em ordem. Minha esposa, que trabalha na área do ensino público do estado de São Paulo, recebeu um convite para um cargo novo que melhoria seus ganhos, mas isso só se realizaria no próximo ano, estávamos ainda em outubro. Eu já estava orando a Deus há algum tempo para que minha esposa tivesse uma evolução profissional, mas naquele mês eu aumentei meu clamor, eu estava bem aflito. 
      Na madrugada de uma segunda-feira para a terça-feira, enquanto eu orava ao Senhor, senti uma conexão forte com Deus, especial, e entendi do Espírito Santo a seguinte palavra: “o que você pede já está sendo feito neste momento”. Pela fé fiquei em paz, confiante que no próximo ano minha esposa teria uma promoção que resolveria nossa dificuldade financeira. Contudo, na terça-feira, ainda pela manhã, minha esposa telefonou me dando a notícia. Uma diretora de uma escola estadual, que estava se tornando escola integral (p.e.i.), tinha ligado para ela naquela manhã, convidando-a para ser vice-diretora e que poderia começar já em novembro, o salário seria maior que o que ela teria no cargo do outro convite.
      Entretanto, algo que a diretora falou nos deixou estarrecidos, ela disse que naquela noite tinha sonhado com minha esposa, vendo-a como a nova vice-diretora da escola. A mulher conhecia minha esposa superficialmente, não eram próximas, nem sabíamos qual sua religião, mas o entendimento que tive foi que no momento em que eu orava, na madrugada, Deus enviou um anjo à casa da diretora influenciando seu sonho. Acredite, meu relato é verdadeiro e fiel, além de minha esposa receber uma promoção profissional, foi melhor que o que esperávamos pelo outro convite e antes do tempo. Era algo impossível? Não, minha esposa tinha as qualificações profissionais adequadas, o milagre não foi o cargo em si.   
      Penso que se nossas vidas não estivessem em comunhão com Deus, se não houvesse em nós um temor para buscar o Senhor com todo o coração e crer que ele poderia atender o pedido, a resposta poderia nem ter sido dada. Não ocorre assim tantas vezes com os seres humanos? Algo parece justo, possível, mas não acontece? Por outro lado, como seres humanos que andam perto de Deus, se nossa oração tivesse sido só burocrática, feita, mas com certa frieza, talvez só tivesse sido respondida no próximo ano. Contudo, a resposta veio antes e melhor, parece que Deus solucionou um problema material, mas também recompensou um amadurecimento espiritual, o milagre foi o quando e o como.
      Tempos depois minha esposa soube que o outro cargo, que tinha sido prometido a ela por uma amiga que a conhecia bem, nem era tudo que achávamos que era. Se tivéssemos nos acomodado com o que pensávamos que era o justo e o possível, talvez tivéssemos ficado sem nada. O viável pode acontecer neste mundo? Pode. É controlado por Deus? É, tudo é. Mas o justo e o possível, por si sós, nos amadurecem espiritualmente? Não. Por isso temo pelos que, ainda que cidadãos honestos e esforçados, só confiam em si mesmos e nos sistemas deste mundo. Viver é mais que administrar o que se vê, o que se pode, o que se constrói com as próprias mãos. Vida eterna é se relacionar com Deus e crescer pela fé. 
      Certas coisas nos pegam de jeito nesta vida, parece que perderemos tudo, que não haverá saída, mas acredite, em Deus sempre há! Grandes provas trazem enormes crescimentos, e faltas significativas são só boas oportunidades de libertação, Deus tira porque não nos faz bem e tem algo muito melhor para nos dar. Não podemos é nos perder, antes, focarmos na oração, ultrapassarmos limites de fé, superarmos a nós mesmos e sem medo avançarmos para o desconhecido. Se Deus manda, Deus capacita, e os maiores desafios o são porque nos colocam diante do que não sabemos, assim, mais confiança em Deus é necessária. Contudo, se formos aprovados, sairemos mais fortes, mais livres, mais felizes. 

27. Milagre: o que é?

      “Ora, àquele que é poderoso para fazer tudo muito mais abundantemente além daquilo que pedimos ou pensamos, segundo o poder que em nós opera, a esse glória na igreja, por Jesus Cristo, em todas as gerações, para todo o sempre. Amém.” Efésios 3.20-21

      Se teu ponto de vista for outro, eu respeito, afinal, milagre é algo muito pessoal, mas quando digo que milagre pode não ser o que é dado, mas quando e como é dado, digo que Deus não age desobedecendo regras que ele mesmo criou. Se, por exemplo, entendemos pela ciência que Deus trabalha na natureza usando milhões de anos, por que acharmos que seja diferente em outras áreas? Não estamos dizendo que a ciência saiba tudo, e mesmo sabendo o que sabe não pode arrogantemente afirmar que o mundo espiritual não existe. Por outro lado, os que creem em Deus, não podem achar que Deus, mesmo sendo todo-poderoso, faça coisas extraordinárias. Pode fazer, mas só aos nossos sentidos humanos limitados. 
      Há outras áreas, mas em duas delas muitos dizem provar milagres que consideram impossibilidades que Deus realiza: áreas financeira e de saúde. Na financeira, se examinarmos com cuidado, entenderemos que o que aconteceu e consideramos milagre não foi algo impossível, já tinha alguma maneira viável de ocorrer e ocorreria de um jeito ou de outro. Já na área da saúde a coisa pode ser um pouco mais complexa, milagres nessa área também podem ter explicação se estudarmos o ocorrido com cuidado, ainda que seja só a atuação positiva de uma atitude de fé na força de vontade para o doente se restabelecer. Contudo, como ainda desconhecemos todo o poder da oração, podemos achar que houve algo impossível. 
      Na experiência pessoal que relatei na primeira parte desta reflexão (postagem de ontem), a diretora não poderia ter recorrido a uma lista de profissionais capacitados para a função e então escolhido alguém? Sim. Poderia ter usado critério de pontos que profissionais da área de ensino público acumulam por tempo e outras capacitações? Sim. Seria milagre se a escolha fosse feita dessas maneiras? Não. Seria bênção de Deus? Com certeza, e Deus seria louvado por isso. Contudo, na experiência que relatei havia duas opções, uma mais demorada e outra mais rápida e com outras vantagens, a opção melhor ter acontecido e antes foi fruto, não de esforço humano e material, não só disso, mas de oração aprovada por Deus. 
      Hoje, com o que a ciência sabe sobre espiritualidade, efeitos da oração podem ser considerados milagres, sejam eles quais forem. Se alguém estiver necessitando de auxílio financeiro, uma pessoa orar e uma terceira pessoa, que não conhece nem o necessitado nem o que orou, entender, porque lhe veio à mente ou porque sonhou, de ir até determinado lugar e ajudar o necessitado, isso poderá ser milagre. Por outro lado se alguém estiver desenganado pelos médicos, alguém orar e a pessoa for curada, isso também será considerado milagre. Mas vejam que em ambos os casos alguém orou, uma conexão com Deus foi feita, um poder espiritual saiu de Deus e tocou alguém, seja com uma orientação ou com cura física. 
      Podemos dizer que milagre é algo que acontece e que não se tem explicação científica de porque aconteceu. O correto é não sairmos dizendo que houve milagre sem analisarmos o ocorrido com cuidado. Muitos dizem provarem milagres mais para exaltarem a fé do homem que o poder de Deus, e muito disso é feito para que pastores sejam famosos, aumentem o número de ovelhas em suas igrejas e recebam mais dízimos. Mas mesmo que seja só a satisfação pessoal de se ter recebido uma graça, pode não ser algo saudável, não precisamos de milagres para provarmos comunhão, proteção, suprimento e cura em Deus. Deus tem interesse que sejamos crentes e espirituais, tanto quanto racionais e inteligentes. 
      Quem anda com Deus está sempre sincronizado com a bênção, mas quem quer amadurecer em todas as áreas, valorizará ciência, estudos, trabalho, tanto quanto saúde mental e afetiva, assim como virtudes morais e profunda intimidade espiritual com Deus. Quem anda de forma madura com o Senhor sabe que precisa fazer sua parte e fará, mas também sabe quando precisa orar de maneira diferenciada pedindo que Deus atue espiritualmente, e creiam, Deus age. Se os céticos e materialistas soubessem o poder que tem a oração não desacreditariam de milagres, mas se evangélicos desinformados e outros mal intencionados soubessem o que Deus faz pelos que o obedecem não promoveriam falsos milagres. 

28. Superação pela fé

      “Ora, a fé é o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas que se não vêem.” Hebreus 11.1

      Ainda que não sinta, creia. Ainda que não veja ou ouça, tenha fé. Ainda que a realidade mostre outra coisa, acredite. Se tua vida estiver de acordo com a vontade de Deus, e se o que você busca for aprovado pelo Senhor, mesmo que pareça improvável, você receberá o que precisa. Fé agrada a Deus porque coloca o homem, ainda habitando o mundo material, no reino do céu, mostra que o ser entendeu seu principal motivo de existir, caminhar rumo à melhor eternidade espiritual, desligando-se da ilusão da vã matéria. 
      Fé implica em esperar, satisfeito com o que se espera sem que ainda se tenha recebido, isso é sentir-se cheio ainda que vazio. Deus é bom, conhece nossos limites, mas será que conseguimos, ao menos um pouco, vivermos só pela fé, sem termos qualquer espécie de prazer que nos ajude enquanto esperamos? A vida faz sentido conforme somos recompensados com paz e alegria por agirmos corretamente, mas pode ser necessário sermos esvaziados, para sermos libertos de ilusões, que nos impedem de sermos felizes pela fé.
      Jesus homem foi levado a limites que nenhum ser humano, não sem merecer, foi. Você acha que Cristo sentia algum prazer que o fortalecia em seus últimos momentos de vida, quando era humilhado, torturado, crucificado e morto? Mas ainda assim ele resistiu, pela fé. Como ele conseguiu isso? Preparando-se. Nos preparamos para o pior, não evitando-o e tendo medo dele, muito menos indo irresponsavelmente em direção a ele como insanos. Jesus sempre viveu pela fé, mantinha os olhos em Deus, não no mundo físico. 
      Passamos vidas inteiras fazendo coisas erradas, não significa que passamos todo o tempo cometendo pecados sérios, envolvendo-nos com drogas pesadas, num estilo de vida adúltero, muitos de nós não chegam a extremos. Mas ainda assim nos viciamos em prazer, ainda que só comendo alguns brigadeiros ou bebendo uma taça de vinho para relaxar. Não somos criados e não conduzimos nossas existências de forma espiritual, mesmo nas igrejas cristãs somos materialistas, trabalhamos para termos mais direito ao conforto. 
      Fé conduz a um prazer, uma satisfação espiritual, e se formos em direção ao Deus Altíssimo será uma unção santa e eterna, o regozijo do céu, não o vazio do inferno. Contudo, trocar o prazer da matéria pelo do Espírito pode não ser algo fácil, por isso momentos onde nos sentimos vazios, sem nenhuma recompensa emocional, só tendo que crer e esperar, podem ser necessários, resistindo a síndromes de abstinência como quem é libertado de drogas. Mas valem a pena, a recompensa é uma iluminação espiritual única e perene. 
      Contudo, muitas vezes nos falta alegria da salvação, não porque estamos sendo provados, mas porque pecamos. Ainda que em Jesus tenhamos perdão imediato de Deus e paz, nosso corpo físico, nossa mente, nossos sentimentos, não se recuperam assim tão depressa. Dessa forma, o humilde se arrependerá e aguardará pacientemente o Santo Espírito achar de novo “conforto” em seu espírito, devida limpeza no templo, para que lhe dê novamente o prazer da presença de Deus. O plano espiritual é vivo e pede respeito. 
      Vitória não está em vencer o prazer do corpo, mas a dor do espírito. A perseverança dos santos não se apressa em buscar prazeres diante da dor, crescimento espiritual só se realiza com superação da dor. Não estamos neste mundo por outro motivo que vencer a matéria, construímos o céu em nós morrendo para a matéria ainda vivos. Contudo, aos que não abrem mão de prazeres do corpo, que não conseguem controlar, não só apetites carnais, mas a vaidade de prevalecerem sobre os outros, só manterão dentro de si o inferno. 

29. Fé e foco

      “Prossigo para o alvo, pelo prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus.” Filipenses 3.14

      Seriedade mental, que podemos chamar também de foco, é entender que precisamos fazer uma coisa e mantermos nossos pensamentos direcionados para isso. É não se desviar, nem para a esquerda, nem para a direita e muito menos parar ou retroceder, mas seguir em frente. Não precisamos correr, podem bastar passos lentos, mas firmes e constantes, não se prendendo ao tempo do mundo e dos homens, mas de Deus. 
      Na vida existem momentos de relaxamento e alegria, e muitos, se andamos com Deus ele nos concederá esses momentos. Não somos robôs ou perfeitos, nossos corpos e nossas almas necessitam de tempo para descansar, mesmo para parar, respirar fundo, para que abracemos quem nos ama e amamos. Jantar em família, férias, um passeio, momentos para usufruirmos com dignidade e sabedoria, da graça de Deus.
      Mas não viemos ao mundo de férias, temos uma missão, temos trabalho a fazer, e mais que o material para manter nossos corpos, o espiritual para aperfeiçoar nossos espíritos. Esse trabalho é constante, contudo, em determinados momentos Deus nos chama para um posicionamento mais sério, quando temos que manter nossos pensamentos e sentimentos determinados, exercendo fé de maneira especial e guardada. 
      Muitos cristãos não fazem uso de seus mais poderosos instrumentos para obedecerem a Deus, por isso têm vidas insatisfatórias. Quem é chamado para fazer algo só terá paz quando fizer isso, mas como fazer se não está capacitado? É o Espírito Santo que nos chama, nos mostra o que fazer e nos fortalece para isso. Você já sentiu o Espírito Santo te chamar, te mandando orar porque tem algo importante a dizer? 
      A questão não é nem se obedecemos ou não ao chamado de Deus, a questão é se conseguimos discernir essa chamada, muitos estão sendo chamados por Deus e nem se dão conta disso, porque estão atentos a muitas vozes, menos a de Deus. Não significa que eles não ouçam a voz da religião, da moralidade, mas essas podem ser só leis mortas, não a viva palavra do Espírito Santo, só a voz viva traz vida e eterna. 
      É sempre difícil tentar explicar coisas espirituais, principalmente para uma grande parte de cristãos que é experiente só em frequentar cultos, em cantar louvores e em obedecer protocolos de fé inventados por pastores hereges para conseguir milagres físicos. Por outro lado temos uma outra parcela de protestantes que se limita à palavra escrita da Bíblia e demoniza qualquer experiência com dons espirituais.
      No todo há muitos cristãos inexperientes com o Espírito Santo, protestantes e evangélicos seguem como católicos desviados, ainda que não creiam em santos, em dogmas fora da Bíblia e não obedeçam o papa. Conhecemos alguém mantendo uma amizade com esse alguém, intimidade não se adquire de uma vez, é aos poucos, com tempo é que sabemos quem é nosso amigo, do que ele gosta e como ele se manifesta. 
      Com o Espírito Santo é semelhante, quer conhecê-lo mais? Comece uma relação de amizade com ele, fale e ouça, mas não tenha-o como alguém distante e desconhecido, mas aberto ao diálogo e mais, com capacidade para te ajudar a fazer a vontade de Deus. No dia a dia o Espírito é próximo, carinhoso, ainda que direto, sempre nos orienta para que tenhamos paz e convivamos com os homens em amor e santidade.
      Contudo, em momentos especiais, ouviremos o Espírito Santo nos falando com uma voz poderosa, parecendo até estar mais longe, mas é porque está nos dando uma orientação diferenciada, que exigirá de nós uma seriedade mental para obedecer. Talvez você esteja andando certo com Deus, mas não está parando para ouvir uma ordem maior, que fará com que tudo em tua vida faça um sentido maravilhoso. 
      Em alguns momentos teremos que nos centrar na fé e só ir, sem nos abalarmos, crermos sem ver, os que entendem esses momentos receberão uma glória singular, não de homens ou externa, não necessariamente, mas interior e no espírito. Se no dia a dia com Deus crescemos, em momentos assim cresceremos muito mais, se vigiarmos, deixarmos para lá as infantilidades e fugas da carne e só focarmos em nosso Deus. 

30. O mistério da fé

      “Guardando o mistério da fé numa consciência pura.” I Timóteo 3.9

      Nós gostamos de ter controle sobre as coisas, assim queremos ter certezas, se não temos, sofremos. Pessoas de nível financeiro e intelectual menor, ocupadas em trabalhar para comprar a próxima refeição, querem no máximo controle sobre comida e moradia, contudo, aqueles com mais grana e estudo querem controlar o planeta. Essa intenção não é em si errada, tratar melhor a natureza e os animais, de modo a se ter mais e melhor qualidade de vida, não só para hoje, mas para o futuro, é algo correto e necessário. Lutar por direitos iguais para uma sociedade sem preconceitos que respeita as diversidades. também é justo e o único jeito de nos desenvolvermos como civilização. 
      A questão, contudo, é querer exercer esses controles sem Jesus e seus ideais morais, sem interagir com o mundo espiritual e confiar em Deus, sem preparar-se para uma eternidade espiritual. Aqueles que se consideram melhores no mundo, endeusam a ciência, a colocam no lugar de Deus, justamente porque através dela podem se achar no controle, com certezas materiais e racionais sobre o universo. Assim o ser humano acha ter encontrado o caminho para a evolução, não entende que isso é apenas uma fase, ainda que de muitas clarezas, uma fase de negação da iluminação maior de Deus. No fim de toda etapa há o desvio maior da verdade, mas só há vida depois da morte e o homem morre várias vezes. 
      As coisas espirituais são intraduzíveis pela matéria, ainda que tenhamos muita sensibilidade espiritual, adquirida com santidade e temor a Deus, e conheçamos a linguagem da matéria profundamente, não podemos de fato explicar conhecimentos espirituais. Por isso toda religião é parte mentira e parte verdade, todas elas, parte se sabe e parte se crê. Se por um idioma do mundo temos dificuldade para traduzir um outro idioma, muito mais difícil é um idioma desse mundo tentar traduzir o idioma do outro mundo. No mundo isso acontece porque as pessoas são diferentes, de culturas, histórias e principalmente de óticas religiosas diferentes, assim as construções emocional e social dos seres humanos mudam. 
      Por mais que certos valores e sentimentos nos pareçam semelhantes, uma pessoa do mundo árabe dá ao amor um significado diferente que dá uma pessoa latina, por exemplo. Em lugares diferentes virtudes têm preços diferentes, um passado histórico que marcou a mente coletiva com elementos diferentes. Muito mais é o mundo espiritual, livre de matéria, espaço e tempo, o amor que Deus sente e compartilha é muito mais pleno, perfeito, abrangente que o amor que os seres humanos experimentam no mundo. Deus expressa-se com pureza, sem filtros, sem atemporalidades, e de forma única para todos, o que varia é nossa percepção e capacidade de compreender e interpretar suas virtudes e conhecimentos. 
      O mundo espiritual não precisa de palavras, de idiomas, ele simplesmente é praticado, a partir de um simples olhar, eis o mistério. O que nos traz consolo quando oramos, é recebermos uma emanação de luz do Altíssimo, nisso nossas mentes podem traduzir, em simples frases se tiverem a inteligência da síntese, uma sabedoria profunda. Por que a Bíblia é livro sagrado superior a outros livros sagrados? Porque ela tem registros disso, de olhares de luz de Deus, onde versículos traduzem palavras vivas. Davi e Salomão têm textos assim, que alimentarão as almas humanas por muito tempo, mas ninguém foi melhor que Jesus para expressar essa síntese, a lista das bem-aventuranças em Mateus 5 é exemplo disso. 
      As verdades mais altas não podem ser formuladas, definidas, vendidas como receitas, isso seria prendê-las e limita-las, quem entende isso nunca terá plena certeza das coisas, por isso precisará crer, e eis o motivo pelo qual fé é tão enfatizada no ensino de Jesus. Uma verdade de fato de Deus não fecha, abre, não muito, mas deixa aberta outras muitas possibilidades, faz com que o ser humano se sinta satisfeito, revigorado, mas vivo e vivo queremos seguir aprendendo mais. A palavra de Deus que acessamos pela fé sempre nos deixa com vontade de querer mais, assim levantamos novas perguntas, crer é admitir não saber, e isso de forma gradativa, quanto mais se crê, mas se sabe e mais se sabe que não se sabe.
      Uma diferença entre a religião de Israel, a velha aliança, e o evangelho, a nova aliança, é que uma se acessa por obras e a outra por fé, Paulo dedicou grande parte de suas cartas a explicar essa questão, a diferenciar o ensino de Moisés do ensino de Cristo. Pela realização de obras se faz algo e se tem direito a receber algo, é tudo material e paupável, mas receber pela fé mostra que o homem não pode entender como Deus trabalha, não pode pagar o que Deus dá, mas aceita só por confiar em Deus. Na nova aliança obras acontecem depois, como consequência da fé, não como moeda de negócio, são efeitos, não causas. Quem recebe favores religiosos por obra não é desafiado a saber mais, mas acha que já sabe tudo pelas leis.
      Mesmo no cristianismo, muitos vivem por obras, não por fé, acham que podem receber favores de Deus por serem assíduos em cultos, obedientes a dogmas e fiéis nos dízimos. Nisso é preciso alguma fé, se envolve Deus e o mundo espiritual sempre é preciso, mas não aquela fé maior que conduz o ser humano a conhecer mais profundamente a Deus, a fé necessária nesse caso é só para conhecer e praticar uma religião. Para que ter dúvidas e crer quando tudo que se precisa saber é ditado por sacerdotes, pastores e livros? Não se crê porque se sabe, quem sabe não carece acreditar, na fé não se tem certeza, nem se precisa ter, mas se aprende a confiar em Deus, ainda que se tenha racionalmente muitas dúvidas. Só crê quem não sabe. 

31. Crer sem saber

      “Disse-lhe Jesus: Não te hei dito que, se creres, verás a glória de Deus?” João 11.40

      Qual o interesse de Deus para a humanidade hoje, com relação às coisas espirituais: que ela explique cientificamente essas coisas ou que aprenda a confiar nele? É que ela aprenda a confiar nele, porque só ele pode levar os seres humanos a conhecerem e praticarem as virtudes morais mais elevadas. Usar a fé não é fraqueza, é fortaleza porque nos leva a ter comunhão com o único que pode nos tornar realmente fortes, não só na matéria, mas no espírito. Quem tem dúvida, crê, mas quem crê não terá mais dúvidas, ainda que seja aberto para fazer novos questionamentos, eis o paradoxo da fé. Isso não significa que você tenha que duvidar de Deus, mas que deva ter uma fé inteligente que confia, prova, questiona e acha a verdade. 
      Vou dar um exemplo. Quem sabe que existe céu e inferno não precisa crer, já racionalizou isso e aceitou sem questionar, mas quem crê no amor maior de Deus está aberto para que exista mais que penas eternas. O conhecimento de Deus é gradativo, cremos e temos paz, se não há paz, nem questione, ande sempre conforme a porção de fé que recebeu e que te conduz em paz. Mas quem anda de perto com Deus sempre será confrontado a saber mais, assim precisará de mais fé, já que novos questionamentos são feitos e novas respostas poderão ser conhecidas. Fé é viva, não é morta e estagnada, não porque tenha firmeza para receber coisas materiais maiores, mas porque tem a extensão para saber mais sobre o mundo espiritual. 
      Deus pode usar mais a dúvida que a certeza, na dúvida somos humildes e cremos, não nos achamos bons o suficiente para entendermos as coisas de Deus. Já na certeza nos achamos donos da verdade e assim pensamos que podemos seguir só por sabermos, sem termos que confiar em Deus. A religião e o mundo espiritual podem ser explicados cientificamente? Talvez um dia, contudo, acho impossível e desnecessário nos atuais níveis moral e intelectual do homem, como tentam fazer, por exemplo, os espíritas kardecistas, quando denominam suas óticas espirituais como ciência. Ainda não é momento para isso, convém ao ser humano que precise crer para ser humilde, ainda que o desenvolvimento científico tenha mudado isso. 
      Antes de termos as ciências médica e farmacêutica desenvolvidas o ser humano acreditava mais sem saber, ainda que muito em superstições e curandeirismos, mas no meio disso havia mais religiosidade. Por que não vemos hoje em igrejas evangélicas tanta expulsão de demônios como víamos há trinta anos atrás, ou na época de Jesus? Porque a psicologia e a psiquiatria têm tratado as pessoas, e não estou dizendo que não existam reais casos de possessão demoníaca, nem que tudo seja transtorno mental. Contudo, saber levou o ser humano a crer menos, e a ciência está aí para isso, para que saibamos, e ninguém a despreze, é dom de Deus tanto quanto os dons espirituais, ainda que se ocupando atualmente mais da matéria. 
      Enganam-se e bastante muitos cristãos que pensam que ciência é, de alguma forma, instrumento do diabo, para levar as pessoas a não crerem em Deus, isso é matar o cão para se livrar das pulgas, e me perdoem a metáfora. As pessoas precisam aceitar que usar um remédio para matar as pulgas não faz do veterinário o cuidador do cão, aquele que levou o cão ao especialista é o cuidador, mas que teve a humildade para reconhecer que não sabia tudo e que podia usar a ajuda de outros para ajudá-lo no cuidado de seu amado animal. Muitos, contudo, por orgulho têm preferido matar o cão só para não admitirem que seu afeto pelo animal não substitui a medicação dada por outro. Ciência é sofisticada ferramenta de Deus. 
      Mas nada impede tolos de serem tolos, nem as verdades espirituais únicas e profundas de Jesus Cristo e muito menos os conhecimentos sérios das ciências impedem, mas que se culpe o ferramenteiro, não a ferramenta, principalmente se ela é dom de Deus. Mas assim como nas coisas espirituais cremos porque não sabemos e assim devemos estar sempre abertos a novos questionamentos, ainda que confiando em Deus sejamos abençoados e ensinados pelos conhecimentos espirituais mais elevados, os cientistas e materialistas, talvez até mais que os crentes religiosos, deveriam estar abertos para todas as possibilidades, incluindo a existência do mundo espiritual, de um Deus espiritual e de uma eternidade espiritual. 
      Crer é confiar sem saber e sabendo que se saberá ainda menos depois que o que se crê se realizar, mas essa é a mais maravilhosa aventura que somos chamados a vivenciar no universo. Existe um véu entre o mundo material e o espiritual, por isso nossos olhos físicos não podem ver, nossos ouvidos físicos não podem ouvir, nosso corpo não pode sentir o mundo espiritual, quem retira esse véu é a fé. Ela não é só uma chave que libera nossa imaginação, que nos permite criar imagens, sons, sensações, que chamamos de experiências espirituais, não, caros ateus, não é isso. Fé é um voto de confiança no mistério, que só precisa disso para que experimentemos o mundo espiritual, e creiam, quem acredita enxerga a glória de Deus. 
      Engana-se o que acha que essa fé pode ser objeto de exaltação humana, que deva ser escancarada nos púlpitos a fim de convencer incrédulos que é fácil obter coisas materiais sem o esforço apropriado. A fé mais profunda é delicada, qual pequeno pássaro que pousa à nossa frente, no gramado de uma praça, se respirarmos um pouco mais alto ele voa e vai embora, quem a alcança cala e guarda. Infelizmente é o oposto disso que vemos principalmente em púlpitos pentecostais, pregadores esbravejando suas pretensas capacidades espirituais, como se fé fosse mérito do crente. Quem crê, vê a glória de Deus para a glória de Deus, não para si, a glória de Deus é espiritual, fé cresce à medida que vislumbramos além da matéria.

32. Acreditar é confiar

      “Ora, sem fé é impossível agradar-lhe; porque é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe, e que é galardoador dos que o buscam.” Hebreus 11.6

      Como você se sentiria, se teu filho viesse te pedir uma coisa e você lhe dissesse que daria, mas teria que esperar um tempo? Passada só uma hora teu filho voltasse e te dissesse que você tinha dito que daria a ele uma coisa, mas que você não tinha cumprido tua palavra? Então, você novamente diria que daria, mas ele teria que esperar um tempo, contudo, passada só mais meia hora ele voltasse, muito triste, dizendo que você não tinha dado o que prometeu, alegando que sabia porque você não tinha atendido seu pedido, que era porque ele tinha te desobedecido no dia anterior? Então, novamente você teria lhe dito que ele deveria ter paciência, que não havia dado ainda, não por estar triste com ele, mas por motivos pessoais teus? 
      Depois de tudo isso, você poderia até pensar que teu filho não confia em você, que não acredita no teu perdão, que não crê que você pode dar a ele o que ele te pede, que acha que você não o ama de fato. Como homens podemos pensar algumas coisas de quem não acredita em nós, mas Deus não é homem, ainda que ajamos como o filho da estória, ansiosos, descrentes e cheios de culpas. Crer é confiar que uma vez que pedimos algo a Deus, e ele nos diz que dará, ele dará. Quando? Não sabemos. Por que ele pode demorar? Podemos também não saber, mas devemos confiar e esperar em paz. Agir assim é a mais pura e sincera forma de adoração, do filho que acredita sem ter recebido, só por confiar que seu Deus o ama e é fiel. 
      Se Deus mandou, confie e obedeça, e entenda, obedecer ordem de Deus não é igual a soldado obedecer seu oficial, nisso pode haver posicionamento sem sentimento, sem afeição, mesmo sem concordância, se obedece friamente, porque o soldado tem patente inferior ao oficial. Com Deus não é assim, obedecer é se colocar em íntima comunhão com ele, estar plenamente conectado a ele, assim, compartilhando de seu amor, de sua paz, de sua luz, o que nos fortalece para obedecer uma orientação sua. Deus é paciente, mas se insistirmos em desobedecer, mesmo que seja a ordem para esperar que ele atenda um pedido que já disse que atenderia, poderá nos disciplinar para que aprendamos a obedecer, nisso podemos ter que esperar mais. 
      Na verdade Deus não muda seus planos, seu tempo, somos nós que podemos mudar, se esperamos em paz muito tempo parece pouco, mas se esperamos na desconfiança uma hora pode parecer dias. Só a vida para nos ensinar a esperar do jeito certo, assim amadurecermos na fé que crê sem ver, mas que não demoremos muito para aprender a viver pela fé, nem fujamos de oportunidades que Deus nos dá para isso. Muitos, sem paciência para crer, lançam sobre seus ombros cargas pesadas demais, usando para coisas desnecessárias tempo que poderia usar para crescer espiritualmente. Esses, ainda que digam que confiam em Deus, só confiam em si mesmos, esperar em Deus pode ser trabalho difícil, mas é o mais útil que há. 
      O Senhor se agrada muito dos que creem do jeito certo e no momento certo, esses experimentam a eternidade ainda no mundo, conhecem mistérios que de muitos são escondidos, recebe antes de outros o início da iluminação que terá plenamente quando deixar a matéria. Deus não nos impõe fé como castigo, para dificultar nossas vidas, ele nos desafia por ela, quem a prova sentir-se-á depois muito satisfeito. Esse galardão, conhecimento científico não pode dar, e ainda que conquistarmos bens pelo nosso trabalho nos faça felizes, não se compara a vivenciar a fé. Confie no teu Deus, se ele disse para você esperar que dará tudo certo, fique em paz, Deus se agrada daqueles que creem nele e esperam dele o melhor para suas vidas. 

33. Fé: cega ou inteligente?

      “Não erreis: Deus não se deixa escarnecer; porque tudo o que o homem semear, isso também ceifará. Porque o que semeia na sua carne, da carne ceifará a corrupção; mas o que semeia no Espírito, do Espírito ceifará a vida eterna.” Gálatas 6.7-8

      Fé não é problema, se for fé inteligente, é caminho de solução para a área espiritual da existência, mas se for fé cega pode trazer mais problemas, e não solução. Crer sem ver e sem que nenhum dos sentidos físicos sejam impressionados por manifestação material, isso é exercer fé. Contudo, não significa que não vejamos, ouçamos ou sintamos quando cremos, esses sentidos podem ser impressionados e de formas bem claras. A diferença está na origem, enquanto experiências puramente físicas independem de fé, de qualidade moral ou de espiritualidade, as espirituais originam-se da fé. 
      A fé funciona como chave para portas que dão entradas a salas, mas mesmo as salas não são as mesmas para todos e nem sempre as mesmas para alguém, variam de acordo com preparo do ser humano e a providência do Altíssimo. Algo muito importante sobre o mundo espiritual deve ser entendido por todos, seja sob a ótica religiosa que for: ele requer respeito porque é constituído em primeiro lugar do criador e Senhor de tudo, santíssimo e todo-poderoso, e depois de criaturas (anjos), que desejam respeito tanto quanto nós queremos. Fé é a chave, mas deve haver respeito para abrir a porta.  
      Fé cega não discerne as coisas, até abre portas, mas não desfruta das salas, acredita no que os outros dizem sobre as salas. Fé cega pode ser usada por tipos diferentes de pessoas, por superficiais que querem qualquer coisa pela fê, e por profundos estudantes do mundo espiritual, mas que só desejam satisfazer curiosidades intelectuais, não querem se expor moralmente, assim todos esses abrem portas, mas não entram nas salas. Salas espirituais contêm tanto o bem quanto o mal, assim fé cega pode enganar as pessoas, levando-as a achar que estão se relacionando com Deus quando não estão. 
      Muitos acreditam na existência de coisas espirituais, convivem no meio de homens e mulheres que exercem fé genuína, mas eles mesmos nunca têm experiências de fé. Para esses o mundo espiritual é só fantasia, às vezes interpretações imaginárias que lhes dão o mesmo prazer que se tem lendo livros, ou assistindo peças e filmes ficcionais. Outros, ainda que nunca se aprofundem na fé, ainda que não tenham fé inteligente, mas crendo nas experiências dos outros, principalmente nas experiências dogmatizadas das religiões, têm experiência reais com fé, afinal, Deus ama a todos.
      Mas o que seria fé inteligente? Fé e inteligência podem parecer conceitos antagônicos, materialistas dizem que o inteligente não precisa crer. Em termos materiais, a ferramenta ciência examina meticulosamente, experimenta em laboratório, faz e repete processos para então estabelecer princípios e fórmulas. É nesse conhecimento aprovado e conhecido que pode-se crer no plano físico, e a ciência tem a missão de nos dar esse conhecimento para que dominemos o planeta, respeitemo-lo e o utilizemos para termos vidas físicas de qualidade para todos, de forma equilibrada e renovável.
      O que materialistas e ateus não entendem é que pode-se usar metodologia científica em experiências espirituais, obviamente desde que elas sejam legítimas e inicialmente experimentadas do jeito certo. Depois que a “porta” é aberta, pela fé e com respeito, a “sala” pode ser conhecida com inteligência, para saber o que é verdade, o que é mentira, o que é bom, o que é mal, e o que é passageiro e o que é perene. O princípio bíblico que melhor define a principal ferramenta para se verificar a qualidade de uma experiência espiritual está em Mateus 7.20, “portanto, pelos seus frutos os conhecereis”.
      Contudo, enquanto uns extremistas adoram a ciência e desprezam religiões e outros adoram religiões e desprezam ciência, muitos não podem provar o melhor da ciência e da religião. O melhor, além do fato de ambas serem instrumentos para campos diferentes, um físico e o outro espiritual, é que cada uma pode auxiliar a outra, completar a outra, e não negar ou anular a outra. Se a fé inteligente pode dar à ciência horizontes ainda não provados fisicamente e ainda assim reais, a ciência pode ajudar os que têm fé cega a avaliar melhor suas experiências para conhecerem o verdadeiro Deus. 
      Eu não estou dizendo aqui que deve-se provar cientificamente as coisas espirituais, ainda que muitas manifestações espíritas já tenham tido certas comprovações, a verdade é que só poderemos ter provas científicas de Deus e dos espíritos no futuro, eu penso assim. Mas talvez no futuro é que provas serão menos necessárias, um ser humano moralmente elevado não exigirá provas para crer, crerá e as provas naturalmente acontecerão, numa interação perfeita entre matéria e espírito. Estou dizendo que fé inteligente é crer e seguir crendo em algo que foi causa de efeito bom e duradouro.
      Por ter fé cega, e não inteligente, é que a humanidade foi e segue enganada por tantos homens maus, seja no catolicismo, no protestantismo ou em outras religiões, e consequentemente foi por isso que a ciência foi e é tão perseguida e negada, ainda hoje em pleno século XXI. O simples fato de acreditarmos em coisas espirituais não nos faz espirituais, o diabo é espiritual e confiar nele é algo carnal, a fé só é espiritual, isso é, só conduz à espiritualidade mais alta, quando é inteligente pois nela inteligência não é limitador mas purificador, separa misticismos e superstições da verdade. 
      Fé inteligente não nos desvia de Jesus, mas nos permite conhecê-lo mais de perto, sem os filtros das religiões, usando-se, sim, Bíblia e a tradição religiosa, mas como base e início, não fim. Uma experiência plena com o verdadeiro Espírito de Deus nos ensinará em todos os níveis, moral, intelectual e espiritual, e nos deixará mais abertos e respeitosos com a ciência. Deus é luz e nele não há treva alguma, se há treva, ainda que tenha nos permitido receber bênçãos do amor de Deus, nos limitará no conhecimento da luz. Deus é inteligente e chama suas criaturas para serem inteligentes. 

34. Não sabemos tudo!

      “Porque, assim como desce a chuva e a neve dos céus, e para lá não tornam, mas regam a terra, e a fazem produzir, e brotar, e dar semente ao semeador, e pão ao que come, assim será a minha palavra, que sair da minha boca; ela não voltará para mim vazia, antes fará o que me apraz, e prosperará naquilo para que a enviei.” Isaías 55.10-11

      Sei que tua vida deve ser corrida, no mundo atual, no Brasil de hoje, todos temos que trabalhar e muito para termos o mínimo de dignidade em nossas vidas e de nossas famílias. Mas você deve ter um tempo de lazer, talvez para ver um filme, uma série, uma novela, talvez até para ler um livro. Que tipo de livro você lê? Só a Bíblia, livros cristãos, romances, ou então, sites da internet, de fofoca, de política? Talvez o máximo que faça é ver vídeos no Youtube e passar o dedo na tela do celular para se atualizar com as bobagens do dia, bem, todos fazemos isso. Aqui vai uma dica, caso tenha algum tempo livre e já tiver lido a Bíblia, conheça um pouco sobre outras religiões.
      Muitos de nós cristãos, e eu me incluo entre esses, ou pelo menos me incluía, têm impressões fechadas sobre outras religiões, e na maioria das vezes opiniões negativas. Acontece conosco aquilo que se tornou ditado, “não li e não gostei”, assim demonizamos muitas religiões, muitos fundadores de religiões, muitos palestrantes e representantes de religiões não cristãs, sem nunca termos procurado saber mais sobre esses. Se sabemos é geralmente a opinião de um dos lados, de teólogos e estudiosos protestantes, que obviamente vão deslegitimar quem não é evangélico, principalmente se esse acredita em princípios que vão contra a doutrina cristã protestante tradicional. 
      Já tive oportunidade de saber mais sobre a vida de muitos que o catolicismo elegeu como santos, sim, há muitos que o são só baseados em crendices populares, superstições, que a liderança católica deu o título mais para agradar o povo e segurar adeptos que realmente por terem algo especial em suas vidas. Contudo, há outros que foram verdadeiros cristãos, e não me refiro só àqueles citados em textos do novo testamento, apóstolos e discípulos do primeiro século, mas em verdadeiros homens de Deus que viveram depois. Como evangélico ou protestante você vai se surpreender com o testemunho real de muitos chamados santos católicos, será edificado com suas vidas. 
      Isso não significa que evangélicos usarão o nome e a posição espiritual dos chamados santos para pedir algo a Deus (ou diretamente a eles), sei que a doutrina protestante só aceita Jesus como intercessor entre Deus e os homens. O posicionamento católico de permitir que homens mortos específicos sejam intermediários é semelhante ao ensino do espiritismo kardecista, que ensina que espíritos superiores (guias) podem abençoar os homens no plano físico. Há mais em comum entre o catolicismo e o espiritismo que entre o protestantismo e o espiritismo. A teologia dos santos abre várias possibilidades, incluindo o procedimento inverso, onde vivos podem interceder por mortos. 
      Falando em kardecismo, eis uma religião que protestantes e evangélicos se mantêm absolutamente distantes, o fato de crerem que não existe reencarnação, comunicação entre vivos e mortos e que tudo que é escrito em nome de espíritos de falecidos pelos espíritas é só mentira de demônios que enganam os homens, faz com que muitos julguem sem ter nenhum conhecimento. Se você se der ao trabalho de ler, não só Allan Kardec, mas Léon Denis e Chico Xavier, verá em primeiro lugar entendimentos históricos sobre muitas religiões e depois orientações morais, com tal profundidade e lucidez, que terá dificuldades para afirmar que tudo foi inspirado pelo diabo. 
      Mas não são só os livros de outras religiões que contêm sabedoria, e em muitos casos muito mais esclarecida que a que achamos em muitos textos bíblicos. As vidas de escritores como Hippolyte Léon Denizard Rivail, Léon Denis e Francisco Cândido Xavier podem ensinar muito sobre vocação missionária e prática do bem. Todas elas contêm polêmicas, aliás, como há nas vidas dos personagens bíblicos Moisés, Davi, Pedro e Paulo, dentre outros, e na trajetória do reformador protestante Martinho Lutero. Sobre esse, procure uma biografia dele escrita por protestantes e outra escrita por católicos, em ambas achará enganos, então tire a média e se aproximará da verdade. 
      Só na vida de Jesus não há polêmicas, mas havemos de concordar que pouco sabemos sobre ele, e historicamente no que sabemos pela Bíblia também há divergências. Contudo, a fatos históricos resistiu de Cristo seus ensinos únicos (fundamentados no Sermão da Montanha, Mateus 5-7) e sua morte sacrificial por toda a humanidade, isso basta. Deixo claro que apesar de afirmar que pouco sabemos e assim não podemos como protestantes e evangélicos afirmar muitas coisas, sobre Jesus podemos afirmar que ele é único e suficiente. Existem outros caminhos, e creia, não são do mal, mas o caminho Jesus Cristo é o mais alto, quem busca a Deus por ele acha a verdade. 
      Neste início de século XXI, com tanta informação disponível por fácil acesso pela internet, com a ciência desenvolvendo-se mais e mais, e com os frutos ruins do falso cristianismo escancarados para quem tiver olhos para ver, não podemos mais simplesmente dizer, “isso é do diabo porque não está na Bíblia”. Meus queridos e minhas queridas, repetirei isso aqui tantas vezes quantas sentir do Espírito Santo, e me perdoe se isso te escandaliza, mas os “últimos tempos”, ainda que não sejam o que muitos creem que são, ocorrerão e exigirão de todos posicionamentos sérios com Deus e seus destinos eternos. É tempo de acordar, de tirar o véu da religião e confiar no Espírito Santo. 
      Compartilho aqui não teoria, mas prática, minhas experiências de cura emocional são reais, meus consolos diários de Deus são verdadeiros, as ações, que aos meus olhos são extraordinárias do Senhor a meu favor, são autênticas. Não me calarei sobre o quanto Deus tem me amado, com paciência e sempre acreditando no meu melhor, se isso te abençoa, siga comigo aqui até onde Deus quiser. Mas o “Como o ar que respiro” tem uma chamada profética, a essa não renunciarei, não por buscar aprovação de homem, por querer polemizar ou como coisa da minha cabeça, mas por temor à palavra de Deus. Não temos todo o tempo do mundo, não mais, apressemo-nos. 
      O caminho da sabedoria é o caminho de Deus e esse nunca tende para homens, ele leva à verdade mais alta. Homens falando de homens sempre enaltecerão a si e menosprezarão o outro, é assim desde que o mundo existe, por isso história, jornalismo e mesmo textos sagrados não merecem confiança de fatos, são narrativas relativas. Fique com a narrativa de Deus, para achá-la é preciso coragem e trabalho, coragem para não depender de aprovação humana, trabalho para crer e ser santo, assim se conhece a sabedoria de Deus sobre tudo. Palavra de Deus não é como palavra de homem, ela traz vida, faz diferença para melhor que permanece, a essa tem direito os humildes. 

35. O poder da grana

       “Assim diz o Senhor: Maldito o homem que confia no homem, e faz da carne o seu braço, e aparta o seu coração do Senhor! Porque será como a tamargueira no deserto, e não verá quando vem o bem; antes morará nos lugares secos do deserto, na terra salgada e inabitável.” Jeremias 17.5-6

     Não se engane achando que a mídia, jornais, redes de televisão e páginas na internet, dão espaço para afrodescendentes porque reconhecem que a civilização tem uma dívida histórica com esses por causa da escravidão. Os poderosos não desprezam mudanças, as usam a seu favor, assim, ainda que haja noção que a mudança é implacável, não há pureza de intenções. Empresas de comunicações dão lugar de fala em programas, matérias e sites, para quem se torna uma maioria utilizável. 
      Isso significa que um direito é adquirido quando se é maioria? Sim, mas não maioria como ser humano, mas maioria como consumidor, como comprador de fast-food, cervejas, celulares, eletrodomésticos, roupas, carros, escolas, serviços bancários etc. A mídia não é nem de direita, nem de esquerda, nem de centro, ela é pela grana, por indústrias, bancos e outras corporações que vendem produtos e usam o marketing divulgado na mídia para promoverem seus produtos. 
      Quando a agenda afrodescendente era “vendida” (desculpe-me o termo) como minoria ainda que não fosse, a mídia pouco se manifestava a respeito. Acreditem, quando lutas por direitos de afrodescendentes deixarem de ser moda, quando a miscigenação estiver tão generalizada que não se identificará mais branco, negro, amarelo, europeu, africano ou asiático, a mídia mudará o foco, de olho não em direitos humanos iguais, mas em consumidores para os produtos dos que pagam a ela por publicidade.  
      A mídia apoiará os donos da grana e esses apoiarão políticos que lhes deem liberdade para ganharem mais grana, independente de serem políticos de direita, de esquerda ou de centro, ninguém também se engane sobre isso. Em nome disso políticos farão qualquer negócio, mesmo dizerem-se a favor dessa ou daquela ideologia. A mídia, orientada por quem a paga, sabe o que será lançado e dará lucro, assim preparará o consumidor, primeiro cria a necessidade para depois vender a solução. 
      Ingênuo quem se envolve com esse sistema só vendo a ponta do iceberg, mas irresponsável o cristão que se põe como militante de político. Também existem muitos administradores de O.N.G.s (eis nessa sigla um mundo tenebroso que não é bem o que parece ser) que são enganados, assim como existem outros administradores de O.N.G.s que se escondem atrás de bandeiras de direitos humanos para promoverem ou destruírem o que interessa aos donos da grana que os pagam. 
      Não há nenhuma novidade nisso, o mundo sempre funcionou assim, ainda que nos tempos antigos as pessoas ligassem poder a direitos recebidos legitimamente dos deuses. Mas será que o Deus verdadeiro tem interesse em grana e poder neste mundo? Não. Assim é lógico concluir que poder neste mundo, de um jeito ou outro, está ligando a “falsos deuses”, seres espirituais malignos. A prova disso é que poder e grana sempre foram para beneficiar alguns, não a maioria mais necessitada. 
      Quem detém a grana não está interessado em teus direitos, mas em teu dinheiro. Deus está interessado em teus direitos, entende isso quem para de olhar para os homens e olha para ele. “Bendito o homem que confia no Senhor, e cuja confiança é o Senhor, porque será como a árvore plantada junto às águas, que estende as suas raízes para o ribeiro, e não receia quando vem o calor, mas a sua folha fica verde, e no ano de sequidão não se afadiga, nem deixa de dar fruto” (Jeremias 17.7-8). 
      Perdoem-me a visão pessimista, ela não significa que não haja evolução moral no planeta. Sim, há, como sempre houve e haverá, mas lentamente, sempre opondo matéria a espírito. As trevas persistirão até que a luz se manifeste totalmente, com o bem vencendo o mal, numa humanidade onde as pessoas não serão percebidas por aparência externa, origem geográfica, nível financeiro ou intelectual, sexualidade e mesmo por religião, mas pelo amor que serve a todos equitativamente.

36. Deus não precisa da política

      “Mas nós, segundo a sua promessa, aguardamos novos céus e nova terra, em que habita a justiça. Por isso, amados, aguardando estas coisas, procurai que dele sejais achados imaculados e irrepreensíveis em paz.” II Pedro 3.13-14

      Ouvi de um evangélico as seguintes palavras: “eu sei que o presidente do Brasil, entre 2019 e 2022, não foi o melhor exemplo de cristão, mas com que presidente teríamos um pastor presbiteriano no S.T.F.?”. Em primeiro lugar o S.T.F. é do Brasil, não de uma religião, ele precisa não de sacerdotes, médiuns ou de qualquer outro tipo de religioso ou de ateu, mas de profissionais competentes e experientes que façam cumprir a Constituição Brasileira para todos os brasileiros, esses também, indiferente das religiões ou não que professem. Se não há mais protestantes ou evangélicos no S.T.F. é porque até agora não apareceu nenhum com competência e experiência profissional suficiente para preencher os requisitos necessários. 
      Por outro lado, não podemos garantir que o pastor presbiteriano que foi aceito no S.T.F. em 2021, tenha competência e experiência profissional para tal, já que o que o colocou lá foi uma bancada evangélica politicamente forte que fez as devidas articulações. Assim, eis outro equívoco de evangélicos que comemoram como vitória divina essa nomeação, confiarem e se apoiarem em políticos, que mesmo que sejam honestos cuidam das coisas deste mundo, não do reino de Deus. Mas por que muitos evangélicos, incluindo fortes lideranças, acham tão importante terem representantes de suas igrejas em cargos políticos nacionais? Seria por pensarem que só assim evangélicos têm seus direitos garantidos? 
      Isso não é verdade, todo cidadão brasileiro tem direitos garantidos pela Constituição, então, a resposta só pode ser para estabelecer no Brasil, assim como no que o meio cristão chama de “mundo”, um reino político baseado em princípios cristãos, ou seja, na tradição judaica-cristã. A pergunta final que podemos fazer é: isso é vontade de Deus? Muitos evangélicos vão dizer que é, talvez baseados no ide de Jesus, dizendo que o evangelho será pregado a toda criatura. Mas penso que achar apologia no novo testamento para isso é difícil, a história narrada por ele se encerra com profecias, ditas por Cristo e por João em Apocalipse, que falam que haverá uma grande perseguição aos justos, não um fortalecimento de cristãos.
      Penso que os evangélicos brasileiros, que desejam poder político no Brasil, se baseiam mais no poder que tinha a nação de Israel nos tempos do antigo testamento, assim como na hegemonia protestante que sempre houve nos E.U.A.. Isso explicaria a relevância que o governante do Brasil entre 2019 e 2022 deu ao Israel moderno e ao governante norte-americano Donald Trump. A verdade é que Deus não tem nenhum interesse em que cristãos tenham poder político no mundo, simplesmente porque o reino de Deus não é aqui, é no plano espiritual, isso Jesus deixou bem claro em João 18.36: “meu reino não é deste mundo, se o meu reino fosse deste mundo, pelejariam os meus servos, para que eu não fosse entregue aos judeus”.
      Mas se nem os cristãos primitivos compreenderam, quando formaram uma comunidade no estilo hippie-marxista, como entendemos em Atos 2.42-47, e depois apoiando a criação da Igreja Católica, por que acharmos que evangélicos atuais entendem? Mas o que penso que muitos evangélicos não entendem, e se entendem aí então é que estão mais equivocados que eu penso que estão, é que o que eles querem fazer a Igreja Católica fez por quase 1.700 anos e deu no que deu. Só se for isso que pretendam, como parece que denominações como a I.U.R.D. e a Renascer em Cristo claramente têm tentado fazer no Brasil e fora dele, serem uma nova igreja católica, para depois mandarem na religião, na política, na cultura e na ciência. 
      Se fosse plano de Deus para os dias atuais haver uma ou mais nações escolhidas, como era Israel nos tempos do antigo testamento, ele já teria feito isso, mas Deus não age assim há milênios, não é mais assim que ele trabalha para conduzir o homem à sua luz. Crer que evangélicos devam ter poder político no Brasil hoje é querer a aliança de Moisés e o reino de Davi de volta, mas é pior que isso, é negar a missão de Jesus, é negar uma iluminação superior que Deus permitiu à espiritualidade humana através de Cristo. Muitos evangélicos não aceitam isso porque se desviaram há algum tempo de Deus, são bons religiosos, mas muitos católicos também são, e ainda assim aceitam e respeitam uma igreja poderosa, mas corrompida. 
      Vou dizer algo que muitos poderão discordar: a política não precisa de evangélicos tanto quanto os evangélicos não necessitam de política, mas todos precisam de justiça. Mas se Deus usou a meretriz Raabe para dar continuidade à genealogia de Davi e de Jesus (Mateus 1.5-6 e Hebreus 11.31), se usou um Sansão, cego e humilhado, para destruir filisteus inimigos de Israel (Juízes 16), se usou o monarca Ciro que confiava em “outros” deuses para livrar seu povo do cativeiro babilônico (Esdras 1), Deus não precisa de homens que obedeçam-lhe em tudo, só homens que obedeçam-lhe no lugar e no momento necessário. É assim que Deus age com as nações neste mundo, na política, na economia, nas guerras, independe do livre arbítrio moral. 
      Quanto à escolha individual que cada ser humano faz para se preparar para a eternidade, isso é outro assunto, e para isso pode ser necessário o contrário, que o homem se distancie dos poderes deste mundo, seguindo o exemplo de Jesus. Se Jesus tivesse vindo para estabelecer um reino neste mundo, pouco tempo depois de sua ascensão, descida do Espírito Santo e fundação da igreja, o povo judeu não teria vivido o cerco de Jerusalém no ano de 70 d.C., onde seu Templo foi destruído e suas intenções de se libertar do império romano foram sufocadas. Israel nunca mais teve a glória que teve com Davi e Salomão, e nunca mais terá, depois de Cristo o que Deus faz na sociedade e nos indivíduos são coisas que independem-se.

37. Política não precisa do cristão

      “Porque tu és grande e fazes maravilhas; só tu és Deus.” Salmos 86.10

      Desculpem-me evangélicos que creem que podem e devem estabelecer um reino de Deus no Brasil, mas isso não é reino de Deus, além de ser inviável e desnecessário, é o reino de um outro ser, aquele que se opõe ao que representa o Cristo. Pergunto a esses, qual o tamanho do Deus de vocês? Quem acha que um Deus poderoso só se realiza plenamente com hegemonia visível de seu poder no mundo físico quer retrocesso, pensa um Deus pequeno, material, não espiritual, Deus é muito mais que isso. Deus é tão grande que não cabe em trono ou cargo, mas só no coração do humilde, eis o mistério, e isso através de seu Santo Espírito, não por qualquer imposição, mesmo que democrática, e muitos menos militar ou econômica. 
      Muitos evangélicos que acham que cristãos devem ser envolver com política podem contra-argumentar assim à consideração que fiz sobre o tamanho de Deus, “justamente por eu crer num Deus todo-poderoso é que creio que ele pode colocar cristãos em posições altas para comandarem o Brasil”. Novamente peço desculpas a quem pensa assim, mas isso é entender errado o evangelho puro e original de Jesus, principalmente os ensinos do Sermão da Montanha em Mateus 5-7. O ensino de Jesus é justamente o contrário, sua vida prática como homem mostrou isso, vida está na morte, poder está em amar e dar a outra face, coragem é para ser pacificador e humilde, não vitorioso numa guerra física na Terra contra inimigos.
      Aliás, no evangelho não existem inimigos, e eis outro equívoco terrível que cristãos que apoiam a direita política cometem, acham que existem inimigos e se põem a lutar contra quem pensa diferentemente deles, acreditando que Deus os apoia. Não, Deus não está nesta luta, e quem for para ela achando que terá vitória sairá derrotado, talvez assim entendam o que realmente é o evangelho e o que Deus tem para eles, planos de paz, não de guerra. Eu acredito que o mundo chegará num tempo onde a salvação de Jesus será entendida por uma grande maioria, nesse momento fé e ciência não se oporão mais, não haverá diferenças e injustiças, mas será um tempo onde o Espírito Santo liderará os indivíduos, não políticos ou religiões. 
      “Buscai primeiro o reino de Deus e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas” (Mateus 6.33), usamos tanto esse versículo e ainda assim não o entendemos, não temos que ficar perdendo tempo com ideologias políticas, cumpramos nossas obrigações básicas como cidadãos e nos coloquemos a conhecer e praticar as virtudes morais. Isso é buscar o reino de Deus, não é lutar para que cristãos tenham cargos nos poderes da república, e me refiro mais ao judiciário, onde é preciso ao menos alguma competência e experiência profissionais. Mas no que envolve articulações políticas, fiquemos fora, é coisa deste mundo, usando armas deste mundo para beneficiar a poderes deste mundo, isso não nos diz respeito. 
      “Portanto, eu vos digo que o reino de Deus vos será tirado, e será dado a uma nação que dê os seus frutos” (Mateus 21.43), se de Israel, a nação escolhida a princípio para testemunhar Deus no mundo, foram retirados privilégios, que diria de nós? Deus não procura cristãos em cargos políticos, não é glorificado com governos deste mundo identificados como cristãos, se fosse assim haveria só duas posições religiosas no mundo, cristãos e ateus. Mas não é assim, além de cristãos existem muitas outras religiões, muitas outras escolhas para se conhecer o divino, muitas outras experiências, e acreditem, cristãos, muitas são legítimas e entregam paz e significado a muitas vidas, permitem frutos do bem que permanecem. 
      “E esta palavra: ainda uma vez, mostra a mudança das coisas móveis, como coisas feitas, para que as imóveis permaneçam; por isso, tendo recebido um reino que não pode ser abalado, retenhamos a graça, pela qual sirvamos a Deus agradavelmente, com reverência e piedade; porque o nosso Deus é um fogo consumidor” (Hebreus 12.27-29). O reino que não pode ser abalado não é o que depende de votos, de revolução, de golpe ou de guerra, é o espiritual, inabalável e eterno, existia no tempo de Israel do antigo testamento, nos primeiros séculos com a igreja primitiva na Terra, e depois, com a igreja católica e a reforma protestante neste mundo. Deus nunca precisou ser visto e reconhecido aqui para ter um reino lá.
      Se querem saber, está tudo na Bíblia, entenderá quem interpretá-la com oração e liberdade no Espírito, indo além de tradições, preconceitos e vaidades, discernindo contextos culturais e históricos pertinentes a todos os seus escritores, incluindo Daniel, os evangelistas registrando as palavras de Cristo, Paulo e João, codificador de Apocalipse. Um erro que muitos cometem é a pressa, achar que o tempo atual é especial quando não é, ainda que as coisas estejam acontecendo mais depressa. Muitas pestes, fomes, eventos violentos da natureza e guerras, acontecem como sempre aconteceram e sempre acontecerão. Ainda há muito para ocorrer, mas o final não é de derrota, é de vitória e para todos, no final a luz mais alta triunfará. 
      Na verdade a humanidade vive, sim, um momento especial, mas esse representa justamente relevâncias, que a extrema direita do Brasil, que muitos cristãos apoiam, diz não serem coisas importantes. São causas que justamente a esquerda tomou como agenda, quando homens se calam as pedras falam, direitos das minorias, cuidado com conservação de rios, mares, terras, ar, florestas e animais. Vendo a coisa por esse prisma quem está adiantando o fim do mundo não são os não cristãos, mas muitos que se autodenominam cristãos. Se o juízo moral ocorrerá na eternidade, o juízo material ocorre neste mundo, cobrando da humanidade seu desrespeito pelo planeta. Será que muitos evangélicos estão preparados para esse juízo? 

38. Quando Deus usa o errado
Introdução

      “Quem é aquele que diz, e assim acontece, quando o Senhor o não mande? Porventura da boca do Altíssimo não sai tanto o mal como o bem?” Lamentações 3.37-38

      Muitos aliam o bem a Deus e o mal ao diabo, assim criam um embate maniqueísta que na verdade não existe. Deus administra tudo, ainda que para alguns trabalhos use seres espirituais de luz e homens de bem, e para outros use seres espirituais das trevas e homens estúpidos e sem sabedoria. ”Diabo” não é um poder equivalente a Deus só que do outro lado, é apenas uma criatura não querendo fazer o bem, ainda que só aja com autorização do Senhor. 
      Esta reflexão pode receber vários nomes, um deles é uma afirmação, “A coisa não é tão simples assim”, outro nome é “Palavras imediatas, palavras eternas”, visto que palavras proféticas diferentes podem ser entregues pelo Espírito Santo, sejam para resolver questões imediatas, sejam para questões mais duradouras. O texto a seguir cita dois governantes, o persa Ciro, que libertou Israel do cativeiro babilônico, e Saul, primeiro monarca de Israel.
      Nenhum desses homens foram, como pessoas, exemplos de homem de Deus, mas ambos foram usados por Deus para esse cumprir seus propósitos. Podemos encontrar nessas crônicas israelitas antigas similaridades com a história política recente do Brasil? Talvez. Mas com certeza eu achei uma lição importante no posicionamento do profeta Samuel e na maneira como Deus age no mundo, usando o bem e o mal para conduzir a humanidade. 

1. A coisa não é tão simples assim

      “Eu sou o Senhor, e não há outro; fora de mim não há Deus; eu te cingirei, ainda que tu não me conheças; para que se saiba desde o nascente do sol, e desde o poente, que fora de mim não há outro; eu sou o Senhor, e não há outro. Eu formo a luz, e crio as trevas; eu faço a paz, e crio o mal; eu, o Senhor, faço todas estas coisas.” Isaías 45.5-7

      Assisti um vídeo que me deixou estarrecido, políticos e apoiadores importantes do governo do presidente do Brasil entre 2019 e 2022, comemorando em 2021 a aprovação de um evangélico ao S.T.F. (refletimos sobre isso nas duas postagens anteriores). O que me estarreceu foi uma mulher, importante nesse contexto, se levantar louvando a Deus e falando em línguas espirituais estranhas, visto o êxtase que ela sentia pelo ocorrido. Podemos analisar esse evento, que na minha opinião é mais importante que muitos cristãos acham que é, sob vários aspectos, mas o mais importante é entendermos que as coisas não são tão simples assim como avaliações rasas e tendenciosas podem achar que são, a vida nunca é simples. 
      A primeira coisa que preciso dizer é que sou cristão que acredita em dons espirituais para os dias de hoje, ainda que reconheça que eles sejam usados muitas vezes com boa intenção, mas de maneira infantil, e às vezes até encenados e forçados com más intenções. Mas a existência do falso não inviabiliza o verdadeiro, e mais, acredito que experiências com os dons espirituais descritos no novo testamento sejam caminho imprescindível para a espiritualidade mais elevada, que pode dar acesso a muitos mistérios da existência humana no universo. Exatamente por levar esse assunto tão a sério é que tenho dificuldade para aceitar que sua manifestação possa ocorrer em vidas em pecado ou equivocadas de alguma maneira. 
      Quem acompanha este espaço sabe do posicionamento deste que vos escreve sobre cristãos apoiando extrema direita política, principalmente um presidente negacionista da ciência e a favor de legalização mais ampla de armas, dentre outras coisas, assim, não considero que cristãos lúcidos estavam naquele grupo que vi no vídeo comemorando a aprovação do evangélico ao S.T.F.. Isso é o que eu penso, mas o que Deus pensa? Deus ama igualmente a todos e dá do seu Espírito a todos que buscam, assim, julgar que algo não é de Deus por ocorrer numa pessoa que em minha opinião não age corretamente em alguns assuntos não é sábio. Se fosse assim Deus não teria usado o catolicismo por séculos para abençoar a humanidade. 
      “Te cingirei ainda que tu não me conheças”, diz o texto de Isaías 45.5-7, tomo para mim essa palavra, eu não conheço a Deus como acho. “Faço a paz e crio o mal, eu, o Senhor, faço todas estas coisas”, o que dizer de uma declaração assim? Deus faz tudo, até usa o malvado para cumprir um propósito benigno neste mundo, e o contexto histórico desse texto se refere exatamente a isso, o rei persa Ciro, seguidor de outros “deuses”, sendo usado para livrar Israel, povo do Deus mais alto, de Nabucodonosor. A verdade é que não sabemos e não entendemos os caminhos do Senhor, eles muitas vezes são complicados, não por causa de Deus, esse é essencialmente reto, mas por causa dos homens e seus sistemas num mundo em confusão.
      Se Deus usou Ciro em seus propósitos, por que não pode usar um político de extrema direita? Isso é possível, apesar de muitos acharem que não é, dentre esses uns que idolatram outro mito, e na opinião desses, um mártire que foi preso injustamente como resultado de um golpe arquitetado por juízes do Paraná na operação Lava-a-jato. Como seres humanos, que buscam a luz mais alta de Deus, não podemos nos deixar ser enganados nem por um, nem por outro, ainda que um deles tenha apoio de lideranças cristãs, contudo, temos que aceitar que Deus usa quem quer. Nossos sentidos presos à matéria, ao tempo e ao espaço, não fazem ideia do que algo pode desencadear, do que deve ocorrer para que o fim melhor ocorra. 

2. Palavras imediatas, palavras eternas

      “Então todos os anciãos de Israel se congregaram, e vieram a Samuel, a Ramá, e disseram-lhe: Eis que já estás velho, e teus filhos não andam pelos teus caminhos; constitui-nos, pois, agora um rei sobre nós, para que ele nos julgue, como o têm todas as nações. Porém esta palavra pareceu mal aos olhos de Samuel, quando disseram: Dá-nos um rei, para que nos julgue. E Samuel orou ao Senhor. E disse o Senhor a Samuel: Ouve a voz do povo em tudo quanto te dizem, pois não te têm rejeitado a ti, antes a mim me têm rejeitado, para eu não reinar sobre eles.”  I Samuel 8.4-8

      Palavras imediatas e palavras eternas, o Espírito de Deus nos dá esses dois tipos de palavras, ambas verdadeiras, ambas acontecerão de um jeito ou outro. As imediatas refletem a misericórdia do Senhor, que precisa ajudar alguém em curto prazo, de qualquer jeito, principalmente se esse alguém, ainda que equivocado em muitas questões, o buscou com sinceridade. Eu vejo um cristianismo evangélico equivocado no Brasil, mas ainda assim sincero, que pai não se toca com um filho, que ainda que teimoso para cumprir sua vocação maior, procura sua ajuda aos prantos? Eu não sou Deus, mas sou pai, e como pai posso entender, pelo menos um pouco, a misericórdia do Senhor com o Brasil, ninguém duvide dela. 
      Os que não temem a Deus não podem entender a Deus, e muitos que se dizem cristãos agem assim, julgam e condenam muitos cristãos, mas não percebem a extensão da misericórdia do Senhor. Sim, penso que um momento espiritualmente tão íntimo como o registrado no vídeo que citei inicialmente, não deveria vir a público. Teve um propósito político para os que aparecem, agradando um eleitorado que acha o que é mostrado relevante, mas quando conveniência humana usa o nome de Deus comete sério pecado, em minha opinião, advertido nos mandamentos de Moisés (Êxodo 20.7). Exibir publicamente, algo que creio ser tão especial, vulgariza o dom do Espírito Santo, mas Deus tem paciência com isso, mais que eu tenho.
      Existe, contudo, uma palavra eterna de Deus que deve ser entregue, de um jeito ou de outro, essa é a que este espaço procura entregar, não com arrogância, mas como missão. Essa palavra revela uma vontade de Deus que vai além do momento atual do Brasil, e que conduz o homem a uma espiritualidade muito mais alta, que o cristianismo do mundo, que as igrejas protestantes e evangélicas, que o catolicismo e outras religiões, podem entender neste início do século XXI no planeta Terra. Nessa vontade mais alta, estupidez e infantilidade em nome do evangelho não cabem, mesmo com intenção sincera, e eu penso que o momento para que Deus cobre essa vontade mais alta já está chegando, ao Brasil e à toda a humanidade. 
      Quando Israel pediu um rei (I Samuel 8.4-8), Deus disse que não precisavam de um rei como as outras nações, ele era seu rei. Ainda assim, na insistência, Deus deu um rei conforme o coração de Israel, Saul, uma intenção sincera, mas errada, alcançou um objetivo vão que deu no que deu. Então, Deus levantou Davi, você acha que Davi era a vontade eterna de Deus para Israel? Também não era, mas era o melhor que Deus podia fazer com a realidade, e de fato Davi era um homem com um coração especial, que realizou grandes coisas, ainda que tenha cometido sérios pecados (II Samuel 11-12). A vontade maior do Senhor para Israel e para toda a humanidade sempre foi Jesus, um rei espiritual que conduz a um reino espiritual. 
      Você acha que durante o reinado de Saul, Israel não cultuava a Deus? Não oferecia sacrifícios, não adorava ao Senhor, não era cuidado pelo Altíssimo? Claro que tudo isso acontecia, e a religiosidade de Israel era sincera, assim como autêntica a atuação de Deus em suas vidas. O que um homem como o profeta Samuel devia pensar quando via tudo isso? Agia com temor a Deus, sabia que aquilo não era o melhor para Israel, mas que ele devia respeitar a escolha do povo e a vontade do Senhor, que tinha dado ao povo aquilo que o povo desejou. Situação semelhante ocorre com muitos cristãos com o governante eleito em 2018 no Brasil, nunca foi e nunca será o melhor, mas foi o que muitos quiseram, que “Samuel” respeite isso. 

Conclusão

      “Porque o Filho do homem virá na glória de seu Pai, com os seus anjos; e então dará a cada um segundo as suas obras.” Mateus 16.27
 
      Este texto representa algo muito especial para mim, uma palavra do Espírito Santo que mudou meu posicionamento diante de posicionamentos que muitos protestantes e evangélicos têm tomado diante da política, principalmente nos últimos quatro anos. Uma parte desses cristãos apoia envolvimento cristão com política no Brasil há algum tempo, pentecostais fazem isso há décadas, colocando membros de suas igrejas nas várias esferas da administração pública, mas o que temos visto, depois que o governante de extrema direita venceu a eleição de 2018, é mais significativo.
      Eu estou entendendo em Deus que não posso julgar, ainda que tenha entendimento de Deus que a igreja cristã precisa sair da infância e que o mais correto seria nenhum envolvimento de pessoas realmente espirituais com as coisas deste mundo, a não ser no mínimo exigido pela lei ao cidadão (Lucas 20.25). Contudo, aprendi muito com o procedimento do profeta Samuel, ele não abriu mão de sua chamada, da iluminação que tinha recebido, mas ainda assim respeitou as escolhas do povo de Israel, e principalmente, acatou o respeito de Deus diante das escolhas não tão adequadas do povo. 
      Assim, de fato, a coisa não é tão simples assim, aquele que quer viver com lucidez deve ter paciência, não se vender a lados, ainda que possa ser julgado como “isentão” ou “em cima do muro”, mas vigiar em Deus, esperando novos céus e nova Terra onde haverá justiça. Deus por sua vez abençoa mesmo o imperfeito, dá do seu Espírito mesmo ao infantil, ouve as orações mesmo do que pede algo que a longo prazo não será o melhor para ele, mas quem não é imperfeito, infantil ou que não pede insistentemente algo que poderá lhe prejudicar depois? A eternidade revelará a verdade.
      O título desta reflexão é “Quando Deus usa o errado”, mas muitos poderão dizer, “Deus usou para que esse governante de extrema direita, ele fez tudo errado?”, também tenho essa opinião, mas esse era o “Saul” que o povo cristão pediu, o “Ciro” que o povo cristão precisava no seu ponto de vista. Mas eu creio que Deus usou, sim, para mostrar que aquilo que o homem acha ser bom, mesmo bem intencionado, pode não ser. Muitos cristãos entendem isso hoje, após quatro anos? Não, na verdade muitos acham que o tal presidente fez tudo certo. Mas de novo digo, a eternidade os fará entender. 

      “Respondeu Jesus, e disse-lhe: O que eu faço não o sabes tu agora, mas tu o saberás depois.” João 13.7

José Osório de Souza, 13/12/2021

39. Do Senhor é o Brasil

      “Do Senhor é a terra e a sua plenitude, o mundo e aqueles que nele habitam. Porque ele a fundou sobre os mares, e a firmou sobre os rios. Quem subirá ao monte do Senhor, ou quem estará no seu lugar santo? Aquele que é limpo de mãos e puro de coração, que não entrega a sua alma à vaidade, nem jura enganosamente. Este receberá a bênção do Senhor e a justiça do Deus da sua salvação.” Salmos 24.1-5

      O Brasil NÃO é do presidente, dos políticos, das forças armadas, nem da ciência, das empresas ou das mídias, e muitos menos dos cristãos, sejam católicos, protestantes, evangélicos, ou de qualquer outros religiosos ou não religiosos. Brasil é de Deus! Sendo assim, antes de quererem fazer isso ou aquilo com o país, deveriam perguntar primeiro a Deus o que ele quer fazer, principalmente muitos protestantes e evangélicos, já que são esses os que se acham ter exclusividade sobre direitos que dizem que receberam diretamente do Senhor. 
      Em primeiro lugar temos que dizer que ninguém, nos dias atuais, tem qualquer direito diferenciado ou privilégio sobre um território geográfico ou político, a não ser aqueles direitos que as leis locais dão a qualquer ser humano sobre a terra, indiferentemente de religião ou ausência de uma. Muitos evangélicos, contudo, pensam de outra forma, querem o reino de Deus no mundo e acham que agem de acordo com a vontade de Deus quando lutam para que sua religião prevaleça na condução política, educacional ou de outra área do país.
      A direita cristã tem predileção pela educação, pois acha que essa tem sido controlada pela esquerda. Primeiro é preciso entender que a nova esquerda não tem só bandeiras trabalhistas, como no início do comunismo, mas bandeiras sociais, pelas minorias, afrodescendentes e indígenas, contra sexismo, preconceitos, a favor da causa LBGTQIA+, da liberação de certas drogas etc. Em grande parte isso vai contra a tradição judaica-cristã, mas não era justamente a igreja católica quem dominava a educação antes? Parece que não deu conta.
      Não existe nenhuma teoria de conspiração na esquerda ter conquistado certas áreas de atuação. O cristianismo falso do mundo, não o de Cristo, teve sua oportunidade e só conduziu a humanidade a um conservadorismo que gerou preconceitos, tentou anular a ciência, e principalmente, negou o evangelho original de Jesus. Pois bem, o progressismo tem agora sua oportunidade, aceitem isso ou não os cristãos, se tivessem administrado certo os ensinos do mestre poderiam estar liderando a humanidade pelo Espírito Santo, ao invés do materialismo ateu.
      Se o Brasil é de Deus, quem tem direito a esse Brasil? O texto bíblico inicial pergunta isso e responde com outras palavras: “quem subirá ao monte do Senhor, quem estará no seu lugar santo? Aquele que é limpo de mãos e puro de coração, que não entrega a sua alma à vaidade, nem jura enganosamente”. Primeiro o texto não se refere a um monte físico, mas a uma posição espiritual. Monte do Senhor ou lugar santo é a presença mais elevada de Deus, não na Terra, mas no plano espiritual. O evangelho não promete reino de Deus no mundo.
      Seja como for o privilégio espiritual que é possível ao ser humano exige certas virtudes, mãos e coração limpos, ausência de vaidades e palavra de verdade. Será que vemos isso, principalmente em políticos de direita e em muitos cristãos que se dizem militantes pelo Brasil em nome de Deus? Penso que não, mãos e coração limpos é santidade na ação e na intenção, na prática e no coração. Como podemos dizer que isso existe em vidas que claramente estão envolvidas com corrupção e práticas ilegais usando suas influências como líderes políticos?
      Vaidade na política é querer se manter num cargo, não porque a maioria democrática deseja ou porque se quer o melhor para o país, mas só para ter exaltado o ego, sua visão de mundo sobre as outras, visão baseada em preconceitos e violência. Não há humildade em muitos que se consideram donos legítimos do Brasil, incluindo líderes evangélicos, há nesses egocentrismo e desejo de vingança. Por último, os que merecem a presença mais santa de Deus não devem jurar enganosamente, serem mentirosos. Quem nega a ciência não é mentiroso? 
      Quem insiste em administrar o Brasil de uma maneira, ainda que sacrificando vidas, influenciando milhares que creem em suas palavras com fake new, dizendo que essa é a melhor forma de fazer as coisas, porque é a que protege o país, não é mentiroso? O pior tipo de mentiroso é o que usa até textos bíblicos para justificar suas mentiras, aliando a Deus coisas que Jesus nunca disse, baseado em interpretações preconceituosas e equivocadas da Bíblia. Esse mentiroso é pior que o que se diz ateu e materialista e que mente só em seu nome. 
      Do Senhor é o Brasil e a vontade de Deus para o nosso país pouco tem a ver com aquilo que muitos líderes evangélicos e um grupo político que se diz representante desse cristianismo enganado e herege, dizem ter. A vontade do Senhor é mudar o indivíduo que permite ser mudado, nada mais, a ação divina não é coletiva, é pessoal, não é política, é moral. Não tem legitimidade espiritual apoiarmos, como igrejas cristãs deste mundo, esse ou aquele político, essa ou aquela ideologia. Mudemos o Brasil, mas de dentro para fora do indivíduo.

40. Oremos pelos governantes

      “Admoesto-te, pois, antes de tudo, que se façam deprecações, orações, intercessões, e ações de graças, por todos os homens; pelos reis, e por todos os que estão em eminência, para que tenhamos uma vida quieta e sossegada, em toda a piedade e honestidade; porque isto é bom e agradável diante de Deus nosso Salvador, que quer que todos os homens se salvem, e venham ao conhecimento da verdade.” I Timóteo 2.1-4

      Ouvi um grande líder evangélico dizer, “dízimos e ofertas das igrejas são necessários pois sem eles não consigo manter programa de TV que faz trabalho evangelístico”, mas quem disse que Deus precisa de um serviço tão caro para propagar o evangelho? Não seria melhor usar esse recurso para ajudar pobres e outros necessitados, mesmo que não se tornem membros oficiais de igrejas? Contudo, testemunho pessoal não aparece para os homens, não conquista poder político, eleitorado, não sacia vaidade de pastor que só quer poder neste mundo. 
      Os que são sábios, humildes e tementes a Deus, cumprirão seus deveres como cidadãos em eleições, e se manterão longe tanto quanto possível de política. Queremos mudar o Brasil? Ajudemos os indivíduos. Evangélicos, ao invés de se envolverem com política, tornem suas igrejas locais de auxílio a pobres e viciados, distribuam alimentos, roupas, criem cursos para ajuda social e profissional. Façam isso não para aumentarem os dizimistas, mas como caridade desinteressada, respeitando livre arbítrios, visando a pátria celeste, não a brasileira. 
      A afirmação que segue poderá chocar alguns: Deus não é Senhor do Brasil! Deus é criador do universo e nada ocorre sem que ele permita, mas neste mundo ele é Senhor só daqueles que deixam que ele seja. Depois que Jesus cumpriu sua obra de redenção, Deus não usou mais uma nação para testemunhar dele, como usou Israel nos tempos do antigo testamento. Israel podia dizer, “Deus é Senhor dessa nação”, ainda que passasse muito tempo rebelde a Deus e em cativeiro. Hoje Deus é Senhor de indivíduos, indiferente da nação que façam parte. 
      Isso não significa que Deus não atenda clamores apaixonados e sinceros do bem, que pedem que Deus salve o Brasil, que Deus cure o Brasil, que Deus traga prosperidade ao Brasil. Mas esses sinceros precisam aceitar que nem no céu haverá humanidade unânime, mas várias, e aqui no mundo as secções são ainda mais numerosas. O Brasil não é um povo, mas vários, especialmente o nosso país, formado por imigrantes de tantos locais do mundo, junto com os povos originais que já estavam nas Américas. Existir só uma crença no Brasil é difícil. 
      Por várias vezes tenho levantado aqui o posicionamento que o reino de Deus é no céu, não no mundo. Isso é argumento para invalidar intenção de cristão envolver-se com política, elegendo candidato que o represente religiosamente, crendo que isso é vontade de Deus. Um bom político precisa nos representar em muitas áreas, materiais, culturais, até morais, mas não religiosa. Talvez seja aí que muitos cristãos tenham uma dificuldade séria, não conseguem separar área moral da religiosa, acham que por alguém não ser cristão não tem moral.
      “Pelos seus frutos os conhecereis” (Mateus 7.20), quando, como cristãos, daremos importância a isso ao invés de crermos que alguém é evangélico só porque diz que tem em fé em Cristo e é membro de igreja? Assim engaiolamos os pardais e deixamos correr soltos, no meio das cidades, os hipopótamos. Quantos homens no mundo, assumindo-se como não evangélicos, e mesmo como ateus, estão fazendo pela humanidade o que muitos cristãos não estão fazendo, defendendo o planeta, fazendo caridade, lutando pelas minorias, eu conheço muitos. 
      Enquanto isso muitos evangélicos acham que estão no centro da vontade de Deus porque participam de cultos em templos lotados, cantando louvores e ouvindo pregadores carismáticos. Eu não entendo pelo texto bíblico inicial, que devemos orar pelos governantes necessariamente esperando que eles se convertam à religião cristã. A passagem diz “para que tenhamos uma vida quieta e sossegada, em toda a piedade e honestidade”, entendo que devemos pedir que eles tenham vidas dignas para desempenharem bem suas funções públicas.
      Depois diz “porque isto é agradável diante de Deus que quer que todos os homens se salvem e venham ao conhecimento da verdade”, assim podemos e devemos até desejar que eles se salvem, mas salvação, seja lá como isso for interpretado, não é pré-requisito para que exerçam bem cargos políticos que envolvem vidas de muitos, incluindo dos que se pretendem salvos. Não se enganem, isso não diminui Jesus, ao contrário, o coloca no lugar certo, o espiritual, e nos leva a tratar todos como Deus trata, respeitando escolhas religiosas pessoais. 

41. Conservador ou progressista?

      “O sábio ouvirá e crescerá em conhecimento, e o entendido adquirirá sábios conselhos; para entender os provérbios e sua interpretação; as palavras dos sábios e as suas proposições. O temor do Senhor é o princípio do conhecimento; os loucos desprezam a sabedoria e a instrução.” Provérbios 1.5-7

      Cristianismo: conservador ou progressista? Os termos progressismo e conservadorismo são bem amplos, surgiram com o iluminismo na Europa no século XVIII e depois como uma resposta a esse no século XIX. Eles podem se referir às áreas social, econômica, política, moral, ética e mesmo religiosa. Enquanto o progressista prega uma evolução constante em muitas áreas, baseada na ciência, o conservador ensina a manutenção de valores tradicionais, que na origem incluíam poder do monarca, por ter recebido esse direito pelo sangue, e submissão à igreja católica. Ele está ligado à direita política, e em seus princípios iniciais até o protestantismo era antagonizado.
      O progressismo é ligado à esquerda política, sendo base para o positivismo, o liberalismo econômico, o darwinismo social e o marxismo, que inicialmente lutava mais no ativismo trabalhista, mas que depois deu origem à nova esquerda. É importante entendermos essa mudança da esquerda, que passou a lutar no ativismo social, em questões como direitos civis e políticos, feminismo, direitos homossexuais, pacifismo, questionamento dos papéis de gênero, aborto e reformas de políticas de drogas. Esse papel social anteriormente era mais ligado à religião, o catolicismo que tinha predominância no ensino, por exemplo, perdeu lugar para ensinadores e pedagogos dessa nova esquerda. 
      Muitos cristãos não percebem, mesmo em seu modo de ver as coisas, que na obsessão de conservarem tradições ultrapassavas, perdem a corrida por representarem as necessidades mais relevantes da humanidade, e não me refiro às materiais, essas a ciência deve resolver. Essas causas da nova esquerda, e mesmo do velho marxismo, buscando igualmente e vida digna para todos, deveriam ser do evangelho, não de ideologias ateias. Mas com medo de se opor ao conservadorismo religioso, muitos cristãos fazem parte do problema, não da solução. Por que muitas das pessoas interessadas em mudar o mundo preferiram as propostas da nova esquerda e não do evangelho? Jesus ficou mais fraco?
      De maneira alguma. O argumento que muitos cristãos usam para ficarem do lado do conservadorismo é que esse defende valores da tradição judaica-cristã, principalmente de família e sexualidade, assim acham que estão do lado de Deus, enquanto que o outro lado, o lado progressista, da esquerda, dos comunistas, para eles é o lado do diabo. Mas que diabo é esse que defende minorias e é contra preconceitos? Não estou dizendo que todas as causas da nova esquerda estão de acordo com a vontade mais alta de Deus, como por exemplo não está a luta por direito indiscriminado ao aborto. Contudo, na falta de sabedoria, muitos cristãos se põem num extremo e não veem que Deus está no equilíbrio. 
      Não nos percamos nos extremos, em poucas palavras: progressismo é evolução, conservadorismo é estagnação. O Deus verdadeiro, é estagnado ou evolutivo? O espiritismo de Allan Kardec é claramente progressista, ainda que seja algo espiritual propõe um espiritualismo científico, assim mais caracterizado ainda como progressista. O catolicismo é início e fim do conservadorismo, não só religioso, mas social, moral e mesmo político, ele sobrevive disso. O protestantismo, ainda que visto inicialmente como progressista, não só na religião mas também na política e na economia, se põe hoje como conservador, principalmente na área social. Hoje o termo conservadorismo liberal está em voga.
      O conservador liberal faz uma diferenciação, mesmo que se seja conservador nas outras áreas, na econômica é liberal. Vemos isso claramente no atual governo brasileiro, conservador nas tradições de família e gênero, portanto na religião, mas liberal na economia. Mas isso não é tentar o melhor de dois muitos? Em se tratando de cristãos, conveniente para preconceituosos e materialistas não assumidos. Preconceituosos porque acham que a Bíblia proíbe certas coisas e desobedecer isso é ir contra Deus, conservadorismo é pai do preconceito. Materialistas não assumidos porque apesar de se dizerem espirituais, estão mais interessados, ainda que pela religião, em riquezas e poderes deste mundo. 
      Desculpe-me se não fui preciso em alguns termos citados, não sou especialista no assunto, se possível, entre nos links deixados e informe-se mais, contudo, esses temas estão presentes no mundo atual, é interessante entendermos alguma coisa sobre eles. “O sábio ouvirá e crescerá em conhecimento”, diz o texto bíblico inicial, assim estar bem informado sobre economia, política, mesmo antropologia, é importante para aquele que teme a Deus e o segue de perto. Nossa sabedoria não está só relacionada com religião e Bíblia, a vida moderna pede muito mais dos que querem andar na luz. As trevas, por sua vez, são astutas, se o que caminha com Deus não estiver atento poderá ser presa delas. 

42. Espírito progride sempre

      “Dize-nos, pois, que te parece? É lícito pagar o tributo a César, ou não? Jesus, porém, conhecendo a sua malícia, disse: Por que me experimentais, hipócritas? Mostrai-me a moeda do tributo. E eles lhe apresentaram um dinheiro. E ele diz-lhes: De quem é esta efígie e esta inscrição? Dizem-lhe eles: De César. Então ele lhes disse: Dai pois a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus.” Mateus 22.17-21

      O texto inicial é uma daquelas passagens inesquecíveis do evangelho, onde tentando deixar Jesus sem resposta, os enviados dos líderes religiosos judeus recebem aquela palavra simples e profunda que só Deus tem, “dai pois a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”. A matéria não precisa negar o espírito, nem o espírito negar a matéria, existe equilíbrio possível. O que não se pode é inverter as coisas, tentar espiritualizar a matéria ou materializar o espírito. Homens “espiritualizam” a matéria quando pela ciência tentam explicar coisas espirituais com conceitos físicos, substituem Deus pelo ego humano, sua providência pela inteligência do homem, seus ideais de moral por ideologias terrenas. 
      Os homens tentam “materializar” o espírito quando creem que prosperidade no mundo é o mais alto reflexo de vida com Deus. “César” merece nossos impostos, não nossas almas, o dinheiro merece nossa administração sensata, não nossa adoração. O mundo físico precisa ser progressista, incluindo vida social que administra diferenças com igualdade, contudo, o plano espiritual pode ser conservador se estiver ligado de fato ao Deus verdadeiro. Mas quem conhece plenamente o Deus verdadeiro para se colocar como um conservador das verdades mais altas e imutáveis? Ninguém, assim temos que ser progressistas também para Deus, isso é focarmos no Espírito Santo, não nas tradição, e seguirmos aprendendo. 
      O cristão deve ser conservador ou progressista? Como em outros assuntos, as pessoas têm dificuldades para serem equilibradas, não acham um meio termo entre uma coisa e outra, ou tomam tudo de um lado ou tudo do outro, assim é mais fácil, não é preciso avaliar, escolher e arcar com consequências. Muitos simplesmente dizem, “sigo a orientação da minha religião, do papa, do padre, do pastor, do missionário, do apóstolo, não me importa o que os outros dizem”. Quem delega deveres delega direitos, o que deixa os outros pensarem por si será escravo dos outros, quem segue a homem não conhece a Deus. Deus pode ser conservador, nós não, ainda teremos que ser progressistas por muito tempo. 
      Deus conserva eternamente suas virtudes no mesmo nível de excelência, mas a humanidade ainda está longe de entender essas virtudes. Jesus veio como homem justamente para ensinar como a mais alta espiritualidade pode se manifestar no plano físico. Contudo, ainda assim, os homens engessaram os ensinos do Cristo, o dogmatizaram para dominarem outros homens, calando a voz do vivo Espírito Santo. O que muitos dizem ser o conservador ensino divino é só conveniente conservadorismo humano, para conhecermos a Deus precisamos nos libertar disso. Só nas asas do Espírito Santo progrediremos às regiões espirituais mais altas em Cristo, só assim teremos um conhecimento pleno para poder conservar.
      Sob um certo ponto de vista, podemos até dizer que o homem ou uma religião que se coloca como conservador é um grande arrogante. É achar que já sabe tudo de Deus, de maneira que aquilo que sabe deva ser guardado e lacrado, achando-se, assim, guardião exclusivo de verdades absolutas, que nunca mudarão e portanto devem ser conservadas. A igreja católica é o maior exemplo dessa arrogância, com isso ela trancou a civilização ocidental por séculos no que é denominado “idade das trevas”, negando ciência, perseguindo e matando quem pensasse diferentemente dela. Mas protestantes e evangélicos atuais também se perdem nesse engano, a arrogância, contudo, sempre precede uma vergonhosa queda.  
      Deus é liberdade para se progredir. Muitos religiosos não entendem essa afirmação, pois na verdade eles não querem ser livres, assim é mais fácil construírem um “Deus” que limita e prende para estão ser cegamente obedecido. Por outro lado, aqueles que negam religião, acham que são livres por não crerem em Deus, não entendem que também têm uma visão equivocada do Deus verdadeiro, aliás, a mesma visão que muitos crentes têm. Ocorre que enquanto muitos religiosos escolhem obedecer esse “Deus” equivocado, os não religiosos escolhem não obedecer a esse mesmo “Deus” equivocado, ainda que se tornem crentes equivocados de outra coisa, a ciência, eficiente para a matéria, mas não para o espírito. 
      “Sou progressista mas não sou comunista, sou conservador mas não sou cristão, sou liberal mas não sou materialista, sou crente mas não nego a ciência”, você consegue fazer essas afirmações? Não precisa fazer todas elas, pode até fazer outras mais arrojadas e mais antagônicas, mas o que importa é não se amarrar a definições absolutas e extremas, é usar a razão para encontrar equilíbrios. Isso é conhecer o Deus mais alto, um Espírito superior e livre que nos chama para sermos espíritos elevados e libertos. O mundo está mudando e há algum tempo, e mudará ainda mais, o Senhor nunca muda. Nós, contudo, precisamos humildemente assumir nossas mudanças para progredirmos em direção ao Deus Altíssimo. 

43. A quem queremos convencer?

      “E Jesus, movido de grande compaixão, estendeu a mão, e tocou-o, e disse-lhe: Quero, sê limpo. E, tendo ele dito isto, logo a lepra desapareceu, e ficou limpo. E, advertindo-o severamente, logo o despediu. E disse-lhe: Olha, não digas nada a ninguém; porém vai, mostra-te ao sacerdote, e oferece pela tua purificação o que Moisés determinou, para lhes servir de testemunho. Mas, tendo ele saído, começou a apregoar muitas coisas, e a divulgar o que acontecera; de sorte que Jesus já não podia entrar publicamente na cidade, mas conservava-se fora em lugares desertos; e de todas as partes iam ter com ele.” Marcos 1.41-45

      Ouvimos com frequência pregadores dizendo que nossas ações devem corresponder às nossas palavras. Não ser hipócrita é praticar o que se fala, mas quem consegue isso? Na maioria das vezes os que mais falam são os que mais têm boas coisas a dizer, portanto com mais coisas a viver. Isso não é sempre, há alguns que falam sempre e sem medo, mas só falam bobagens, portanto, o que falam condiz com o que vivem, esses acham que gostar de falar dá legitimidade para se dizer qualquer coisa. Contudo, um modo de atenuar a hipocrisia é falar menos, assim seremos menos cobrados, isso pode ser mais fácil que não praticar tudo que falamos. Quem fala se compromete, quem pouco fala, pouco se compromete (Provérbios 17.28). 
      Os outros precisam saber de tudo que pensamos? Não. Principalmente em termos de espiritualidade é melhor calar que falar. Muitos cristãos creem o contrário, principalmente evangélicos, por se verem como donos da verdade que livra todos do inferno, acham que devem tentar convencer as pessoas a acreditarem como eles acreditam. Não acham que estão importunando ninguém com isso, mas ajudando, mas na verdade estão importunando, e muito a muitas pessoas, eles mesmos, estão dando a juízes mais argumentos para que esses lhes cobrem em algum momento. Esses juízes estão neste mundo, também estarão no outro, mas mais que isso, estão dentro de nós. Falar demais pode ser uma tentativa de convencer juízes interiores. 
      No mundo atual as pessoas estão obcecadas para compartilhar suas vidas, a facilidade de acesso e de compartilhamento e a beleza das molduras entregues pelos filtros das redes sociais, levam muitos a crer que os quadros são maravilhosos e importantes. As pessoas estão sendo enganadas, manipuladas para que gerem espaços onde elas, de graça, ajudam a vender produtos. As pessoas trocam suas privacidades por fama, mas não percebem que são só marionetes nas mãos dos poderosos donos de Facebook, Instagram, Youtube, Twitter etc, e esses só querem lucros financeiros. Algo perigoso nesses negócios é que eles não respeitam limites nacionais, são globais, se acham acima do bem e do mal, de governos e de autoridades. 
      Quem resiste à fama, ao prazer de saber que é visto e admirado por muitos, de ter reconhecimento no mundo? Jesus resistiu, ele sabia os perigos de certas coisas serem conhecidas. O primeiro perigo foi o mais óbvio, sua missão despertaria a inveja de líderes religiosos judeus que poderiam lhe fazer mal por isso. Cristo sabia que não poderia ser livrado de seu fim, não se pode esconder a luz para sempre, mas o segredo deveria ser mantido para que o tempo de Deus se cumprisse. Enquanto isso Jesus ensinava os discípulos, cujas memórias construiriam o que mudou a humanidade depois, os textos bíblicos. Jesus era um homem de ação, suas palavras eram efeito disso, mas elas teriam uma missão no futuro por isso precisou de tempo. 
      Outro perigo de deixar público certos conhecimentos é jogar pérolas aos porcos, deixar saber quem não está preparado para saber que portanto entenderá errado e contribuirá mais para à incredulidade que para a fé. No texto bíblico inicial o homem relatou uma cura física, quem não fica feliz com uma cura assim? Mas ele não foi sábio, em primeiro lugar porque desobedeceu uma orientação de Jesus. Quando Deus fala, ainda que não entendamos, mesmo que discordemos com boa argumentação, devemos obedecer. Deus não vê só o aqui e agora, mas todos, tudo e sempre, o Senhor sabe as consequências de uma informação nos complicados sistemas do universo, das relações humanas, dos poderes e escolhas de homens e outros seres. 
      Não falar algumas coisas porque as pessoas não estão preparadas para certas coisas é ato de amor. Podemos estar protegendo as pessoas delas mesmas, de pecarem, caso recebam certas informações, e não me refiro só a mistérios espirituais, falo de coisas triviais de nossas vidas materiais. Sejamos responsáveis, não só alertando os outros de perigos caso não façam as coisas certas, mas também impedindo-os de cometerem erros de julgamento sabendo de coisas que não podem administrar de maneira sadia, moral e espiritualmente. O silêncio protege, não só a nós como aos outros. Se muitos acham que falar é melhor que fazer e outros pensam que fazer é melhor que falar, orar a Deus deve preceder tudo, ações e palavras. 
      Falar demais encurta o tempo, impede Deus de agir com paciência, quando falamos demais ocupamos tempo e atenção que alguém deveria estar dando a Deus. Sem paciência com os outros ou com o que achamos que precisamos receber dos outros, queremos resultados rápidos. Mas Deus trabalha no silêncio, e de maneiras que não podemos sequer imaginar. Deus é espírito, o Espírito é intraduzível pela matéria, essa só pode fazer esboços grosseiros dele. Oração vale mais que discursos, se feita com intenção correta, amor e iluminação, porque ela se coloca no mundo espiritual, com ferramenta espiritual atuando nas pessoas de maneira espiritual. Orar não apressa nada, e se fazemos isso em espírito, o pouco valerá por muito. 
      Quando oramos, em todos os níveis, emocional, racional e espiritual, saímos convencidos do que somos, do que queremos, do que temos que receber e do que Deus quer nos dar. Essa satisfação anula toda carência e insegurança que nos levam a querer convencer os outros de algo que nada tem a ver com os outros. A oração emocional pode desaguar em choro, e podemos estar precisando muito chorar. A oração racional nos faz verbalizar as questões, entendermos intelectualmente nossa vida no que é possível, é exercer inteligência e ver soluções. Mas é na oração plenamente espiritual, onde o Espírito Santo não é só meio passivo, mas participante ativo, quando exercemos os dons espirituais, onde recebemos a paz maior. 

44. Gideão e sua incredulidade

      “Então o anjo do Senhor lhe apareceu, e lhe disse: O Senhor é contigo, homem valoroso.” Juízes 6.12
(Para melhor entendimento leia passagens bíblicas no final)

      Gideão, talvez, seja o homem mais incrédulo que a Bíblia relata, mais que Tomé? Talvez. Ainda assim Deus o escolheu para livrar a nação de Israel. Isso nos ensina que não é o homem para uma ação de Deus, que beneficiará outros homens, mas a ação de Deus para ensinar um indivíduo, que depois pode ser usado para abençoar outros indivíduos. O Senhor tem sempre interesse específico em nós, assim não chama preparados, mas prepara chamados, ainda que chamados tenham sempre potencial para serem usados. 
      Deus não chama qualquer um para qualquer coisa, o Senhor sabe o que podemos vir a ser, ainda que não sejamos no presente. Gideão não era qualquer um, mas o homem certo para uma missão. Na passagem de Juízes 6-8, a história de Israel é reincidente, o povo se afastou de Deus e foi entregue nas mãos de seus inimigos, esses impediam Israel de plantar e criar animais, com isso Israel empobreceu, perdeu sua autonomia de nação. Onde estavam os falsos deuses em que confiou Israel para ajudá-lo nesse momento? 
      Deus toma a iniciativa para ajudar um povo que se afastou dele, o “anjo do Senhor” veio e assentou-se sob uma árvore. Gideão, trabalhando, mas mais ocupado em ludibriar o inimigo, que mudar a condição que tinha levado Israel a sucumbir diante do inimigo, não viu o “anjo do Senhor”, assim o anjo “apareceu” a Gideão para que ele o reconhecesse. Imediatamente Deus deixou bem claro o que pensava de Gideão, “o Senhor é contigo, homem valoroso”, a palavra de Deus é sempre de incentivo, nunca de acusação. 
      Deus é maravilhoso, acredita em nós quando nós não cremos nem nele, nem em nós mesmos. “Se o Senhor é conosco, por que tudo isto nos sobreveio?”, disse o incrédulo Gideão, ele duvidou da afirmação do “anjo”, não teve a noção ou a humildade para assumir que Israel sofria porque estava em pecado, antes jogou a culpa em Deus pelo sofrimento. O “anjo” respondeu mostrando novamente a fé que Deus tem em nós, que não exige de nós mais que o que somos e podemos fazer, “vai nesta tua força e livrarás a Israel”.
      Quantas vezes temos que ouvir de Deus que se crermos e obedecermos tudo vai dar certo, até que mudemos de atitude e deixemos de ser rebeldes e incrédulos? Gideão insistiu em sua narrativa de vítima e fraco, como se Deus dependesse de suas forças e capacidades para fazer algo. “Porquanto eu hei de ser contigo, tu ferirás aos midianitas como se fossem um só homem”, insistiu Deus em sua paciente tarefa de conduzir o homem incrédulo e orgulhoso à vitória. Ah, se de fato crêssemos no amor de Deus. 
      Gideão não se convenceu, após duvidar das palavras, duvidou da legitimidade do mensageiro, ele queria um sinal. Se tem uma coisa que aprendemos com a história de Gideão é que um sinal nunca basta, quem pede um, pede dois, três e por aí vai, por isso ou cremos sem ver imediatamente, ou não fiquemos arrumando desculpas por sermos incrédulos. Quem pede sinal joga em Deus a responsabilidade de provar que é Deus, e tira de si a responsabilidade de crer em Deus, que petulância a nossa tantas vezes. 
      Deus acrescentou algo ao sinal, pediu a Gideão que derramasse o caldo sobre a carne e os pães, para que ficassem mais úmidos, então, fez subir fogo que os consumiu, após isso o “anjo” se foi. Coloquei “anjo do Senhor” entre aspas, esse ser, citado algumas vezes na Bíblia, é um mistério, alguns dizem que não é um simples anjo, mas um enviado especial, que fala por Deus em primeira pessoa, seria Gabriel? Parece que ele se apresenta inicialmente em forma humana. Leia na postagem de amanhã a parte final desta reflexão. 

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      “Porém os filhos de Israel fizeram o que era mau aos olhos do Senhor; e o Senhor os deu nas mãos dos midianitas por sete anos.” “Assim Israel empobreceu muito pela presença dos midianitas; então os filhos de Israel clamaram ao Senhor.” 
      “Então o anjo do Senhor veio, e assentou-se debaixo do carvalho que está em Ofra, que pertencia a Joás, abiezrita; e Gideão, seu filho, estava malhando o trigo no lagar, para o salvar dos midianitas. Então o anjo do Senhor lhe apareceu, e lhe disse: O Senhor é contigo, homem valoroso. 
      Mas Gideão lhe respondeu: Ai, Senhor meu, se o Senhor é conosco, por que tudo isto nos sobreveio? E que é feito de todas as suas maravilhas que nossos pais nos contaram, dizendo: Não nos fez o Senhor subir do Egito? Porém agora o Senhor nos desamparou, e nos deu nas mãos dos midianitas. 
      Então o Senhor olhou para ele, e disse: Vai nesta tua força, e livrarás a Israel das mãos dos midianitas; porventura não te enviei eu? E ele lhe disse: Ai, Senhor meu, com que livrarei a Israel? Eis que a minha família é a mais pobre em Manassés, e eu o menor na casa de meu pai. E o Senhor lhe disse: Porquanto eu hei de ser contigo, tu ferirás aos midianitas como se fossem um só homem.”
     “E ele disse: Se agora tenho achado graça aos teus olhos, dá-me um sinal de que és tu que falas comigo. Rogo-te que daqui não te apartes, até que eu volte e traga o meu presente, e o ponha perante ti. E disse: Eu esperarei até que voltes. E entrou Gideão e preparou um cabrito e pães ázimos de um efa de farinha; a carne pós num cesto e o caldo pós numa panela; e trouxe-lho até debaixo do carvalho, e lho ofereceu. 
      Porém o anjo de Deus lhe disse: Toma a carne e os pães ázimos, e põe-nos sobre esta penha e derrama-lhe o caldo. E assim fez. E o anjo do Senhor estendeu a ponta do cajado, que estava na sua mão, e tocou a carne e os pães ázimos; então subiu o fogo da penha, e consumiu a carne e os pães ázimos; e o anjo do Senhor desapareceu de seus olhos.”
 Juízes 6.1, 6, 11-21
José Osório de Souza, 28/11/2021

45. Israel não aprendeu a lição

      “Porém o Senhor lhe disse: Paz seja contigo; não temas; não morrerás.” Juízes 6.23
(Para melhor entendimento leia passagens bíblicas no final)
 
      Nesta postagem a parte final da reflexão sobre Gideão, leia na postagem anterior a 1ª parte. Chega a ser engraçado, primeiro Gideão duvida, depois teme, mas novamente há algo que pode comprovar que o “anjo do Senhor” não era um mero anjo, tal o estarrecimento de Gideão quando entende isso. Deus conforta Gideão de novo com a linda palavra do versículo inicial, que respeito o todo-poderoso mostra por nós, seres frágeis e orgulhosos. A paciência de Deus é infinita, nosso bom ânimo, não, devido à nossa incredulidade. 
      Essa história parece cumprida até aqui, e deveria bastar para Gideão aprender a lição, mas não bastou, ainda mais dois eventos mostram seu persistente ceticismo. Gideão pede mais sinais, dois com o velo de lã, para que Deus prove que daria a ele vitória conduzindo Israel contra seus inimigos. Finalmente Deus prova ainda mais a fé de Gideão, diminuindo ao máximo o tamanho do exército que Gideão lideraria, chegando ao número de apenas trezentos. O homem tem que ser enfraquecido para se fortalecer em Deus. 
      Por que isso? O incrédulo, ainda que obtenha vitória, poderá não crer que ela foi conquistada por intermédio de Deus, mas por ele, dessa forma um exército mínimo seria mais argumento para convencer Gideão a crer no poder de Deus, não na capacidade sua ou do exército de Israel. Por que isso era importante? Porque Deus não queria simplesmente dar a Israel uma vitória sobre um inimigo do momento, mas queria curar o problema inicial, que levou Israel a se afastar de Deus e ser oprimido por inimigos. 
      Se Gideão e Israel não aprendessem isso, poderiam até ter vitória naquela situação, mas passaria um tempo, eles se afastariam novamente de Deus e seriam oprimidos por um novo inimigo. Deus não quer só resolver um problema imediato, externo e passageiro, mas nos dar uma cura interna e duradoura. Quanto trabalho damos a Deus e consequentemente a nós mesmos por causa de nossa incredulidade, se simplesmente crêssemos seria muito mais fácil e rápido, pouparíamos tempo e muito sofrimento. 
      Desculpe-me, mas essa história não tem final feliz, e eis outro motivo que faz da Bíblia um livro único. Se fossem só registros de escritores contando sua própria história, talvez muitos fatos fossem deixados fora, como ocorre com auto-biografias, onde o que escreve sobre si mesmo só fala das coisas boas. Mas nas crônicas de Israel as coisas ruins são registradas sem receio, e em se tratando de Israel, sua história não tem um final feliz neste mundo até hoje, muitos ainda não entenderam que a vitória é individual e por Jesus.
      Parece que bastou o juiz Gideão falecer para que a nação de Israel voltasse a se afastar do Senhor e sofrer as terríveis consequências disso. Como um povo que provou tantos milagres de Deus pôde negá-lo tantas vezes? Mas será que somos diferentes, melhores que os israelitas? Isso é prova que experimentar milagres não é demonstração de espiritualidade, não nos faz mais ungidos, como tantos evangélicos acham hoje. Gideão pediu um, dois, três sinais, Deus deu provas, fez o milagre, ainda assim não foi suficiente. 
      Vejo nos personagens do velho testamento Deus lançando em nosso rosto, ainda que com amor, uma verdade: não mudamos facilmente, é preciso trabalho para pararmos de errar, pagarmos os preços pelo que erramos, então, fazermos coisas certas e colhermos bons frutos disso. Só mudamos com muita dor e muito tempo, tenhamos humildade para admitir isso. Talvez a eternidade dê continuidade à nossa evolução, talvez necessitemos de mais, talvez o trabalho para melhorarmos possa ser maior que esta vida, só talvez…

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      “Então viu Gideão que era o anjo do Senhor e disse: Ah, Senhor Deus, pois vi o anjo do Senhor face a face. Porém o Senhor lhe disse: Paz seja contigo; não temas; não morrerás.”
      “E disse Gideão a Deus: Se hás de livrar a Israel por minha mão, como disseste, eis que eu porei um velo de lã na eira; se o orvalho estiver somente no velo, e toda a terra ficar seca, então conhecerei que hás de livrar a Israel por minha mão, como disseste. E assim sucedeu; porque no outro dia se levantou de madrugada, e apertou o velo; e do orvalho que espremeu do velo, encheu uma taça de água. 
      E disse Gideão a Deus: Não se acenda contra mim a tua ira, se ainda falar só esta vez; rogo-te que só esta vez faça a prova com o velo; rogo-te que só o velo fique seco, e em toda a terra haja o orvalho. E Deus assim fez naquela noite; pois só o velo ficou seco, e sobre toda a terra havia orvalho.”
      “E disse o Senhor a Gideão: Com estes trezentos homens que lamberam as águas vos livrarei, e darei os midianitas na tua mão; portanto, todos os demais se retirem, cada um ao seu lugar.”
      “E sucedeu que, como Gideão faleceu, os filhos de Israel tornaram a se prostituir após os baalins; e puseram a Baal-Berite por deus. E assim os filhos de Israel não se lembraram do Senhor seu Deus, que os livrara da mão de todos os seus inimigos ao redor. Nem usaram de beneficência com a casa de Jerubaal, a saber, de Gideão, conforme a todo o bem que ele havia feito a Israel.”
Juízes 6.22-23, 36-40, 7.7, 8.33-35
José Osório de Souza, 28/11/2021

46. Paz pelo perdão

     “Tendo sido, pois, justificados pela fé, temos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo; pelo qual também temos entrada pela fé a esta graça, na qual estamos firmes, e nos gloriamos na esperança da glória de Deus.” Romanos 5.1-2

      Este espaço virtual não é lugar de respostas fechadas, mas de abertas perguntas, este que vos escreve não o faz porque sabe, mas porque não sabe. O que me leva a começar a escrever muitas vezes são questionamentos pessoais, que Deus, ao mesmo tempo que digito o texto, me responde. Compartilho muitas reflexões de consolos diários, mas outras como esta, são dúvidas doutrinárias que tenho e que existem porque o cristianismo tradicional não me respondeu, assim as levo a Deus. O tema desta vez é “salvação pela fé”, será que realmente sabemos o que é isso?
      Necessitamos do perdão de Deus, isso é água para nossa sede espiritual, entendendo ou não o que ele representa, Deus o dá a nós e nós sentimos paz. Contudo, ser perdoado é mais que ser limpo para voltarmos a uma posição passiva, que merece o céu para sempre só por estar nessa posição, antes é nos colocarmos de novo em movimento, para que por nossas obras continuemos rumo ao Altíssimo e único Deus verdadeiro. Deus nunca faz o trabalho que é nosso, até para crermos precisamos antes merecer por um certo trabalho, para então recebermos fé e seguirmos trabalhando. 
      Jesus tem duas importâncias exclusivas, a primeira é como homem encarnado que foi, mostrando-nos o ideal de vida moral e espiritual que Deus deseja de nós nesse mundo e que é possível termos. A segunda é como espírito eterno numa posição celestial acima de todo principado e potestade, demônios, diabos, anjos e outros seres espirituais, posição em que ele se encontra hoje. Quando oramos pelo nome de Jesus alcançamos pelo Espírito Santo a posição espiritual mais alta, que nos põe em contato direto com o Deus Altíssimo, transpassando todos os seres e reinos celestes. 
      Jesus, contudo, não é só uma porta, o que já seria muito bom, ele é um amigo que nos conhece, que nos ama e que intercede junto ao pai para que esse nos aceite, nos perdoe e nos capacite para seguirmos trabalhando. Não se enganem, Deus ouve a todos e a todos atende, mas por Jesus temos um acesso mais rápido e direto, felizes os que experimentam o perdão de Deus por Jesus. O Espírito Santo é uma experiência especial que temos pelo nome de Jesus, ele nos chama para crer, nos dá a paz do perdão e nos fortalece para seguirmos, o Espírito é consolador, mestre e meio.
      Ninguém despreze a necessidade do perdão de Deus, mesmo o esforço do homem de se levantar do erro e prosseguir para acertar não substitui esse perdão. Ninguém queira reformar uma casa sem antes pedir autorização do proprietário para isso, assumindo que ele é o dono do lugar e que quem faz a reforma é só um empregado. Pedir perdão a Deus faz isso, assume Deus como criador e mantenedor do universo e de nossas vidas, por isso temos uma paz singular depois, nada é melhor que estarmos agradando a Deus, isso nos dá a paz que nos fortalece para trabalharmos na reforma.
      A principal doutrina do cristianismo é Jesus Cristo como o salvador que perdoa toda a humanidade diante de Deus. Outras religiões dizem que Jesus foi um espírito superior, mas que é mais relevante como exemplo de vida, não como meio que aperfeiçoa de forma imediata os que nele creem. Enquanto outras religiões erram ao menosprezarem o papel salvador e perdoador de Jesus, o cristianismo tradicional se acomoda a um aperfeiçoamento meio “mágico” feito pela fé, menosprezando a importância de obras humanas nesse crescimento. Como sempre, a verdade está no equilíbrio. 
      Extremos sempre conduzem a equívocos, enfatizar as obras pode impedir as pessoas de provarem a maravilhosa redenção que há em Cristo, não só como alvo, mas como perdoador no caminho. Mas enfatizar a fé pode acomodar as pessoas, jogar toda a responsabilidade em Deus e tornar o homem ocioso, isso ainda coloca as pessoas em comunhão com Deus, mas pode impedi-las de crescer. Por causa desse equívoco que se faz com a fé é que mesmo após quase dois mil anos que Jesus subiu, a maioria dos cristãos ainda segue espiritualmente infantil e superficial, sendo aquém do que pode ser.
      Às vezes acho que precisamos mais de perdão que de salvação, visto que muitos têm certeza que são salvos, mas não vivem como perdoados, não têm paz. Salvação eterna? Isso é com Deus, eu confio nele, não em mim e muito menos em minha fé. Contudo, algo eu sei, sempre que busco ao Senhor com humildade, seja no momento que for, ainda que tenha errado muito e que não mereça nem sua atenção, sempre que preciso Deus me perdoa, e que paz sinto então. Essa paz é a força que necessito para seguir no presente, e proteção, contra a culpa do passado e o medo do futuro. 

47. Salvação pela fé

      “Mas Deus, que é riquíssimo em misericórdia, pelo seu muito amor com que nos amou, estando nós ainda mortos em nossas ofensas, nos vivificou juntamente com Cristo (pela graça sois salvos), e nos ressuscitou juntamente com ele e nos fez assentar nos lugares celestiais, em Cristo Jesus; para mostrar nos séculos vindouros as abundantes riquezas da sua graça pela sua benignidade para conosco em Cristo Jesus. Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus. Não vem das obras, para que ninguém se glorie” Efésios 2.4-9

      O cristianismo tradicional não pesa corretamente fé e obras, desequilibra os ensinos, assim pode não entender adequadamente textos bíblicos como o inicial. O texto conclui dizendo que a salvação não vem de obras, mas pela fé, o ponto é entendermos o que é a salvação referida. Salvação é comunhão com Deus, não aperfeiçoamento imediato, ainda que haja uma perfeição em potencial, salvação nos sintoniza com a espiritualidade mais alta de Deus. Essa salvação, que é o início de um processo, começa com uma oração de fé onde nos colocamos em Deus, isso é o chamado novo nascimento.
      Essa é a diferença principal que a nova aliança do Cristo entrega à humanidade, com relação à velha aliança de Moisés, ela é importante porque só assim alcançamos pela fé uma posição espiritual acima de outros “deuses”. Os outros “deuses” que a Bíblia se refere tantas vezes, e que vemos em muitas mitologias, hinduísta, egípcia, babilônica, grega, romana etc, não são só imagens e estátuas vazias, meros frutos da imaginação humana. Essas imagens e estátuas são símbolos, ainda que criados por homens, de seres espirituais reais e que podem estabelecer contato com os homens.
      Esses seres ainda existem, só que o homem moderno não necessita tanto de reforços antropomórficos, zoomórficos ou antropozoomórficos como precisavam os antigos, ainda que as formas mistificadas ainda sejam invocadas mentalmente. O deus egípcio Anúbis, por exemplo, com corpo humano e cabeça de chacal, não é só uma fantasia, ele tem significados esotéricos profundos e se refere a uma legião de seres espirituais. Da mesma maneira as entidades do afroespiritismo, seus desenhos e esculturas, ainda que sincretizadas, representam seres espirituais que existem e agem.
      Os cristãos, em sua maioria, não entendem o conceito de ídolo, sim, mesmo a Bíblia diz que as representações físicas são mortas e não podem responder aos homens, mas os seres espirituais que elas representam podem, obviamente não como Deus responde. Que formato têm esses seres? Espíritos não têm formatos, mas os homens podem aliar formas a eles, baseados em suas imaginações e nas atuações que desde os tempos antigos foram ligadas a eles. Um ser que vive no fogo será vermelho, um ser que controla raios poderá ser representado como um zigue-zague de energia.
       Cristãos, contudo, não se enganem, ainda que chamando de outros nomes, seres humanos de outros tempos, culturas e religiões, podem ter se relacionado com o Deus Altíssimo e verdadeiro. Uma revelação importante do evangelho não é só sobre a possibilidade dos homens terem contato com o mundo espiritual, mas poderem se ligar intimamente com o Deus mais alto, essa foi a grande bênção que Jesus permitiu aos homens, depois que ele subiu ao céu. Entendamos salvação principalmente como livramento de confusão e ruídos espirituais, que impedem contato com o Deus Altíssimo.
      O equívoco, porém, que o cristianismo comete, está depois desse, digamos assim, primeiro contato, que é só o início de algo, não o fim. Quando a Bíblia diz que a salvação é de graça para que ninguém se glorie, ela diz que a iniciativa para que o homem possa ter essa ligação tão especial com o Altíssimo foi do próprio Deus. Isso coloca o ser humano inicialmente incapacitado de estabelecer essa ligação por si mesmo, se Deus não tomasse a iniciativa ela não ocorreria. Quem valoriza exageradamente obras despreza essa incapacidade, e joga sobre o ser humano peso desnecessário. 
      Jesus veio no tempo certo para um homem preparado para um upgrade espiritual, upgrade que permitiria conhecimentos mais profundos de Deus. Antes o Deus Altíssimo e verdadeiro não atendia os seres humanos, não só de Israel mas de todos os lugares e tempos do planeta? Atendia, mas digamos assim, num estado de excessão, como no tratamento que nós seres humanos damos a nossos filhos menores. A eles não dizemos tudo, falamos muitas vezes usando metáforas, ainda que os amemos muito e os protejamos, fazendo por eles coisas que eles ainda não podem fazer sozinhos. 
      O engano mais sério que exagerar-se na doutrina de salvação por fé incorre, é a estagnação do espírito humano, que leva ao conservadorismo e esse a preconceitos. Entenda certo, sem fé é impossível agradarmos a Deus, neste mundo não podemos ter diálogo com Deus sem fé, de maneira alguma diminuímos seu valor. Contudo, ela não pode ser usada como chave para trancar, mas para abrir, e mais e mais, isso requer obras. O novo testamento enfatiza essa doutrina porque foi escrito num tempo que um povo precisava entender uma mudança, a da salvação por obras para a salvação pela fé.
      Entretanto, a igreja católica e até mais a reforma protestante, sob o aspecto fé, quiseram encarcerar a humanidade na primeira sala que a fé abre, não entenderam e se entenderam não ensinaram, que a morada espiritual tem infinitas câmaras que podem ser abertas pela fé. É como se fosse dada uma mansão a uma família e pela fé as pessoas abrissem a porta sem saber o que achariam lá dentro. Então, encantados com o hall de entrada, ficassem lá, só contemplando, esquecendo-se do resto da mansão, ainda que houvesse no molho muitas outras chaves, que elas não se deram ao trabalho de usar.
      Quando pela primeira vez buscamos a Deus com fé e boa sinceridade, um molho completo de chaves nos é entregue. Se usamos só uma ou duas chaves, as outras permanecem lá, como questionamentos sem respostas dentro de nós. A primeira coisa que temos que fazer é olhar o molho de chaves e o admitir para nós mesmos, não adianta fingirmos que ele não existe, não podemos fazer de conta que tudo bate nas religiões cristãs e que estamos em paz com isso. Volto, assim, ao início desta reflexão, o “Como o ar que respiro” é espaço para perguntas abertas, não para respostas fechadas.

48. Humildade para compartilhar

      “Sede unânimes entre vós; não ambicioneis coisas altas, mas acomodai-vos às humildes; não sejais sábios em vós mesmos” Romanos 12.16

      É normal, todos nós quando recebemos algo bom queremos compartilhar com os outros. Pode ser um presente, a aquisição de um carro, de uma casa, de um celular, para nós músicos, a compra de um instrumento musical, mas também boas notícias como um aumento de salário, um compromisso de noivado ou casamento, o nascimento de um filho, uma viagem. Nos faz felizes, não queremos esconder, queremos que muitos saibam, como se diz, algumas coisas gostaríamos de sair na rua anunciando aos gritos. 
      Não pode ser diferente com uma experiência religiosa, com uma experiência com Deus, se nos faz bem queremos que os outros saibam, e mais, queremos que os outros também tenham a experiência. Muitos não entendem protestantes e evangélicos, o porquê deles tanto quererem falar de suas crenças. É simples, eles têm experiências reais e poderosas com Deus, que impressionam seus sentimentos e mudam suas vidas, não querem guardar isso só para eles, querem que os outros saibam e experimentem a mesma a coisa. 
      Uma coisa é um testemunho religioso pessoal, outra coisa é usar religião para promoção, não de Deus, mas da instituição, e consequentemente de homens que a lideram e que podem ter algum lucro com isso. Uma religião não cresce porque é falsa, não a princípio, populariza-se pois seres humanos sinceros experimentam Deus através dela, é o que vem depois que pode torná-la falsa. Homens gananciosos veem que podem ganhar algo com as pessoas que a religião atraiu, então, testemunho sincero banaliza-se. 
      Enquanto há compartilhamento honesto, há o que ser compartilhado, experiências vivas com Deus, mas quando passa a ser popularização forçada, para atrair mais homens e encher templos, as pessoas não vêm mais para terem experiências com Deus, vêm pelos falsos benefícios que homens usam para atraí-las. Sinceros ainda se aproximam e têm experiências reais? Sim, mas a maioria vem pelo modismo, não veio no início motivada por algo verdadeiro, mas vem agora seduzida por homens, não atraída por Deus. 
      Nisso algo que começou puro e poderoso torna-se falso e ralo. O que é falso não se mantém, novas falsidades devem ser inventadas e adicionadas para que a instituição se mantenha atraente, lotando templos e dando lucro aos líderes. Nesse momento a banalização está concluída. A pergunta que fazemos é: até que ponto a popularização de religiões é saudável? Ou mais, é vontade de Deus? O cristianismo se corrompeu quando deixou as reuniões secretas nas catacumbas e se mudou para os palácios dos imperadores? 
      O assunto se resume à humildade, mesmo que a experiência com Deus seja real e forte, não devemos nos sentir melhores por isso, o vaso não é superior ao óleo raro e perfumado que contém. Muitos, vendo o valor do óleo, querem manipula-lo ou mesmo simula-lo, para que haja mais dele para ser comercializado, também embelezam os vasos, a fim de valorizarem o falso óleo. Esquecem-se que óleo puro só Deus pode conceder ao humildes, cujos vasos podem ser os mais simples possíveis, Deus não abençoa pela aparência. 
      Assim também surgem as divisões, é difícil haver unanimidade na ganância e na vaidade, homens diferentes usam elementos e meios diferentes para aumentar o óleo original. Também criam designs distintos de vasos para tornarem mais sedutores os óleos falsificados e fazerem crescer seus lucros nos negócios. Deus une, não divide, porque ele trabalha pelo seu Santo Espírito e esse é indivisível. Deus pede vasos limpos e vazios para encher com seu óleo, mas é indiferente o vaso ser de barro ou de alabastro. 
      É tempo, não de construção, mas de desconstrução, para reconstruir algo no lugar? Não mais. Deus não precisa mais de construções físicas para chamar a atenção dos homens, eles já amadureceram o suficiente intelectual e emocionalmente. Podemos entender as coisas espirituais do jeito puramente espiritual, sem véus, podemos conhecer a Deus sem intermediários que não sejam Jesus e o Santo Espírito, um sendo a porta e o outro conduzindo-nos a ela. Os tempos são de mudança, que ela não nos pegue despreparados. 

49. Obra de Deus, não de homens

      “Eis que vos envio como ovelhas ao meio de lobos; portanto, sede prudentes como as serpentes e inofensivos como as pombas. Acautelai-vos, porém, dos homens; porque eles vos entregarão aos sinédrios, e vos açoitarão nas suas sinagogas; e sereis até conduzidos à presença dos governadores, mas, quando vos entregarem, não vos dê cuidado como, ou o que haveis de falar, porque naquela mesma hora vos será ministrado o que haveis de dizer. Porque não sois vós quem falará, mas o Espírito de vosso Pai é que fala em vós.” Mateus 10.16-20

      A verdade é que não podemos ter o céu na Terra, aquele céu que cristãos imaginam que existirá baseados nas profecias de Apocalipse, com ruas e castelos de ouro e pedras preciosas e com uma multidão entoando hinos de louvor. O Vaticano é exemplo explícito da tentativa de se criar o céu na Terra, assim como as luxuosos catedrais católicas distribuídas pelo planeta. Mas não escapam disso os protestantes, nos E.U.A., na Coréia do Sul, no Brasil, por exemplo, com enormes templos. Isso tudo é realmente necessário? 
      Mas não é só o cristianismo que cai nessa tentação, outras religiões também perdem a intenção sincera e simples do início e se tornam presas de institucionalizações, tentando se empoderar no mundo, criando convenções e confederações, adquirindo editoras de livros, canais de televisão etc. Isso tudo produz riqueza material, que até poderia ser usada para caridade e auxílio aos necessitados, mas dificilmente o homem resiste à tentação, e nem é a do dinheiro, mas a da vaidade de ser reconhecido como importante no mundo. 
      Existe sinceridade em muitas instituições religiosas, muitas delas são bem mais humildes e sensatas que a Igreja Católica, isso é verdade. Uma revelação também precisa de ferramentas para ser compartilhada, livros ainda são o meio mais eficiente e duradouro, editados na maior número de idiomas possível, compartilhados não só em papel, mas em arquivos digitais pela internet. Mas será que é preciso mais que isso? Que as pessoas pratiquem o que creem, se reúnam em grupos pequenos, deem liberdade ao Espírito. 
      Podem argumentar, “se deixarmos a coisa correr solta ela se perde”, a esses eu respondo que sim, nos primeiros momentos, aqueles que receberam as fontes originais, devem ter cuidado, mas isso não pode ser mantido para sempre. Em menos de um século, Pedro, João e Paulo, por exemplo, faleceram, o que ficou foram seus textos, o trabalho que começou em Deus é mantido por ele, não por homens. Contudo, em algum momento o homem se acha dono da revelação, assim cria uma instituição para controlar as coisas. 
      Alguém pode me acusar de utópico, de estar fora da realidade, mas experiência espiritual não é isso? Um ideal de vida que nos é ensinado por um plano invisível, fora da realidade do mundo material? Que o espiritual seja de fato espiritual, que os seres humanos no mundo físico vejam só os frutos disso, amor, paz, santidade, virtudes morais. Jesus homem existiu assim, vivendo e ensinando, sem vaidades, sem religião, só ele, o pai e aqueles que o pai lhe dava e que estavam prontos para aprenderem sobre a vida eterna.
      No texto bíblico inicial Jesus dá uma orientação simples aos primeiros que enviou como missionários, principalmente quando fossem pressionados pelos homens maus do mundo. Se fazemos uma obra que não é nossa devemos nos dispor e estarmos preparados, mas confiantes que o Senhor da obra é quem a realiza através de nós. Por não confiarem no Espírito Santo é que tantos se põem na posição de donos de religiões, de crenças e de igrejas, tentando fazer pela carne algo que só o Espírito Santo pode fazer. 
      Interessante que os lobos descritos, além dos governadores, que podem ser cargos políticos ou militares, são os sinédrios, grupos de líderes judeus da área religiosa e de outras áreas, e as sinagogas, portanto gente da religião dos judeus, não de religiões pagãs. Entendemos que o principal inimigo dos verdadeiros cristãos são religiosos da religião de Israel. Isso também ocorre hoje, quando uma revelação mais profunda de Deus é manifestada, se levanta contra, não outras religiões ou ciência, mas o próprio cristianismo tradicional. 
      Isso ocorre porque o Vaticano e as denominações protestantes e evangélicas temem a Deus, zelam pela verdade mais pura recebida de Cristo? Não, ocorre porque as instituições tradicionais e seculares têm medo de perder seus poderes e lucros, ocorre por ganância e vaidade. Mas Jesus no céu mais alto e o Espírito Santo ligando o homem a Deus, são mais fortes, seguirão atraindo a humanidade em amor à luz do Altíssimo. Deus, o pai, não nos deixa sozinhos, quem o busca, o acha, não é enganado pelos desviados.

50. Esotérico ou exotérico?

      “Porque agora vemos por espelho em enigma, mas então veremos face a face; agora conheço em parte, mas então conhecerei como também sou conhecido.” I Coríntios 13.12

      Por várias vezes tenho dito aqui que Deus pode ser conhecido mais profundamente, não sem religiões, mas apesar delas, e mais, além delas. Existe um conhecimento público (exotérico) e um secreto (esotérico), e não confunda aqui secreto com satanista, há conhecimentos públicos do bem como há do mal, assim como há conhecimentos secretos de ambos. Costumamos entender algo escondido como errado, como do mal, e isso também é verdade, mas o próprio Deus esconde coisas boas de seus filhos quando eles não estão preparados para tais conhecimentos. Até o bem conhecido no momento errado e por pessoas erradas pode fazer mal. 
      O termo esotérico nos é mais conhecido, os cristãos o aliam ao ocultismo, à magia, a ordens secretas e mesmo a religiões orientais. Já o termo exotérico, com “x”, é menos usado, mas ele é justamente o que tecnicamente se refere ao nível de cristianismo com o qual a maioria dos cristãos interage. Católicos, evangélicos e protestantes leigos, e mesmo muitos sacerdotes, pastores e reverendos, só conhecem o cristianismo exotérico, não o esotérico. O que seria o cristianismo esotérico? Os dons espirituais, descritos por Paulo em I Coríntios 12, são a porta para esse cristianismo, o preservado por Deus dos não devidamente preparados. 
      As religiões criam cercas e deixam portas bem fechadas, principalmente a católica, no intuito de manterem certos conhecimentos nas mãos de poucos para dominarem sobre muitos. Se pensarmos assim, as denominações protestantes mais tradicionais, mais próximas da teologia original da reforma, apesar de terem se descartado de doutrinas católicas adicionais à Bíblia, incluindo livros de seu cânone, estão mais próximas da intenção católica de manter a maioria no exoterismo cristão. Já as pentecostais, por permitirem experiências com dons espirituais, deixam a porta aberta ao cristianismo esotérico, é claro que isso é faca de dois gumes.
      Um cristianismo amarrado a dogmas e à palavra escrita na Bíblia, fica limitado a leis, mas impede mais facilmente desvios, já aquele livre para dons espirituais pode ser presa da subjetividade humana. Se alguém diz que sabe de algo ou que deve fazer algo porque o Espírito Santo lhe mandou, fica mais difícil ir contra, ainda que não se tenha tido a mesma experiência. Nesse caso, o mais sensato é utilizar com sabedoria as duas coisas, a palavra revelada e a escrita, cuidando que uma não contrarie a outra, não de maneira extrema. Uma causa de tantas sizões na igreja evangélica é o pentecostalismo, mas até que ponto isso é realmente problema? 
      Conhecimento público é mais material, já o secreto é mais espiritual, indiferente se sejam do bem ou do mal. Não que o cristianismo exotérico não nos ensine sobre coisas espirituais, mas ele vai só até um ponto, e nos prende ao tradicional e coletivo. Já o esotérico é busca pessoal, vai além da tradição e nos revela o mundo espiritual com mais profundidade. Liberdade nunca é ruim, mas ela deve ser o início, que nos conduza no final a conhecimentos e práticas corretas e altas. Assim, o pentecostalismo, apesar de parecer levar muitos a infantilidades, pode ser o começo da maturidade, já o não pentecostalismo mantém todos na infância sempre. 
      Mas não sejamos limitados nem façamos generalizações, o que conduz o ser humano ao conhecimento espiritual mais elevado é seu coração e a aprovação de Deus, que nada mais são que demonstradores de sua vocação, isso é indiferente da igreja ou da religião que o ser professa. Existem cristãos protestantes mais esotéricos que pentecostais que falam línguas espirituais estranhas, e mesmo no catolicismo Deus chama muitos para conhecê-lo com intimidade. Igreja e religião não importam, a chamada é espiritual, se existe, de algum jeito e em algum momento da vida, a pessoa ouvirá o Espírito Santo e buscará respostas a seus questionamentos.

51. Leia, ore e viva melhor

      “Disse-lhe o seu senhor: Bem está, bom e fiel servo. Sobre o pouco foste fiel, sobre muito te colocarei; entra no gozo do teu senhor.” Mateus 25.23

      Podemos dividir os seres humanos em dois grupos: o primeiro grupo é o que tem curiosidades espirituais inatas, o segundo grupo é o que se acomoda ao conhecimento que recebeu em sua juventude. Uns sempre questionam, não se acomodam à hipocrisia ou por medo. Mas entenda certo, pessoa que vê defeito em tudo e que reclama de todos não é necessariamente uma curiosa espiritual, pode ser assim e se acomodar a uma religião ou igreja e ficar nelas a vida toda, sempre insatisfeita. Contudo, também não ache que ter medo é aviso que não deve superar limites, na medida certa medo é saudável, nos protege de riscos desnecessários. 
      Quando Deus nos chama para conhecer mais, sentimos certo medo, assim vamos com calma. A leitura é algo que nos põe em contato com novos conhecimentos, de ler não devemos ter medo. Muitos cristãos têm vidas espirituais limitadas porque têm medo até de ler um texto religioso que não seja a Bíblia ou ensinos teológicos evangélicos. Sobre religião, leia tudo, principalmente o que te causa alguma apreensão, se há medo, há o desconhecido, e aprender requer em primeiro lugar que admitamos que não sabemos tudo e que muitas coisas nos são desconhecidas. Não é porque discordamos que é mal, principalmente se não conhecemos.  
      Há muita coisa interessante para se ler sobre religião, espiritualidade e Deus, sim, também há muita bobagem, da mesma maneira que há no cristianismo. A primeira dica é: vá às fontes, aos textos de fundadores, conheça a raiz antes dos galhos. Um segredo de ler bem é adquirir livro não pelo título ou pelo assunto, mas pelo autor. Pesquise sobre o autor, e esteja preparado para as polêmicas sobre ele, assim como para os críticos, que muitos vezes querem aparecer mais que os autores. Alguns exercem a função de crítico, não por terem experiência para fazer análises justas, mas por recalque, como se diz, quem não faz vira crítico. 
      Li certa vez um livro, o autor escreveu sobre o tema proposto de um jeito simples e profundo, contudo, a biografia inicial do autor, disponível na edição que comprei, me ensinou tanto quanto o resto do livro. Pude conhecer, através de um histórico detalhado feito por um escritor sério, que respeitou o autor, mas não se deixou levar pela paixão, a prática de vida do autor. De fato havia em sua história episódios duvidosos, nada espirituais, e eis outra coisa importante para avaliarmos a relevância de livro religioso. Não considere só a originalidade do autor no assunto, mas em se tratando de espiritualidade, verifique como ele pratica sua teoria. 
      Depois que você ler e entender, ore, com muita sinceridade e sem conceitos pré-concebidos, pergunte a Deus o que é verdade e o que não é, o que poderá abençoá-lo e o que nao poderá, insista nessa oração, preparado para todas as respostas. Deus mostra sua vontade a nós de várias maneiras, em primeiro lugar dando-nos ou não paz sobre um assunto, mas depois, o Senhor pode falar de maneiras bem diversas. Um conselho, certos questionamentos convém que você mantenha em segredo, entre você e Deus, tente não falar com outras pessoas a respeito, principalmente se forem cristãos do tipo conformado, não escandalize ninguém.
      Algo muito importante precisa ser dito: Deus é sábio, não chama uma pessoa para novos conhecimentos para que esses a prejudiquem, para que ela se perca, assim siga avaliando tudo com sabedoria. Leia, ore, então, viva melhor, a busca deve fortalecê-lo, não enfraquecê-lo, deve fazê-lo feliz, com desejo e com forças para ser mais santo. Se a busca estiver prejudicando você de alguma maneira, se estiver te levando a ser alguém pior que era antes da busca, e pior em termos morais, pare tudo. Sê fiel no pouco, antes de querer ser fiel no muito, o que vem de Deus é verdade, luz e excelência, não confunde, esclarece, não rebaixa, eleva. 

52. Sincera religiosidade: até quando?

      “A justiça do sincero endireitará o seu caminho, mas o perverso pela sua falsidade cairá.” Provérbios 11.5

      O estilo crítico deste espaço pode levar alguém a interpretar errado sua intenção, e é justamente sobre isso esta reflexão, sobre intenção sincera do bem. Não duvido da boa sinceridade de muitos cristãos em cultuarem a Deus em igrejas católicas, protestantes e evangélicas, não duvido da boa intenção de muitos pastores em pregarem e manterem ministérios. Não podemos duvidar da intenção sincera do bem de ninguém, jamais, Deus ama a todos e a todos atende. O ponto, contudo, que precisa ser levantado nestes tempos atuais, é que muitos, ainda que sinceros e bem intencionados, se acomodam e se acovardam. 
      Por que nestes tempos atuais? Porque vivemos tempos decisivos, quando uma mudança precisa ocorrer, quando o velho e imperfeito cristianismo precisa ser confrontado sem medo para o bem da humanidade. Só assim as pessoas poderão de fato ter experiências retas e puras com Deus, pelo Espírito Santo e através de Jesus. Você que me lê, precisamos agir, e nem vou usar o termo “pensar fora da caixinha”, já que muitos usam esse termo, mas na verdade só saem da caixa menor para outra um pouco maior, e seguem presos. A ação é orar mais, para vivermos mais em santidade, amor e humildade, sermos melhores cristãos. 
      Conheço muitos pastores sinceros, não são só gananciosos vendendo fé para ganhar dízimos, objetivando grandes ministérios só por fama e grana, não, existem muitos pastores homens de bem, tanto nas igrejas protestantes tradicionais quanto nas pentecostais. Existem também padres corretos, que fazem o que podem para ajudar a conduzir a Deus homens e mulheres dentro do catolicismo. Deus conhece o coração sincero de todos esses e lhes recompensa com paz e com vida eterna, ninguém se engane sobre isso. Contudo, muitos seguem, ainda que fazendo tudo que podem, limitados pelas cercas da religião. 
      Critico a religião muito aqui, mas o que seria religião? Não me refiro à definição tradicional, dada principalmente à religião cristã, o religare, a religação do homem a Deus por meio de Cristo, ou em outra religião, por outro meio. Quando digo religião me refiro a construções e tradições humanas, ainda que sobre bases legitimamente de Deus, que homens fazem, para que outros homens creiam. Isso, contudo, de forma cômoda, aceitando sem fazer críticas, só porque acham que são coisas de Deus. Religiões citam Deus, até tentam usar a Deus, e tudo isso Deus usa, mas tudo isso não é o Deus verdadeiro e pleno.
      Deus olha com especial afeto os que se colocam entre cercas e tentam ser fiéis ao que lhes ensinam dentro delas, e muitos fazem isso com todo o coração, com pura humildade, com fidelidade e sem hipocrisia. Conheço, especialmente, irmãos católicos e da Congregação Cristã no Brasil assim, só para citar dois exemplos. Quem conhece sabe que essas religiões em especial exigem seguimento de protocolos nada fáceis, no catolicismo são os sacramentos, os dogmas, as festas, os santos, na Congregação são os costumes e outras diretrizes, que levam pessoas a assumir suas religiosidades sem temer o que outros pensam. 
      Confesso que tenho certa inveja de alguns religiosos, às vezes queria ter a chamada de Deus que eles têm, parece mais fácil, e não veja nisso ironia ou falta de respeito com o que outros creem. Mas para sermos realmente sinceros no que vivemos temos que ser fiéis às nossas chamadas pessoais, à fé em que cada um de nós é chamado para conhecer a Deus e ser um bom ser humano no mundo. Muitos evangélicos acham que podem converter qualquer um à sua religião, isso não é verdade. Se alguém que se dizia de outra religião veio para uma denominação evangélica, é porque na verdade nunca foi da outra religião. 
      Nunca foi porque nunca deveria ter sido, tinha uma chamada de Deus e estava desobedecendo-a em outra religião. Um bom católico nunca vai deixar o catolicismo para ser protestante, muitos podem dizer que conhecem ex-católicos que se tornaram evangélicos, mas será que de fato algum dia foram católicos? Penso que mesmo que tenham sido adeptos atuantes do catolicismo, em seus corações sempre houve dúvidas, não tinham paz onde estavam. Por outro lado, mesmo que sejamos protestantes abertos que até aceitam entendimentos de outras religiões, se nossa chamada é ser protestante devemos permanecer assim. 
      Nem tudo que cremos deve ser compartilhado com os outros, e nem tudo que não cremos deve ser mudado, importa-nos boas obras apoiadas em fé sincera. “A justiça do sincero endireitará o seu caminho”, isso significa que onde há boa sinceridade ainda que se comece torto se achará no final o caminho reto. “Mas o perverso pela sua falsidade cairá”, quem não é sincero do bem é falso, pode até querer mostrar que é uma coisa, mas no coração é outra. Esse não ficará de pé para sempre, um dia a verdade virá à tona, então, terá que tomar uma decisão do lado da boa sinceridade, ou não, seguirá falso e muito infeliz. 
      É a fidelidade a uma fé verdadeira que leva muitos a serem sinceros e bem intencionados mesmo em religiões imperfeitas. Não devemos julgar ninguém porque não sabemos como Deus trabalha nos corações, usando religiosidades, mesmo diferentes da protestante e evangélica, para mudar o caracter das pessoas. Entendamos que o objetivo de Deus não é que as pessoas tenham religiões perfeitas, elas não existem e até agora nunca existiram. O objetivo de Deus é aperfeiçoar as pessoas, liberta-las de vícios, curá-las de feridas emocionais, dar a elas perdão e paz para que ajudem todos a seguirem para a sua luz mais alta em amor. 
      A religiosidade de muitos é sincera, mas até quando isso bastará? Assim, voltamos ao ponto do início desta reflexão, os tempos urgem, logo não bastará mais ser bem intencionado dentro de cercas construídas por homens. Os próprios homens não estão suportando mais ficar entre cercas, o alimento limitado que eles recebem das religiões institucionalizadas não está saciando mais a espíritos que estão sendo libertados pela ciência e por bandeiras sociais que pedem direitos iguais a todos. Os olhos estão sendo abertos, e como o cristianismo tradicional não fez isso, o materialismo fez, contudo, esse não pode alimentar o espírito. 
      A razão foi despertada, isso só deixará mais clara a necessidade espiritual, de forma que religiões tradicionais não bastarão mais. O único que pode evoluir o espírito humano é o Espírito Santo de Deus, o mesmo que as religiões tentaram sufocar e por isso morreram. O novo não se esquecerá da Bíblia, mas a interpretará de maneira mais correta, o novo não desprezará o Cristo, mas porá Jesus em seu lugar mais alto, o novo, apesar de despertado pelo materialismo, não será ateu, mas realmente espiritual e unirá a humanidade, destruindo todas as cercas. Acharão o novo os que se despojarem do comodismo e do medo. 

53. O que se faz, não com o quê (I)

      “Meus irmãos, pode também a figueira produzir azeitonas, ou a videira figos? Assim tampouco pode uma fonte dar água salgada e doce. Quem dentre vós é sábio e entendido? Mostre pelo seu bom trato as suas obras em mansidão de sabedoria.” Tiago 3.12-13

      Na vida, dentro ou fora das religiões, dentro ou fora do cristianismo, Deus apresenta a todos os seres humanos ferramentas. Elas são conhecimentos religiosos, espirituais, morais, sobre espiritualidade e virtudes, sobre o mundo espiritual e sobre Deus. Através dessas ferramentas as pessoas podem conhecer elas mesmas, o ser humano, o mundo espiritual, Deus e os valores morais, para serem melhores, não só neste mundo, mas para a eternidade pós morte. 
      Existem vários tipos de ferramentas, algumas mais delicadas, específicas, precisas, e outras mais brutas, gerais, não tão precisas. Cabe a cada um de nós neste mundo, pelo trabalho e pelo livre arbítrio, escolher quais ferramentas tomar e usar. Na eternidade, contudo, não seremos avaliados pela sofisticação das ferramentas, mesmo pela aparência delas, mas pelo que fizermos com elas, pela qualidade das obras que construímos com as ferramentas. 
      Nós, seremos humanos, contudo, temos a tendência de julgar as pessoas pela qualidade das ferramentas que elas possuem, e muitas pessoas são hábeis para exibirem suas ferramentas, procurando justamente serem valorizadas por elas. Não percebemos que muitos com pedaços de madeira e pedras constroem lindos palácios, enquanto que outros, com furadeiras de última geração e jogos completos de chaves de fenda, só constróem cavernas rudimentares. 
      Um cuidado especial temos que ter com os que descobrem novas ferramentas, sim, porque ferramentas espirituais não são inventadas por homens, mas criadas por Deus, os homens apenas as descobrem. Não é porque alguém descobre pela primeira vez uma ferramenta que seja seu criador, que saiba usar bem a ferramenta, ou que possa seguir usando-a bem até o fim de sua vida neste mundo. É certo que quem descobre tem a missão de divulgar a ferramenta.
      Como divulgadores, descobridores ganham fama, principalmente se a ferramenta entrega uma iluminação inédita. Mas eles também terão que usar as ferramentas para construir algo, e serão, como qualquer outra pessoa, avaliados pelo que construírem. Nem o fato de terem descoberto uma ferramenta lhes dá créditos adicionais. Não podemos idolatrar alguém só por ser fundador de religião, seu valor está aliado àquilo que ele praticar de bom com ela. 
      Em termo espirituais, o homem que pisou este planeta e compartilhou a ferramenta mais poderosa foi Jesus Cristo. Ele não só mostrou o caminho como viveu esse caminho em toda a sua plenitude. Por isso, mesmo cristianismos corrompidos, resistem até hoje por estarem baseados num elevado exemplo de vida. Mas outros fundadores de religiões também descobriram, autorizados por Deus, ferramentas, e umas bem preciosas, ninguém se engane sobre isso. 
      Mas se o catolicismo, construído sobre a mais elevada ferramenta, se corrompeu, por que não se corromperiam religiões fundadas sobre ferramentas inferiores, tendo em vista que os próprios fundadores dessas viveram abaixo do nível de Cristo? Alguns descobridores, ainda que famosos, não construíram muito e até destruíram no final o que tinham feito. Isso ocorre quando se cai na vaidade de se achar melhor justamente por se ter descoberto algo.
      Por isso não devemos idolatrar nenhuma religião, muitos menos fundadores de religiões, reformadores de religiões ou codificadores de religiões, só Jesus viveu o que pregou e pregou o ensino mais elevado de todos. As ferramentas são de Deus, não dos homens, aos homens cabe tomá-las e usá-las para construir boas obras, os que as descobrem mais responsabilidade ainda têm, de fazer melhor com a nova ferramenta que entregam para que deem exemplo. 
      Mas também não podemos nos escandalizar só porque um descobridor pisou na bola, repito, os homens são descobridores, não inventores, quem cria é Deus. Não é porque alguém traz uma visão mais profunda de Deus e nos abençoa com ela, que ele seja Deus. Ele continua sendo homem, sujeito à vaidade e cabível de livre arbítrio, se ele parar de construir algo verdadeiro ou construir algo falso, a responsabilidade é dele. Nosso compromisso é por Jesus. 
      Cristãos, não sejam preconceituosos, neste século XXI Deus tem disponibilizado muitas ferramentas à humanidade. Sabemos se elas funcionam vendo não a beleza delas, nem a fama dos que as descobriram, mas os bons frutos dos que as utilizam. Saibamos mais que aquilo que nos é ensinado em missas e cultos por homens que se acham donos da verdade e exclusivos proprietários de ferramentas. Tudo é de Deus, dele viemos, a ele voltaremos, a ele a glória.

54. O que se faz, não com o quê (II)

      “O Senhor olha desde os céus e está vendo a todos os filhos dos homens. Do lugar da sua habitação contempla todos os moradores da terra. Ele é que forma o coração de todos eles, que contempla todas as suas obras.” Salmos 33.13-15

      Se acompanhou o raciocino da primeira parte desta reflexão, entendeu que fiz uma espécie de negação a algo que a maioria dos cristãos gosta de afirmar. “Só Cristo salva”, dizem os evangélicos, os católicos dizem algo mais extremo, ”Fora da Igreja (católica) não há salvação”, mas os espíritas contra-atacam com “Fora da caridade não há salvação”. Todos querem ser proprietários exclusivos da verdade dizendo que receberam de Deus a chancela. 
      A vaidade leva pessoas a se acharem donas de verdades, não entendendo que: Cristo nos capacita para sermos caridosos e assim fazermos parte de uma igreja celestial! Eis a harmonização de todas as afirmativas anteriores, vindas de origens distintas. Não tem a ver com religião e o mundo, mas com Deus e o plano espiritual. Os homens não aceitam que Deus ama a todos, entrega ferramentas conforme os limites humanos, para que todos façam boas obras. 
      Os fins justificam os meios? Não nesse caso, só existe um meio para Deus, Jesus. Até que ponto importa que as pessoas conheçam suas ferramentas, importa que saibam usá-las bem. Nem todos sabem como um computador funciona, mesmo assim podem usá-lo com eficiência. O Sol é o Sol, não importa se o olhamos a olhos nus ou com um potente telescópio. Se usarmos um telescópio saberemos de mais detalhes que quem olha a olhos nus, mas isso importa?
      Cientistas estudam mais a fundo o Sol para saber coisas importantes sobre o universo e a relação desse com a Terra. Mas para nós, seres humanos comuns, importa-nos ter o Sol brilhando num período suficiente para beneficiar agricultura, os animais e nos permitir exercer atividades produtivas com mais facilidade. Deus é Sol que brilha para todos, ainda que muitos não tenham ferramentas sofisticadas para saber com profundidade como ele age. 
      Confortáveis em templos cristãos, muitos não se atêm ao fato que milhares de pessoas no mundo não possuem as ferramentas igreja e Bíblia para conhecer Jesus como eles conhecem. Essas pessoas estão condenadas ao inferno porque não tiveram acesso a ferramentas melhores para chegar a Deus? Mas quem disse que muitas dessas pessoas, em suas religiões e com outras ferramentas, não têm experiências reais com o Deus verdadeiro? Deus é espírito.
      Cristãos, Deus não ama só vocês, ama a todos. Se vocês, de posse de doutrinas e dogmas definidos, de igrejas organizadas e reconhecidas, de tantas versões de Bíblias, de escolas teológicas com um pensamento cristão analisado sob tantos pontos de vista, enfim, com as melhores ferramentas, construíram um cristianismo corrupto, por que exigir dos outros que tenham crenças mais claras com as ferramentas que possuem? Deus vê a intenção do coração. 
      Não tenho dúvida que Jesus é alguém especial e exclusivo enviado por Deus a este planeta, acima de todas as ferramentas espirituais. Contudo, o que muitos cristãos não entendem é que muitos, ainda que não tenham conhecimento intelectual sobre Jesus e a Bíblia, se tiverem fé e intenção correta, têm comunhão com Deus e através de Jesus. Jesus é hoje um ser espiritual numa posição única, ninguém que quer se aproximar do Altíssimo o faz fora de Jesus. 
      Por outro lado tem muita gente dentro de templo e de catedral, falando o nome de Cristo, mas muito distante de Jesus e de Deus. Esses sabem o evangelho, conhecem o Cristo que viveu no primeiro século, foi crucificado e ressuscitou, mas não experimentam o Jesus que reina atualmente nas regiões espirituais mais altas. Eles têm acesso a melhor ferramenta e não constroem muito com ela. Será que só por conhecerem a ferramenta terão créditos na eternidade? 
      Na verdade, existe muita gente chamando Jesus de outro nome, em outro idioma, às vezes só por um dialeto que nem escrita usa, mas se aproximando de Deus. São os bons construtores, construindo castelos com pedaços de pau e pedra, enquanto que muitos que se chamam de cristãos, com a caixa de ferramentas completa nas mãos, estão dentro de cavernas rudimentares. Haverá muitas surpresas na eternidades, diminuí-las é possível aqui, com humildade. 
      Vejo católicos idolatrando Pedro, protestantes idolatrando Martinho Lutero, espíritas idolatrando Chico Xavier, e poderia citar mais exemplos. Só Jesus pode ser totalmente amado e seguido, e não me refiro às religiões cristãs, mas à pessoa espiritual de Cristo hoje. Deus usa muitos para descobrir ferramentas, esses são especiais, mas são homens. Há seres elevados no mundo hoje? Sempre há, mas talvez você nunca os conheça, eles vivem discretos e humildes. 

55. Mente, mãos e coração

     “Ainda assim, agora mesmo diz o Senhor: Convertei-vos a mim de todo o vosso coração; e isso com jejuns, e com choro, e com pranto. E rasgai o vosso coração, e não as vossas vestes, e convertei-vos ao Senhor vosso Deus; porque ele é misericordioso, e compassivo, e tardio em irar-se, e grande em benignidade, e se arrepende do mal.” Joel 2.12-13

      A primeira vergonha é difícil, mas a segunda pode ser muito pior se algo de bom não for aprendido com a primeira. Vemos isso na história da Alemanha na primeira metade do século XX, derrotada e humilhada na primeira guerra mundial, não aprendeu algo útil com isso. Ocorreu que o oportunista e insano Adolf Hitler apareceu e usou uma nação orgulhosa, levando os alemães a uma vergonha maior na segunda guerra mundial. (Refletimos sobre isso na postagem Hitler, arquétipo diabólico). 
      Paciência, eis uma característica decisiva no amor de Deus pelos homens, o Senhor não se apressa para disciplinar, nem para julgar, só para amar. Na verdade espiritual maior, Deus não envergonha ninguém, não disciplina ninguém, não julga ninguém e não condena ninguém, a escolha é sempre do ser humano. Perto de Deus o homem vivencia libertação moral e iluminação espiritual, assim como dignidade material. Longe, contudo, experimenta só prazeres materiais e isso só por um tempo. 
      O homem enxerga disciplinas e julgamentos, são pontos de vista seus. É o ser humano, principalmente o do antigo testamento com uma ótica antropomórfica de Deus, que interpretou um Deus ativamente punidor e executor de sofrimentos. Deus nunca se coloca nessa posição, está sempre disponível para amar e abençoar. O ser humano, contudo, afastando-se do Senhor, fica indisponível para ser beneficiado pelas bênçãos que existem nas altas regiões espirituais às quais Jesus dá acesso. 
      Para ser didático vou antropomorfizar Deus, perdoem-me a licença poética. A mente de Deus sabe tudo, acompanha tudo, sua providência administra todas as coisas. Suas mãos tomam a iniciativa para alcançarem todos que tomam a iniciativa de o buscarem, mesmo que estejam longe. O coração de Deus, e o entendamos como sendo o centro ativo das virtudes do Senhor, perdão, misericórdia, amor, luz, paz, ele está na posição mais alta. Têm acesso ao coração os que são conduzidos a Deus por suas mãos.
      Enquanto as mãos executam como que um movimento mecânico, de retirar de uma posição e colocar em outra, o coração executa a intenção que abençoa os próximos de Deus. O movimento das mãos do Senhor são condicionados ao nosso livre arbítrio, já o coração de Deus abençoa sempre, ainda que só alcançando os próximos. Os distantes são conhecidos pela mente de Deus, são chamados por Deus ao arrependimento, Deus não se esquece deles, mas enquanto não se decidem estão longe do coração. 
      O coração de Deus está longe dos que não querem obedecer a Deus porque em seu coração só existem virtudes. Se estivesse perto desses significaria que o coração do Senhor conteria vingança, punição, dores e trevas ativas. O que está ativo nas regiões espirituais longe de Deus são outros seres rebeldes, como o diabo e os demônios, são esses que fazem os distantes de Deus sofrerem, não Deus. O seres espirituais distantes do Senhor são eles mesmos os castigos do mal, punem a si mesmos e aos pares. 
      Os distantes provam disciplinas e julgamentos, assim como, em situação extrema, o inferno ou a pior eternidade, longe do coração de Deus. A melhor eternidade, o céu, está perto de Deus, nela estão os próximos do Senhor, praticantes de fé e de boas obras em Cristo. Há sérios enganos ao aliar a um Deus espiritual formas humanas, principalmente na área moral, contudo, na funcionalidade o antropomorfismo pode ser útil ao ensino, ainda que Deus não tenha cabeça, membros, tronco ou coração. 
      Deus delega a anjos e outros seres espirituais as tarefas de “movimentos” espirituais, perceba como é maravilhoso. Distantes, Deus nos vê e se importa, e ainda que não possa agir porque não autorizamos, seu coração nos ama e mostra-nos isso. O Senhor anda pela Terra procurando quem o queira. Então, decidimos nos achegar a ele, ele nos ouve, suas mãos nos tomam, seus braços nos aproximam de seu peito, abraçam-nos forte e nos colocamem seu coração, onde nos limpa, nos cura, nos ensina e nos protege. 

56. Disciplinas e julgamentos

      “Se suportais a correção, Deus vos trata como filhos; porque, que filho há a quem o pai não corrija? Mas, se estais sem disciplina, da qual todos são feitos participantes, sois então bastardos, e não filhos.” “E ninguém seja devasso, ou profano, como Esaú, que por uma refeição vendeu o seu direito de primogenitura. Porque bem sabeis que, querendo ele ainda depois herdar a bênção, foi rejeitado, porque não achou lugar de arrependimento, ainda que com lágrimas o buscou.” Hebreus 12.7-8, 16-17

      Esta reflexão é uma análise do tratamento ao qual Deus nos submete para nos aperfeiçoar, tratamento que dividirei em quatro procedimentos: disciplinas menores, disciplinas maiores, julgamentos primários e julgamento final. Isso não refere-se especificamente a uma metodologia bíblica, mas você já deve ter verificado esse tratamento em tua jornada, ainda que com outros nomes. Acima de tudo, a reflexão é uma exortação para que não tenhamos que passar pelo terrível e derradeiro julgamento. 
      Com paciência Deus espera que nos arrependamos dos erros morais diários e não coloquemos nossas cabeças nos travesseiros sem nos sentirmos perdoados. Com paciência Deus aguarda que assumamos vícios mais duradouros e queiramos viver um novo dia sem cair neles, ainda que os tenhamos praticado por algum tempo. Mas com paciência vemos Deus nos disciplinar, não para que fiquemos na disciplina para sempre, mas para que entendamos que o pecado prejudica, a nós e aos outros, por isso melhor é não pecarmos
      Depois de nos dar muitas chances, de aguardar que entendamos que posições que nos afastam do melhor de sua moral para nossas vidas no final darão frutos amargos, vemos Deus nos julgar e nos deixar numa situação onde teremos que perder muitas coisas, passar muito sofrimento, para que corrijamos os caminhos errados. Contudo, se ainda assim persistirmos no orgulho, em não aceitarmos o plano de Deus como o melhor para nós, um segundo julgamento do Senhor poderemos provar. 
      Esse segundo julgamento é terrível, nele perdemos tudo, todas as nossas referências precisarão ser aniquiladas, uma “morte”, não necessariamente do corpo, haverá para que uma nova vida comece. Nisso Deus tentará nos reconstruir, agora não haverá modo de fugirmos, mas para alguns isso pode ser até perda da vida física. Esse último julgamento tem uma característica, entre ele e um menor anterior, um bom tempo pode se passar, é a paciência de Deus revelando que o que virá será bem sério. 
      Por ser esse hiato longo, muitos pensam que insistiram tanto que prevaleceram, acham que fizeram braço de ferro com o destino e foram vitoriosos. Mas só é a bonança antes do temporal, é um tempo a mais que Deus dá ao ser humano para mudar de atitude. Se nos erros menores a disciplina é rápida, se mesmo julgamentos primários vêm depressa, o segundo julgamento pode levar uma vida. Muitos morrem no erro, em boa situação material, mas longe de Deus, esses serão surpreendidos na eternidade. 
      Tem muita gente aguardando esse segundo julgamento, isso é muito triste. Já vi gente ser avisada e ser avisada e ser avisada e não mudar de vida, então, sofrer um final trágico. Entenda bem, gente assim não é criminosa, violenta ou marginal, esses têm um tratamento adequado mas diferente dos que me refiro aqui como réus do último julgamento. A principal característica dos réus desse julgamento é o orgulho, teimam em fazer as coisas dos seus jeitos, não se rendem humildemente à vontade de Deus. 
      Passamos por disciplinas menores quase que diariamente. Disciplinas maiores passamos por muitas, mas nelas sofremos como filhos. Julgamentos primários podem ser necessários, às vezes mais de um em nossas vidas. Neles precisamos aprender a crer em Deus ainda que em exílios, cárceres ou desertos, mas mesmo nesses Deus cuida de nós e eles passam. Contudo, o segundo julgamento só ocorre uma vez, alguns ainda conseguem superá-lo neste mundo, mas muitos terão que morrer para sofrê-lo. 
      O texto bíblico inicial fala-nos de dois procedimentos de Deus, primeiro a disciplina, e depois, pelo menos até onde entendemos o escritor sobre Esaú, um julgamento. Até um ponto sofremos como filhos, não perdemos direitos, há apenas a tristeza que o afastamento de Deus precisa nos trazer, e precisa para que entendamos que erros têm preços ruins. Mas depois desse ponto julgamentos podem nos humilhar e muito neste mundo, chegando ao ponto do Senhor nos deixar seguir sob a nossa própria sorte. 

57. Você crê em céu e inferno?

      “O Senhor não retarda a sua promessa, ainda que alguns a têm por tardia; mas é longânimo para conosco, não querendo que alguns se percam, senão que todos venham a arrepender-se.” II Pedro 3.9

      A teologia de penas eternas, que diz que após a morte as pessoas poderão ter dois destinos irrevogáveis e extremos, é relevante hoje no cristianismo? Em que, crer no céu e no inferno na eternidade, interfere na vida dos homens na realidade deste mundo? Muda alguma coisa na tua vida? Você pensa nisso quando faz tuas escolhas, quando tenta ser um ser humano melhor? Ou nem pensa a respeito, faz o que pode e entrega o resto nas mãos de Deus, sem esquentar muito a cabeça? 
      Ocorre que muitos que têm certeza do céu não se esforçam para serem melhores, creem na salvação e o que são já lhes basta ser. Já outros, que têm certeza do inferno, não sofrem por serem piores, acham que estão condenados e nada pode mudar isso. Mas alguns preferem não ter certeza de nada, acham que quando morrerem tudo acabará, ou no máximo todos irão para o mesmo limbo, todavia, isso torna as vidas desses absolutamente sem sentido e isenta de responsabilidades. 
      A verdade é que a eternidade não muda ninguém, a única coisa que nos muda é a existência temporária no mundo com certeza da morte, que faz com que queiramos ser melhores ainda que só para retardar o fim. Contudo, mais que o medo, o que mais nos transforma é o amor, ainda que não demos importância ao que vem depois da existência no mundo, desejamos ser melhores para fazermos felizes quem amamos. Jesus deu muita importância no evangelho a amar ao próximo. 
      Até que ponto certeza de salvação e de condenação eterna faz diferença nas vidas das pessoas neste mundo? Muitos aceitam isso porque é dogma de suas religiões, mas na verdade nunca pensaram seriamente no tema, se refletissem melhor a respeito talvez mudassem de ideia. Será que muitos hoje, no século XXI, são fiéis às igrejas porque têm medo do inferno? Não creio que a maioria dos cristãos, católicos ou protestantes, pense assim nos dias atuais, os dias são hipócritas. 
      Algo é certo, muitos buscam religiões, principalmente a evangélica, porque temem o diabo, não pelo que ele pode levá-los a ser espiritualmente na eternidade, mas pelo que ele pode fazer-lhes neste mundo na área material. Nisso a igreja católica teve sucesso, deu poder ao diabo e o usou para amarrar as pessoas a ela, mais do que usou o amor divino. O ponto é que muitos querem se livrar do diabo sendo bons religiosos no mundo, não sendo pessoas melhores para a eternidade. 
      Responda-me honestamente: você de fato aceita, sem dúvidas ou qualquer espécie de peso, que alguém que convive com você no trabalho ou que é um parente teu, por não ser cristão como você é, vai passar a eternidade no inferno? Muitos podem dizer, “mas o inferno existe para pessoas realmente más”, mas mesmo assim, será que ninguém pode mudar com o tempo? É mau porque gosta? Não tem motivos justificados para não ser alguém civilizado e merecedor do céu? 
      Muitos até fazem certas considerações, mas estão presos à religião que diz que certas coisas são assim porque Deus quer e nós não podemos ir contra. Novamente caímos no questionamento tanto feito aqui: quem são esses que dizem que Deus pensa assim? A Bíblia, os dogmas, a teologia tradicional? Não vou me estender no tema, vou apenas dizer: busque a Deus, pergunte a ele sobre algumas coisas, sem medo de discordar da religião, peça que ele te mostre a verdade. 
      A verdade é que o ser humano já mudou, não aceita mais o falso cristianismo como aceitavam os seres humanos de séculos passados, ocorre somente que a maioria dos seres humanos ainda não teve coragem de assumir a mudança. Assim continuam indo a missas e cultos, ouvindo muitas coisas, mas jogando a maior parte dessas coisas no lixo, retêm apenas o que lhes interessa. Vivemos tempos de hipocrisia religiosa, as pessoas querem parecer cristãs, mas não serem de fato. 
      Só os sofrimentos extremos, do tempo que muitos chamam de final e que abaterão todo o planeta, para acabar com essa hipocrisia, e esse tempo se aproxima. A humanidade terá que passar por uma enorme pressão para se livrar dos misticismos e superstições do falso cristianismo, e então entender a simplicidade do evangelho que Jesus ensinou há quase dois milênios atrás. Os homens já usaram todo o tempo que tinham para serem crianças, o momento de crescer urge. 
      Talvez uma visão mais pragmática da vida, onde se busca qualidade de vida no mundo, não só visando riqueza para todos, mas justiça social e respeito com o planeta, seja melhor, conduza as pessoas a tratarem todos com mais respeito, que simplesmente crer que uma decisão de fé livra do inferno e dá o céu para sempre. Até que ponto tantos que se acham melhores e mais próximos de Deus por seguirem o cristianismo de religiões, são de fato seres humanos espirituais? 
      Num juízo final, o que será cobrado? Teoria ou prática? Fé cega ou inteligente? Cuidado, os que creem no inferno, ele pode existir justamente para pessoas como vocês, não para os outros, como diz o ditado, “quem deve, teme”. Quanto aos que vivem com humildade e justiça, que amam a todos, indiferente de cor de pele, sexualidade, religião, poder aquisitivo, e que respeitam mistérios espirituais e não se acham donos da verdade, nada têm a temer, Deus os conhece bem.

58. Qual a religião da eternidade?

      “As misericórdias do Senhor são a causa de não sermos consumidos, porque as suas misericórdias não têm fim; novas são cada manhã; grande é a tua fidelidade.” Lamentações 3.22-23

      Será que há só uma religião no plano espiritual, que exige que todos creiam de uma maneira e que pune quem não crê assim? Entender a existência de uma única religião na eternidade é entender Deus impondo a todos uma única maneira de entender o universo, principalmente o plano espiritual, de acordo com uma religião que existe no mundo e que foi estabelecida por homens. Isso seria considerar o cristianismo (do mundo) como a perfeita vontade de Deus para guiar o homem, ignorando fatos sérios. Um fato são os terríveis erros que a igreja católica cometeu na história, como as cruzadas, a inquisição, o negacionismo científico, e mesmo sua omissão em eventos como a segunda guerra mundial. 
      Nesses erros não estão fora os protestantes, que também têm comedido sérios erros, principalmente atualmente, quando se envolvem com política, negacionismo e materialismo. Outro fato é ignorar outras religiões, como o hinduísmo, o islamismo, o budismo, o confucionismo, os espiritismos, que possuem uma enorme quantidade de adeptos. O mundo ocidental europeu desinformado desprezou por muito tempo os mundos árabe, oriental, africano, e mesmo povos americanos tradicionais, como se ele fosse maioria e mais importante no planeta. Todos esses outros mundos estão condenados ao inferno, que muitos cristãos acham que existe, só por não serem cristãos, ou por não serem europeus ou descendentes?
      Achar que na eternidade haverá só uma religião implica crer que Deus considera uma religião do mundo e desconsidera as outras. Entenda certo, cristão, não estou dizendo que sua crença seja banal ou só mais uma, mas estou levantando a possibilidade dessa ser só sua crença pessoal, que Deus respeita como respeita outros seres humanos com outras crenças, ainda que sua crença seja especial. Não estou tirando de Jesus sua posição exclusiva, no mundo e na eternidade, não creio assim. Acredito que apesar do cristianismo do mundo, catolicismo e protestantismo dentre outras seitas, Jesus foi, é e sempre será o melhor caminho, a mais pura verdade e a vida mais próxima do melhor plano de Deus para os homens. 
      Ainda que Jesus seja singular, Deus respeita quem não o conhece como os cristãos o conhecem, porque, meu querido irmão e minha querida irmã que me lê, você já se atentou ao tamanho do planeta? Você já pensou sobre o número de seres humanos que o habitam? Nos cinco continentes, com línguas, raças, níveis culturais e financeiros diferentes? Você já refletiu como é criada uma criança no meio da China, na selva da África, nas favelas do Haiti ou no Afeganistão dominado por extremistas do Islã? Não, meus amigos, ainda no século XXI não é todo mundo que pode conhecer a Jesus como você conhece, frequentar uma igreja evangélica ou uma catedral católica, mas ainda assim Deus ama toda a humanidade. 
      As doutrinas do catolicismo e do protestantismo não constituirão o livro de leis que regerá a eternidade, pelo menos não integralmente. Assim, meus queridos irmãos cristãos, católicos e demais, estejam felizes e sejam úteis em suas crenças, mas tenham as mentes abertas e preparem-se. Quando passarem para o outro lado encontrarão o Jesus real, puro e perfeito, sem as capas de corrupção que as religiões cristãs lhe impuseram no plano físico. Esse Jesus receberá todos com amor, abaixo dele poderá estar Krishna, Maomé, Buda, Confúcio, Kardec e outros fundadores de religiões, também esperando com afeto, mas ninguém tem a posição de Jesus, e acima dele, só Deus. Sejamos humildes, não sabemos tudo. 
      Creio que uma coisa é certa, na eternidade uns seres humanos se sentirão em paz e próximos a Deus, num “céu”, e outros seres humanos se sentirão atormentados e longe de Deus, num “inferno”. Qual a motivo dessa paz e desse tormento? Seria o fato deles terem professado no mundo a religião cristã ou não? Não necessariamente, com certeza muitos que conheceram na prática o que Jesus ensinou terão grandes possibilidades de estarem em paz, ainda que não tenham sido católicos, protestantes ou de outras seitas cristãs. Para aceitarmos isso precisamos enxergar Jesus além das religiões cristãs, muito mais maravilhoso que elas dizem que ele é. Busque a Deus com todo o coração e você entenderá isso.

59. O amor de Deus é eterno

      “Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três, mas o maior destes é o amor.” I Coríntios 13.13

      O cristianismo no mundo não tem propriedade exclusiva sobre Cristo, mas como certas religiões professam o nome de Jesus de forma mais direta, há mais possibilidade dos homens conhecerem a Jesus nelas. Cristo, contudo, está muito além das religiões, seu amor é muito maior, nele não há penas eternas, mas misericórdias eternas, ainda que haja justiça e colheita de plantios ruins. A religião da eternidade é Cristo, não o cristianismo, é Jesus, não o catolicismo ou o protestantismo, é luz, não trevas, é vida eterna, não morte eterna. Podemos entender que há penas eternas por alguns textos bíblicos? Sim, mas por outros textos podemos entender outra coisa. A verdade está no Espírito Santo, busquemo-lo. 
      “Porque a sua ira dura só um momento; no seu favor está a vida. O choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã.” (Salmos 30.5). Quem pode afirmar que o inferno, apesar de terrível, não durará só uma noite? Que duração terá essa noite? Pode ser de alguns meses, como pode ser de anos. Será eterna? Será que Deus se ira para sempre? “Eu, porém, vos digo que qualquer que, sem motivo, se encolerizar contra seu irmão, será réu de juízo; e qualquer que disser a seu irmão: Raca, será réu do sinédrio; e qualquer que lhe disser: Louco, será réu do fogo do inferno.” (Mateus 5.22). Por outro lado será que passarei a eternidade no inferno por ter me irado? Jesus não teve a intenção de dizer isso. 
      O objetivo de ter sido tanto usado o termo “inferno eterno” no novo testamento foi enfatizar, principalmente para um ser humano do século um, a seriedade do pecado, principalmente o pecado interior que havia mesmo embaixo da aparência religiosa que líderes religiosos judeus pregavam. Foi conveniente à igreja católica manter textos com esse viés no cânone, por isso a Bíblia não pode ser interpretada ao pé da letra, precisa sempre do discernimento vivo do Espírito Santo. Muitos cristãos não aceitam que há ensinos antagônicos na Bíblia, ela não é coesa, assim os que dizem que só creem no que está na Bíblia precisam conhecer melhor a Bíblia, ou então assumir que só creem em um dos lados dela. 
      Existe nos textos bíblicos um “Deus” que se ira, que se vinga, que destrói e pune dura e eternamente? Sim, existe esse “Deus” na Bíblia. Mas também existe um Deus que ama e ama a todos, mesmo os que se colocam como inimigos dos cristãos, que não disciplina para sempre, e veja que usei o termo “disciplina”, não “pune”, que recebe o que reconhece seu pecado e pede perdão. O ponto é que o cristianismo tradicional não considera livre arbítrio na eternidade, mas só no mundo. Mas meus queridos, se em tão pouco tempo que vivemos aqui mudamos tanto, por que não mudaríamos tendo toda a eternidade, sem as distrações e limites da matéria, do espaço e do tempo? Se isso ocorrer, nosso inferno não seria convertido em céu? 
      Nada que estou supondo aqui, e estou apenas pensando contigo, supondo coisas, diminui o melhor do cristianismo que experimentamos no mundo. O poder exclusivo do nome de Jesus nas mais elevadas regiões espirituais, o exemplo de vida moral mais alta que ele nos ensinou, a sabedoria tão linda contida em tantos textos bíblicos, de Salmos ao evangelho de João, de Jó à primeira epístola de Paulo aos coríntios, da história da nação de Israel rumo à Canaã às viagens missionárias dos primeiros discípulos, dos mistérios de Gênesis aos de Apocalipse, tudo isso é verdade se interpretado com o Espírito Santo. Mas considere a possibilidade, só considere, de eterno ser o amor de Deus e o livre arbítrio humano, não a ira divina. 
      Não, caríssimos irmãos protestantes e evangélicos, isso não é passar a mão na cabeça de pecador ou diminuir a santidade de Deus, de forma alguma, isso também não é facilitar a espiritualidade dos seres humanos. Isso apenas leva-nos a entender a eternidade do espírito e a temporariedade da matéria, sendo matéria só oportunidade para aperfeiçoar o espírito. Nossa existência limitaria-se a uma? O que seriam os novos céus e a nova terra citados na Bíblia, só lugares de descanso eterno para não se fazer nada? Não, existir eternamente é trabalhar eternamente, a felicidade está em servir, não em permanecer inerte em estado de comtemplação. O que nos impulsiona nesse trabalho é o amor de Deus rumo à sua santidade.  

60. Ressureição e corpo espiritual

      “Porque, se os mortos não ressuscitam, também Cristo não ressuscitou. E, se Cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé, e ainda permaneceis nos vossos pecados. E também os que dormiram em Cristo estão perdidos. Se esperamos em Cristo só nesta vida, somos os mais miseráveis de todos os homens. Mas de fato Cristo ressuscitou dentre os mortos, e foi feito as primícias dos que dormem.“ 
      “E há corpos celestes e corpos terrestres, mas uma é a glória dos celestes e outra a dos terrestres. Uma é a glória do sol, e outra a glória da lua, e outra a glória das estrelas; porque uma estrela difere em glória de outra estrela. Assim também a ressurreição dentre os mortos. Semeia-se o corpo em corrupção; ressuscitará em incorrupção.” 
I Coríntios 15.16-20, 40-42
 
      O capítulo quinze da primeira carta de Paulo à igreja de Corinto discorre sobre vários assuntos relacionados a últimos tempos e natureza de nossos corpos no plano espiritual. Ressurreição foi uma exortação que tinha relevância para o apóstolo-teólogo naquele momento, já que muitos não criam em existência clara e vitoriosa após a morte. Hoje, os que não são ateus e materialistas, e ateus e materialistas são minoria, creem de alguma maneira em vida pós-morte, mas isso não era crença dos judeus do século I.
      O antigo testamento, baseado na Torá e em outros textos sagrados israelitas, narra a história de um povo se relacionando com um Deus espiritual, mas que liberta e guia para uma Canaã no plano físico, as promessas, vitórias e prosperidades são materiais, aqui e agora no mundo. O povo judeu da Bíblia é um povo materialista, isso influenciou muito a civilização ocidental, diferente da oriental, que orientada principalmente pelo hinduísmo e o budismo, tem uma ótica mais espiritual e do outro plano da existência. 
      Esse entendimento veo-testamentário é tão forte que mesmo o cristianismo evangélico, que crê em céu e inferno, teima em achar que o reino de Deus deve ser evidenciado aqui, por isso vemos no Brasil atual tanto interesse de evangélicos em política e em ter um presidente de sua religião. Talvez vivamos um momento que ressurreição deva ser instada veementemente, não para que sejamos ociosos no mundo e nem desrespeitosos com o planeta e a humanidade, mas para que entendamos nossa chamada espiritual maior.
      Paulo exorta que a morte neste mundo não é o fim, que depois seguimos existindo no plano espiritual, que essa outra etapa da existência será com um corpo diferente, “celestial”, não material, e que se isso não for entendido a obra redentora do Cristo é menosprezada. Mas além de repreender alguns sobre a ressurreição, Paulo cita outras doutrinas. É interessante entendermos que muitas doutrinas que temos hoje em igrejas católicas e evangélicas, foram resultados de construções gradativas, não nasceram prontas. 
      Em primeiro lugar, homens que foram testemunhas oculares dos atos de Cristo e que ouviram direto dele muitas coisas, ensinaram depois o que acharam ser o evangelho original. Depois temos Paulo, que ainda que não tenha aprendido diretamente de Jesus, codificou o cristianismo, principalmente nas orientações que deu às igrejas, muitas fundadas por ele, através das cartas. Muito do que Paulo escreveu foi direcionado a judeus convertidos, mostrando-lhes que a nova aliança de Cristo era superior a de Moisés.
      Contudo, à medida que o que entendemos como catolicismo foi imergindo, textos cristãos, ou tidos como tais, dos quatro primeiros séculos foram sendo puxados, revistos, reinterpretados, mesmo alterados, conforme aqueles que se colocavam como novos líderes do cristianismo achavam adequado. Como hoje, nos primeiros séculos havia várias seitas, com doutrinas diferentes em alguns aspectos, assim, a Igreja Católica, subtraindo e adicionando textos, foi montando o que considerava ser a doutrina cristã oficial.  
      A reforma diminuiu o cânone, enfatizou salvação por fé e descartou compras de indulgências, nivelou adeptos acabando com hierarquias e celibato. Contudo, um ponto importante é que tanto o cristianismo original, quanto o catolicismo e o protestantismo, são de certa forma seitas judaicas. A base da religiosidade israelita, pecado que separa de Deus e necessidade de sacrifício de sangue para remissão desse, continuou. Só houve substituição de sacrifícios de animais no Templo de Jerusalém por fé no sacrifício do Cristo.
      Sobre a substância de nossos corpos no plano espiritual, o exemplo bíblico mais direto está nas aparições de Jesus após ressuscitado e neste mundo (leia João 20-21). Ele podia surgir e desaparecer, percorrer distâncias na velocidade do pensamento, comer e apresentar os sinais adquiridos no corpo físico. Jesus, contudo, era especial, com “glória” especial, e no plano espiritual a “glória” não será a mesma para todos, variará conforme a qualidade moral, ainda que a substância espiritual de todos seja incorruptível.
       Paulo pode ter se referido a essa diferença na mesma carta, em I Coríntios 3.12-15. “E, se alguém sobre este fundamento formar um edifício de ouro, prata, pedras preciosas, madeira, feno, palha, a obra de cada um se manifestará; na verdade o dia a declarará, porque pelo fogo será descoberta; e o fogo provará qual seja a obra de cada um. Se a obra que alguém edificou nessa parte permanecer, esse receberá galardão. Se a obra de alguém se queimar, sofrerá detrimento; mas o tal será salvo, todavia como pelo fogo.”
      O conceito “galardão”, pouco falado em púlpitos, pode explicar as distinções, não na substância, mas na graduação moral dos seres no outro plano. Podemos entender que não serão só salvos e condenados, mas haverá nuanças entre santos e ímpios. Mas será que diferença moral também não interferirá na substância espiritual? Seres mais morais mais iluminados e seres menos morais mais entrevados? O certo é que uma grande maioria de cristãos, ocupada com o mundo, entende pouco sobre ressurreição e corpo espiritual. 

61. Arrebatamento e batismo pelos mortos

      “Eis aqui vos digo um mistério: Na verdade, nem todos dormiremos, mas todos seremos transformados; num momento, num abrir e fechar de olhos, ante a última trombeta; porque a trombeta soará, e os mortos ressuscitarão incorruptíveis, e nós seremos transformados. Porque convém que isto que é corruptível se revista da incorruptibilidade, e que isto que é mortal se revista da imortalidade. 
      E, quando isto que é corruptível se revestir da incorruptibilidade, e isto que é mortal se revestir da imortalidade, então cumprir-se-á a palavra que está escrita: Tragada foi a morte na vitória. Onde está, ó morte, o teu aguilhão? Onde está, ó inferno, a tua vitória? Ora, o aguilhão da morte é o pecado, e a força do pecado é a lei. Mas graças a Deus que nos dá a vitória por nosso Senhor Jesus Cristo.” 
I Coríntios 15.51-57
  
      Uma doutrina parece ser citada em I Coríntios 15, o arrebatamento, na afirmação num abrir e fechar de olhos. Essa é a doutrina protestante que mais tenho dificuldade de compreender, não pode ser interpretada metaforicamente, mas só ao pé da letra, e é exatamente isso que me assusta. Jesus falou sobre ela em Mateus 24.27, Paulo também fala em I Tessalonicenses 4.17. Minha dificuldade para “aceitar” esse evento não tem a ver em quando ele vai acontecer, se antes, no meio ou depois do período escatológico chamado “tribulação”.
      Minha dificuldade está em como o arrebatamento vai acontecer. Por que minha dificuldade em aceitar o como? Porque é algo sobrenatural, que acho que evangélicos aceitam, mas nem param para pensar direito no que representa. Como assim, muitos seres humanos em corpos físicos sumirão do mundo puxados por uma força espiritual, num piscar de olhos, na velocidade de um relâmpago? Milhões de pessoas vão desaparecer do planeta Terra sem uma explicação científica? Até que ponto Deus agiu, age ou agirá assim? 
      Muitos protestantes e evangélicos não sabem, mas as igrejas Católica, Ortodoxa Oriental, Anglicana (Episcopal), Luterana e muitas denominações Calvinistas, não creem num retorno preliminar de Cristo, assim, não acreditam nesse arrebatamento físico no mundo. Crer nesse evento é exceção entre cristãos, não é regra. Penso que muitos que creem no arrebatamento estão com as cabeças tão cheias de milagres, que em grande parte nem acontecem, que só o aceitam por acharem que é só mais uma extraordinariedade de Deus.
      Interessante que Paulo inicia I Coríntios 15.51 com eis aqui vos digo um mistério, o mistério citado seria o arrebatamento ou o que ele diz depois, todos seremos transformados? O tema principal do texto não é arrebatamento, mas o corpo espiritual que teremos após a ressurreição. Me faz pensar o porquê de Paulo e de escritores dos evangelhos terem citado arrebatamento como citaram, ou sabiam mais e não disseram, porque sabiam que as pessoas daquele tempo não entenderiam, ou de fato criam do jeito que registraram.
      Prefiro o meio termo, que lhes foi revelado por Deus como metáfora de algo espiritual, ainda que não soubessem, para que estivesse na Bíblia. Um argumento que fundamentalistas usam é, “a Bíblia é a palavra de Deus”, e não, “a Bíblia contém a palavra de Deus”, assim, mesmo que tenha sido montada por homens, creem que o Espírito Santo acompanhou para que fosse construída conforme vontade divina. Não tenho dúvida que a vontade de Deus prevalece, só não acho que seja da maneira que muitos acham que é. 
      Deus usa coisas diferentes para prevalecer sua vontade, incluindo manipulações e equívocos humanos. A Bíblia contém a palavra Deus e é totalmente útil a Deus assim, ainda que não coesa muitas vezes. Primeiro porque serviu a pessoas de tempos antigos, mas depois porque desafia pessoas de outros tempos. Às pessoas dos tempos antigos falou como elas podiam entender, mas às pessoas de hoje pode ainda falar, se buscarmos no Espírito Santo uma interpretação mais profunda que nós hoje podemos compreender. 
      Será que devemos continuar interpretando a Bíblia hoje no século XXI, como interpretavam as pessoas do século XIX ou antes? Crer num arrebatamento físico e ao pé da letra é a mesma coisa que acreditar que o mundo tenha sido criado em seis dias. Sim, meus queridos, Deus pode realizar um arrebatamento físico e criar o mundo em seis dias, não estamos diminuindo o poder de Deus, mas será que é assim que ele age? Isso fica por conta da fé de cada um, só pense e ore mais, antes de aceitar uma interpretação romantizada.  
      Além de ressurreição, arrebatamento e corpo espiritual, I Coríntios 15 cita uma doutrina interessante no verso vinte e nove, batismo pelos mortos. “Doutra maneira que farão os que se batizam pelos mortos, se absolutamente os mortos não ressuscitam? Por que se batizam eles então pelos mortos?” Muitos criam na época de Paulo que podiam se batizar por quem não tinha sido batizado e havia morrido, legando ao morto o direito do batismo. Não entendemos que Paulo recrimine isso, também não estou julgando o costume. 
      A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias (Mórmons) ainda tem esse costume, eis um detalhe que a Bíblia contém que passa batido a muitos. Pois é, está na Bíblia, mas muitos evangélicos não obedecem, assim eu pergunto, aos que creem que devam obedecer cegamente a toda a Bíblia, por que esse costume não é seguido? Alguns alegam que Paulo se refere a um costume pagão, não de igreja cristã, mas juntemos essa passagem polêmica a outras iguais (como a da consulta de Saul à médium em I Samuel 28).
      O que importa é seguirmos a orientação final de I Coríntios 15.58: “sede sempre abundantes na obra do Senhor, sabendo que o vosso trabalho não é vão no Senhor”. O Altíssimo permitiu textos misteriosos na Bíblia, muitos o são porque nem os escritores originais, com toda a experiência que tinham com Deus, sabiam muitas das verdades mais profundas. Mas a dúvida existe por dois motivos: para que sigamos pela fé e estejamos trabalhando espiritualmente sempre, indiferente de como ou quando certas coisas ocorrerão.

62. Paciência e fé dos santos

      “Se alguém tem ouvidos, ouça. Se alguém leva em cativeiro, em cativeiro irá; se alguém matar à espada, necessário é que à espada seja morto. Aqui está a paciência e a fé dos santos.” Apocalipse 13.9-10

      Será que podemos usar o texto bíblico inicial como base para uma doutrina? Talvez. E se for para basear uma doutrina que se opõe a outra bem extremada? Quem sabe, mas isso não nos impede de conjecturar sobre algo que está na Bíblia. O texto não é metafórico, nem uma parábola, aliás, é bem objetivo, mas pode conter um mistério, e não está sozinho no cânone bíblico na categoria de textos, digamos assim, polêmicos. Está em Apocalipse e pode fazer parte de profecias dos últimos tempos, pelo menos assim creem, não todos, mas muitos, dessa forma pode se referir a algo que ainda ocorrerá. 
      Me chama a atenção o fato dele começar com a frase se alguém tem ouvidos, que parece nos exortar sobre algo além do óbvio, cujo significado mais profundo não pode ser entendido sem uma atenção maior. Mas ele também termina de forma enigmática, aqui está a paciência e a fé dos santos. Apesar de citar endividados morais e suas devidas penas, relaciona isso aos santos, não aos ímpios. Quem encarcera e oprime será encarcerado e oprimido, quem mata com espada com essa será morto, assim podemos concluir que quem mata com arma de fogo será morto com arma de fogo, não com arma branca. 
      Pergunto: esse texto de alguma forma não torna o conceito de condenação algo relativo, na proporção do erro? Ele pode simplesmente se relacionar à perseverança, necessária para aprovação em provas para se obter uma posição espiritual, trabalho exercido com insistência e no tempo. Mas se, como se crê tradicionalmente, fé em Jesus basta para pagar dívidas, para que outros pagamentos? Qual a relevância levantada aqui? Se usarmos o texto bíblico inicial para concluir que penas não são eternas, estaremos dizendo que o inferno pode não ser para sempre ou igual para todos os condenados. Será? 
      Quem matou, se for morto, terá pago sua dívida, quem colocou em cativeiro, se for posto em cativeiro, também estará livre da dívida. Porém, ser morto e ser colocado em cativeiro são penas distintas, então, se o pagamento for feito na eternidade o inferno não será igual, ser morto não é igual a estar em cativeiro, por outro lado, se for feito no mundo não haverá necessidade de inferno. Mas será que o que pagou a dívida com cativeiro e o que pagou com morte terão direito ao mesmo céu? Há nisso certa dificuldade para entendermos inferno e céu como eternos e iguais. Isso importa para você?
      Isso não anularia o poder do sacrifico do Cristo homem do passado, nem a posição exclusiva de Jesus espiritual hoje. Nossa fé em Jesus nos dá acesso espiritual a Deus, isso nos permite receber o perdão do Senhor, que nos deixa em paz com o Altíssimo, a paz que perdemos quando pecamos. Essa paz nos dá forças para seguirmos e permite que Deus nos ajude, o Espírito Santo habita os limpos, somos limpos assumindo pecados e tomando posse de perdão. Toda essa experiência, contudo, não nos exime de termos que pagar preços pelos nossos erros, e só quitando essas dívidas somos aperfeiçoados.
      Se há necessidade de paciência e fé ao santo, é porque o aperfeiçoamento não é instantâneo, o santo o adquire enquanto pratica boas obras morais no plano físico, ainda que pela fé em Jesus ele tenha paz com Deus e isso lhe dê direito à salvação necessária para ter o céu no plano espiritual. Fizemos assim uma distinção entre aperfeiçoamento moral e salvação. Isso é um pouco diferente da doutrina mais convencional, baseada, por exemplo, em textos como Colossenses 2.9-10, em que fé em Cristo, salvação, direito ao céu e aperfeiçoamento espiritual, é tudo obtido de uma só vez e imediatamente. 
      Você entende onde esta reflexão pode nos conduzir? O ponto não é diminuir Jesus, mas aumentar a responsabilidade do ser humano em seu aperfeiçoamento, entendendo que mesmo salvas no céu as pessoas terão níveis diferentes, conforme o que trabalharam no mundo. Não tenho dúvidas que interpretações que cristãos têm como certas da Bíblia por séculos, são só a superfície de muitos conhecimentos. Sobre Daniel e Apocalipse, por exemplo, sabemos muitos menos que achamos saber. Por que, então, estão na Bíblia? Para aprendermos a ser humildes, não arrogantes, achando que sabemos tudo. 
      Fizemos aqui uma distinção em relação ao que doutrinas cristãs tradicionais pensam sobre penas eternas e aperfeiçoamento moral. Fizemos também um rebalanceamento de importâncias da fé e das obras, mas também propomos uma interpretação diferente da relevância da existência no plano físico e no espiritual. Jesus continua como sempre será, acima de tudo, única porta para Deus e exemplo maior de excelência moral, mas as tarefas dos homens mudaram um pouco nesta ótica. Deus faz sua parte, mas se os homens não fizerem as deles não haverá aperfeiçoamento. O que você pensa sobre isso?

63. Muito para crescer

      “Por isso, deixando os rudimentos da doutrina de Cristo, prossigamos até à perfeição” Hebreus 6.1a 

      Por que queremos ser santos? Como evangélicos entendemos que termos virtudes morais é melhor, principalmente porque nos livra de encrencas, de adultério, de gastar dinheiro com bebidas alcoólicas e cigarro. Mas na prática santidade para muitos é só isso, não adulterar, não beber e não fumar, se conseguem fazer isso já se sentem satisfeitos, enquanto isso outros pecados, principalmente aqueles pessoais que ninguém sabe, correm soltos. Muitos cristãos não entendem santidade como condição fundamental para se ter comunhão com um Deus santíssimo, para, então, receber dele ensinamentos. 
      Para muitos santidade é obedecer leis, e aí está novamente o uso errado da Bíblia, como só uma lista de sins e nãos. Ver a religião cristã assim facilita a vida, de ovelhas e de pastores, de quem obedece e de quem manda, não há necessidade de pensar, de refletir, de questionar, e assim, possivelmente, de discordar. Mas é importante entendermos que questionamento religioso não é algo só intelectual, e por achar que é, que muitos discordam do cristianismo, ainda que baseados na prática de cristãos equivocados, e até chegando a conclusões legítimas, todavia, deixando isso só em suas mentes.
      O questionamento, depois de refletido, deve ser levado a Deus, isso é o que nos faz ver a imperfeição da religião, mas humildemente crendo na perfeição de Deus, isso é entender que o cristianismo no mundo foi por caminhos sombrios, mas que Jesus sempre será a luz mais alta. Crítica pela crítica, só para achar álibis para não se aproximar de Deus e odiar homens, para nada vale. Mas de novo nos vemos diante de trabalho que muitos não querem fazer, orar a Deus, e não só pedindo algo material e agradecendo por algo material recebido, mas para vivenciar intimidade espiritual com Deus. 
      A doutrina que diz, que basta fé para se ter perdão, e perfeição moral que dá direito a um céu eterno, e que diz que todos que creem assim, indiferente do pecado, também terão o mesmo direito, acaba amarrando os cristãos. Na verdade, grande parte de evangélicos não tem ideia do que seja santidade e de porque ela é exigida, não existe um esforço diário para se alcançar santidade e aperfeiçoá-la, porque não se entende que isso tenha implicação direta no nível de existência espiritual na eternidade. Por isso tantos focam em fé e não em obras, e fé para terem coisas no mundo, não na eternidade.
      Se acreditamos que o céu está garantido, para que ser mais ou menos santos? Por outro lado, se acreditamos que o inferno é o destino dos que não são cristãos, nos moldes do que achamos que é ser cristão, para que nos importarmos em ajudar as pessoas materialmente? Basta que conheçam o evangelho e o aceitem ou não como única salvação. Há um antagonismo estranho que a crença na perfeição imediata pela fé leva, que beneficia, equivocadamente, só os que se acham salvos. Eles não precisam se esforçar, tanto para serem melhores no céu, quanto para ajudar materialmente os que não irão ao céu.
      Sob esse ponto de vista, conseguimos entender porque muitos protestantes e evangélicos estão tão presos aos templos, ao que se faz dentro deles, como se fossem castelos que os protegessem do inferno. Por isso chamam de irmãos os pares, aos outros não, no pouco que ajudam materialmente o fazem a esses “irmãos”, e se fazem aos outros é antes para tentar convertê-los à sua religião. Muitos cristãos não fazem caridade, mas só proselitismo, por acharem que exercem fé, não exercem amor, e justamente por quem, sob o ponto de vista deles mesmos, mais precisa, os que estão fora das igrejas.
      Jesus homem não teve castelo, era do mundo, daqueles que muitos religiosos judeus de seu tempo não consideravam merecedores da melhor eternidade. Hoje muitos cristãos amam criticar os fariseus, se acham melhores que eles, mas será que se estivessem no contexto religioso e histórico do primeiro século não agiriam da mesma maneira que os fariseus? Jesus trabalhou o tempo todo, não para arregimentar adeptos para uma religião, mas para servir em amor, a israelitas e gentios, ajudava neste mundo a todos, com isso com certeza fazia por merecer o melhor lugar na eternidade espiritual. 
      Mas não pensemos que Jesus fazia algo só pensando na eternidade, praticar boas obras aqui por achar que teria pagamento lá, até isso é vaidade. Jesus tinha uma urgência sem segundas intenções, uma voluntariedade pura, fazia o bem porque é o que se deve fazer, como recompensa em si mesmo, assim se é aperfeiçoado espiritualmente. Se salvação é paz com Deus, e isso se ganha sendo perdoado por Deus através da posição espiritual de Jesus, ela é só o início da caminhada, não o fim, sim, é o melhor início, mas ainda assim, só o isso. É preciso trabalhar depois em santidade e por amor para crescer. 
      “Crescer”, como assim? Talvez seja esse um dos pontos mais importantes no equívoco de muitos cristãos, eles não acham que necessitem crescer. Para eles basta crer, obedecer algumas leis morais, frequentar cultos, dar o dízimo, ler um pouco a Bíblia, orar pelo básico, e pronto. Isso, sim, é diminuir Deus, achar que a altura espiritual do Senhor é tão baixa e tão fácil de ser acessada. “Por isso, deixando os rudimentos da doutrina de Cristo, prossigamos até à perfeição” (Hebreus 6.1a), ah, meus queridos, a eternidade é bem mais eterna que muitos acham que é, e Deus, bem mais alto.

64. Profundo e escondido de Deus

      “Falou Daniel, dizendo: Seja bendito o nome de Deus de eternidade a eternidade, porque dele são a sabedoria e a força; e ele muda os tempos e as estações; ele remove os reis e estabelece os reis; ele dá sabedoria aos sábios e conhecimento aos entendidos. Ele revela o profundo e o escondido; conhece o que está em trevas, e com ele mora a luz.” Daniel 2.20-22
 
      Os cristãos, de maneira geral, sempre tiveram um conhecimento raso de suas doutrinas, se não fosse assim o catolicismo não teria dominado a civilização ocidental por tanto tempo. No protestantismo os tradicionais até conhecem mais sua tradição, mas não a questionam, já muitos pentecostais são parecidos com os católicos. É claro que muitos, ocupados com o trabalho da manhã para pagar o almoço, não têm tempo nem energia para pensar em teologia, e acredite, a esses Deus entende e deles cuida. “A cana trilhada não quebrará, nem apagará o pavio que fumega” (Isaías 42.3a).
      Deus tem permitido que seres humanos mais esclarecidos sejam levantados nos últimos tempos, que podem entender melhor as coisas e guiar os outros num entendimento sensato sobre a vida. Contudo, mesmo esses, que às vezes são doutores nas ciências, na religião continuam como ignorantes camponeses, desses o universo cobra lucidez, razoabilidade, profundidade espiritual. Mesmo chamados e capacitados não acham tempo, estão mais ocupados em acumular riquezas, em manter o establishment, em serem vistos como bons religiosos pelos pares, aceitando educadamente sua religião.
      O protestantismo saiu do catolicismo, mas o catolicismo parece que não saiu desse, e se querem saber, em alguns aspectos ficou até pior. Quis reformas e as fez, mas para se prender ainda mais, depois gerar cisões, banalizando o evangelho. O catolicismo tem algo de nobre em seu arrogante e gélido desvio, mantém-se impávido e altivo, a mais alta torre da Babilônia, desafiando deuses e se achando o próprio Deus. Enquanto isso o Espírito Santo clama, busca corações que o acolham, ouvidos que o ouçam, olhos que o vejam, para mostrar aos homens a verdade, que tantos acham ser donos. 
      O clamor do Santo Espírito não é por clemência, ele não mendiga por atenção nem se vende por qualquer preço, sua voz é mansa e clara, procurando quem quer se deixar ser iluminado. “Não deis aos cães as coisas santas, nem deiteis aos porcos as vossas pérolas, não aconteça que as pisem com os pés e, voltando-se, vos despedacem. Pedi, e dar-se-vos-á; buscai, e encontrareis; batei, e abrir-se-vos-á. Porque, aquele que pede, recebe; e, o que busca, encontra; e, ao que bate, abrir-se-lhe-á.” (Mateus 7.6-8). As pérolas estão reservadas aos que buscam a Deus com todo o coração, esses saberão mistérios. 
      Muitos se acham orgulhosos guardiões de tradições religiosas, mas, e perdoem-me o termo (ele é o bíblico), são só porcos recebendo o que porcos merecem. As pérolas estão guardadas para os que não aceitam os erros da religião como algo normal, que não dizem “não olho para o padre (ou pastor), mas para Deus”. Foi por causa dessa atitude hipócrita que o falso cristianismo trouxe tanta dor à humanidade, e mantém ainda hoje tantos preconceitos. Não sejamos aqueles que serão tragicamente surpreendidos na eternidade, que terão que ser humilhados para seguirem para a luz do Deus Altíssimo.
      Sejamos os que humildemente acharão na verdade sem véu o descanso, porque no mundo conheceram o profundo e o escondido de Deus. Não tenho a pretensão de encontrar em todos os cristãos os mesmos questionamentos que trago em mim, só compartilho aqui meu ponto de vista. Se você, que lê os textos deste espaço virtual, encontra pontos comuns, que bom, senão, entenda bem o que é postado, não discorde sem antes entender, reflita e ore, mas decida em Deus por aquilo que te dá paz. Escrevo em oração e com responsabilidade, não é letra morta, mas no Espírito e com muito respeito a todos. 
      Mas como já disse outras vezes, se alguém começou a ler o “Como o ar que respiro” buscando estudo bíblico de acordo com teologias das tradições cristãs, está no lugar errado, existem muitas páginas na internet com essa proposta. O ponto aqui é questionar, não responder, para que cada um ache resposta em Deus. Não concordo com muita coisa ensinada como verdades dogmáticas em igrejas, isso não faz com que eu me perca dos caminhos do Senhor, antes me leva a buscá-lo ainda mais. Quanto ao que ele quer de mim em santidade, humildade e amor, fica cada vez mais real em minha vida. 
      Vemos o que queremos ver, se temos algo forte na cabeça mesmo olhando para o caos acharemos um padrão, o que temos mais certeza que existe, testes psicotécnicos mostram essa tendência. A Bíblia é a maior fábrica de heresias que há, muitos que acreditam em coisas que ao meu ver e ao teu ver podem parecer absurdas, poderão nos dar argumentos bíblicos minuciosos para legitimarem seus pontos de vista. Por isso, a aprovação do Espírito Santo e bons frutos que permanecem, devem ser o critério mais alto para sabermos se algo em que acreditamos é de fato aprovado por Deus para nossas vidas. 
      Contudo, não se esqueça de uma coisa, cada um sabe de Deus o que está preparado para saber, não necessariamente tudo, nem o mais profundo, mas só o que pode abençoá-lo para viver a vontade do Senhor para sua vida. Sejamos sempre fiéis à fé que nos trouxe até o lugar onde chegamos em vitória e paz, ela até pode ser aperfeiçoada, mas se for verdadeira nunca será negada. Deus é ilimitado, nós não, Deus sabe tudo, nós, se soubéssemos tudo nos perderíamos. Mas o tempo de iluminação é chegado, religiões tradicionais não satisfarão mais, uma busca do profundo e do escondido de Deus urge! 

65. “Porque está na Bíblia”, é resposta?

      “Porque todos os que são guiados pelo Espírito de Deus, esses são filhos de Deus. Porque não recebestes o espírito de escravidão, para outra vez estardes em temor, mas recebestes o Espírito de adoção de filhos, pelo qual clamamos: Aba, Pai. O mesmo Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus.” Romanos 8.14-16

      Um argumento usado por grande parte de cristãos para acreditar cegamente em algo é, “porque está na Bíblia”. Será que isso basta? Vou responder a esses de maneira semelhante a que respondemos a crianças em muitos casos, porque está na Bíblia não é resposta. Por quê? Porque podemos achar aprovação para as coisas mais absurdas possíveis na Bíblia, se não a interpretarmos de maneira correta. A Bíblia pode ser só um texto qualquer, sem a unção do Espírito Santo. Quem tem essa unção? Os humildes e crentes. É preciso humildade e fé para entendermos a vontade de Deus, mesmo na Bíblia.
      Isso não é exclusividade de cristãos e a Bíblia, também ocorre com muçulmanos e o Alcorão, com hinduístas e budistas e o Bhagavad-Guita, o Mahabharata e outros textos, com os espíritas e os livros de Allan Kardec e Chico Xavier, dentre outros exemplos. O problema aqui é um já comum na religiosidade, idolatria, e livros sagrados também podem virar ídolos. Entre os evangélicos existe “bibliolatria”, chega ao extremo de se achar que o livro feito de papel e outros materiais, pode ter poder para expulsar demônios. Quem já não viu “pastores” dando com a Bíblia na cabeça de endemoniado? 
      Mas o que mais se vê é a idolatria do texto, é certo que também pode chegar ao ponto de certas versões terem predileção, como a Revista e Corrigida para algumas denominações pentecostais. Interpretação ao pé da letra e a atemporalidade que desconsidera contexto histórico são os equívocos mais comuns. Se houvesse inteligência religiosa, aqueles que se colocam como líderes, deveriam ensinar a Bíblia de maneira diferente hoje em dia, essa é a verdade, não como uma lista de regras, como um livro de leis, mas como textos históricos que relatam experiência de antigos com Deus, simples assim. 
      Você sabe que está idolatrando a Bíblia quando acha que só o fato de discordar de alguma passagem dela já o põe em pecado. Muitos quando leem que Deus não criou o mundo em seis dias já demonizam o que fez tal afirmação, nem param para entender que esse pode não estar negando a Bíblia, mas só uma forma de interpreta-la. Mas quem está preparado para ensinar Bíblia corretamente? Muitos têm capacidade intelectual, até discernimento espiritual, mas não têm coragem, esses não querem contrariar pessoas que querem pastor que lhes diga o que querem ouvir, pessoas que pagam o pastor. 
      É isso que queremos dizer quando falamos que o protestantismo saiu do catolicismo, mas o catolicismo não saiu do protestantismo, a civilização ocidental acostumou-se com um cristianismo, até aceita certas reformas protestantes, mas com limites. Uma das coisas católicas que está marcada a ferro nas mentes das pessoas é a ideia de verdades dogmáticas, e isso pode ser ainda mais extremo nos protestantes, que desconsideraram outros textos, outros ensinos, outros sacramentos, e focaram exclusivamente num cânone de sessenta e seis livros. Para esses a Bíblia é a verdade, eternamente incontestável.
      O dogma é bisavô do conservadorismo, que é avô do preconceito, que é pai da ignorância. O ignorante nega a ciência, a razão, a possibilidade de pensar por si mesmo, de questionar e de poder chegar a conclusões próprias. Quem pensa por si não pode ser controlado, sem controle não pode ser manipulado e não manipulado não pode ser usado para dar alguma espécie de lucro ou de poder para os outros, aqueles que criaram o dogma. É assim que sempre funcionou o mundo, na economia, na política, na religião, na ciência, nas artes etc. A libertação disso está no vivo Espírito Santo de Deus. 
      “Porque o Espírito Santo me disse”, isso é resposta! Mas isso criaria o caos? Permitiria que qualquer um dissesse que faz, fala ou crê pois o Espírito Santo o mandou? Sim, a princípio poderia até ser. Mas a paz e os bons frutos que permanecem confirmariam se o que alguém fez, falou ou creu foi autorizado pelo Espírito Santo. E as religiões, o que seria delas? Pessoas com entendimentos mais ou menos em comum se agrupariam naturalmente, mas se houvesse humildade, mesmo pessoas com pontos de vista muito diferentes, viveriam em paz, e umas acrescentariam às outras seus entendimentos. 
      Você pode achar isso uma utopia, mas a humanidade está caminhando para isso, infelizmente, por causa do orgulho, do egoísmo e do materialismo, depois de perder muito tempo, separando ou invés de unindo, odiando ao invés de amando, condenando ou invés de salvando. As pessoas despertaram para ir atrás de seus direitos, sim, ainda há muitos equívocos, vingança de um lado, prepotência do outro, mas logo a dor será de todos, se a humanidade não foi unida pela amor, será pela dor, como diz o ditado. Não existem melhores e piores, somos todos irmãos, espíritos de um pai espiritual. 

66. Os segredos do coração

      “O nosso coração não voltou atrás, nem os nossos passos se desviaram dos teus caminhos, para nos esmagares onde vivem os chacais e nos envolveres com as sombras da morte. Se tivéssemos esquecido o nome do nosso Deus ou se tivéssemos estendido as mãos a um deus estranho, será que Deus não teria descoberto isso, ele, que conhece os segredos dos corações?” Salmos 44.18-21 (Nova Almeida Atualizada)

      Durante minha vida já tive quatro pontos de vista diferentes sobre a morte. O primeiro deles aconteceu em minha juventude, eu nem pensava no assunto, ainda que muitos de meus caminhos fossem caminhos vãos e de morte, achava que nunca morreria. Mas não é assim com muitos de nós? O segundo ponto de vista foi o pior e mais difícil de ser superado, já mais maduro, pelo menos no corpo, comecei a ter consciência da culpa, que quando não bem resolvida deseja a morte por achar que só ela pode livrar da dor de viver, esse é um ponto de vista bem covarde.
      O terceiro ponto de vista veio depois de um tempo que eu tinha superado o segundo, já tinha resolvido a culpa, já não culpava os outros, a lucidez tinha me achado e eu a segurava, mas nesse momento comecei a me achar no direito de morrer. Isso é irresponsabilidade, principalmente com os que nos amam, que ficariam sozinhos caso partíssemos antes do tempo. Atualmente tento segurar o quarto ponto de vista, tem características de todos os outros, não penso na morte, ainda que tenha consciência que a dor seja grande e que minha atuação neste mundo já esteja no último ato. 
      A orientação que vem verdadeiramente de Deus, principalmente quando passamos de certa idade, nos conduz a uma vida saudável em várias áreas, ela é para pensarmos na morte da maneira mais correta, não desejando-a, mas se preparando adequadamente para ela. Nos preparamos para a morte vivendo melhor, não é caindo em depressão, nos afastando dos outros, concentrando tristeza e celebrando doenças. Quem de fato anda com Deus não se prepara para um fim, mas para um começo ainda melhor, não para a morte, mas para a vida eterna, para a melhor eternidade com Deus.
      O céu é posição espiritual de luz, não de trevas, quem se prepara para a morte do jeito certo vive ainda melhor neste mundo, coloca-se na luz e nela a verdade é exibida sem medo, deveríamos viver assim sempre, não só na velhice. Infelizmente vejo gente sofrendo muito no final, por quê? Porque os segredos de seus corações vêm à tona e eles não são bons. Passaram a vida fugindo de si mesmos, então, quando não podem mais prevalecer pelo que empreendem no plano físico, percebem que não têm mais nada, estão vazios dentro de si, reputação, religião, tudo é falso. 
      Reconhecem que construíram castelos de cartas sobre areia num campo aberto exposto aos ventos. Quando eram mais novos podiam se esforçar e manter tudo de pé, mas no final, não há mais forças, e tudo vai ao chão. Podemos dizer como o salmista no texto bíblico inicial, que não retrocedemos para as vaidades, nem nos desviamos para o egoísmo, que não adoramos os deuses deste mundo? Que por isso Deus não pode pesar sua mão sobre nós, pois nada temos para esconder dentro de nós e todos os segredos de nossos corações são agradáveis ao Senhor? 
      Em outras palavras isso é dizer, estou pronto para morrer e para enfrentar a luz mais alta de Deus, ela não revelará nada que eu já não tenha mostrado a Deus, tudo foi provado, fui aprovado, errei, mas admiti, me apossei de perdão, alcancei a paz e nela permaneci. O inferno começa aqui, assim como o céu, na eternidade não haverá mágicas, seremos o que já somos, trabalhemos aqui para melhorarmos e agradarmos a Deus. Nada agrada mais o Senhor que a verdade. Não, ela não precisa ser boa, todos nós temos terríveis verdades, mas ela precisa ser assumida, o quanto antes.
      Por isso, “não tenhas inveja dos homens malignos, nem desejes estar com eles”, “com a sabedoria se edifica a casa e com o entendimento ela se estabelece” (Provérbios 24.1, 3). Não tenhamos inveja de ninguém, menos ainda dos que parecem dar-se bem, ainda que não vivendo totalmente de acordo com a vontade de Deus. Muitos até edificam uma família, um negócio, mas não conseguem estabelecê-lós, seus finais serão de vergonha. “Os ímpios não subsistirão no juízo”, “ porque o Senhor conhece o caminho dos justo” (Salmos 1.5a, 6a). Já o final do humilde é sempre de honra. 

67. Reina o Senhor, regozije-se a terra

      “Reina o Senhor. Regozije-se a terra, alegrem-se as muitas ilhas. Nuvens e escuridão o rodeiam, justiça e juízo são a base do seu trono. Adiante dele vai um fogo que lhe consome os inimigos em redor. Os seus relâmpagos alumiam o mundo; a terra os vê e estremece. Derretem-se como cera os montes, na presença do Senhor, na presença do Senhor de toda a terra. Os céus anunciam a sua justiça, e todos os povos veem a sua glória. Sejam confundidos todos os que servem a imagens de escultura, os que se gloriam de ídolos; prostrem-se diante dele todos os deuses.” Salmos 97.1-7

      “Reina o Senhor, regozije-se a terra”, isso significa que a humanidade em todo o planeta Terra pode ser feliz porque Deus existe, tudo controla, ama a todos e atua ativamente para que todos vivam em paz. É bonito dizer isso, talvez o escritor do Salmo 97, com a visão pequena de mundo de seu tempo, pudesse dizer que havia felicidade na Terra, principalmente levando-se em consideração, que para ele, se a nação de Israel estivesse materialmente bem, a vontade do Senhor estaria sendo feita. Contudo, hoje, no século XXI, com celular e internet na mão, sabemos que existe muita infelicidade no planeta, muita injustiça, muito preconceito, muito poder nas mãos de poucos. Ainda assim Deus reina? Sim, só que hoje podemos entender que a responsabilidade de melhorar o mundo é nossa, não de Deus, ele só respeita nosso livre arbítrio. 
      O homem israelita do antigo testamento usava muito a diferenciação “nós e eles”, amigos e inimigos, santos e ímpios, judeus e gentios, infelizmente muitos evangélicos atualmente teimam em viver um cristianismo baseado nesse conceito, que podia até não ser inadequado ao israelita do antigo testamento, mas é hoje após a missão de Jesus. No Cristo espiritual não existe “nós e eles”, mas só “nós”, quem não aceita isso mantém o conservadorismo e os preconceitos, empodera o Diabo e o inferno, diminui Deus e seu amor revelado de forma tão clara na vida do Cristo homem. Será que não devemos ver a Bíblia como um livro histórico? E com história não entenda fatos reais, mas registros imperfeitos de homens, ainda que homens com maravilhosas experiências com Deus. Talvez essa ótica nos conduza à verdade mais alta.
      Deus, mundo, seres físicos e espirituais, quais as dimensões disso tudo? Alguns ensinos chamam a atenção no Salmo 97, em primeiro lugar sobre Deus, que é avaliado sob duas perspectivas. A primeira delas é material, uma reflexão veo-testamentária não pode deixar de olhar Deus como uma grandeza e uma potência material, um homem que vivia em guerras e que precisava de sua força física para sobrevivência no mundo, antes da revolução industrial e de outros marcos civilizatórios, interpretava o Deus maior como o maior e mais forte em termos objetivos. A afirmação “derretem-se como cera os montes, na presença do Senhor” é significativa para demonstrar o Deus todo-poderoso, nos passa a impressão de uma capacidade que não precisa nem agir ativamente, basta sua proximidade para imensos corpos materiais se desfazerem.
      Deus também é avaliado espiritualmente, e aí é compartilhado uma virtude exclusiva de Deus, elevação moral mais alta. Podemos entender esse conceito de duas maneiras, uma é comparando Deus a outros “deuses”, e na época outros deuses eram formatados fisicamente em imagens de pedra, madeira e outros materiais. Essas formatações, como matéria física, eram vazias e mortas, mas enganam-se os que acham que os que fabricam imagens ou desenham figuras “adoram” só aquilo que os olhos físicos veem e o que suas mãos podem tocar e levar. Esculturas e figuras são só representações de entidades espirituais, são usadas para que se tenha algo para se focar mental e emocionalmente, mas que permitem o estabelecimento de comunicação com o plano espiritual, com seres vivos e inteligentes, ainda que moralmente baixos. 
      A outra maneira de entendermos a elevação de Deus é que ele não é só superior a ídolos materiais, mas também, e principalmente, mais elevado que as entidades espirituais que são focadas quando uma imagem é adorada. Por isso a “os que servem a imagens de escultura”, segue “prostrem-se diante dele todos os deuses” (Salmos 97.7). Essas ídolos podem ser falsos deuses porque não podem abençoar os homens como Deus abençoa, mas não são mentiras, existem e ainda que a princípio sejam só imaginação de mente humana maldosa ou transtornada psicologicamente, acharão no plano espiritual algum espírito enganador afoito por ser adorado, ansioso para ser ouvido, pelos homens no plano físico. Por isso comunicação espiritual que não seja com Deus é proibida na Bíblia, não por ser impossível, mas por ser perigosa e inútil.

68. A luz difunde-se para o justo

      “Sejam confundidos todos os que servem a imagens de escultura, os que se gloriam de ídolos; prostrem-se diante dele todos os deuses. Sião ouve e se alegra, as filhas de Judá se regozijam, por causa da tua justiça, ó Senhor. Pois tu, Senhor, és o Altíssimo sobre toda a terra; tu és sobremodo elevado acima de todos os deuses. Vós que amais o Senhor, detestai o mal; ele guarda a alma dos seus santos, livra-os da mão dos ímpios. A luz difunde-se para o justo, e a alegria, para os retos de coração. Alegrai-vos no Senhor, ó justos, e dai louvores ao seu santo nome.” Salmos 97.7-12 

      O que chama atenção no Salmo 97, após as reflexões sobre Deus e falsos deuses, é uma característica dos que servem aos falsos deuses, eles vivem em confusão. Fora do Deus mais elevado não pode haver segurança e clareza, porque longe do Altíssimo há trevas. Por mais que alguém pareça ou queira parecer, ou diga que é, uma pessoa lúcida, que sabe o que faz e por onde anda, se ela não temer ao único e verdadeiro Deus, de alguma forma estará em comunhão com falsos deuses e de algum jeito adorando-os, tenham esses formas físicas ou mentais. Ateus e materialistas não aceitam que nossas vidas sempre sofrem interferências espirituais, que é impossível existirmos neste mundo sem estarmos ligados espiritualmente a Deus ou a outros seres espirituais. Fora de Deus há confusão, ainda que se queira fazer o bem e nem se creia no diabo.
      Há pessoas sempre envolvidas em novos projetos, principalmente profissionais, bem intencionadas e esforçadas, até fazendo alianças com outras pessoas, também bem intencionadas e esforçadas, mas seus projetos sempre fracassam. Por quê? Porque desprezam Deus em suas equações. Já os “santos”, os “justos”, temem ao Senhor o tempo todo, nada fazem sem colocar diante de Deus seus planos, sempre são gratos ao Senhor, por tudo, seja pelas vitórias, seja pelas portas fechadas, é sobre esses um outro ensino do Salmo 97, esses odeiam o mal. Sempre que vemos a palavra odiar no antigo testamento é sábio colocá-la sob a ótica do novo testamento, senão poderemos achar na Bíblia aprovação para algo errado. Muitas heresias nascem da interpretação de textos do antigo testamento ao pé da letra, fora do contexto do novo testamento. 
      Deus não odeia ninguém e os renascidos em Jesus e com o Espírito Santo também não devem odiar. Contudo, os que temem a Deus não acham conforto no mal, mas sentem nojo do que se relaciona com o mal como de coisa imunda, isso não é detestar algo para destrui-lo, mas para se afastar de algo. Quem “odeia” no Espírito Santo não chega perto para violentar, agredir, ofender ou diminuir, mas só se afasta, o ódio de Deus não está nele se aproximar para destruir, mas em sua presença afugentar para longe os que não o amam. Quem ama a Deus afasta-se do mal, não luta com o mal, ou mais, o mal se afasta de quem ama a Deus, como diz Tiago 4.7, “sujeitai-vos, pois, a Deus, resisti ao diabo, e ele fugirá de vós”. As trevas têm medo da luz e nelas não estão só espíritos maus, mas todos os seres humanos que lhes dão ouvidos.
      “Ele guarda a alma dos seus santos, livra-os da mão dos ímpios”, quem se afasta do mal é naturalmente guardado pelo bem, simples causa e efeito. Mas “a luz difunde-se para o justo e a alegria para os retos de coração”, eis o último ensino do Salmo 97. Iluminação e alegria são direitos dos justos e retos, nem precisam se esforçar para terem clareza nas decisões, prosperidade na vida e alegria no dia a dia. Perto do Senhor naturalmente (ou sobrenaturalmente) colhe-se o bem. O texto, contudo, dá-nos a impressão de algo mais, como se Deus criasse de forma especial coisas boas para os que andam com ele, como se a razão de existência do bem fosse os homens de bem. Por isso alguém que teme a Deus se sente tão mal com o pecado, ele não foi gerado em Cristo para as trevas, mas para a luz, foi vocacionado para ter paz.
      Sejamos humildes, mas não temamos os homens, principalmente os que não temem a Deus. Por mais que muitos homens e mulheres pareçam poderosos, sinceramente acharem-se superiores a nós, podem estar em profundas trevas espirituais, aparentando serem fortes, mas serem inseguros, com mais medo de nós que nós deles. O mais importante é sabermos que se confiamos em Deus, nosso medo não se justifica, quanto aos que não confiam em Deus com todo coração, por mais que neguem o medo, estão desprotegidos e confusos. A alegria é direito dos retos, a luz emana aos justos, a honra é dádiva do Senhor aos quebrantados, a felicidade verdadeira, que não se baseia em riquezas e aprovação deste mundo, nunca falta ao que adora e obedece ao Deus único, verdadeiro e Altíssimo, creiamos no Senhor que sempre nos ama. 

69. Deus fala por parábolas

      “Por isso lhes falo por parábolas; porque eles, vendo, não vêem; e, ouvindo, não ouvem nem compreendem. E neles se cumpre a profecia de Isaías, que diz: Ouvindo, ouvireis, mas não compreendereis, e, vendo, vereis, mas não percebereis. Porque o coração deste povo está endurecido, e ouviram de mau grado com seus ouvidos, e fecharam seus olhos; para que não vejam com os olhos, e ouçam com os ouvidos, e compreendam com o coração, e se convertam, e eu os cure.” Mateus 13.13-15

      Boa parte das maiores verdades registradas na Bíblia está escondida nas parábolas, essas por si só contêm mistérios e podem tanto ser entendidas ao pé da letra quanto por uma interpretação mais profunda de suas figuras. As parábolas também são mais difíceis de serem alteradas em traduções, versões e compilações do cânone bíblico, elas existem no antigo testamento, mas Jesus as usava de maneira especial. Eram e são didáticas para os mais simples, assim como chaves para tesouros espirituais que os “iniciados” entendem, aqui vou usar o termo “iniciados” me referindo aos que buscam a Deus com mais intimidade. Nisso se revela o amor do Senhor, sendo tão alto e sábio não nega sua luz a ninguém, mas trata a todos de maneira específica, respeitando limites e escolhas. Jesus disse muito mais que aquilo que é ensinado nas igrejas, os que têm ouvidos e olhos espirituais ouvem e veem o que o Espírito Santo pode ensinar aos que querem aprender. 
      Contudo, além dos simples e dos íntimos, Jesus tinha o objetivo de atingir um terceiro grupo de pessoas através das parábolas, aqueles que já não eram (ou não se consideravam) simples, mas que também não aceitavam os mistérios de interpretações mais profundas. Aos que não abrem os olhos, as trevas são impostas, não pelo ambiente externo, mas pelo seu arrogante mundo interior. É sobre esses que se refere o texto inicial de Mateus, não é sobre o povo mais simples, mas sobre a liderança religiosa israelita do início do primeiro século. Jesus nos ensina algo com muita clareza, que os que menos podem conhecer os textos religiosos podem ser justamente os líderes, que mais acham que sabem, pois interpretam os textos e os usam para suas conveniências, não para servirem ao próximo e ao Senhor. Por isso devemos buscar bons líderes e acatá-los, mas sempre colocando em Deus nossa confiança maior, não em homens e no que esses dizem sobre o Senhor. 
      Com relação às nossas necessidades triviais e principalmente materiais, nossos empregos, o sustento de nossas famílias, mesmo o caminhar de nossos filhos e cônjuges no mundo, Deus nos fala sempre e de forma direta e simples. Manter nossas existências com dignidade é prioridade para nós e para nosso pai, contudo, a vida com Deus pode ser mais que isso, por isso dons espirituais e consagrações e orações mais intensas. Insto que o Espírito Santo tem mais a nos dizer que seus consolos diários, mais a nos entregar que o perdão de Deus em Cristo, mas a operar que ações que achamos ser extraordinárias (“milagres”) em momentos especiais de nossas vida. Muitas coisas sobre o mundo, os tempos, os homens, os seres espirituais, o universo e a vida eterna, Deus pode revelar aos que estão preparados para saber e o buscam da maneira correta. Com obediência, santidade, humildade e fé, que perseveram na busca, muitas respostas podem ser recebidas. 
      Duas coisas preciso dizer aos que sentem de Deus fazerem uma busca espiritual mais profunda: depende de nós, e, Deus se revela aos poucos. Muito se fala e se pergunta, por exemplo, sobre vida em outros planetas e o.v.n.i., mas você já questionou a Deus sobre isso? Muitos dizem que não perguntam a Deus sobre assuntos assim porque são bobagens, inúteis, contudo, lá no fundo de seus corações têm algum prazer em ler sites de teorias de conspiração a até creem um pouco no que esses lugares dizem. Eis um exemplo de algo que já perguntei a Deus e tive resposta, qual foi a resposta? Bem, eu a guardo para mim, se quiser saber pergunte você a Deus. A iniciativa de buscas mais profundas é nossa, Deus respeita isso e se nós não buscarmos ao Senhor seguiremos vivendo só com o que sabemos. Se temos curso técnico, Deus nos permite empregos como técnicos, mas se temos curso superior, Deus nos permite empregos melhores, depende de nós estudarmos mais.   
      O uso por Jesus de parábolas se refere à forma como o Espírito Santo trabalha em nós para nos revelar mistérios, uma forma gradativa. Somos limitados muito pelo medo, e quando temos um entendimento fechado de que algo é proibido para nós porque entendemos que a Bíblia proíbe, isso bastará para que nem questionemos certas coisas. Assim, a primeira coisa a entender é o que é a Bíblia, palavra ipsis litteris de Deus, ou só registros de homens de tempos antigos que tiveram experiências com Deus? Deus não desceu do céu e escreveu algo em uma pedra, um pergaminho ou um papel, e se Jesus escreveu alguma coisa não temos isso em mãos hoje, o que temos são textos de segundos ou de terceiros, além da tradição oral, que mais ainda perde do original no tempo. Aceitar algo como verdade final porque está na Bíblia, não deve nos impedir de questionar e levar esse questionamento ao Deus vivo em oração, contudo, ainda assim, Deus nos mostrará as coisas com muito cuidado. 
      Muitos teólogos por terem estudado muito as doutrinas tradicionais, por conhecerem o cânone bíblico de cabo a rabo, por lerem os idiomas originais da Bíblia, por terem graduações e pós-graduações em religiões, se acham profundos conhecedores do mundo espiritual, mas podem ser apenas extremos conhecedores do raso. O profundo e o escondido só o vivo Espírito Santo, não a letra morta, pode revelar. Conhecimento implica em mais e sérias escolhas, será que o curioso inicial está preparado para isso? Deus não quer que nenhum se perca, melhor um formado no curso médio e feliz, que um infeliz com curso superior incompleto. Livre arbítrio, Deus o respeita muito, sempre nos perguntará e pedirá que confirmemos a resposta, para saber se estamos preparados para seguir, se saber não nos levará à perdição. Nossa prática moral deve acompanhar nosso conhecimento espiritual, se é de Deus funciona assim, saber mais deve nos tornar mais santos e mais humildes. 

70. Questionar não é pecado

      “Eis que dias vêm, diz o Senhor, em que farei uma aliança nova com a casa de Israel e com a casa de Judá. Não conforme a aliança que fiz com seus pais, no dia em que os tomei pela mão, para os tirar da terra do Egito; porque eles invalidaram a minha aliança apesar de eu os haver desposado, diz o Senhor. Mas esta é a aliança que farei com a casa de Israel depois daqueles dias, diz o Senhor: Porei a minha lei no seu interior, e a escreverei no seu coração; e eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo. E não ensinará mais cada um a seu próximo, nem cada um a seu irmão, dizendo: Conhecei ao Senhor; porque todos me conhecerão, desde o menor até ao maior deles, diz o Senhor; porque lhes perdoarei a sua maldade, e nunca mais me lembrarei dos seus pecados.” Jeremias 31.31-34

      A passagem do capítulo trinta e um de Jeremias nos revela que a segunda aliança que Deus faria com o homem seria diferente da primeira, a primeira foi baseada em sacrifícios de animais e numa lei registrada num livro, a segunda seria baseada no Espírito de Deus “escrevendo” diretamente nos corações dos homens. O próprio Deus ensinaria cada ser humano de maneira direta, isso tiraria da religião oficial o papel de ser instrumento oficial de Deus, o próprio Deus seria seu instrumento, por Jesus através do Espírito Santo. Contudo, ainda assim, pouco tempo depois da partida de Jesus e da fundação das primeiras igrejas, o homem voltou a se abrigar em uma religião institucional no mundo, não no Deus espiritual. Não que não fossem ou não sejam necessárias igrejas, elas são bênçãos, tanto espiritual quanto socialmente, mas se elas se tornam ferramentas de homens para dominar sobre homens o vivo Espírito de Deus se afasta e uma palavra morta ganha espaço.           
      Por isso a importância (equivocada) que muitos cristãos dão à Bíblia, principalmente os evangélicos, acham que com ela podem ter um pocket deus, um “deus portátil de bolso”, onde as regras estão claras e não há risco de errar sem que haja necessidade de busca por oração. Sempre que o homem se poupa de pensar abrirá mão para que outros pensem por ele, isso o fará depender dos outros. Não existe ociosidade religiosa maior que assistir um culto construído sobre liturgias e ritos, onde tudo já está bem mastigado para que nos alimentemos do deus dos outros de acordo com os protocolos dos outros. Se esses protocolos ainda fossem baseados na palavra original e genuína de Deus, seria menos ruim, mas não são, são baseados num cânone bíblico modificado no decorrer dos séculos pelos homens, os mesmos que ensinam que questionar a legitimidade divina desse cânone é pecado. Esse é o ponto desta reflexão, chamar a atenção sobre a verdade da Bíblia, que muitos fecham os olhos para não ver.             
      Se dermos uma passeada pelo Google acharemos vários espaços virtuais, sites, redes sociais, blogs, vídeos, com propostas de revelar heresias, a maioria defendendo a Bíblia como um livro que deve ser interpretado ao pé da letra, qualquer interpretação que contenha subjetividade é considerada heresia. Muitos não percebem que as maiores heresias são baseadas justamente em interpretações ao pé da letra da Bíblia, e seguindo nesse raciocínio, a afirmação que acabei de fazer, sobre não interpretar a Bíblia ao pé da letra, para muitos já é uma heresia. A conclusão que chegamos é que toda denominação ou seita cristã tem, em alguma instância, uma heresia em relação a outra denominação ou seita cristã, sendo assim, se todas são, nenhuma é, já que nenhuma pode ser usada como referência para as outras. Interessante que as religiões cristãs são as que possuem mais seitas e heresias. 
      Por esse motivo consolo-me, não me acho dono da verdade ou algum tipo de profeta especial, mas só mais um homem com direito a pensar, avaliar e compartilhar isso, e mesmo que essa visão seja considerada heresia para alguém, aceito isso em paz, pronto para dar satisfação ao Senhor por ela, seja aqui ou na eternidade. Não tenho nenhuma pretenção de convencer ninguém sobre meu ponto de vista, só o compartilho na esperança que outros mesclem seus pontos com o meu e talvez, através dessa mistura, cheguem mais perto do conhecimento mais puro de Deus. Não tenha, contudo, ninguém, ainda que apoiado por tradições, instituições, denominações, grandes pregadores, doutores em teologia, dogmas milenares, a presunção de se achar proprietário ou sócio da verdade maior. Nenhum homem no mundo teve ou tem essa posse e na verdade ninguém precisa ter. 
      Muitos, só por levantarmos certas questões, podem nos considerar heréticos, mas fazer esse tipo de avaliação é direito de todo ser humano, não representa um sacrilégio, principalmente se temos uma experiência genuína com o único Deus através do Espírito Santo. Contudo, se você se sentir desconfortável com isso, se o que for refletido for além de sua porção de fé, não considere as palavras deste texto, fique firme nas convicções que te trouxeram até aqui em paz. Ao que muito sabe muito é cobrado, e para muitos é melhor saber menos. Eu não quero desviar ninguém do amor de Jesus por causa de especificações técnicas sobre teologia e doutrina, que na verdade não fazem diferença para que o ser humano tenha uma comunhão real com Deus e o mundo espiritual.

71. Bíblia, palavra de Deus?

      “Porque eu testifico a todo aquele que ouvir as palavras da profecia deste livro que, se alguém lhes acrescentar alguma coisa, Deus fará vir sobre ele as pragas que estão escritas neste livro; e, se alguém tirar quaisquer palavras do livro desta profecia, Deus tirará a sua parte do livro da vida, e da cidade santa, e das coisas que estão escritas neste livro.” Apocalipse 22.18-19

      A chamada de atenção do texto acima, apesar de ser usada como orientação para toda a Bíblia, está no livro de Apocalipse e se refere especificamente ao livro de Apocalipse, mesmo porque quando João a registrou não existia a Bíblia como a conhecemos hoje, muito menos o novo testamento. O livro de Apocalipse é um texto com profecias sobre o final dos tempos, um livro único, logo precisava de uma exortação forte e clara para que ninguém distorcesse de alguma forma as informações nele contidas. Mas usar a exortação como lei genérica é exemplo de como textos bíblicos podem ser usados por homens para defender seus interesses. Mas será que todas as palavras ditas inspiradas por Deus e contidas no cânone bíblico, seguem essa orientação, foram mantidas íntegras, de acordo com as fontes originais? Mesmo que tenham sido, será que as fontes entenderam certo a palavra de Deus no momento que a registraram? Até que ponto a Bíblia é palavra fidedigna do único e verdadeiro Deus? 
      Uma grande maioria de cristãos tem uma fé cega na Bíblia, a aceita como palavra fidedigna de Deus, cada versículo, cada capítulo, cada livro, para muitos tudo isso é uma verdade escrita diretamente pela mão de Deus. Sobre o novo testamento, por exemplo, muitos acreditam que após Jesus subir e o Espírito Santo descer em Pentecostes, apóstolos e discípulos registraram suas experiências diretamente com o Cristo em manuscritos, criando os evangelhos, depois outros escreveram as cartas para as igrejas que se formavam e para outras pessoas, desses textos foram feitas cópias fiéis, primeiro à mão e depois pela imprensa, para que desse material tivéssemos o cânone bíblico atual, ainda que com diferenças entre a versão católica e a protestante. É um raciocínio simplista que usando como álibi a providência divina, que conforme muitos guardou todo o processo, desconsidera o livre arbítrio e todas as interferências que podem transformar as informações que o homem recebe e passa em frente para outros homens.
      A coisa não foi tão simples assim, e desde já deixo uma declaração: apesar de não ter sido bem assim, Deus, em sua misericórdia, permitiu que fosse registrado o suficiente da verdade original para que a humanidade conhecesse a missão superior e singular de Jesus. O mais importante está na Bíblia, e os que de fato querem Deus, não religiões humanas, podem achá-lo, mesmo numa Bíblia que não reflete exatamente o que disse e fez Jesus. Quem analisa a vida sob um ponto de vista científico, quem estuda história, arqueologia, paleontologia, psicologia etc, entende que os homens são frutos do meio e do tempo, dessa forma, ainda que tenhamos recebido um ensino verdadeiro há trinta anos atrás, as relevâncias que deram a ele há trinta anos, há vinte anos, há dez anos e hoje, são distintas. Mudamos no tempo influenciados pelos acontecimentos do momento, por isso mudam as relevâncias que damos a um ensino, assim poderemos rever textos e atualizá-los conforme nosso presente. 
      Durante o primeiro século, por exemplo, muitas coisas ocorreram com o povo judeu convertido ao cristianismo, eventos políticos, religiosos, filosóficos, sociais, incluindo a dispersão do povo judeu em 70 d.C., que deu a muitos cristãos novas expectativas pelas promessas do evangelho. Assim, um texto bíblico que ainda estava sendo escrito à mão, sem muito de científico, pode ter sofrido influência em suas relevâncias, para satisfazer os anseios presentes do povo. Outro fato que influenciou o registro das palavras originais de Jesus e as cartas às igreja, foi a filosofia grega, rejuvenescida pela escola de Alexandria no primeiro século. Devemos também levar em conta que a Septuaginta, versão da Bíblia hebraica em grego koiné (língua franca do Mediterrâneo oriental pelo tempo de Alexandre, o Grande), traduzida entre os séculos III a.C. e I a.C. em Alexandria, que tornou-se a versão do antigo testamento para os primeiros cristãos, também contém discrepâncias em relação aos textos hebraicos originais.
      Na história da igreja católica, papas e concílios interferiram por séculos no cânone bíblico, onde a versão Vulgata de São Jerônimo (escrita entre os séculos IV d.C. e V d.C.) foi a Bíblia oficial por muito tempo, mudando partes conforme conveniências para manipular seus adeptos, na maioria um povo humilde e sem cultura. Mas mesmo a lucidez protestante, que priorizou metodologia mais científica para traduzir a Bíblia, buscando traduzir as fontes mais antigas possíveis, nas línguas originais, não dando a importância que a Igreja Católica dá à Vulgata só pela tradição, no máximo usará cópias, ainda que mais antigas, escritas por homens de seu tempo, não um texto escrito diretamente por Jesus. É importante citarmos os manuscritos do Mar Morto, encontrados entre as décadas de 1940 e 1950 nas cavernas de Qumran em Israel, que contêm as cópias mais antigas de alguns textos bíblicos: 
      “Porções de toda a Bíblia Hebraica foram encontradas, exceto do Livro de Ester e do Livro de Neemias... Os Manuscritos do Mar Morto são de longe a versão mais antiga do texto bíblico, datando de mil anos antes do que o texto original da Bíblia Hebraica, usado pelos judeus atualmente... Embora os rolos demonstrem que a Bíblia não sofreu mudanças fundamentais, eles também revelam, que é possível até certo ponto, que houvessem versões diferentes dos textos bíblicos hebraicos usadas pelos judeus no período do Segundo Templo, cada uma com as suas próprias variações. Com exceção principalmente do livro de Isaías, os fragmentos preservados nestes manuscritos possuem algumas variações, que os diferenciam do texto massorético na grafia e na fraseologia” (Fonte Wikipedia). 

72. Verdades sobre a Bíblia

      “Por isso não desfalecemos; mas, ainda que o nosso homem exterior se corrompa, o interior, contudo, se renova de dia em dia.” II Coríntios 4.16

      A solução para se ter uma Bíblia mais autêntica, não está no uso de fontes mais antigas, ainda que tivéssemos em mãos o primeiro texto do evangelho escrito por Mateus (considerado por muitos o evangelho mais antigo), ou uma versão do evangelho de João (considerado o último evangelho escrito) de acordo com as relevâncias dadas por Jesus, e não pela subjetividade alterada pelo tempo do apóstolo do amor, ainda assim o homem poderia, tempos depois, lendo os textos, subverter a palavra original do Cristo, interpretando diferentemente. Isso pode não ter alterado um texto de forma mais extrema, mas subtraído algumas partes ou mesmo escolhido palavras, para traduzir o original, não erradas, mas que levassem a um entendimento um pouco diferente do original, e de acordo com a doutrina vigente da igreja que o estivesse traduzindo. O importante é entendermos que a tal providência divina não pôde interferir no livre arbítrio dos homens, e mesmos papas, teólogos e outros líderes, responsáveis pela construção do cânone bíblico, também são homens, limitados, com defeitos, vaidades e conveniências, e com direito ao uso do livre arbítrio. Deus permite a confusão para que trabalhando o homem exerça seu livre arbítrio, assim, cabe a cada um de nós por mãos à obra e achar o conhecimento de Deus na fonte, Deus. 
      Se alguém, que até agora acreditou que a Bíblia foi escrita por homens, mas sob inspiração divina e que por isso não contém erros, se essa pessoa ler este texto, entendê-lo, aceitar o que foi dito, então, ficar angustiada, sentir-se desestabilizada em sua fé, essa é a reação mais honesta que penso que possa haver, talvez seja a mais sincera. Infelizmente, não é isso que acontece com muitos, esses simplesmente vão chamar essas críticas a uma interpretação da Bíblia ao pé da letra e de forma atemporal, menosprezando contextos e livre arbítrio dos escritores, de heresias. Chamarão esse que vos escreve de herege, de desviado, mesmo de instrumento do diabo. É mais fácil demonizar o opositor, jogando-o num extremo, que aceitar o próprio extremismo, ou ainda melhor, que achar um meio termo equilibrado. Outros, contudo, até crerão nas críticas levantadas, gente mais acostumada a pensar, mas não darão a elas a devida importância, esses são os que mais me intrigam. Eles conseguem seguir vivendo como religiosos, fazendo em suas vidas uma separação entre aquilo que ouvem na igreja e o que ouvem nas universidades e nas empresas, dizendo que os dois lados falam a verdade. Entretanto, verdade dividida não é verdade, não existem duas verdades, mas uma mentira e uma só verdade.
      Aqui no “Como o ar que respiro” costumo não entrar em muitos detalhes sobre questões consideradas polêmicas, informo alguns links, enfim, está tudo na internet para quem quiser se aprofundar. Se muitas pessoas estudassem mais entenderiam o nível de consciência moral e intelectual que a humanidade se encontra hoje, e que se não foi atingido por muitos é só por preguiça ou covardia. Nesse nível estamos capacitados para buscar a verdade, além do autoritarismo religioso de homens, sem medo do papa, do vaticano, de qualquer presidência nacional de denominação religiosa protestante ou de doutor em teologia. Contudo, as pessoas temem sair de zonas de conforto, e a religião talvez seja a zona mais confortável que existe no mundo. Muitos pensam, “por que teria eu que duvidar de uma igreja de dois mil anos, poderosa, presente em todo o mundo?”, e mesmo os protestantes, que são só católicos desviados, ainda que achem em suas denominações abrigo contra o inferno, sentimento de pertencimento e algum refrigério para culpas, não entendem e não acreditam em muitas coisas, mas fazem de conta que está tudo certo. Quando compreenderemos, principalmente em se tratando de vida espiritual, que nosso compromisso é conosco e com Deus, não com homens? Não há igrejas no céu, mas existem muitas no inferno. 
      O ser humano só começa a viver de lembranças quando envelhece, quando não tem mais juventude para ter novas e melhores experiências, assim passa a achar satisfação nas memórias. O jovem por sua vez, quando tem uma experiência feliz, nem se lembra da experiência anterior, mesmo que tenha sido boa, a última lembrança é a mais forte e ele segue vivendo para isso, para ter boas, novas e melhores experiências. A humanidade começou a usar o recurso do álbum de velhas fotografias quando envelheceu, e na religiosidade cristã quando parou de ter novas experiências com Deus, assim os ícones do cristianismo, a cruz, a figura de Cristo, os dias santos, as imagens e as esculturas, supriram a falta de uma nova e viva experiência espiritual. Mas a humanidade não teve esse envelhecimento de maneira sadia, ela envelheceu ainda jovem, quando ainda tinha muito a vivenciar da espiritualidade cristã. Deixou que o Espírito Santo se afastasse e tentou dar continuidade à sua experiência adorando ídolos, e a Bíblia também pode ser uma espécie de ídolo. Contudo, a verdadeira espiritualidade não envelhece nunca, porque não baseia-se no corpo, no mundo, nos homens, mas no espírito, e esse caminhando para o Altíssimo, em constantes e melhores novidades de vida. 

73. Para quem é a Bíblia?

      “Santifica-os na tua verdade; a tua palavra é a verdade.” João 17.17

      Deus não permitiu que o cânone bíblico fosse construído e mantido para que só teólogos o entendessem com muito estudo, e para que ignorantes o aceitassem sem pensar muito. Não, a Bíblia existe para que qualquer um seja atendido, desde que tenha ajuda do Espírito Santo e algum interesse sobre contextos históricos e culturais deste mundo. Quem Deus abençoa e ensina com sua palavra? A todos. Mas todos são teólogos? Não. Mas os outros também não devem ser crentes ingênuos que aceitam tudo sem pensar. 
      Hoje os tempos mudaram, e não é só a interpretação da Bíblia que pode ser melhor, o entendimento de informação e de onde ela está registrada mudou. Nos tempos bíblicos as pessoas não tinham, todas elas, cópias do velho testamento, da Torá, em casa, ou podiam levar os textos sagrados por todos os lugares. Sacerdotes tinham cópias e eles as liam para o povo, o que eles entendiam como palavra de Deus era algo objetivo, não sujeito à qualquer subjetividade, era sim e não, sem direito a interpretações pessoais. 
      No tempo de Jesus já existiam cópias em pergaminhos nas sinagogas, mas foi só com Gutenberg, a partir do século XV, que cópias da Bíblia foram disponibilizadas com mais facilidade, ainda que nem todos soubessem ler. Na igreja católica sacerdotes liam a Bíblia nas missas, celebradas em latim, não se tinha esse hábito em casa. O relativismo, que nos acostumamos hoje, que diz que todos podem ter opiniões, que mesmo um texto pode ter interpretações diferentes, conforme a pessoa que o lê, é uma aquisição recente.
      Um estudo histórico científico abriu a cabeça dos homens para a verdade, já que no passado a verdade histórica era a propagada pelo poder vigente, por monumentos e outros registros que esse fazia e mantinha, era costume destruir o que o poder anterior tinha construído. Vemos isso no Egito antigo, mas também nos tempos atuais, quando militares deram o golpe nos anos 1960 no Brasil, informaram a sociedade, por livros e pela mídia, que eles e tudo que no passado os representava, era o certo, a verdade, e o resto, não.
      Vivemos um momento especial do que chamo de “bibliolatria”, entramos numa livraria evangélica e podemos comprar uma Bíblia entre muitas versões, comentadas por “entendidos” de todas as espécies, para crianças, jovens, mulheres, homens (até para homoafetivos, como alguns chamam a versão N.V.I., sem fazer aqui qualquer juízo de valor). Quem quer saber a vontade de Deus pensa que basta abrir uma Bíblia e ler. Mas isso é um avanço ou um retrocesso? Isso não está só ajudando a calar mais o vivo Espírito Santo? 
      Vejo protestantes saindo para o pentecostalismo e pentecostais procurando teologia protestante, todos insatisfeitos com o que possuem, mas poucos de fato buscando a Deus com perseverança e santidade. Pentecostais provaram dons do Espírito, mas só superficialmente, teólogos protestantes aprofundaram-se num estudo que acham ser científico das escrituras, mas amarrados a dogmas, muitos ainda do catolicismo, verificaram a superfície com microscópios, mas não se deram ao trabalho de cavar bem fundo com pás. 
      Todos continuam sabendo só mais do mesmo, por quê? Porque não usam as ferramentas melhores, a ciência para conhecerem os contextos deste mundo, e o Espírito Santo para receberem as verdades do outro mundo. A falsa ciência e a falsa espiritualidade são pés diferentes de uma mesma pessoa, a covarde, que busca aprovação de homens, sejam cientistas ou teólogos, não de Deus. Tudo está na Bíblia, nunca negamos isso, mas é preciso lê-la certo, o humilde e inteligente entenderá isso e achará a verdade mais alta.
      Já o covarde, que quer agradar a todos, não chega a lugar algum. Mas não é isso que o cristianismo falso deste mundo, seja pelo catolicismo, pelo protestantismo ou pelo pentecostalismo, faz? Amarra o ser humano a um estado eterno de infantilidade espiritual? Eu amo a Bíblia, mas Deus tem me ensinado a vê-la do jeito certo, testemunhos de homens antigos sobre Deus e sobre Cristo. Deus não desceu do céu e a escreveu, assim não temos que interpretá-la como leis extremas de Deus que não podem ser avaliadas.
      Se alguém discorda das afirmações feitas aqui, pensa que se as seguisse se desviaria de Deus, com todo o respeito, devo dizer que talvez você confie mais em religião de homens, que em Deus. Não, você não precisa e nem deve aceitar o que compartilho, mas pode considerar orar a respeito, não de qualquer jeito e nem com a mente fechada, mas com fé, pedindo a Deus que te mostre a verdade, seja ela qual for. Se mesmo depois de orar não mudar de ideia, então, permaneça em paz na fé que te trouxe em vitória até aqui.

74. Que poder teremos no céu?

     “Mas o que tendes, retende-o até que eu venha. E ao que vencer, e guardar até ao fim as minhas obras, eu lhe darei poder sobre as nações, e com vara de ferro as regerá; e serão quebradas como vasos de oleiro; como também recebi de meu Pai. E dar-lhe-ei a estrela da manhã. Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas.” Apocalipse 2.25-29

      Que poder terão os homens na eternidade, como privilégio por terem guardado a vontade do Senhor até o fim? Seria poder como aquele que os israelitas podiam exercer sobre os que venciam em batalhas, aqueles que em relação a eles estavam numa posição inferior, por isso, como superiores, tinham direito de escravizar e tomar despojos? Seria um poder físico, beligerante, opressor? Ou seria a autoridade que Jesus tinha quando encarnado, sobre os seres humanos de maneira geral, inferiores a ele espiritualmente, mas que para os quais o Cristo ensinava com amor, respeitava os limites com misericórdia, mostrava o melhor caminho para Deus com humildade, não era de forma alguma opressor, ainda que com firmeza e luz? 
      O próprio João, quando registrou o livro de Apocalipse, interpretou as revelações que recebia pelo Espírito Santo sob sua inteligência moral e intelectual, conforme um homem do seu tempo, por isso ele usou palavras para ensinar o povo de seu tempo, e as palavras foram duras, “com vara de ferro as regerá, e serão quebradas como vasos de oleiro”. Eis outro texto bíblico que nós, cristãos do século XXI, precisamos entender sob a ótica do Espírito Santo, que sempre revela a vontade de Deus de maneira gradativa, condizente com a inteligência moral e espiritual do momento histórico que o homem vive, contudo, essa interpretação mais espiritual não é nova (e nem minha), é a de Jesus.
      Interessante que mesmo o apóstolo do amor, que tanta intimidade teve com o Cristo encarnado, também estava limitado à visão religiosa da velha aliança judaica, mas e quanto a você, será que pensa que na eternidade a mais alta espiritualidade será demonstrada como diz o texto, se interpretado ao pé da letra? Se crê assim, eu respeito, aliás é uma posição comum na teologia cristã tradicional, eu porém creio diferente. Existirão diferenças no mundo espiritual, e os superiores terão um trabalho a fazer, não o de um duro domínio sobre os inferiores, mas como mestres conduzindo em amor esses ao Deus altíssimo, eu pelo menos aprendo isso com as palavras e as atitudes de Jesus, lendo os evangelhos. 
      Sim, existirá uma regência firme, porque não haverá mais “jeitinhos” de se afastar de Deus, e também os espíritos serão quebrados como vasos do oleiro, mas não para serem destruídos, mas quebrantados, para que através da humildade achem o caminho para Deus. Estou me arriscando a compartilhar crenças pessoais que vão além de muito que ensina o cristianismo tradicional, mas não se escandalize, apenas pense um pouco, ao invés de só ler o texto bíblico e aceitar a interpretação do senso comum cristão. O céu será um lugar só de louvor e comtemplação para os salvos? O texto inicial, mesmo interpretado ao pé da letra, diz que não, administrar poder sobre as nações, seja lá o que isso signifique, é um trabalho.  
      Muitos, apesar de conhecerem a Deus e de buscarem o conhecimento de sua vontade para suas vidas, ainda vivem neste mundo aquém da melhor espiritualidade de Deus para eles, são os teimosos que permitem que o Espírito Santo entre em seus corações, mas só até um ponto. Esses seriam os que não guardam até o fim as obras de Deus? Que por isso terão algo a aprender, mesmo na eternidade? Se for isso, quem os ensinará? Serão os que foram fiéis a Deus até o fim, ninguém se engane com relação a isso, e muitos se espantarão quando verem doutores, mestres e mesmo líderes, que no mundo tinham posições importantes, serem na eternidade alunos dos que no mundo eram seres considerados marginais e inúteis. 

75. Está funcionando pra você?

      “Quem és tu, que julgas o servo alheio? Para seu próprio senhor ele está em pé ou cai. Mas estará firme, porque poderoso é Deus para o firmar. Um faz diferença entre dia e dia, mas outro julga iguais todos os dias. Cada um esteja inteiramente seguro em sua própria mente.” Romanos 14.4-5

      O contexto original do texto bíblico inicial, é o escritor da carta aos romanos, falando sobre aqueles que se convertiam ao cristianismo no primeiro século, e que mantinham costumes da religião anterior. É a isso que ele se refere ao dizer “um faz diferença entre dia e dia, mas outro julga iguais todos os dias”. O escritor, possivelmente Paulo, não faz diferença entre o que age assim e o que não age, mas aconselha que não se julgue ninguém, nem para mais, nem para menos. A frase final é a que mais nos ensina, “cada um esteja inteiramente seguro em sua própria mente” com a vida que escolhe ter.
      Quem sabe se um casamento funciona ou não? Não é quem está do lado de fora, mas só quem está dentro. Com religião é semelhante, algumas religiões funcionam para alguns e não para outros, o que não podemos é julgar estando do lado de fora, sem conhecer de fato quem são as pessoas dentro das igrejas. Muitos fazem um esforço tremendo para terem vidas melhores, para acertarem suas trajetórias, e usam o que têm à mão, não necessariamente o que nós achamos ser melhor. A reflexão que segue não é um julgamento, mas uma pergunta, pode não ser o teu caso, mas pensemos no assunto. 
      Faço uma pergunta a muitos evangélicos: sinceramente, religião está funcionando para vocês? Algo que me leva a fazer esse questionamento e ver no que se transformam famílias e filhos de muitos evangélicos com o tempo. Sei que muitos começam a frequentar igrejas com boa sinceridade, querem achar algo, querem respostas, querem Deus e sua atenção. Sentem-se bem cantando músicas evangélicas, orando com pares, ouvindo os pregadores, se emocionando com palavras enfáticas sobre fé e milagres. As pessoas querem espiritualidade mais que achamos, o problema é como e onde.
      O ser humano pode receber dois tipos de formações, a moral e a cultural. Nas igrejas as duas coisas são influenciadas pela religião, assim se aprende que adulterar, roubar e matar é errado, mas também, principalmente nas igrejas evangélicas, que certo estilo de arte, de linguagem, de vestuário é mais adequado a cristãos. Mas os costumes também estão aliados à moralidade já que se acredita que vestir certas roubas, falar certos termos ou ouvir certas músicas ou mesmo ir a cinema e ver TV pode ser pecado. Pelo livre arbítrio, cada um tem direito de falar, ouvir ou vestir o que quiser.
      Contudo, o que aos nossos olhos começa de um jeito, depois pode acabar de um jeito muito diferente. Talvez porque as gerações passadas fossem mais submissas a tradições, mesmo mais temerosas de desobedecerem o que aprendiam de seus pais, cristãos, católicos e protestantes, criados em igrejas, seguiam assim até o fim de suas vidas. Contudo, hoje, vemos tantos que foram crianças e pré-adolescentes em igrejas se transformarem em seres humanos bem diferentes quando entram na juventude. A princípio não há nada de errado nisso, novamente, cada um tem livre arbítrio e deve exercê-lo. 
      A questão são as prioridades, o que de fato queremos que nossos filhos aprendam, costumes ou moral? Muitos querem que aprendam costumes pois acham que esses refletem a moral, assim, a primeira coisa é entendermos que o que aparenta nosso lado físico exterior não necessariamente se refere ao nosso lado moral interior. Muitos não só acham que o lado externo deva refletir o interno, mas que ele tem mais relevância que o interno, afinal, as pessoas veem, pelo menos a princípio, o lado externo, não o interno. Saber desconectar esses lados, eis o primeiro passo para se ter uma religião que funcione. 
      Nesse aspecto precisamos entender que as coisas mudaram muito, principalmente nas últimas décadas no mundo. Desde os anos 1960 temos experimentado uma revolução na maneira como as pessoas se expressam, em muitas áreas, obedecer ao conservadorismo dos antigos cedeu lugar a individualidades que podem fazer o que quererem, onde, quando e do jeito que querem. O lado exterior foi libertado do interior, na verdade não há mais patrões coletivos, o ser humano se tornou mais complexo, e sua trajetória no tempo leva a mudanças vivenciadas entre as tantas opções oferecidas. 
      Se visitássemos lojas de roupas dos anos 1950 veríamos como as opções oferecidas eram bem menores que as de hoje em dia, isso reflete o interior das pessoas. Sim, hoje ainda existem padrões, bolhas, tribos, mas antigamente eram em número bem menor. Isso se adequa à liberdade emocional que as pessoas têm hoje, crianças e adolescentes são expostos a isso o tempo todo, nas escolas, nas ruas, e principalmente, na internet e pelos celulares. Tentar padronizar o ser humano é impossível, a não ser que seja escolha dele ou que ele tenha sérios problemas emocionais que o aprisionem a tradições. 
      Por que crianças criadas em igrejas fogem da igreja assim que podem? Porque não se sentem bem dentro delas, e não se sentem bem porque não conseguem harmonizar o que são com o que as igrejas são. O que jovens que saem de igrejas são? São aquilo que deram e eles, mais aquilo que escolhem ser. O que damos às crianças, leis morais superficiais e fora de contexto? Padrões estéticos exteriores, o que vestir, ouvir e beber? Obrigações para que vivam para receberem aprovação de religião e membros de igrejas? Isso tudo é falso, quando elas crescerem avaliarão isso e entenderão que há hipocrisia.
      Se buscamos na religião e consequentemente ensinamos a crianças e adolescentes as coisas certas, essas coisas terão mais chances de serem retidas pelos espíritos de todos. O que é bom e correto gera boas e permanentes sementes, que um dia darão bons frutos, ninguém duvide disso. Assim, a primeira coisa é os adultos viverem uma relação adequada com Deus, mesmo em religiões imperfeitas, para então viverem e darem exemplo dentro de casa. Se isso não ocorrer a semente gerada será de falsidade e hipocrisia, essa não dará nenhum fruto bom e poderá ter um resultado até pior. 
      Muitos jovens, criados em igrejas, têm mais aversão ao cristianismo que outros, que não foram criados por pais evangélicos ou católicos, contudo, a aversão deles não é a Jesus, ainda que eles não saibam disso a princípio, é só ao falso cristianismo que tentaram lhes impor. Por outro lado há o livre arbítrio, assim, mesmo que os pais tenham vivido um evangelho coerente e tenham conseguido testemunhar isso na prática dentro de seus lares, os jovens podem fazer outras escolhas. Nesse ponto eis a sabedoria de pais que temem a Deus, respeitarem as escolhas de seus filhos e ficarem perto deles.

76. Será que funciona pra seus filhos?

      “Bem-aventurada é a nação cujo Deus é o Senhor, e o povo ao qual escolheu para sua herança. O Senhor olha desde os céus e está vendo a todos os filhos dos homens. Do lugar da sua habitação contempla todos os moradores da terra.” Salmos 33.12-14

      Muitos cristãos, pais de famílias, amam dizer o texto bíblico inicial, bem-aventurado o povo ao qual o Senhor escolheu para sua herança. Meu caros, eu quero dizer isso sobre minha mulher e minhas filhas, que são felizes porque recebem a herança de Deus. Mas qual é a herança do Senhor, seria dinheiro e bens? Não, isso vem na medida, mas não é o mais importante. A herança é elevação moral e clareza intelectual, de pessoas que fazem diferença no mundo por terem virtudes. Para isso Deus sempre funciona, ainda que as religiões não, busquemos o Senhor sempre, e construiremos famílias virtuosas e duradouras.
      A outra coisa que Salmos 33.12-14 diz é que Deus vê tudo, inclusive o que somos na privacidade de nossos lares. Há coerência entre o que somos lá e o que mostramos na igreja? Não estou dizendo que o que queremos mostrar na igreja seja o melhor, pode ser só um falso moralismo desnecessário. A segunda coisa que Deus mais ama em nós é sermos verdadeiros, mas a primeira coisa é vivermos uma verdade que o agrada. Talvez nossa religião não funcione porque estamos tentando viver uma verdade que não é nossa, e que nem Deus exige de nós, só as nossas culpas mal resolvidas é que exigem. 
      Sei que o que pretendo é difícil, visto que seres humanos só aprendem no tempo, errando e depois acertando, se é assim comigo, por que não seria com os outros? Mas a intenção desta reflexão é poupar tempo. Poupamos tempo quando exercemos a prática de pensar, avaliando se nossas escolhas atuais realmente estão funcionando, em se tratando de religião, se o que estamos ouvindo dentro de igreja reflete, pela menos numa parte considerável, nossa prática de vida e de nossas famílias. Não tenho dúvida que a genuína palavra de Deus sempre nos abençoa, mesmo em igrejas imperfeitas. 
      Se com todos devo ser misericordioso mais ainda com os que estão dentro de igrejas, Deus os ama profundamente e os atrai à sua luz mais alta em Cristo, contudo, pensemos melhor no que estamos fazendo com nossas vidas e de nossas famílias. Você pode ser alguém coerente, que tem alegria de ter filhos, que você criou em igreja, também frequentando cultos e de maneira sadia, mas entenda, isso não acontece com muitos. Muitos teimaram em ficar em igrejas estranhas, achando que cultos criariam seus filhos, não a vida real do dia a dia dentro de seus lares, assim se afastaram e os perderam. 
      Enfrentamos tempos difíceis, o mundo está super populoso, falta emprego e líderes políticos são em grande parte corruptos, além disso a liberdade irresponsável têm multiplicado pseudo-famílias, que pesa sobre alguns o trabalho de sustentar filhos. Faltam pais, faltam mães, falta maturidade, que com a ajuda da mídia que prega ideologias libertárias, produz indivíduos que querem só desfrutar e nunca servir. Muitas crianças e adolescentes são criados só pela avó, incentiva-se tudo para que cada um tenha seu prazer, menos evitar filhos quando ainda não se está preparado para criá-los melhor.
      As igrejas, principalmente as pentecostais, que recebem pessoas de níveis financeiros mais baixos, refletem a maior parte do mundo real. Enquanto católicos e protestantes tradicionais permanecem fechados em seus guetos, fora da realidade, distante de tudo que poderiam fazer como conhecedores do evangelho e com nível financeiro mais alto, lideres oportunistas e mal intencionados se aproveitam da culpa não resolvida para enriquecerem. Que importa a esses que crianças e jovens sejam atendidos de forma adequada, para serem e seguirem sendo bons cristãos no complexo mundo moderno? 
      Não, meus queridos, a religião cristã não funciona para muitos, não como é possível funcionar de acordo com o evangelho original de Jesus. Infelizmente muitos só vão aceitar isso tarde demais, quando verem filhos perdendo tempo em prioridades erradas, sem base moral e cultural para serem luzes no mundo, não só religiosamente, mas intelectualmente. Coerência se obtém com pés na terra e coração no céu, vivendo e andando no Espírito. Equilíbrio se conquista priorizando valores interiores e praticando-os, não sendo sepulcros caiados como os fariseus que queriam só aparentar. 
      Atualmente interação com cultura, arte e tecnologia, é imprescindível para ser cidadão do planeta, criar filhos longe disso é aliena-los, tornando-os despreparados para serem seres humanos produtivos e prósperos. Vejo pais em igrejas ensinando filhos a serem fiéis com agendas religiosas, se orgulham se veem seus filhos em “congressos” de jovens, liderando o louvor, orando em público, mas não se preocupam adequadamente com o bom desempenho escolar dos mesmos. O maior equívoco ocorre com casamento, querem que jovens se casem o quanto antes, com receio deles “pecarem”. 
      Existe um momento, e isso é mesmo antes de filhos terem vidas econômicas independentes e morarem em outras casas, que pai e mãe cristãos devem convidar filho para ir à igreja, não obrigar, respeitando caso a resposta seja, “não quero ir”. Acredite, se você criou seu filho sem hipocrisia, coerente com o que você é, ainda que ele não concorde cem por cento com tudo que é feito na igreja, ele irá à igreja. Nesse caso, como você, ele saberá tomar o que é bom, deixar para lá o que não é, enquanto faz suas escolhas no mundo, nos estudos, na profissão e na área afetiva, temendo a Deus, não à religião. 
      A verdade é que religião institucionalizada só funciona para líderes mal intencionados e como retorno material. A pastores e ovelhas sinceros do bem, que querem realmente a Deus, pode até funcionar no início, mas chegará um momento que Deus pedirá mais e a religião não terá para dar. Tenhamos essa consciência, aconselhemos os que não tem, e a esses sempre com cuidado, só Deus sabe o tempo de cada um, o que cada um está preparado para saber e ser, é preciso ser fiel no pouco antes de almejar mais. Mas tenhamos coragem para admitir quando a coisa não está mais funcionando.
      Sei que é difícil aos pais, para mim é difícil, mas nossos filhos são de fato o que se revelarem na juventude e na maturidade, infância e pré-adolescência são ilusões. Temos oportunidades únicas de ensinar nossos filhos aquilo que achamos importante, e isso ficará dentro deles para sempre. A escolha final, contudo, deve ser deles, não devemos tirar deles esse direito, ainda que os amando, orando por eles e aconselhando-os com respeito. Eu, contudo, creio que uma boa criação transforma alguém, talvez não em curto prazo, mas sempre dará aos filhos portos seguros para onde retornarem. 

77. Resolvamos pendências aqui

      “Concilia-te depressa com o teu adversário, enquanto estás no caminho com ele, para que não aconteça que o adversário te entregue ao juiz, e o juiz te entregue ao oficial, e te encerrem na prisão. Em verdade te digo que de maneira nenhuma sairás dali enquanto não pagares o último ceitil.” Mateus 5.25-26

      A passagem inicial faz parte do que considero o texto mais importante da Bíblia, os capítulos 5 ao 7 do evangelho de Mateus, nele estão registrados os ensinos de Jesus no chamado “Sermão da Montanha”. Os versículos acima falam de resolvermos pendências, de pedirmos perdão e acertarmos assuntos pessoais não resolvidos. Mas será que ele também pode revelar coisas sobre a eternidade, a duração de penas e até mesmo sobre a “inferno”? 
      Ninguém é perfeito e alguns de nós, como eu, são muito imperfeitos, assim pisam muito na bola, principalmente na falta de amor para com as pessoas. “A ninguém devais coisa alguma, a não ser o amor” (Romanos 13.8a), quem tem dívida deve procurar pagá-la o quanto antes, o melhor pagamento é fazer certo o que se fez errado, contudo, na impossibilidade disso, um pedido sincero de perdão, que não exige nada em troca, pode ser necessário. 
      Não tenhamos medo ou orgulho de pedirmos perdão, entretanto, alguns perdões de homens podem ser difíceis, assim, oremos antes e peçamos orientação de Deus, se sentirmos paz, peçamos perdão, senão, descansemos no perdão de Deus e oremos por quem pode não querer nos perdoar. Com alguns erros teremos que conviver por toda a vida, não devem impedir-nos de termos paz em Deus, mas devem ser lembrados com humildade.
      As coisas têm consequências nesta vida, às vezes bem duras, mas o sábio não se esquecerá de pendências, orará ao Senhor para que o coração de quem ele machucou seja quebrantado e possa, um dia, perdoá-lo. Mas existem outras pendências na vida, que não um erro que cometemos contra alguém. Percebo isso à medida que envelheço, desejo de reencontrar alguns que conheci em minha trajetória e tentar ser a bênção que não fui no passado. 
      À medida que o tempo passa teremos menos amigos próximos, pelo menos não novos, assim pode ser importante recuperarmos velhas amizades, das quais o mundo e o tempo nos separaram. Eu acredito que toda aproximação que fazemos neste mundo tem um propósito especial, não convivemos com pessoas na família, nas escolas e universidades, nas empresas, mesmo nas vizinhanças de nossas casas, por acaso, Deus tem um bom propósito nisso. 
      Pessoalmente tive a chance de viver em muitas cidades, ser membro de muitas igrejas, mesmo numa cidade morar em muitos bairros, característica herdada de meu pai, tendência à vida cigana, que minha esposa tem compartilhado nos últimos vinte e cinco anos de vida. Isso é bom, não temos medo de encerrar coisas, não nos prendemos a tradições, temos oportunidade de conhecer pessoas, mas isso é ruim, nos sentimos sempre começando algo. 
      Talvez por isso eu tenha facilidade para avaliar as coisas e não me acomodar, mudando da água para o vinho sem perder muito tempo. Mas isso me faz hoje pensar em tantas pessoas que me conheceram numa versão inacabada de mim, me arrependo de não ter amado e ajudado alguns com mais qualidade. Por isso tenho pedido a Deus, que se for possível, me permita rever alguns neste mundo antes de partir, quem sabe ainda possa ser útil a eles. 
      Contudo, é na segunda parte da passagem bíblica inicial que pode estar escondido um mistério. “Em verdade te digo que de maneira nenhuma sairás dali enquanto não pagares o último ceitil”, a frase começa com uma declaração usada para enunciar mistérios, em verdade, como aquela que diz quem tem ouvidos, ouça, presente bastante em Apocalipse. O texto ensina sobre pagamento não eterno de dívidas, mas até que seja quitado o último “centavo”.
      Esse ensino não está presente só nessa passagem, mas ele é sempre ofuscado pelo senso comum cristão que diz que pela fé em Cristo todos os pecados são perdoados, sem que haja necessidade de qualquer pagamento feito pelo pecador. Mas a coisa não funciona bem assim, o perdão em Jesus nos deixa em paz com Deus, isso nos fortalece para trabalharmos e pagarmos nossas dívidas, e todas elas terão que ser pagas, de um jeito ou de outro.
      O jeito mais rápido está na humildade que clama a Deus e pede perdão aos homens, mudando depois de atitude para não repetir o erro e servir aos outros em amor. O jeito mais difícil é sofrendo na mão de quem faz conosco o que fizemos com os outros. Seja como for, zeremos nossas pendências o quanto antes. Você já deve ter visto pessoas que passam a vida seguindo em frente e empreendendo, trabalhando bastante e honestamente, sonhando alto.
      Elas podem até parecer, aos nossos olhos, fortes e resistentes, contudo, são insensíveis, passam por cima dos outros e não olham para trás. Essas são as que mais colhem surpresas ruins e constantes, parece que tudo acontece com elas, estão sempre envolvidas em acidentes de carro, sendo assaltadas, com vidas afetivas instáveis, vítimas nos empreendimentos financeiros de crises nacionais e mundiais, ganham bastante, mas também perdem muito.
      Pessoas assim podem possuir pendências não resolvidas, assim, o mundo espiritual das trevas recebe legitimidade para atormentar suas vidas, elas sofrem ações do ladrão, que vem matar, roubar e destruir (João 10.10a). Com dívidas não pagas não podemos só fazer de conta que não existem, devemos buscar forças em Deus e quitá-las, assim teremos direito à segunda parte de João 10.10, “eu vim para que tenham vida, e a tenham com abundância”. 
      Ser atormentado por espíritos malignos no mundo também é um jeito do universo cobrar dívidas, mas é um jeito ruim de se pagar, pior que isso é só poder pagar no plano espiritual. O que preferimos, o jeito de amor do Senhor, pagar neste mundo ao mal ou ser torturado na eternidade? “Concilia-te depressa com o teu adversário, enquanto estás no caminho com ele, para que não aconteça que o adversário te entregue ao juiz e te encerre na prisão”. 

78. Onde tesouros não são consumidos

      “Não ajunteis tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões minam e roubam; mas ajuntai tesouros no céu, onde nem a traça nem a ferrugem consomem, e onde os ladrões não minam nem roubam. Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração.” Mateus 6.19-21

      Tanto tempo, tanta energia, tanta saúde, tanta preocupação, são gastos tentando ajuntar tesouros neste mundo. Sei que precisamos trabalhar e muito para darmos vidas materiais dignas às nossas famílias neste mundo, mas até que ponto? Acabamos ficando obcecados pelo mundo, não sabemos o momento de parar de nos gastar nele, buscarmos mais a Deus e crermos nele. Assim, muitos veem o que conquistaram por anos perdido por filhos que não souberam administrar o que receberam, e não souberam fazer isso porque lhes faltou a proximidade de pais, que ao invés de estarem obcecados por trabalho, deviam estar confiando em Deus e mais próximos a filhos. Acabamos achando que proteger nossos filhos de sofrerem como nós sofremos, é entregar-lhes bens materiais, esquecemos que o que eles mais precisam é de nós. 
      A visão que passei acima não representa grande parte das famílias atualmente, principalmente as de classes financeiramente mais baixas, talvez represente famílias do meu tempo e da geração seguinte, dos que hoje têm entre quarenta e sessenta anos e de classe média e acima. Hoje, a última geração, com menor poder aquisitivo e que representa a maior parte das pessoas, pelo menos, no Brasil, não consegue acumular algo para os filhos. Mantém famílias com ajuda dos pais também em condições difíceis, torcendo que filhos atinjam a idade mínima para trabalharem e ajudarem a sustentar lares desestruturados. Temos que tomar cuidado quando fazemos análises sociais hoje em dia, como representante da classe média, gente como eu não representa a maioria, minhas referências pouco dizem a uma grande parte de brasileiros. 
      Isso tem que me preocupar, porque a palavra do “Como o ar que respiro” precisa falar a quantos forem possíveis, não só a elites. Deus ama a todos e deseja que uma orientação de esclarecimento espiritual chegue a todos. Mas ainda que os de classes mais baixas não tenham condições de construir patrimônios para seus filhos, também perdem tempo, energia, saúde e preocupação com coisas erradas, e para esses ainda mais difíceis de serem conquistadas. Por isso cresce a marginalidade, instrumentalizada pelo crime e pelo tráfico de drogas, a qual muitos se aliam para obter aquilo que sabem que dificilmente conseguiriam com trabalho duro e honesto. De um jeito ou de outro, o ser humano teima em ajuntar tesouros na terra, onde traça e ferrugem consomem, e onde ladrões minam e roubam. 
      Como ajuntamos tesouros no céu? Estando próximos às pessoas em amor. O ser humano, de maneira geral, é social, gostamos de nos reunir com amigos, isso sempre é prazeroso. Mas o que compartilhamos nesses encontros, são palavras de graça e vida eterna, ou vãos prazeres, malícia e morte? Por mais gostoso que seja começar um churrasco em família, regado com muita cerveja, o final pode ser patético, o álcool revela prioridades e verdades das pessoas, não raramente reuniões de família acabam em brigas. Para haver graça e vida, deve haver Deus, e pode bastar uma luz para que todo o ambiente se ilumine. Ser luz de Deus não é ser moralista, evangelista inconveniente, religioso chato, falador dono da verdade, não, tem a ver com esperar com sabedoria, mais ouvir que falar, pronto para ser útil no momento adequado. 
      Os tesouros mais preciosos que existem não são ouro, prata e pedras preciosas, ou em valores atuais, um carro caro, roupas luxuosas, um cartão de crédito ilimitado ou o celular topo de linha, isso tudo se consome no tempo. Tesouros são virtudes morais nos espíritos dos seres humanos, generosidade, misericórdia, amor, santidade, paz, praticarmos isso e ajudarmos os outros a praticarem é ajuntar tesouros que não se consomem, porque podem ser levados deste mundo para a eternidade. Onde está nosso coração, nos tesouros do mundo ou nos eternos? Se está nos tesouros eternos, ainda que trabalhemos por vidas dignas no mundo, não damos tanto valor e não perdemos tempo demais com coisas materiais, não sofremos tanto com perder e não nos alegramos demais ao ganhar, sabemos que estamos aqui de passagem. 
      Nos preocupemos em amar e em sermos úteis às pessoas, aguardando sempre oportunidades para podermos ajudar, e como as pessoas precisam de ajuda, principalmente quando veem que os tesouros que ajuntaram neste mundo não resolvem seus problemas mais sérios. Os tesouros deste mundo não trazem de volta entes queridos que partiram, não compram cura para muitas enfermidades, não preenchem a solidão, não anulam culpas por coisas erradas que foram feitas e que não podem ser desfeitas. Mas muitos desistem da vida simplesmente porque perdem os tesouros que ajuntaram neste mundo, e nem é preciso que sejam milionários falidos, basta que sejam pessoas de classe média que se acostumaram a serem valorizadas pelos pares, não por virtudes morais, ainda que não fossem imorais, mas pela estabilidade financeira que tinham.

79. A vida é espiritual

      “Então os justos resplandecerão como o sol, no reino de seu Pai. Quem tem ouvidos para ouvir, ouça. Também o reino dos céus é semelhante a um tesouro escondido num campo, que um homem achou e escondeu; e, pelo gozo dele, vai, vende tudo quanto tem, e compra aquele campo.” Mateus 13.43-44

      Em 2018, no dia 10 de abril, meu pai faleceu. À noite, quando cheguei de viagem a Ribeirão Preto, fui até o velório, e vi pela primeira vez o corpo no caixão, uma percepção muito interessante me veio. Era noite, o local estava vazio, à meia luz, o enterro seria só na manhã seguinte, mas o responsável abriu o lugar para nós. Não me aproximei do caixão, olhei de longe, então, um sentimento forte me veio sem ao menos eu pensar no assunto, sem nenhuma racionalização, emoção expressa numa frase: “ele não está aí”. 
      Devemos respeito a todos, sempre, a quem perde entes queridos, mais ainda, a maneira como as pessoas expressam sentimentos pode variar, ninguém se ache melhor ou pior por se expressar de um jeito. Contudo, em nenhum momento senti vontade de correr ao caixão e interagir emocionalmente com o que restava de meu pai, confesso, e repetindo, com o maior respeito com todos, naquele momento não entendi quem desesperadamente abraça caixões. Talvez porque minha relação com meu pai não tenha sido tão próxima…
      Por favor, me entendam corretamente, não estou fazendo julgamento de valor, dizendo que isso é errado e aquilo é certo, mas eu senti um discernimento espiritual muito forte e claro, que me dizia que aquilo que eu conhecia como meu pai não estava naquela sala, não estava naquele lugar, não estava mais no mundo material, mas no plano espiritual. O consolo que isso me trouxe foi não mentalizar e registrar como memória um ser em decomposição, com a carne sem cor, os olhos sem brilho, enfim, matéria descartada. 
      A “imagem” que me veio depois, e que permanece em mim até hoje de meu pai, é a de um ser espiritual vivo e eterno. No texto bíblico inicial, de novo com a frase que enuncia mistérios, quem tem ouvidos, ouça, uma revelação, a última imagem que temos de quem parte, não representa o que podemos nos tornar, espíritos que brilharão como o Sol. Muitos, ainda que religiosos, têm visões materialistas da vida, passam anos em templos, mas não creem na eternidade, não a ponto de serem consolados por ela quando precisam. 
      Infelizmente muito do falso cristianismo leva os homens a celebrarem mais a morte que a vida, por isso um ícone tão usado é o de um “Cristo” ainda na cruz. Mesmo a visão de santidade é equivocada, privações e proibições que tentam mortificar o corpo ainda em vida, menosprezando o Espírito Santo. Só se aprende os mistérios da vida eterna dando liberdade ao vivo Espírito Santo, só ele pode dominar a matéria. Só quem tem essa experiência enfrentará a morte de maneira correta, ainda que com dor, mas com paz e certeza.
      A experiência que tive não é mera imaginação ou privilégio de alguns, é o discernimento que o Espírito Santo dá a todos que o buscam. A vida é espiritual, não material, a realidade é espiritual, a matéria que é uma ilusão passageira. Adquire-se esse entendimento e o retém quem pratica vida de íntima comunhão espiritual com Deus por Jesus e no Espírito Santo. Aos que sofrem com a partida de entes queridos, Deus vos ama e pode consolar-vos, se o buscarem com todo o coração. A morte não tem que ser dor sem fim. 

80. Salvação se perde?

      “Porque é impossível que os que já uma vez foram iluminados, e provaram o dom celestial, e se tornaram participantes do Espírito Santo. E provaram a boa palavra de Deus, e as virtudes do século futuro, e recaíram, sejam outra vez renovados para arrependimento.” “Porque a terra que embebe a chuva, que muitas vezes cai sobre ela, e produz erva proveitosa para aqueles por quem é lavrada, recebe a bênção de Deus; mas a que produz espinhos e abrolhos, é reprovada, e perto está da maldição; o seu fim é ser queimada.” Hebreus 6.4-6a, 7-8

      Meus queridos, é de suma importância que vençamos fraquezas morais neste mundo. Não basta assumirmos erros, pedirmos perdão por eles a Deus em nome de Jesus, e ficarmos em paz, para depois repetirmos e repetirmos o processo ad infinitum. Isso não basta para termos a melhor eternidade com Deus, o céu. Não serei irresponsável com vocês, dizendo que as coisas são assim tão simples e fáceis, porque não são. Temos que lutar e vencer, vence-se mantendo-se numa nova condição de vitória sobre fraquezas morais no tempo. Responda a você mesmo com sinceridade: pode dizer que já deixou de praticar certas condutas, de dizer certas coisas, de pensar tantas coisas, testificando que de fato venceu certas fraquezas? 
      O texto bíblico inicial entrega um ensino bem sério, que deixa claro que uma decisão de fé tornando-se membro de uma igreja e mesmo tendo algum tempo de vida de acordo com a vontade de Deus, não bastam, caso depois se volte à prática de velhos pecados. Veja que na parábola do texto, a mesma água cai sobre sobre terras que dão frutos diferentes, uma dá erva proveitosa e outra dá espinhos e abrolhos, a água é simbologia do Espírito Santo. Se ambas recebem a mesma água, simbolizam seres humanos diferentes recebendo o mesmo Espírito Santo, portanto, sendo ambos “convertidos” ao evangelho, estando em igrejas e tendo vidas religiosas semelhantes, o que dá “espinhos” e “abrolhos” não é um ímpio ou incrédulo.
      O ponto aqui não é se opor ao entendimento que seres humanos não erram depois que conhecem o cristianismo, isso é o óbvio, mas é enfatizar que fé e perdão não bastam. Se não houver trabalho constante, o fim de quem começou certo pode ser até pior que o daqueles que nunca foram certos. “Se depois de terem escapado das corrupções do mundo forem outra vez envolvidos nelas e vencidos, tornou-se-lhes o último estado pior do que o primeiro, melhor lhes fora não conhecerem o caminho da justiça, do que, conhecendo-o, desviarem-se” (extraído de II Pedro 2.20-21). De quem mais sabe mais é cobrado, contudo, não sou extremista como parece ser o autor da carta aos Hebreus, acredito que sempre há novas oportunidades.
      Contudo, teimosia no erro aumenta o preço do arrependimento, não porque Deus negue perdão, mas porque podemos chegar num ponto que temos muita dificuldade de nos perdoar, assim, podemos nos afastar muito de Deus. Dificuldade para vencer fraquezas todos temos e sempre, muitas coisas só vencemos no final da vida, simplesmente por enjoarmos de fazer a coisa errada e ela não nos trazer mais prazer. Deus ama quem quer fazer a coisa certa porque é o certo a se fazer e agradável a ele, permitindo assim ao homem aperfeiçoamento moral e crescimento espiritual. Só isso nos faz cidadãos do céu, carimbar o passaporte para a melhor eternidade de Deus é algo feito aqui, com mudança real de vida que permanece. 
      Se você tiver mais fé que eu, pode aceitar o texto bíblico inicial na íntegra e ao pé da letra, mas isso implica em alguns posicionamentos extremados. O texto pode apoiar a crença que salvação se perde, a isso podemos contra-argumentar que só “perde” quem nunca teve, mas veja que ambas as terras receberam a mesma água, assim, tanto salvos como perdidos receberam o Espírito Santo, mas se salvação se perde o selo do Espírito é retirado. Por outro lado se salvação não se perde, muitos salvos que se desviaram podem estar vivendo vidas desalinhadas com o evangelho e ainda assim serem salvos, a isso podemos contra-argumentar que não sabemos o fim desses, quem sabe se não voltarão ao evangelho antes de morrerem? 
      Penso que salvação se perde e pode ser novamente adquirida, mas também creio que quem foi selado de maneira diferenciada com o Santo Espírito, pode até se afastar do convívio de igrejas cristãs, mas nunca perderá uma conexão espiritual especial e verdadeira com Deus. Quem é amigo de Deus sempre será, isso é mais forte que o mundo, que a vida, e a providência divina sempre conduzirá os amigos do Senhor a sua intimidade, a tempo de se prepararem o melhor possível para a eternidade. O problema é que amamos julgar mal as pessoas, condená-las neste mundo, se relativo ao direito que achamos ter de sermos juízes, tivéssemos o dever de sermos amigos, poderíamos ser instrumentos de salvação em muitas vidas. 

81. Penitência, indulgência, purgatório

      “Assim também a fé, se não tiver as obras, é morta em si mesma. Mas dirá alguém: Tu tens a fé, e eu tenho as obras; mostra-me a tua fé sem as tuas obras, e eu te mostrarei a minha fé pelas minhas obras. Tu crês que há um só Deus; fazes bem. Também os demônios o crêem, e estremecem.” Tiago 2.17-19

      Fé e obras, como equilibrá-las de modo a alcançarmos a melhor eternidade de Deus. Reflitamos a respeito comparando doutrinas católicas com outras. 

      Perdão pela fé no nome de Jesus é ponto passivo, agora se obras são para completar o pagamento desse perdão, para evoluir o espírito, para dar direito ao céu e consequentemente livrar do inferno, ou para retirar de um meio termo, o purgatório, são pontos que variam em diferentes teologias cristãs. Vejamos três conceitos importantes no catolicismo, indulgência, penitência e purgatório, que envolvem perdão e penas eternas (para mais detalhes clique nos links).
      Penitência são jejuns, orações, esmolas, vigílias e peregrinações, que fiéis oferecem a Deus como provas de que estão arrependidos dos seus pecados, pagando um pecado cometido ou agradecendo uma graça recebida.
      Indulgência é a remissão total ou parcial da pena temporal devida para a justiça de Deus, pelos pecados que foram perdoados, ou seja, do mal causado como consequência do pecado já perdoado através da confissão sacramental. Embora no sacramento da Penitência a culpa do pecado é removida, e com ele o castigo eterno devido aos pecados mortais, ainda permanece a pena temporal exigida pela Justiça Divina, e essa exigência deve ser cumprida na vida presente ou na depois da morte, isto é, no purgatório. Uma indulgência oferece ao pecador penitente meios para cumprir esta dívida durante sua vida na terra, reparando o mal que teria sido cometido pelo pecado.
      A tradição do Purgatório tem uma história que remonta antes de Jesus, à crença encontrada no judaísmo de rezar pelos mortos, especula-se que o cristianismo pode ter tomado a sua prática similar. Desde os primeiros tempos, a Igreja honrou a memória dos defuntos e ofereceu sufrágios em seu favor, em especial o sacrifício eucarístico, a fim de que purificados, eles possam chegar à visão beatífica de Deus. Os católicos consideram que o ensino sobre o purgatório faz parte integrante da fé derivada da revelação de Jesus Cristo que foi pregada pelos apóstolos.
      No catolicismo, a penitência paga perdão por pecado neste mundo, a indulgência adianta no mundo, o pagamento por consequência do pecado, que teria que ser feito no purgatório, no outro mundo. Interessante que os mesmos que acreditavam no que a igreja católica dizia que condenava ao inferno, não praticavam o que a mesma igreja dizia dar direito ao céu, preferiam pagar o céu com bens materiais. É claro que a igreja incentivava isso porque era útil para ela. A reforma protestante aboliu essas doutrinas, assim aos evangélicos basta fé no nome de Jesus para terem perdão dos pecados, sem necessidade de qualquer pagamento adicional, seja aqui ou na eternidade (João 3.18). Também não há purgatório para protestantes, ou é céu ou é inferno, e eternos. 
      Indulgência e purgatório colocam o catolicismo mais próximo do espiritismo kardecista, já que essas doutrinas consideram a possibilidade de interferência de seres humanos do plano físico, na qualidade de vida dos seres desencarnados no plano espiritual. Quando se reza pelos mortos para tirá-los do purgatório e liberá-los para o céu, usa-se uma capacidade que protestantes não admitem que seja possível, para esses é impossível qualquer comunicação ou influência de vivos com mortos. O católico também se aproxima do kardecismo quando admite a intermediação dele com Deus por santos, portanto comunicação com espíritos de mortos, assim quando um santo lhe fala podemos dizer que uma espécie de mediunidade seja exercida. 
      Sobre muitos aspectos o catolicismo, talvez porque tenha refletido em concílios por séculos sobre tantas questões espirituais e filosóficas, é muito mais aberto que o protestantismo. Muitos evangélicos não sabem disso, aliás, sabem pouco sobre as doutrinas de suas igrejas, quanto mais das doutrinas das outras religiões. Aos que têm tanta certeza de penas extremas e eternas, será que de fato céu e inferno são para sempre? Purgatório parece um conceito mais justo e de acordo com o amor Deus, podendo depender de nossa intercessão aqui e de um arrependimento lá. Eis novamente o catolicismo se aproximando das doutrinas espíritas, para o kardecismo sempre há oportunidade para se livrar de uma condenação mais duradoura. 
      Como protestante reconheço benefício na doutrina da penitência, que se aproxima do ensino em Tiago 2.17-19, ela não facilita demais o perdão, não limita o acerto de contas à assunção do pecado e posse de paz com Deus pela fé. É preciso algo mais, mostrar por obras que custem um preço ao pecador o arrependimento. Penso que os evangélicos “vendem” o perdão de Deus barato demais, isso pode conduzir as pessoas a uma ociosidade moral, a acharem que entrada no céu e livramento do inferno é fácil. O lado negativo da penitência, que alcança o extremo na indulgência paga com dinheiro, é que confere ao homem a capacidade de ter perdão e entrar no céu, relegando a graça e a misericórdia de Deus a segundo plano. 
      Na verdade existe indulgência, mas não legislada, aplicada e cobrada pela religião ou pelos homens, mas por Deus, é a lei universal de “causa e efeito”, ou de se colher o que se plantou, usando termos mais bíblicos (Gálatas 6.7). Que arrogância da Igreja Católica achar que pode verificar, medir e fazer cumprir essa lei, com certeza só para obter algum lucro material com isso, por outro lado achou entre os homens seres tolos o suficiente para “comprarem” tal coisa. A Igreja Católica tenta materializar com todos os detalhes um reino de Deus no mundo, e ainda que isso não tenha dado certo, que só tenha atrasado a civilização ocidental, muitos protestantes e evangélicos tentam repetir isso atualmente, ao se envolverem com política. 
      É por esse motivo que leis são inviáveis para conduzirem o ser humano a uma espiritualidade madura, obedecer cegamente uma lei impede a reflexão, conduz a um extremo ou a outro, por isso uma velha aliança foi substituída por uma nova, por isso a Lei de Moisés deu lugar ao evangelho do Cristo. Só uma relação íntima com o vivo Espírito Santo, onde há a necessidade de uma interação inteligente com Deus, onde se fala e se ouve, onde se pensa e se sente, pode mostrar qual é a parte do homem e qual é a parte de Deus com equilíbrio, enfatizando a importância da coerência entre o que se crê e o que se pratica. Quando entenderemos que na eternidade não haverá religião? Só nós, confrontados diretamente com a luz de Deus. 

82. Que fim do mundo eu quero?

      “Mas vós vede; eis que de antemão vos tenho dito tudo. Ora, naqueles dias, depois daquela aflição, o sol se escurecerá, e a lua não dará a sua luz. E as estrelas cairão do céu, e as forças que estão nos céus serão abaladas. E então verão vir o Filho do homem nas nuvens, com grande poder e glória. E ele enviará os seus anjos, e ajuntará os seus escolhidos, desde os quatro ventos, da extremidade da terra até a extremidade do céu.” Marcos 13.23-27

      O mundo vai acabar? A ciência diz que sim, quando o Sol consumir todo o hidrogênio, o combustível que ele usa para queimar e manter sua coesão, se expandirá e queimará principalmente os planetas mais próximos, incluindo a Terra, mas calma, isso acontecerá só daqui a mais ou menos cinco bilhões de anos, pois é, demora um pouco. Podemos achar apologia para esse fim do mundo na Bíblia? Sim, até para esse, no texto bíblico inicial e em outros, que falam de caos cósmico.
      Contudo, será que é esse fim científico do mundo que esperamos, ou melhor, que queremos? Não é o que querem muitos protestantes e evangélicos, esses aguardam um fim do mundo que justifique a história do mundo conforme o que entendem ter sido relevante nessa história. Esses cristãos veem o mundo como um ringue de luta entre Deus e o diabo, assim, o fim de mundo que desejam é o que derrota o diabo e os que o seguem, aprisiona esses no inferno, e aloja os outros no céu com Deus. 
      Muitos cristãos protestantes e evangélicos, e veja que não são todos já que católicos e cristãos de algumas denominações não têm a mesma interpretação literal do Apocalipse, mas muitos dizem que não são eles que desejam esse fim do mundo, mas é esse fim do mundo que Deus disse a eles que ocorrerá. Baseados em que afirmam isso? Na interpretação que fazem da Bíblia. Essa é a verdade de Deus? Não necessariamente, interpretações diferentes podem ser feitas dos mesmos textos bíblicos. 
      Já refletimos aqui sobre como a Bíblia, apesar de conter registros verdadeiros de experiências de homens antigos com Deus, foi construída por interesses de homens, judeus, católicos e protestantes. Não penso que Deus escolha homens (ainda que Marcos 13.27 use o termo), ele ama a todos e quer que todos se salvem, seria melhor dizer que ele seleciona os preparados. Mas creio no livre arbítrio humano, que o homem escolha não a Deus, mas aquilo que quer acreditar sobre Deus.
      Nunca abrirei mão de Jesus, como ser espiritual que me conduz de forma exclusiva a Deus, e como modelo de vida neste mundo pelo homem que foi no passado, o evangelho são os ensinos espirituais mais elevados que a humanidade já recebeu, e digo isso respeitando todos os líderes e fundadores de outras religiões, assim como os adeptos de outras religiões. Também não nego a relevância do livro de Apocalipse e de outros textos que falam do fim do mundo na Bíblia, há verdades neles.  
      A pergunta não é o que Deus diz, mas o que queremos acreditar que Deus diz, e talvez mais, por que queremos acreditar de um jeito e não de outro? O que isso revela, não sobre Deus, mas sobre nós mesmos? Fins do mundo diferentes revelam coisas diferentes sobre pessoas diferentes, e muito mais que só sobre suas interpretações escatológicas, mas sobre como interagem com outras pessoas, principalmente com aquelas que pensam de maneira diferente delas sobre Deus e espiritualidade. 
      Seres humanos que tiveram pais prepotentes e até violentos, enquanto não forem curados, poderão querer se relacionar com seres humanos com as mesmas características, querendo receber desses o que não receberam dos pais. Assim se submeterão a patrões estúpidos, a maridos e esposas possessivos, mesmo a pastores dominadores, da mesma forma, buscarão religiões moralistas, que pedem sacrifícios e fé cega. Não é a religião que define o homem, mas o homem que define a religião.
      O que é mais extremo que o fim do mundo? Pessoas extremas creem em coisas extremas, onde não há meio termo, mas só sim e não. Mas será que nós seres humanos somos isso, branco e preto, sem nuanças de variação? Podemos nos acomodar em polos porque é mais fácil, principalmente se não queremos pensar, ter trabalho intelectual e espiritual de entender as coisas, mas se buscarmos no Espírito Santo, com perseverança e santidade, veremos que a existência é muito mais complexa.
      Não posso convencer ninguém, mas posso contar minha experiência, eu também já fui extremista, via na Bíblia e no cristianismo aquilo que era mais fácil para mim ver, de acordo com minha formação familiar. Mas ouvi a voz de Deus e busquei a verdade, não, isso não foi para achar desculpas para desobedecer os preceitos de Deus e viver uma vida em pecado, e portanto infeliz, ao contrário. Minha busca me fez valorizar mais a santidade, assim como o preço que o pecado mais sutil cobra. 
      Entendermos que a humanidade tem uma história e que nela o ser humano evolui, adquire ciência, perde medos e aprende a ver as coisas por dentro, não só na aparência, é o começo. Mas o mais importante é entendermos que Deus fala a homens e são esses quem registram e tornam em religiões suas palavras, assim, nas crenças, no cristianismo e mesmo na Bíblia, há mão do homem, interpretando e usando conforme, não a imutabilidade atemporal de Deus, mas as limitações humanas. 

83. O fim revela o que sou

      “ E, assentando-se ele no Monte das Oliveiras, defronte do templo, Pedro, e Tiago, e João e André lhe perguntaram em particular: dize-nos, quando serão essas coisas, e que sinal haverá quando todas elas estiverem para se cumprir. 
      E Jesus, respondendo-lhes, começou a dizer: Olhai que ninguém vos engane; Porque muitos virão em meu nome, dizendo: Eu sou o Cristo; e enganarão a muitos. 
      “Mas olhai por vós mesmos, porque vos entregarão aos concílios e às sinagogas; e sereis açoitados, e sereis apresentados perante presidentes e reis, por amor de mim, para lhes servir de testemunho.”
      “Na verdade vos digo que não passará esta geração, sem que todas estas coisas aconteçam.” 
Marcos 13.3-6, 9, 30

      O conceito do fim do mundo, ainda que baseado em palavras puras de Deus, foi construído e mantido por homens e pelos frutos que esses homens deram e dão. Nas religiões que esses homens criaram, podemos saber que eles não tinham e não têm as intenções mais puras de quem de fato anda em comunhão com Deus. Como podemos aceitar que a igreja católica, com todo seu histórico de aliança com paganismo, inquisição, amor às riquezas e idolatria, pode nos dizer o que é a palavra de Deus?
      Com relação a muitos protestantes e evangélicos um axioma interessante é usado. Eles creem num fim do mundo literal e se acham mais espirituais por isso, porque pensam que creem na Bíblia sem duvidarem dela, não duvidam porque acham que obedecendo a Bíblia obedecem a Deus, visto que creem que a Bíblia é a palavra de Deus. Mas o que esses não aceitam é que o que acham ser a palavra de Deus é só o que eles pensam ser, e uma palavra sustentada por religiões humanas e imperfeitas.
      Conhecemos alguém não pela teoria, mas pela prática, nessa três frutos são fundamentais: santidade, humildade e amor. O santo o é dentro de si, não só na aparência farisaica, no legalismo que só “não bebe, não fuma e não fala palavrões” e que defende falso moralismo por vaidade. O humilde não entra em discussões, principalmente se têm melhores argumentos, quem sabe, cala, não joga pérolas aos porcos. Mas quem ama não considera ninguém porco ou inimigo, tem paciência com todos. 
      Por mais que eu veja sinceridade e fé em muitos evangélicos que creem em fim do mundoequivocado, não acredito que isso seja só um engano menos importante. Ainda que eu creia que Deus abençoe a todos, até heréticos e desviados dentro de igrejas, penso que a um posicionamento errado sobre algo tão importante como fim do mundo, juntam-se dificuldades em outras áreas da vida, que se ainda não vieram à tona, virão. Deus não pode ajudar e proteger quem teima na mentira, não sempre.
      Deus tem tido muita paciência com os seres humanos, e sempre terá principalmente com os cristãos, mas esses têm teimado em permanecerem como crianças, sabendo o mínimo e interpretando a palavra de Deus como quem lê estórias da carochinha, e não verdades divinas eternas, ainda que se achem teólogos. Nessa infantilidade estão também doutores de teologia diplomados, que apesar dos estudos que têm, olham com microscópio a superfície, não cavam fundo com pás, assim só sabem mais do mesmo.
      A luz é o Espírito Santo, não nossos intelectos, nossos achismos, nossas opiniões pessoais, entende isso os amorosos, santos e humildes. Mas mais algum tempo e muitos serão acordados, ou não, visto que o ser humano é hábil para achar mesmo na palavra de Deus aprovação para entendimentos que sejam agradáveis aos seus ouvidos. Seja como for, quem não entender isso aqui, entenderá na eternidade, ainda que os frutos ruins dos anti-cristos estejam aí para serem vistos por quem tiver olhos espirituais.
      Nem sempre a Bíblia nos ensina por interpretação literal que fazemos dela, mas sempre nos ensina pelos princípios. “Que ninguém vos engane porque muitos virão em meu nome e enganarão a muitos”, quem vem em nome de Cristo vem dentro de igrejas cristãs, não no mundo, contudo, muitos evangélicos fazem guerras com inimigos de fora, enquanto deixam passar os inimigos de dentro, como católicos têm aceitado por séculos um catolicismo pagão que quer um reino de Deus no mundo. 
      “Vos entregarão às sinagogas”, Jesus se refere a inimigos dentro de sua religião, e como esses inimigos queriam um messias como o rei Davi, que os livrasse do império romano no mundo, querem religiosos atuais um fim do mundo literal. Percebem como o princípio é o mesmo? Literalmente Jesus podia se referir à destruição do Templo de Jerusalém, que ocorreu em 70 d.C., já que disse que não se passaria uma “geração”, e às perseguições que cristãos teriam até o estabelecimento do catolicismo. 
      Como outras profecias, a da passagem bíblica inicial é uma que já pode ter se cumprido, não se referindo a algo que ocorrerá só no fim do mundo. É claro que os que querem um fim de mundo à sua maneira, vão dizer que a palavra “geração” pode ser interpretada de outra forma, mas sendo assim podemos interpretar a Bíblia de formas diferentes, e todos poderemos dizer que estamos obedecendo uma palavra de Deus. Mas qual é de fato a palavra de Deus sobre o fim do mundo? É mistério. 
      Não estou dizendo que o que muitos pensam do fim do mundo está totalmente errado, que evangélicos, aos quais falo em primeiro lugar porque são os da minha “casa”, devem crer diferentemente. Não, esteja em paz naquilo que crê e que te trouxe até aqui com Jesus, contudo, tenha cuidado, religiões e teólogos não sabem tudo. Deus pode só ter permitido a você saber o que você pode saber para estar perto dele, nem sempre convicção é sinal de espiritualidade, pode ser só falta de humildade.

84. Responsabilidades com quem sofre

      “Sujeitai-vos, pois, a Deus, resisti ao diabo, e ele fugirá de vós. Chegai-vos a Deus, e ele se chegará a vós. Alimpai as mãos, pecadores; e, vós de duplo ânimo, purificai os corações. Senti as vossas misérias, e lamentai e chorai; converta-se o vosso riso em pranto, e o vosso gozo em tristeza. Humilhai-vos perante o Senhor, e ele vos exaltará.” Tiago 4.7-10

     Muitos sofrem ao nosso redor e necessitam urgentemente de ajuda, suas religiões não estão bastando para eles, mesmo o amor verdadeiro de parentes e amigos não estão resolvendo suas questões. Até que ponto o problema alheio nos toca? Sentimo-nos responsáveis pelos outros? E nesta reflexão, o ponto nem é responsabilidade material, mas espiritual. Enquanto alguns sofrem bem ao nosso lado, nós estamos olhando só para nossos próprios umbigos, até tratamos com educação os sofredores, temos noção de suas dificuldades, podemos até orar por eles. Mas será que só isso resolve? Será que só isso nos permite cumprir nossa vocação de luzeiros de Deus no mundo?
      Muitos de nós só entendem o poder da oração quando têm problemas pessoais, e principalmente nas áreas financeira e de saúde, quando a dificuldade nos atinge diretamente, ou no máximo a nossos cônjuges e filhos. Em situações assim, conseguimos elevar ao Senhor um clamor diferenciado, totalmente conectado ao Espírito Santo, que toca o coração do Altíssimo por Jesus e recebe uma resposta poderosa, completa, que resolve de maneira milagrosa um problema. Infelizmente, para fazermos essa oração temos que ser confrontados por uma dor ou a uma vergonha muito grande, senão nem por nós e por nossas famílias nos consagraremos e faremos um clamor diferente. 
      Em algumas situações exercemos fé especial? Sim. Nos apossamos de toda a espiritualidade para nos ligar a Deus? Sim. Provamos milagres? Sim, incontestáveis. Mas exercemos amor? Não, não precisamos necessariamente de amor para clamar ao Senhor por nós, por cônjuges e filhos, só precisamos de alguma vergonha na cara, e perdoem-se o termo. Pedimos porque não queremos ser envergonhados na sociedade e porque é nossa obrigação ajuda-los. Exercer amor é fazer algo ainda que não estejamos sofrendo, ainda que um problema não tenha a ver conosco, ainda que estejamos bem com Deus e a vida. Contudo, queremos ajudar porque amamos quem sofre.
      Amar não é fácil, dá trabalho, leva-nos a sair de zonas de conforto, da segurança de nossos castelos, bem construídos e protegidos, para entrarmos na choupana do necessitado, sentir sua dor, chorar com ele e por ele clamar a Deus. Como eu disse antes, o ponto desta reflexão não é auxílio material, mas emocional, moral e espiritual, assim a choupana não é o imóvel que muitos residem ou sua condição financeira, mas uma condição de sofrimento interno. Essa condição pode fazer adoecer mente e corpo mesmo dos ricos, de maneira que médicos de várias especialidades são consultados sem que se ache solução. Dor de alma só Deus cura, para essa a medicina é o amor. 
      Não faça porque religião manda, faça e deixe para lá necessidade de reconhecimento, conheça em detalhes a razão da dor, sinta profundamente a dor e chore com quem chora. Isso é viver o evangelho, isso é seguir a Jesus, isso é ser cristão. Se a pessoa não for da mesma religião que você não seja preconceituoso, não ataque suas crenças, nas palavras seja o mais genérico e resumido possível. Ore, contudo, diretamente a Deus pedindo solução, se achar liberdade da pessoa em Deus, imponha suas mãos na cabeça dela, e faça a melhor oração de tua vida, com convicção, de todo o coração. Feche os olhos e visualize a pessoa ligada ao Deus Altíssimo por uma feixe de luz. 
      O ensino bíblico que define esta reflexão é “chorai com os que choram”, mas se você ler o texto bíblico inicial e senti-lo, não por você, mas pelo outro, praticará Romanos 12.15b. Não, não estou dizendo que o texto inicial não seja para nós, mas não adianta o usarmos para colocarmos nossas vidas em ordem e desprezarmos o que sofre. Amar é sofrer pelo outro, ainda que não se precise ou que não se tenha pelo que sofrer. Assim, quando ler sujeitai-vos a Deus, resisti ao diabo, achegue-se a Deus, limpe as mãos, purifique o coração, quando ler essas palavras sinta as misérias do outro, lamente e chore, convertendo teu riso em pranto, como se o sofrimento fosse teu.
      Isso não é exercício de encenação, teatro, é empatia, trabalho espiritual que Deus nos chama a fazer. Se temos vidas com Deus só por nós e pelos mais próximos a nós, só chegamos ao primeiro nível de espiritualidade e estacionamos nele. Muitos se acham bastante espirituais, por terem vidas pessoais vitoriosas, quando são só crianças mimadas abençoadas pelo pai. Somos chamados à maturidade exercendo amor empático, sofrendo com os que sofrem, servindo ao próximo, oração com a pessoa em sofrimento é ferramenta poderosa nesse serviço. Ajudemos materialmente com urgência, ouçamos os problemas com paciência, mas oremos com quem sofre.

85. Todos responsáveis por todos

      “Porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus; sendo justificados gratuitamente pela sua graça, pela redenção que há em Cristo Jesus.” Romanos 3.23-24

      Quando vejo um grupo de jovens, na média com menos de vinte anos, passando a pé em frente de minha residência, nos finais de semana, muitas vezes após às vinte e duas horas, indo para algum lugar, uma praça, um posto de gasolina, com pouco dinheiro no bolso e muitas vezes com nenhum, me vêm alguns pensamentos à mente. Minha tendência é comparar com minhas filhas, que tiveram um ensino particular com mais qualidade, novas ainda, mas focadas nos estudos, no estágio profissional, que também se divertem, mas de forma mais protegida, mais próximas a mim e à mãe.
      Fico triste, tantos jovens achando razão de viver, alegria, em coisas tão fúteis, em música ruim, em bebidas alcoólicas, em cigarro, quando não em coisa pior. Eles não são tão diferentes de filhas por quem tanto amo e zelo em oração, mas por algum motivo, que só Deus sabe, nasceram em lares com menor poder aquisitivo, e às vezes nem com falta de dinheiro, mas de pais mais próximos, de referências mais altas de cultura, de moral, de Deus. Nesses momentos Deus me fala, “esses jovens têm importância para mim, tanto quanto tuas filhas, como têm os pais deles tanto quanto têm você e tua esposa”.
      Todos somos responsáveis por todos. Parece uma afirmação óbvia, principalmente para cristãos, que participam de igrejas que dizem que têm a missão de salvar o mundo, mas na prática não é bem assim que funciona. Muitas igrejas evangélicas funcionam hoje mais como lojas rápidas de conveniências ou prontos socorros. As pessoas entram em templos quando estão com necessidades iminentes, não querem profundidade espiritual, relação social, só querem soluções, simples e rápidas, de igrejas de alta rotatividade, fáceis de se entrar, fáceis de se sair, sem que haja muita cobrança. 
      Que solução é mais simples e rápida que a que se compra com fé genérica e ofertas de alguma grana? Ninguém precisa conhecer a Deus mais seriamente, experimentar melhorias morais, mesmo acreditar em verdades como únicas, não importa, pode até ser só mais uma verdade, importa é um tratamento célere para uma dor. Isso é o que ocorre em muitas igrejas cujo público são pessoas de poder aquisitivo mais baixo e com menor formação intelectual. Sim, não sejamos injustos, há alguma mudança de vida, libertação de vícios, casamentos arrumados, mas muitas vezes só superficialmente. 
      Já em igrejas protestantes tradicionais, não em todas, mas em muitas, apesar de serem procuradas por motivos menos materialistas e com referências intelectuais mais altas, os templos funcionam mais como clubes fechados. Essas não estão muito cheias atualmente, os frequentadores não são de alta rotatividade como nas outras, mas a maioria as frequenta há anos, muitos desde crianças. Contudo, há algo em comum com as pentecostais e neopentecostais, pouca responsabilidade com os outros, não é qualquer pessoa que entra, assiste um culto, é bem tratada e fica como membro oficial. 
      Perdoe-me se estou sendo injusto com a tua igreja, a crítica que levanto aqui não deve ser generalizada, mas só responda uma coisa, com que frequência você vê batismos em tua igreja, que não sejam de filhos ou mesmo de parentes de membros antigos? O número reduzido de batizados reflete a prioridade que muitas igrejas evangélicas e protestantes dão para aqueles, como os jovens que citei acima, do mundo. Muitos de nós acostumamo-nos a olhar muitos como os outros, não sentindo qualquer responsabilidade por eles. Não os julgamos mal, mas também não os amamos como devíamos amar. 
      Se muitas igrejas protestantes não abraçam os do “mundo” e se as outras igrejas veem os do “mundo” como produtos descartáveis, outros abraçam. Ideologias de esquerda, materialistas, traficantes de drogas assim como vendedores de cigarro e bebidas alcoólicas abraçam os do “mundo”. Enquanto isso muitos cristãos demonizam a orientação de manter templos com menos gente para evitar aglomeração perigosa em pandemia, acham que são servos de Deus preparados para o Apocalipse quanto só querem permanecer em suas zonas de conforto, protegidos do mundo, mas não salvando o mundo. 
      Muitos protestantes e evangélicos terão grandes surpresas quando despertarem na eternidade após a morte de seus corpos físicos, muitos, com certeza do direito ao céu, ficarão torturados por muito tempo em “infernos”, confusos, procurando o que nunca existiu. Muitos, que se achavam donos da verdade, melhores que os outros por crerem na Bíblia interpretada ao pé da letra, que condenaram homoafetivos, afroespíritas, mesmo católicos e outros religiosos, verão que muitos receberam na eternidade o amor do Cristo e eles não, porque não exerceram amor como deviam estando no mundo. 
      Não tenhamos tanta certeza de nossas salvações eternas, mas também não temamos infernos sem fim, confiemos no amor de Deus e amemos. Todos nós somos responsáveis por todos, se não entendermos isso aqui entenderemos lá, se não amarmos aqui teremos que amar lá. Em Jesus há um privilégio diferenciado, não é nossa carteirinha de evangélico, nem nosso nome em rol de membros que importa, usemos esse privilégio para darmos frutos de amor que permaneçam, senão só fé não bastará. “Porque, assim como o corpo sem o espírito está morto, assim também a fé sem obras é morta” (Tiago 2.26).

86. O poder dos símbolos

      “Mas, se andarmos na luz, como ele na luz está, temos comunhão uns com os outros, e o sangue de Jesus Cristo, seu Filho, nos purifica de todo o pecado.” I João 1.7

      A reforma protestante negou o poder dos símbolos, e em última instância, para aqueles que atingem espiritualidade mais iluminada e madura, não há necessidade de símbolos materiais para se ter uma experiência com Deus, digo isso com o respeito que tenho com todos que pensam diferente. Não estou dizendo com isso que protestantes e evangélicos tenham maturidade ou que desfrutem de toda iluminação, que sejam por isso melhores que católicos ou outros religiosos. 
      Mesmo que seja só por ideias, símbolos ainda podem ser usados, amarrando o ser humano na infantilidade espiritual que não vê muito mais que quem usa símbolos materiais. A diferença é que a reforma protestante colocou o homem num contato mais direto e reto com o Altíssimo, pela fé exclusiva em Jesus, ainda que negue a maior parte das capacidades que o Espírito Santo pode dar aos seres humanos para conhecerem mais profundamente o mundo espiritual.
      É inegável que os seres humanos precisam de símbolos materiais para concentrarem sua fé, para focarem pensamentos e sentimentos, ainda que muitos não tenham exatamente a noção de com quem estão se comunicando de fato. Assim, imagens em figuras e estátuas de homens e mulheres que já morreram e foram proeminentes em suas crenças, mesmo de arcanjos, de entidades e de outros seres espirituais, ajudam os seres humanos a terem a atenção de seres no plano espiritual. 
      Sim, nenhuma fé fica impune, nenhum intenção mental e emocional direcionada ao plano espiritual é em vão, acreditem nisso protestantes e evangélicos. Há poder nos símbolos desde muito tempo, como o antigo testamento tão bem nos descreve quando fala de “falsos deuses”, ainda que venham à mente de muitos evangélicos mal informados, quando leem sobre idolatria, só estátuas de pedra, madeira ou outro material, vazias, que não podem interagir com os seres humanos. 
      O ser humano precisou, e vejam que usei o verbo no passado, de símbolos nos tempos antigos, ainda que num estado de excessão. A história de Israel no antigo testamento é a de um Deus espiritual tentando convencer a humanidade que símbolos materiais são desnecessários. Mas o motivo de vermos isso com tanta ênfase em tantas passagens, seja pelos registros de Moisés, dos juízes, dos reis ou dos profetas, não era para ensinar que outros deuses não existem, mas que não são confiáveis.
      Não vou entrar em detalhes, mas a coisa funciona mais ou menos assim. Se você moldar uma estátua, ou desenhar uma imagem, de um ornitorrinco, por exemplo, então, invocar o mundo espiritual focado nisso, achará algum “ser espiritual” que se identifique como tal. Seres espirituais ”inferiores” são vaidosos, carentes por interação e adoração, como não querem se render a Deus querem ser deuses e encontram em seres humanos, assim como em outros espíritos ”inferiores”, atenção. 
      Por isso construção física de símbolos espirituais é tão perigosa, não fazemos ideia de quem responderá se chamarmos por eles. O mundo espiritual é complexo, usando um termo cristão, existem toda espécie de “demônios” e “diabos”, seres das trevas em vários níveis de hierarquia. Se são das trevas não são da luz, assim não são da verdade, mas da mentira. Qualquer ser espiritual é espírito, espírito não tem corpo, mas os ”mais baixos” são ligados à matéria, por isso tem predileção por símbolos.

87. Acima dos símbolos

      “Porque eu conheço que o Senhor é grande e que o nosso Senhor está acima de todos os deuses.” Salmos 135.5

      Existe outro aspecto importante sobre símbolos, verificado com representações de seres híbridos, parte homem, parte animal. Também se referem a seres espirituais, mas cada parte tem um significado, e assim podem conter vários significados espirituais. A esfinge, parte humana, parte leão, parte pássaro, conforme o ocultismo é mais que um animal mítico, é um conjunto de símbolos esotéricos. Quem foca em uma imagem de animal, não está adorando um animal, mas evocando significados espirituais. 
      Povos originais (indígenas) da América do norte têm ligações espirituais com animais, um urso, uma águia, uma cobra, sendo que cada animal representa um espírito ou um significado espiritual específico. Por outro lado religiões hinduístas já consideram certos animais como possuidores de espíritos especiais, por isso, por exemplo, os bovinos são respeitados, mas nesse caso não é simbolismo. Assim, a conexão espiritual que não com Deus por Jesus, pode ser bem variada e complicada. 
      Toda a velha aliança de Israel, recebida e codificada por Moisés, é um grande simbolismo da nova aliança que seria entregue por Jesus (refletimos a respeito em “Os templos de Jerusalém“). Não que os judeus adorassem a construção do templo, ou os objetos usados nas festas e cerimônias, mas Deus ensinava ao homem sobre a obra redentora do Cristo através dos protocolos da religião israelita. Isso construiu um símbolo mental muito poderoso usado pelo catolicismo e pelo protestantismo.
      Por que nos sentimos tão eficientemente purificados quando pedimos que Deus nos lave com o “sangue” de Cristo? Não sei quanto a você, mas eu me sinto, me pego usando esse simbolismo muitas vezes. Ainda que mental, é um símbolo porque o sangue físico e real de Cristo não vem nos limpar quando oramos assim. Jesus hoje é espiritual e numa posição espiritual elevadíssima, acima de toda sorte de seres espirituais e físicos. Mas essa figura funciona, como funcionam outras figuras.
      Baseada em Lucas 22.19-20 a Igreja Católica tem, talvez, o simbolismo mais forte de todos, que mais que um símbolo, creem eles, é uma manifestação física. No sacramento da Eucaristia a hóstia se transforma, dentro do corpo do crente, em corpo e sangue do Cristo (“transubstanciação”). No meio protestante e evangélico a interpretação da ceia varia muito, não é consenso, para uns aproxima-se bastante da doutrina católica, para outros a ceia é só um culto de memória e de confirmação de fé. 
      Pessoalmente acredito que não devemos julgar mal ninguém por usar símbolos materiais para focar ou reforçar sua comunicação com Deus e o mundo espiritual. Deus ouve e atende a todos, indiferente de símbolos, religiões e mesmo de intenções. Contudo, como alguém que tem certeza de suas convicções e acredita que conhece certas verdades, humildemente posso aconselhar. Busquemos a Deus, focando mentalmente nele, e através da verbalização do nome de Jesus Cristo, isso basta.  
      Concluo lembrando algo já dito aqui, nossa comunicação com o plano espiritual é mental, assim imagens, vistas ou imaginadas, não são só percepções e invenções de nossas cabeças, podem ser usadas para interagirmos com Deus e com outros seres. Não faço aqui qualquer juízo de valor, dizendo o que é certo e o que é errado, mas posso dar um testemunho. Buscarmos ao Deus Altíssimo, e não outro “deus”, nos cura, nos limpa, nos protege e nos conduz sem confusão sempre em vitória. 

88. Quem é Deus senão o Senhor?

      “Porque quem é Deus senão o Senhor? E quem é rochedo senão o nosso Deus? Deus é o que me cinge de força e aperfeiçoa o meu caminho.” Salmos 18.31-32

      Um texto nem sempre nos ensina só pelo que diz, pode dizer-nos muito nas entrelinhas e ensinar mesmo pelo que não diz. A Bíblia é coletânea de registros históricos, assim, um entendimento mais abrangente dela se faz verificando vários aspectos, língua original, história, geografia, respeitando contextos, então, transferindo, se possível, para a realidade do leitor. Entender que a pergunta de Salmos 18.31 é só a declaração do “rochedo” que nosso Senhor é, é útil, mas a pergunta pode nos dizer mais, se nos aprofundarmos na sociedade do escritor e do antigo testamento de maneira geral. Por que o salmista faz a pergunta? Ele busca algum reforço na resposta? Qual?
      Quem é Deus senão o Senhor? Hoje em dia, após quase dois mil anos de doutrinação cristã, isso é questionamento que não fazemos, temos gravado na mente que só existe um Deus e ele é todo-poderoso. No tempo do antigo testamento isso não era bem assim, cada nação tinha seu “deus” e mesmo mais de um, politeísmo era comum. Em Salmos 86.12a há uma citação interessante, “entre os deuses não há semelhante a ti, Senhor”. Os “outros deuses” não são negados, só são colocados numa posição abaixo de Deus, assim, mesmo entre os israelitas é discutível afirmarmos que eles criam na existência de um único deus, ainda que convictos que seu Deus era o mais poderoso de todos.
      Em muitos textos bíblicos o registro dos escritores sobre deuses é feito de maneira exotérica, não esotérica, assim referem-se a estátuas e imagens, aos símbolos materiais usados para foco mental e emocional, portanto, de conhecimento popular e exotérico, não ao que era invocado no plano espiritual através desses ícones físicos, os espíritos malignos ou “deuses”, de conhecimento muitas vezes só de “iniciados”, o esotérico. Talvez hoje, com o neo-politeísmo que anda surgindo, principalmente pela promoção, por exemplo, de religiões afros e de povos originais (e aqui não exerço qualquer juízo de valor, só faço constatação “técnica”), Salmos 18.31 tenha relevância. 
      A verdade é que Deus ocupa uma posição espiritual única e eterna, nele está Jesus, com ele o Espírito Santo conecta todos os que o buscam. É assim ainda que abaixo dele principados e potestades de toda sorte de seres espirituais, da mais alta luz às trevas mais intensas, existam e possam ser acessados. Esse acesso a outros seres é prudente de ser feito? Não. Mas é possível? É. O termo falso deus é inapropriado em muitos casos, Deus só existe um, mas abaixo dele seres espirituais podem se colocar como deuses, também são verdadeiros, mesmo que não sejam Deus. Com verdadeiros não dizemos que sejam bons, podem ser maus, mas são reais. Falso deus mesmo é o homem arrogante. 
      Enganam-se muitos cristãos que pensam que pessoas de outras religiões são enganadas por deuses que se dizem algo quando são outra coisa, assim, como falsos deuses. Quem busca outros deuses sabe muito bem quem está buscando, sabe que não são Deus, e os espíritos desligados da luz mais alta de Deus, enquanto guias de religiosidades oficiais e provadas no tempo, também se identificam corretamente. Espíritos enganadores, que podem se passar por outros, inclusive, numa presunção muito grande até por Deus, são menores, geralmente são os que se apossam de indivíduos, esses são repelidos até em meios espíritas, não sendo “expulsos” só em igrejas evangélicas. 
      Muitos evangélicos e mais ainda protestantes tradicionais, mais próximos às doutrinas da reforma, têm um conhecimento superficial e às vezes enganoso do mundo espiritual, de demônios, diabos e outros. Pessoas que se relacionam com o mundo espiritual de maneira mais séria e profunda, ainda que não com Deus por Cristo e no Espírito Santo, não ficam necessariamente possuídas violentamente, perdendo controle de mentes e corpos. Se um evangélico acha que pode entrar numa sessão espírita kardecista, por exemplo, e expulsar demônios, se equivoca, a coisa é um pouco mais complexa. Mas sim, quem se envolve com algo que é proibido na Bíblia pode correr riscos sérios. 
      Não é adequado usar Efésios 6.12-13, “porque não temos que lutar contra a carne e o sangue, mas, sim, contra os principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais, portanto, tomai toda a armadura de Deus, para que possais resistir no dia mau e, havendo feito tudo, ficar firmes”, para jogar responsabilidade no diabo por algo que é livre arbítrio humano. Contudo, esse texto se aplica corretamente à batalha espiritual, necessária quando alguém está intensamente amarrado a um problema e a espíritos maus. Mesmo dores que a medicina não acha a causa, podem ser efeito de opressão espiritual prolongada. 
      Seres espirituais, que acham harmonia em modos de vida errados, ligados a vícios, a culpas e a outras dores não resolvidas em Deus, podem torturar pessoas. Nesse caso nossa luta é conversar com a pessoa para que ela escolha um modo de vida diferente, mas também é orar para que espíritos maus, que entraram em sintonia com ela, não a atormentem mais, nem tentem nos revidar por estarmos ajudando-a. Cuidado, ao se envolver com problemas sérios, o mal pode se voltar contra você, por isso é necessário convicção de que Deus nos autorizou a nos envolvermos, e firmeza para depois permanecermos protegidos com a armadura de Deus, senão tentativa de cura pode até piorar a doença.
      Outra lição que aprendemos no salmo 18 é a resposta dada no versículo 32 à pergunta do versículo 31: “Deus é o que me cinge de força e aperfeiçoa o meu caminho”. É impossível existirmos sem comunhão com Deus, pobres dos ateus e materialistas que tentam viver sem crer no espiritual, ou que só confiam na ciência. Se Deus não te fortalecer, não saia para a batalha, poderá até ter vitória, mas ficará ainda mais fraco e susceptível às retaliações de espíritos maus, e não duvide, eles contra-atacam, esperam o momento melhor e jogam sujo. Peçamos a Deus que aperfeiçoe nosso caminho, de maneira que possamos fazer as melhores escolhas, sem ingenuidade ou irresponsabilidade, fortalecidos nele.

      “Ao único Deus, sábio, seja dada glória por Jesus Cristo para todo o sempre. Amém.” Romanos 16.27 

89. Conhecemos a luz verdadeira?

      Por favor, leia este texto até o fim para poder entender corretamente a reflexão, obrigado. 

      “Ali estava a luz verdadeira, que ilumina a todo o homem que vem ao mundo. Estava no mundo, e o mundo foi feito por ele, e o mundo não o conheceu. Veio para o que era seu, e os seus não o receberam.” João 1.9-11

      “Se Deus não existe, tudo é permitido” (frase do livro “Irmãos Karamazov" de Fiódor Dostoiévski), mas quem disse que não se deve fazer algo porque Deus existindo condenará quem fez? Na verdade Deus existe, tudo pode ser feito, e cada um colherá os frutos do que plantou, como causa e efeito do universo, não como ação de um Deus prepotente condenando quem plantou mal ou recompensando quem plantou bem. A frase do clássico russo parece “avançada”, mas baseia-se num entendimento retrógrado. Quem acha que pode fazer tudo porque Deus não existe, equivoca-se tanto quanto quem acha que só pode fazer algumas coisas porque são as autorizadas pelo Deus em que crê, ambos não conhecem o verdadeiro Deus. 
      O falso cristianismo do mundo pregado pelo catolicismo e também pelo protestantismo, criou duas espécies de seres humanos aparentemente opostos de pessoas, mas com uma mesma característica. Uns obedecem cegamente a um falso “Deus”, outros desacreditam cegamente desse mesmo falso “Deus”, mas ambos acham que se relacionam, por veneração ou por oposição, com o Deus verdadeiro. Um pecado será cobrado de muitos líderes religiosos, falsidade ideológica, a venda de algo como sendo Deus sendo que não é Deus, mas também será cobrado de muitos, religiosos e ateus, a falsa ingenuidade que os levou a aceitar as coisas sem questionar, sem avaliar, sem casar teoria com prática, tanto para obedecer, quanto para não. 
      Grande parte de ateus, que chamam religiosos de ignorantes, é tão desinformada quanto os religiosos que critica, e foi doutrinada pela mesma religião equivocada dos religiosos. A única diferença é que uns escolheram aceitar o equívoco que lhes ensinaram e outros não. Se ambos conhecessem o Deus verdadeiro talvez muitos mudariam de lado, alguns religiosos se tornariam céticos, pois não achariam a verdade agradável a seus ouvidos, e alguns ateus creriam em Deus. Os religiosos judeus do primeiro século agiram assim, veio a luz verdadeira de Deus encarnada em Jesus Cristo e eles não a aceitaram, antes odiaram, perseguiram, torturam e crucificaram essa luz. Quem não pensa é enganado, de um jeito ou de outro. 
      Quem criou as leis do universo foi Deus, elas deixam sozinhos os que plantam errado e aproxima das virtudes do Senhor os que plantam certo. Quem se afasta de Deus colhe mentira e desgraças, físicas, morais e espirituais, que existem nas trevas longe da luz de Deus. Quem se aproxima de Deus autoriza o Senhor a abençoá-lo, sincroniza-se com a boa vontade do Altíssimo que perdoa, protege e supre. Lista de leis morais não aproximam o homem de Deus, talvez de religiões, o que nos aproxima de Deus é amá-lo, correspondendo a seu amor primeiro e maior por nós. Nenhuma causa ficará sem efeito justo, mas todos os seres humanos, ainda que em tempos diferentes, poderão chegar a Deus e às suas riquezas e glórias eternas.
      Jesus não foi compreendido por muitos líderes religiosos judeus do primeiro século, tão entendidos nos textos sagrados, João registra isso claramente nos primeiros versos de seu evangelho. Contudo, até hoje, parece que muitos não entendem o Cristo, e o pior muitos que se põem como líderes e guardiões de tradições cristãs. “Mas a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, aos que crêem no seu nome, os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus; e o Verbo se fez carne e habitou entre nós e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade” (João 1.12-14). Muitos precisam nascer pelo Santo Espírito.

90. Só outra teoria de conspiração

      “Suave é ao homem o pão da mentira, mas depois a sua boca se encherá de cascalho. Cada pensamento se confirma com conselho e com bons conselhos se faz a guerra.” Provérbios 20.17-18

      Os de direita veem teoria de conspiração na esquerda, os de esquerda veem teoria de conspiração na direita, os cristãos veem teoria de conspiração na mídia, os não cristãos veem teoria de conspiração nos cristãos, religiosos veem teoria de conspiração na ciência, ateus veem teoria de conspiração nos religiosos. A conclusão que chegamos é que ou existem muitas conspirações secretas sendo armadas ou não existe nenhuma, são os seres humanos que são propensos a imaginarem teorias conspiratórias, eu fico com a segunda opção, com convicção.
      Não nego que até existam propósitos secretos, mas muito mais ligados a empresas, para conquistarem consumidores e terem mais lucro econômico, que para propósitos religiosos, espirituais e mesmo políticos, para se dominar o mundo e se fazer papel de deus. Pessoalmente tenho uma regra inicial, não acredito em teorias conspiratórias, elas dariam um trabalho desnecessário para existir, há meios mais práticos de se obter objetivos neste mundo, e repito, a prioridade dos maus é grana. Teoria de conspiração é mentira e é concebida por mentirosos com propósitos.
      Pode existir só uma teoria, a mais eficiente, fazer as pessoas crerem em teorias conspiratórias. Apesar de haver probabilidade de existir vida inteligente em outros planetas, ela pode estar muito longe daqui, e se alguém conseguir chegar até aqui poderá estar moralmente avançado, tanto quanto cientificamente, e não se deixará ser percebido, respeitando nosso nível inferior de evolução. Mas isso também é uma teoria. Por outro lado, dizer que coisas acontecem por causa de extraterrestres é conveniente para quem não quer revelar a verdade, e eis outra teoria.
      O que leva a essa tendência é a ignorância, quem não sabe e muitas vezes não quer saber, cria fantasias na cabeça. Quanto mais o ser humano se informar com a verdadeira ciência e com o verdadeiro conhecimento do mundo espiritual, menos teorias serão inventadas. Infelizmente, imaginar pode ser mais prazeroso para os ociosos, não entendem que a realidade é muito mais fantástica e muito mais prazerosa que a ilusão. Depois de vida inteligente fora da Terra, religião e política são as áreas preferidas para teóricos de conspirações imaginarem coisas.
      Um mecanismo de teoria conspiratória é a necessidade de se achar opositores, isso conforta quem não quer aceitar que a verdade não está lá fora, mas dentro dele, o diabo não são os outros, mas ele próprio. O exagero em ver teorias de conspiração pode ser efeito de ou conduzir a transtornos psiquiátricos, mas em qualquer nível não é sadio. É diferente de apreciar ficção, em livros e filmes, por exemplo, nesse caso é até salutar, exercício de imaginação, vislumbrar de possibilidades, mas sempre com limites para que não se torne escapismo doentio. 
      Outra satisfação que pode ser achada em teorias conspiratórias é a existência de seres poderosos, no plano espiritual ou no físico, aos quais podemos aliar coisas que não entendemos, mas que gostaríamos que fossem explicadas do nosso jeito. Por isso algumas teorias agradam a alguns e outras a outros, se vê o que se quer ver, a realidade criada pela teoria não está na realidade do mundo ou do plano espiritual, mas dentro da cabeça do que nela acredita. Por isso quem acha uma teoria para chamar de sua se sente tão confortável com ela e até ajuda a inventá-la.
      Contudo, temos que entender que teorias de conspiração são instrumentos úteis nas mãos de quem quer controlar as pessoas para poder usá-las, principalmente dando a elas motivos para terem medo. Depois que o falso medo é implantando, quem o disseminou se coloca como o que vai combater o medo. Teoria de conspiração pode ser arma de líderes políticos e religiosos inescrupulosos, que não querendo resolver problemas reais, porque são difíceis ou porque não valem a pena resolver, criam falsos problemas e se colocam como solução para esses. 
      Uma característica da teoria conspiratória é que possui explicações complexas, de modo que quem por ela é enredado sente-se apropriando de um conhecimento profundo sobre algo, que outros não viram a relevância, mas que ele viu. Dessa forma teoria de conspiração apela para a vaidade das pessoas que se acham sinceramente mais lúcidas que os que não creem na teoria. Quem crê em teoria conspiratória se vê como paladino da verdade, quase que numa missão profética de levar luz a aprisionados pelas trevas, por isso religião é terra fértil para teorias. 
      Creio que os que mais têm interesse em teorias conspiratórias são os seres espirituais das trevas, e isso também pode ser uma teoria. Eles não têm corpos físicos, não podem se satisfazer pelos apetites e capacidades da matéria, assim satisfazem-se inventando mentiras e torturando o que nelas crê. Na maior parte das vezes a própria figura de um anjo caído controlando o mal é teoria da conspiração, que originou-se no início da humanidade no planeta, quanto o ser humano ainda não tinha conhecimento científico e discernimento moral e espiritual.
      Como diz o texto bíblico inicial, teoria de conspiração pode ser agradável no começo, se mostra iluminadora de mistérios, de coisas que não se tem controle, cria inimigos para se odiar, deuses para se adorar, mas depois deixa desgosto. O sábio ouve outras opiniões, pesquisa o assunto sabendo o que é dito contra e por quem é dito, não por especuladores maliciosos, mas por cientistas ou espiritualistas idôneos, conforme a área. Cai fácil em mentira quem se fecha em bolha, ouve só o que gosta de ouvir de quem pensa como ele, e que não busca a Deus. 
      Você pode ler esta reflexão, reavaliar muitas de suas crenças, orar e quem sabe, até mudar de opinião em alguns assuntos. Contudo, você também pode fazer a leitura e considerar este texto só mais uma teoria de conspiração, a escolha é tua. Não tenho a pretenção de me colocar como dono de alguma verdade, só compartilho minhas opiniões e conclusões, sempre baseado em vida prática com Deus e com a vida no tempo. “Ninguém se engane a si mesmo, se alguém dentre vós se tem por sábio neste mundo, faça-se louco para ser sábio” (I Coríntios 3.18). 

91. Adivinho, profeta, médium

      “O espírito do Senhor Deus está sobre mim; porque o Senhor me ungiu, para pregar boas novas aos mansos; enviou-me a restaurar os contritos de coração, a proclamar liberdade aos cativos, e a abertura de prisão aos presos” Isaías 61.1   

      “A palavra adivinhar vem do latim divinare, que significa prever o futuro. Em latim, divinare tem o sentido de conseguir predizer o que vai acontecer. Essa previsão podia ser feita à sorte ou pela dedução, mas normalmente era uma previsão feita com ajuda sobrenatural. A palavra divinare vem de divinus, que significa divino, pertencente ou relativo a um deus. Também podia significar algo sagrado, com caraterísticas dos deuses (como ser maravilhoso) ou alguém inspirado por um deus, como um adivinho ou um profeta. Os adivinhos afirmam conseguir fazer previsões e descobrir coisas ocultas porque recebem mensagens de seres sobrenaturais, como deuses. Divinus vem da raiz divus, que significa deus ou divindade, um ser sobrenatural com poderes especiais. Divus também podia significar divino.” Fonte 

      Comunicação com Deus, com deuses, com anjos, com demônios e com espíritos, nunca foi só intelectual, onde se lê algo e se obedece. Essa relação implica numa presença sobrenatural inteligente no ser humano, que abre os sentidos espirituais, para que uma informação seja levada ao plano espiritual e outra seja recebida desse plano. Isso é ponto passivo, as perguntas são: o que é essa presença, uma só, várias, são boas, são más? O que é permitido e o que não é? Sendo proibido, por que é? Levantarei alguns questionamentos nesta reflexão sobre experiências com “espíritos”. 
      Na Bíblia, o termo adivinho tem vários sentidos, referindo-se às práticas de profecia ou mesmo de lançar sorte. Entendemos como adivinho o que recebe uma informação desconhecida por meios místicos ou aleatórios. No antigo testamento homens como Daniel, decifradores de sonhos e visões, eram adivinhos legitimados pela Bíblia como do Deus verdadeiro. Esses recebiam informações, principalmente sobre o futuro de Israel e das nações vizinhas, por contatos com Deus, com tipos diferentes de anjos e com aquele ser especial, “o anjo do Senhor”, que fala por Deus em primeira pessoa.
      O termo também é usado para quem tinha acesso a informações por espíritos de mortos, ou espíritos de adivinhação, oráculos ou deuses, esse último termo usado para espécies variadas de seres espirituais. Essa prática, a necromancia, pode incluir também o termo médium, surgido no século XIX no espiritismo kardecista, substituindo o termo deuses por espíritos de mortos. O afroespiritismo também pratica adivinhação, seja pelo jogo de búzios no Candomblé, seja pelo transe mediúnico por pães e mães de santo na Umbanda, nessas práticas se diz receber informações de entidades espirituais.
      Um cristão mais conservador pode dizer que em igrejas carismáticas há o Espírito Santo e esse não adivinha, fala a verdade por meio de servos de Deus, assim o oposto para ele também é válido, que toda manifestação espiritual que ocorre em outros lugares são do diabo, e essas, sim, adivinhações. Além dos búzios, outros meios podem ser usados para revelarem a vida das pessoas, como a astrologia, que faz a adivinhação estudando a posição de planetas e astros em datas de nascimentos, e como o Tarô (ou cartomancia), que faz adivinhações por meio de cartas aleatórias de um baralho especial.
      Ainda que cristãos, de maneira geral, generalizem as coisas, aqueles que conhecem as práticas não cristãs, diferenciam adivinhadores sérios de meros oportunistas, interessados em ganhar dinheiro explorando a curiosidade das pessoas e o encantamento humano pelo místico. Mas não é assim também nas igrejas cristãs, onde há profetas sérios e oportunistas? Muitas vezes uso aqui textos bíblicos como palavra indubitável de Deus para nossas vidas, mas outras vezes, como nessa, cito as posições doutrinárias de cristãos sobre um assunto, para depois reavalia-las, entenda essa reflexão como suposições. 
      As citações bíblicas compartilhadas no final deste texto são quatro referências diferentes sobre os termos adivinhação e adivinho. Levítico 20.27 é a Lei de Moisés, proibindo veementemente prática de comunicação com espíritos por meio de médiuns, e condenando esses a uma morte terrível. Ezequiel 13.6-8 fala da má prática de adivinhação feita por israelitas e em nome de Deus. Reconhecemos que é adivinhação humana e não palavra de Deus porque o texto diz que tais adivinhos dizem coisas que não acontecerão, que Deus não os mandou dizer, e que portanto são vaidades e mentiras.
      Já I Coríntios 12.3-4, 8-10 ensina sobre dons espirituais no novo testamento, e nesse caso precisamos entender algo importante. A simples forma não confere legitimidade para que o conteúdo seja de Deus. É preciso haver verdadeira palavra do Senhor compartilhada por seres humanos em comunhão com Deus. Falar alguns termos conhecidos em línguas espirituais estranhas, e quem é do meio sabe a que me refiro, iniciar uma profecia com “assim diz o Senhor”, ou encerrá-la com “fiquem em paz”, dizer que teve um sonho ou uma visão “diferente”, nãos basta para que sejam palavras de Deus.
      O texto de Isaías 3.1-5, contudo, é interessante, nele o termo adivinho é citado junto de outros, que definem diferentes posições sociais, militares, religiosas em Israel, incluindo a de profeta, sem que haja distinção ou recriminação. Ele diz que todos serão igualmente tratados por Deus com falta de sustento e de liderança. Isso nos passa a ideia que adivinhação era algo comum naquele tempo. Será que a criminalização da prática era geral, ou só para a errada? Seja como for, contato com mundo espiritual é algo complexo, pode ser perigoso e muitas vezes é ineficiente para conduzir a virtudes morais. 
      Veja que não estou sendo extremista, dizendo que toda manifestação espiritual que não ocorre em igreja cristã não é do Espírito Santo e é do diabo, usando como álibi a passagem de Levítico 20.27, dentre outras, que proíbe de forma extrema a prática do que a Bíblia chama de adivinhação, e que inclui a moderna mediunidade. Contudo, afirmo que por Jesus as coisas são menos complicadas e menos arriscadas, assim, acredito que muitos espíritas deveriam simplificar suas crenças e se converterem ao cristianismo primitivo, mas também creio que muitos evangélicos deveriam abrir suas mentes.

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      “Quando, pois, algum homem ou mulher em si tiver um espírito de necromancia ou espírito de adivinhação, certamente morrerá; serão apedrejados; o seu sangue será sobre eles.” Levítico 20.27
      “Viram vaidade e adivinhação mentirosa os que dizem: O Senhor disse; quando o Senhor não os enviou; e fazem que se espere o cumprimento da palavra. Porventura não tivestes visão de vaidade, e não falastes adivinhação mentirosa, quando dissestes: O Senhor diz, sendo que eu tal não falei? Portanto assim diz o Senhor Deus: Como tendes falado vaidade, e visto a mentira, portanto eis que eu sou contra vós, diz o Senhor Deus.” Ezequiel 13.6-8
      “Portanto, vos quero fazer compreender que ninguém que fala pelo Espírito de Deus diz: Jesus é anátema, e ninguém pode dizer que Jesus é o Senhor, senão pelo Espírito Santo. Ora, há diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo.” “Porque a um pelo Espírito é dada a palavra da sabedoria; e a outro, pelo mesmo Espírito, a palavra da ciência; e a outro, pelo mesmo Espírito, a fé; e a outro, pelo mesmo Espírito, os dons de curar; e a outro a operação de maravilhas; e a outro a profecia; e a outro o dom de discernir os espíritos; e a outro a variedade de línguas; e a outro a interpretação das línguas.” I Coríntios 12.3-4, 8-10
      “Porque, eis que o Senhor, o Senhor dos Exércitos, tirará de Jerusalém e de Judá o sustento e o apoio; a todo o sustento de pão e a todo o sustento de água; o poderoso, e o homem de guerra, o juiz, e o profeta, e o adivinho, e o ancião, o capitão de cinquenta, e o homem respeitável, e o conselheiro, e o sábio entre os artífices, e o eloqüente orador. E dar-lhes-ei meninos por príncipes, e crianças governarão sobre eles. E o povo será oprimido; um será contra o outro, e cada um contra o seu próximo; o menino se atreverá contra o ancião, e o vil contra o nobre.” Isaías 3.1-5

92. Espírito e espíritos

      “Porque já é manifesto que vós sois a carta de Cristo, ministrada por nós, e escrita, não com tinta, mas com o Espírito do Deus vivo, não em tábuas de pedra, mas nas tábuas de carne do coração.” II Coríntios 3.3  

      “A palavra espírito apresenta diferentes significados e conotações diferentes, a maioria deles relativos a energia vital que se manifesta no corpo físico. A palavra espírito é muitas vezes usada metafisicamente para se referir à consciência e a personalidade. As noções de espírito e alma de uma pessoa muitas vezes também se sobrepõem, como tanto contraste com o corpo e ambos são entendidos como sobreviver à morte do corpo na religião e pensamentos espiritualistas, e "espírito" também pode ter o sentido de "fantasma", ou seja, uma manifestação do espírito de uma pessoa falecida. Na filosofia, aparece como sinônimo do termo mente (intercambiável como esprit, no francês, e Geist, em alemão), principalmente em questões como o racionalismo de Descartes, no dualismo mente-corpo, e o idealismo (por exemplo, o Espírito (Geist) Absoluto de Hegel no idealismo alemão). O termo também pode se referir a qualquer entidade incorpórea ou ser imaterial, tais como demônios ou divindades, no cristianismo especificamente do Espírito Santo.” Fonte 

      Uma lei ditando um não extremo podia ser mais prática para livrar os homens de encrencas e os levar a confiarem diretamente em Deus. O caminho que a Bíblia apresenta para Deus é simples e seguro, no antigo testamento direto ao Altíssimo, e no novo, por Jesus e pelo Espírito Santo. Ainda assim I João 4.1-3 (compartilhada no final deste texto) nos chama a atenção por citar o termo “espíritos”, no plural. É preciso lembrar que o adjetivo “santo” foi acrescentado pelos primeiros que juntaram textos para comporem o novo testamento, originalmente em muitas passagens só havia o termo “espírito”.
      I João 4.1-3 diz “provai se os espíritos são de Deus”, assim a questão não é se havia mais de um espírito, mas se eram de Deus. A passagem diz mais, “nisto conhecereis o Espírito de Deus, todo o espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne é de Deus”. Se muitos evangélicos acham que podem entrar num centro kardecista, pedirem a qualquer “espírito” que está usando um médium para confessar que Jesus veio em carne, e que esse se negará a confessar, enganam-se. Aliás, João se refere nessa passagem a uma seita de seu tempo, que negava que Jesus tinha vivido na Terra com corpo físico.
      Da mesma forma nada ocorrerá se tentarmos expulsar pelo nome de Jesus muitos dos espíritos que influenciam médiuns, muitos evangélicos falam do que não sabem. Será que o que sabem não foi concluído sobre uma mediunidade errada, aquela em que os homens se deixam possuir por espíritos inferiores, os chamados demônios? Talvez espíritas que se convertem em igrejas evangélicas na verdade nunca tenham sido bons espíritas, só tiveram experiências erradas, talvez esses de fato necessitem de exorcismos, já os genuínos talvez sigam fazendo o bem, convictos de suas crenças, só talvez…
      Evangélicos identificam como médiuns pessoas possuídas pelo que eles chamam de demônios, assim, violentas, descontroladas, escravas de vícios, com identidades transtornadas, moralmente sujas, que são libertadas por autoridade no nome de Cristo. Por outro lado, no meio evangélico, há pessoas que perdem controle físico e emocional dizendo-se em transe do Espírito Santo, nesses casos não há violência ou sujeira moral, mas só inconveniência social, que no mínimo é demonstração infantil de efeito emocional de experiência espiritual. Precisamos avaliar sempre o que dizem os dois lados.
      Espíritas também não aceitam, principalmente kardecistas, transe que gere violência ou sujeira moral, que prejudique o médium, e em seu meio há transes que elevam as pessoas, compartilham sabedoria e produzem virtudes que dão bons frutos. Vou dizer algo que talvez escandalize, pode ser que muitos médiuns sejam usados pelo mesmo Espírito Santo que exerce dons espirituais nos crentes. Qual a experiência mais espiritual? A de pentecostais em igrejas cristãs, que muitas vezes não passa de manifestações exibicionistas, ou de médiuns, que mostram em frutos práticos santidade e caridade? 
      Em várias passagens da Bíblia verificamos Deus se revelando aos homens, não diretamente, nem genericamente pelo que o cristianismo padronizou chamar de Espírito Santo. Seres espirituais de luz são usados de formas diferentes, alguns como anjos (Gênesis 19), outros como serafins (Isaías 6), outros como querubins (Ezequiel 10), outros como arcanjos (Daniel 10). Por que acharmos que hoje, quando pedimos a Deus uma palavra e ele nos fala de maneira espiritual e direta, que é um Espírito Santo genérico que responde? Deus usa anjos e outros seres espirituais o tempo todo para nos falar e nos iluminar.
      Quem disse que não são esses seres, mais específicos, que falam aos homens em outras religiões, ainda que chamados por outros nomes? Muitos dizem, “não, é o diabo se fazendo passar por Deus”. Quando líderes religiosos judeus disseram que Jesus fazia o que fazia pelo diabo, ele respondeu que uma árvore se reconhece pelos frutos (Mateus 12.24-33). Talvez, antes de nos acharmos donos da verdade, e no direito de julgarmos, principalmente espíritas kardecistas (mas também a outros) como diabólicos, deveríamos conhecer melhor os frutos desses, anos de vidas dedicadas à caridade e ao bem. 
      Sinceramente eu não sei se o mundo já está preparado para conhecimentos espirituais mais profundos. Não estou fazendo aqui qualquer juízo de valor, defendendo ou condenando, e cito o kardecismo pois o conheço mais, distinguindo-o de outros espiritismos, mágicos e mais antigos, presentes em religiões de povos tradicionais, como na Umbanda e no Candomblé existentes no Brasil, baseados em tradições africanas. O que eu sei é que o mundo ainda precisa e muito da simplicidade de Jesus, que leva os homens diretamente a Deus e permite-lhes acesso ao professor e consolador Espírito Santo. 
      II Coríntios 3.3 ensina que Deus se relaciona com as pessoas pelo seu Espírito, sois a carta de Cristo escrita não com tinta, mas com o Espírito do Deus vivo nas tábuas de carne do coração. Salvação de Deus, evolução do ser, comunhão do homem com o divino, tudo isso é feito com um Deus Espírito compartilhando sua eterna essência com suas criaturas. Religião, no melhor sentido da palavra, funciona espiritualmente, o termo espírito não é força de retórica, algo abstrato ou opcional, é uma presença viva e ativa. Relegar a segundo plano experiências espirituais na religião é negar sua razão de ser. 

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      “Amados, não creiais a todo o espírito, mas provai se os espíritos são de Deus, porque já muitos falsos profetas se têm levantado no mundo. Nisto conhecereis o Espírito de Deus: Todo o espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne é de Deus; e todo o espírito que não confessa que Jesus Cristo veio em carne não é de Deus; mas este é o espírito do anticristo, do qual já ouvistes que há de vir, e eis que já está no mundo.” I João 4.1-3
      “Mas os fariseus, ouvindo isto, diziam: Este não expulsa os demônios senão por Belzebu, príncipe dos demônios. Jesus, porém, conhecendo os seus pensamentos, disse-lhes: Todo o reino dividido contra si mesmo é devastado; e toda a cidade, ou casa, dividida contra si mesma não subsistirá. E, se Satanás expulsa a Satanás, está dividido contra si mesmo; como subsistirá, pois, o seu reino?” “Mas, se eu expulso os demônios pelo Espírito de Deus, logo é chegado a vós o reino de Deus.” “Ou fazei a árvore boa, e o seu fruto bom, ou fazei a árvore má, e o seu fruto mau; porque pelo fruto se conhece a árvore” Mateus 12.24-26, 28, 33