09/07/21

Não é fácil ser bom

      “Mas, sobretudo, tende ardente amor uns para com os outros; porque o amor cobrirá a multidão de pecados. Sendo hospitaleiros uns para com os outros, sem murmurações, cada um administre aos outros o dom como o recebeu, como bons despenseiros da multiforme graça de Deus.I Pedro 4.8-10

       Não sei você, mas para mim não é fácil ser bom, eu preciso estar numa vigilância constante, me esforçar muito, para ser principalmente paciente, e consequentemente, amoroso, não conseguimos amar sem estarmos em paz e ter paz é não se incomodar com o mundo externo. Entretanto, se precisamos nos esforçar tanto para amar o outro, será que o problema está no outro ou em nós? Em nós, com certeza, mas como pode ser difícil nos controlarmos para sermos bons e não seres em conflito que perdem a paz por qualquer coisa. Sei que estou enganado, mas olhando de fora para algumas pessoas, elas me parecem tão controladas, tão benignas, demonstram tranquilidade com tanta facilidade, parece que nada, ou muito pouco, as desestabilizam, olhando de fora chego a invejá-las. 
      Mas como eu disse, sei que estou enganado, todos têm grandes conflitos internos, ninguém é perfeito, senão não estariam neste mundo em expiação, a diferença é que alguns escondem seus conflitos mais facilmente. Será que essa facilidade melhora as coisas? Talvez não, quem esconde melhor o problema tem a tendência de manter o problema sem solução por mais tempo, já que se os outros não sabem, parece que está tudo bem, nos preocupamos mais com aparência externa que com a verdade no interior. Não sei você, o ponto, contudo, é que eu enfrento uma batalha diária para deixar Deus brilhar em mim, para não ser estúpido com os outros, para não julgar mal, para ter paciência, para estar em paz e amar sempre com o amor sacrificial de Jesus, e essa luta me faz sofrer muito, meu Deus sabe. 
      Talvez, sentir que se está perdendo constantemente uma batalha tenha um lado bom, significa que continuamos combatendo, que não desistimos, já que muitos não perdem mais batalhas porque simplesmente pararam de lutar, perderam tantas vezes que concluíram que não valia mais a pena. Muitos, cansados de se humilharem e pedirem perdão, assumiram para si que o problema está nos outros, não neles, que se eles não têm paciência com os outros é porque os outros são insuportáveis, não são eles que são estúpidos. Isso parece estranho? Mas digamos a verdade, não é assim que na prática e com o tempo, nós e muita gente age, no meio familiar, com os irmãos na igreja, com os colegas de trabalho, no trânsito? Nos dias atuais, quando vivemos em constante pressão, paciência parece ser um luxo. 
      Como sabemos se isso ocorre conosco? Simples, respondendo a uma pergunta: há quanto tempo eu não peço perdão para alguém? Ou pelo menos, há quanto tempo eu não peço perdão a Deus pela falta de paciência que tenho com os outros? Isso é assumir que fomos deficientes no amor. Não basta pedir perdão a Deus por pecados mais explícitos e que cometemos sozinhos, em segredo, muitas vezes até nossa oração e assunções de pecados são feitas por orgulho, para nos sentirmos com a consciência tranquila, enquanto o principal que o evangelho manda, amar o próximo, não fazemos. Sim, é preciso uma batalha constante, não só por santidade moral e por disposição de justiça na área material, é preciso que lutemos pelo amor, ele será exaltado acima da fé na eternidade, ele cobre multidão de pecados. 
      Como nos ensina Pedro no texto inicial, cada um administre aos outros o dom como o recebeu, todos podemos ser úteis aos outros de alguma maneira. Nem todos temos uma amabilidade fácil e leve no jeito de ser, a vida fez muitos de nós duros e mesmo um pouco frios, muitos de nós tivemos que achar um jeito para vivermos com o passado, com a dor e com a solidão. Mas o que tem o Espírito Santo com liberdade dentro de si, achará um jeito de servir, um jeito de ser bom, mesmo que seja escrevendo textos para pessoas que nunca vai conhecer (pelo menos neste mundo), como é o caso deste que vos escreve, ou orando nas madrugadas por pessoas que não fazem a mínima ideia do quanto são importantes para nós, do quanto nós as amamos e queremos para elas tudo o que há de melhor em Deus. 

08/07/21

Sofrimento merecido (?)

      “O estrangeiro, que está no meio de ti, se elevará muito sobre ti, e tu mais baixo descerás; ele te emprestará a ti, porém tu não emprestarás a ele; ele será por cabeça, e tu serás por cauda. E todas estas maldições virão sobre ti, e te perseguirão, e te alcançarão, até que sejas destruído; porquanto não ouviste à voz do Senhor teu Deus, para guardares os seus mandamentos, e os seus estatutos, que te tem ordenadoDeuteronômio 28.43-45

      Você admite os sofrimentos e injustiças que recebe como merecidos, que por conta de escolhas erradas e atitudes sem amor você merece o tratamento deselegante de muitos e as oportunidades ruins ou ausentes que você experimenta, por exemplo, em tua vida profissional? Em primeiro lugar, antes de refletirmos mais nessa questão e em sua resposta, vamos entender melhor sobre a que nos referimos com “merecer”. Este mundo é injusto, as pessoas são egoístas, e nisso estamos incluído, assim também somos injustos e egoístas, contudo, existem, sim, coisas que sofremos sem merecer. 
      Tem muita gente que sofre por causa da ganância e de preconceitos dos outros, que só pensam em si mesmos, que só querem receber e não querem dar ou servir os outros. Isso é verdade, assim muitas coisas não devemos simplesmente aceitar como coisas que merecemos ou que não podemos modificar, temos que reagir e superar, a partir de uma atitude honesta, corajosa e crédula que muitas realidades podem ser mudadas para melhor. Como sempre falo aqui, principalmente em relações afetivas, casamentos, namoros, famílias, violação e exploração não devem ser aceitas! 
      Contudo, a pergunta inicial se refere a algo mais profundo, que vai além do mal que os outros fazem a nós, se refere ao mal que nós mesmos fazemos, contra os outros e contra nós mesmos. Temos consciência que também somos maus, que também somos injustos, que também escolhemos mal? Ou em nome de nosso prazer achamos desculpas para fazermos qualquer coisa e pensamos que isso é legítimo porque temos direito à liberdade e a usufrutos? Um ser humano maduro avalia os outros mas também se avalia, é exigente com afeto recebido mas também é correto com o que dá aos outros.
      Digo agora algo aos mais velhos, aos que já tiveram oportunidades de errar e de acertar, aos que sabem discernir o mal dos outros do mal de si mesmos. Avaliar a vida de maneira geral no tempo, entender a grande maioria das dores que experimentamos como consequências de erros nossos e portanto merecidos, não erros dos outros, ainda que tenham sido erros que cometemos quando nos permitimos viver sob relações injustas e violentas, é atitude de profunda humildade espiritual, de assumirmos nossa parte na existência e de não jogarmos a culpa nos outros, na vida ou mesmo em Deus. 
      Procuramos sempre que possível analisar um tema sobre todas as perspectivas, assim enquanto é sábio verificarmos até que ponto não somos vítimas, mas merecedores do que recebemos neste mundo, também não é sábio dizermos que alguém sofre porque merece sofrer. Não julguemos porque não temos amor suficiente para sermos justos juizes, e porque não sabemos como cada um administra seu sofrimento ainda que merecido. Às vezes alguém que sofre por merecimento é mais feliz que alguém que agiu corretamente e por isso nos parece não ser merecedor de nenhum sofrimento ou injustiça. 
       Não gostamos, em sã consciência, de textos bíblicos como o inicial, que diz serei cauda e meu inimigo será cabeça, gostamos de ler o oposto, mas a verdade é que passamos grande parte de nossas vidas reais sendo mandados e oprimidos pelos outros, todos nós, de alguma maneira. Deve ser assim para que aprendamos o caminho da humildade, para sermos provados e então aprovados, e não estamos neste mundo por outro motivo. “Eu mereço grande parte das injustiças que sofro, se não pelo que fiz neste mundo por motivos que Deus sabe, e eu humildemente aceito isso, até o fim”.
      A palavra desta reflexão, assim como as últimas desta semana, são duras, mas palavras duras ditas pelo Senhor são orientações em amor. Elas não têm o objetivo de nos humilhar, mas de nos ensinar a viver corretamente, conhecendo a Deus e seguindo-o. Assim, sejamos humildes, aceitemos certas realidades, mas confiantes, Deus protege de maneira especial os humildes. “Melhor é ser humilde de espírito com os mansos, do que repartir o despojo com os soberbos. O que atenta prudentemente para o assunto achará o bem, e o que confia no Senhor será bem-aventurado” (Provérbios 16.19-20). 

07/07/21

Para onde a hipocrisia nos leva?

      “Conheço as tuas obras, que nem és frio nem quente; quem dera foras frio ou quente! Assim, porque és morno, e não és frio nem quente, vomitar-te-ei da minha boca.Apocalipse 3.15-16

      Quem convive por um tempo em igrejas cristãs, se for honesto, constatará hipocrisia, mas se for sincero verá que essa não existe só nas vidas dos outros, mas na dele também. Hipocrisia é dizer, mas não viver, mesmo crer e pregar a teoria, mas não conseguir pô-la em prática. A palavra de Deus que sai da boca de Deus por Jesus e chega a nós pelo Espírito Santo, sempre pode ser praticada, a não ser que não queiramos, já palavras de homens, mesmo contendo Bíblia e ditas de púlpitos, até podem ser vividas, mas só até um ponto. 
      Quem não vive não sabe e não deveria ensinar, e quem ouve esses falsos mestres fatalmente cairá na hipocrisia. A hipocrisia é o segundo de dois pecados, o primeiro é dar ouvidos a palavras erradas, o segundo é não assumir que essas palavras são erradas. O hipócrita, acima de tudo, quer agradar a homens mais que a Deus, quer aprovação de pessoas que são importantes para ele, morre de medo de ir contra a religião, e não pode admitir que não está conseguindo praticar aquilo que ela diz ser a vontade de Deus para sua vida. 
      Mas num determinado momento vemos que não somos só nós que não praticamos e mentimos a respeito disso, os outros também fazem o mesmo, nesse momento podemos nos revoltar, ver cair por terra um mundo no qual vivíamos e acreditávamos. Quando isso ocorre podemos ir para um de dois lados: ou largamos a fé mais pura e criamos um cristianismo conveniente, baseado em mágoa e ceticismo, ou então buscamos a Deus para saber o que ele de fato quer de nós. Ambas as escolhas nos colocarão em oposição à religião. 
      Existe uma terceira opção, que a maioria escolhe, é dizer que as coisas são assim mesmo, que ninguém é perfeito, que temos que aceitar as coisas dessa forma e que errados são os que se afastam das igrejas porque prestam mais atenção nas vidas alheias. Essa terceira opção na verdade é o álibi que muitos acham para serem hipócritas e viverem bem com hipócritas, eles não entendem que essa não é a vontade de Deus para ninguém. Esses não são sábios ou equilibrados, como podem se achar, mas os mornos do texto bíblico inicial. 
      Vencemos a hipocrisia com dois conhecimentos: primeiro desligando religião de Deus, segundo crendo que Deus tem mais para nós que a religião. O primeiro conhecimento é muito difícil de ser assimilado, principalmente na religião cristã com sede no Vaticano onde achamos pessoas que temem mais o papa que a Deus, só pensar que o que eles ouvem nos templos não é de Deus os faz sentir nas pernas as labaredas do inferno. Mas protestantes e evangélicos também têm esse terror, por isso muitos seguem hipócritas e infelizes. 
      O segundo conhecimento é o que separa meninos de homens, amigos de Deus de religiosos, ele é o fim da hipocrisia e o início de uma jornada rumo ao Altíssimo, onde a intimidade do Senhor é conhecida. O verdadeiro conhecimento de Deus é vida e na vida há prática de amor e santidade que religião não pode dar porque é conhecimento de homem, ainda que sobre Deus. Hipocrisia é inevitável, mas escolher o que seremos depois de constatá-la não é. O que escolhemos ser: hipócritas que temem a religião ou amigos do Altíssimo? 

06/07/21

Não traia um amigo

      “Adúlteros e adúlteras, não sabeis vós que a amizade do mundo é inimizade contra Deus? Portanto, qualquer que quiser ser amigo do mundo constitui-se inimigo de Deus. Ou cuidais vós que em vão diz a Escritura: O Espírito que em nós habita tem ciúmes?Tiago 4.4-5

      Quando pecamos, principalmente aqueles pecados mais secretos, que na maioria das vezes ninguém fica sabendo e que diretamente não prejudica a ninguém a não ser a nós mesmos, traímos um amigo, e isso, sim, de maneira objetiva e profunda, qual amigo é esse? O Espírito Santo. Sempre reafirmamos aqui que Deus, o Esprito Santo e Jesus (esse após ressurreição e ascensão), são espíritos, não homens físicos, e possuem qualidade morais superiores às dos homens. Dessa forma o Espírito Santo não se machuca, não se ira, não se afasta, mas nós, seres humanos encarnados, temos a percepção, em nossas almas limitadas pelos corpos físicos, que traímos o Espírito Santo quanto pecamos. Nos sentimos machucados, frios, distantes, e podemos até achar, como até escritores bíblicos acharam, que é Deus quem está ressentido conosco. 
      Isso nem tem tanta importância, o importante é sabermos que pecado tem um preço e que precisamos pagar esse preço. O preço não é algum tipo de trabalho para nos dar crédito para recebermos perdão, não, perdão é gratuito e o temos no momento em que o pedimos, o preço é adquirirmos e mantermos nossa sensibilidade moral. Morte espiritual nada mais é que frieza, insensibilidade afetiva, moral e espiritual, e muitos, ainda que bons cidadãos e mesmo bons cristãos, estão mortos. Mortos não fazemos amizades positivas, a não ser ligações com pares, outros mortos, insensíveis, escarnecedores das virtudes, maliciosos que não acreditam no perdão e em perdoados porque não pedem mais perdão e seguem não perdoados. Mortos não se importam em “machucar” o melhor amigo que podemos ter, o Espírito Santo de Deus. 
      Muda bastante nossa relação com Deus quando entendemos que o pecado não é algo que nos torna filhos piores, maridos piores, religiosos piores, não só isso, mas amigos piores, e não de qualquer ser, de Deus. Amizade é superior à relação entre patrão e empregado, entre general e soldado, entre senhor e servo, porque ela é uma relação entre iguais. Não, não somos iguais a Deus, ainda bem, ele é muito superior, em amor, santidade, poder e fidelidade, mas o Espírito Santo se coloca como nosso amigo, sempre disponível para nos aconselhar e consolar, então, quando pecamos, ele está ao nosso lado, assistindo-nos pecar. Se não sentimos vergonha fazendo algo errado na frente de alguém que nos ama e zela pela nossa saúde moral, então, algo muito errado está acontecendo conosco. Sejamos sensíveis e não traiamos um amigo. 

05/07/21

Nós confiamos em Deus!

      “Uns confiam em carros e outros em cavalos, mas nós faremos menção do nome do Senhor nosso Deus. Uns encurvam-se e caem, mas nós nos levantamos e estamos de pé.Salmos 20.7-8

      O salmista usa o argumento confiar em carros e cavalos num contexto de guerra física, onde esses veículos e esses animais conferem poder armamentista contra inimigos físicos. De fato carruagens de guerra e cavalos eram os equipamentos que permitam velocidade e proteção em conflitos de mil e quinhentos anos atrás, tê-los em quantidade com homens peritos em usá-los podia definir a vitória numa guerra. Contudo, o salmista, ciente disso, diz que confiar em Deus é melhor que confiar em carros e cavalos, ser autorizado por Deus para uma guerra, tendo Deus ao seu lado, confere mais capacidade de vitória que outros recursos, mesmos os mais atuais e tecnológicos.
      E nós, hoje em dia, em que guerras estamos envolvidos, e se estamos, quais são os instrumentos que os homens confiam para serem vitoriosos nessas guerras? Somos como qualquer homem, ainda que crendo em Deus, confiamos nas forças materiais, nas capacidades e ferramentas que os olhos podem ver, que as mãos podem construir e usar, que a ciência entrega? Ou de fato sabemos que um Deus espiritual e invisível é mais poderoso que qualquer coisa ou ser no universo? Os que não confiam em Deus encurvam-se e caem, ainda que bem preparados e mesmo bem intencionados, mas os que fazem menção do nome do Senhor se levantam, permanecem de pé e são vitoriosos para a glória de Deus. 
      Pode ter certeza que o rei Davi ia a guerras com ótimos carros, cavalos e cavaleiros, ele não desprezava a tecnologia de seu tempo, da mesma maneira nós hoje temos que ser sábios e esforçados, trabalharmos com a ciência do lado. Contudo, ainda que fazendo a nossa parte e com muita diligência, confiando a vitória no nome do Senhor, não no que temos ou fazemos, mesmo fazendo o melhor e tendo tudo que nos é possível. Ninguém seja insensato com a realidade física, com estudo, com trabalho, com ciência, mas também não seja cético com o mundo espiritual. Cavalos, carros, computadores, dinheiro, estudo, ciência, determinação física, tudo isso passará, Deus é espírito e é para sempre. 

04/07/21

Carne e espírito (2/2)

      “E todos os que criam estavam juntos, e tinham tudo em comum. E vendiam suas propriedades e bens, e repartiam com todos, segundo cada um havia de mister. E, perseverando unânimes todos os dias no templo, e partindo o pão em casa, comiam juntos com alegria e singeleza de coração, Louvando a Deus, e caindo na graça de todo o povo. E todos os dias acrescentava o Senhor à igreja aqueles que se haviam de salvar.” Atos 2.44-47

      Antes de seguirmos com a segunda parte da reflexão sobre carne e espírito, uma nota sobre a igreja primitiva de Atos. Muitos de nós, quando lemos o texto acima, pensamos achar o ideal máximo de vida cristã no mundo, concluindo os primeiros relatos do livro de Atos sobre a descida do Espírito Santo, a primeira pregação, os primeiros convertidos, enfim, a inauguração da igreja no mundo. Naquele momento, achar que uma vida comunitária, sem apegos materiais, dando prioridade ao espírito, fosse o final da vontade de Deus para os seus no mundo, podia ser algo até natural, afinal ninguém nasce adulto, passa-se por infância. O tempo registrado nos primeiros capítulos de Atos é justamente isso, a infância da igreja.
      Esse ideal, quase comunista, que recentemente provamos (anos 1960 e 1970), quando o movimento hippie de contracultura influenciou até o cristianismo, pode parecer um ápice espiritual cristão, mas é só infantilidade, parte de muitos equívocos que os primeiros cristãos tinham, incluindo a crença que a segunda vinda de Cristo era próxima (vede exortações de Paulo em II Tessalonicenses 2). Inocência tem seu tempo, mas mantida indefinidamente é prejudicial, todo o modo de vida descrito em Atos 2.44-47, principalmente as relações com bens materiais, não constitui caminho de espiritualidade mais alta para nós hoje, e crendo que é, seitas são criadas enganando muitos e alguns até à morte (vede Ramo Davidiano e Jim Jones).
      Existem dois tipos de meio termo entre os extremos da carne e do espírito, um é o das pessoas em conflito. Essas pessoas são materialistas, mas sentem-se culpadas por isso, o senso comum cristão as chama de carnais, mas elas podem até buscar espiritualidade em religião, ainda que experimentem constante guerra contra o pecado. Nesse meio termo se acha grande parte das pessoas atuais, gente que precisa viver a realidade, trabalhar para ganhar a vida, assim não podem se dar ao luxo de serem monges em retiro, e não são essa espécie de religioso simplesmente porque são pessoas normais e sadias, que querem ter relacionamentos afetivos, casarem-se, terem filhos, e nisso também, por si só, não há nada de errado. 
      O outro tipo de meio termo é o de pessoas equilibradas, que é o meio termo mais correto porque não nega a realidade deste mundo ao mesmo tempo que se prepara para a realidade do outro mundo. Alguns podem achar que é mais fácil ser espiritual se isolando, pode até ser, se isso for vontade de Deus, e a vontade de Deus para cada ser só Deus e o ser sabem, não podemos julgar ninguém. Contudo, se é difícil controlar certas coisas podendo usufruir delas, quanto mais tentando se abster totalmente delas, sendo mais claro, se é difícil, por exemplo, ao casado ser fiel, quanto mais ao solteiro. Mas a satisfação não está em ser solteiro ou ser casado, mas em estar em paz em Deus, e nisso é preciso equilíbrio entre corpo e alma. 
     Alimentar conflitos gasta energia, viver em guerra enfraquece ambos os lados, o segredo é deixar que dois lados distintos vivam, mas cada um no seu tempo e no seu lugar, sem que um lado guerreie contra o outro, mesmo porque em se tratando de corpo e espírito um lado só se livrará do outro após a morte. Ser guiado pelo espírito não é matar a carne, mas respeitá-la, e assim usar o corpo como templo do espírito, não como seu caixão mortuário. Um corpo debilitado não será instrumento eficiente para que o espírito brilhe, quanto mais vivo e mais limpo o corpo, mais forte é o fogo do espírito neste mundo. Viemos a este mundo justamente para achar o equilíbrio entre os dois princípios, não para que um anule o outro. 
      Neste mundo, a vitória do espírito não está na morte da carne, assim como a vitória da carne não está na morte do espírito, existem pessoas desenvolvendo espiritualidade, tendo comunhão com o mundo espiritual e ainda assim sendo pessoas carnais, por outro lado tem muitos tentando matar as inclinações da carne e ainda assim não sendo espirituais. Neste mundo, repito, a carne está no desequilíbrio, tanto pendendo para um como para outro extremo, o espírito não anula ninguém, convive com tudo em harmonia pois respeita o momento do homem encarnado. Cuidado com quem vive o tempo todo em igrejas tanto quanto com quem não sai de bares, esses estilos de vida podem ser aparentemente diferentes, mas são ambos prejudiciais. 

Leia na postagem de ontem 
a 1ª parte desta reflexão 
José Osório de Souza, 17/02/2021

03/07/21

Carne e espírito (1/2)

      “Digo, porém: Andai em Espírito, e não cumprireis a concupiscência da carne. Porque a carne cobiça contra o Espírito, e o Espírito contra a carne; e estes opõem-se um ao outro, para que não façais o que quereis. Mas, se sois guiados pelo Espírito, não estais debaixo da lei.Gálatas 5.16-18

      O ensino inicial de Paulo é correto, porém, pode ser mal interpretado, muitos entendem por ele que existe uma guerra, de igual por igual, entre os apetites do corpo e as virtudes espirituais, mas não é bem assim, não para quem tem alguma lucidez moral. O que ocorre não é bem uma batalha, mas a tentativa de dois sistemas distintos viverem ao mesmo tempo, o material e o espiritual, e neste mundo ambos possuem direitos de existirem. Deus foi cruel colocando na Terra sistemas antagônicos em um único ser? Não, não fez isso por crueldade, os desígnios divinos são bem mais altos, mas resumindo, esse é o único jeito que o ser humano tem para evoluir, tanto como organismos físicos, como espíritos eternos. 
      Algumas óticas religiosas propõem extremismos, a negação de todo desejo do corpo como único meio de atingir a espiritualidade mais alta, assim há monges e outros religiosos no hinduísmo, no budismo, no catolicismo, e mesmo em seitas evangélicas, onde castidade, regimes alimentares, jejuns constantes, exercícios físicos, abstinência de bens, uso de hábitos comuns ou mesmo de quase nenhuma roupa, enfim, o desligamento completo de vaidades para se ter vidas dedicadas exclusivamente a servir os necessitados, ou mais, viver em constante meditação, em exílio em locais retirados. Isso, contudo, não representa necessariamente a espiritualidade mais alta de Deus, pelo menos não é uma regra geral, para todos. 
      Os materialistas mais extremados, por sua vez, que não são aqueles que muitos cristãos chamam de carnais, já que não são seres humanos perdidos nos prazeres do corpo, ao contrário, podem ter vidas tão disciplinadas como as dos monges, não se ocupam em crer e conhecer aquilo que se refere à espiritualidade. Eles objetivam o mundo físico, a conservação do planeta, a boa qualidade de vida, suas causas estão em moda no mundo atual e constróem muito da agenda da chamada esquerda nova, e são esquerda mais por se oporem aos preconceitos e misticismos da tradição judaica-cristã que por serem marxistas ortodoxos. Eles têm como guia supremo a ciência, e nisso, em si, também nada tem de errado. 
      Se todos os seres humanos vivessem o ideal de espiritualidade que alguns creem ser o mais correto, o mundo não desenvolveria, os espaços não seriam povoados, a ciência, como consequência do crescimento populacional, não evoluiria para controlar o meio ambiente e produzir alimentos e outros recursos com mais eficiência. Isso é importante só para o corpo? Não, a preocupação da ciência em criar e manter um planeta melhor para as gerações futuras, faz com que avós e pais abençoem filhos e netos, já que isso cria condições para uma vida com menos preocupações com sobrevivência do corpo e injustiças sociais, o que permite sobrar tempo para ocupar-se com lazer, com artes e principalmente, com espiritualidade. 
      É importante que entendamos que o termo carne na Bíblia não se refere necessariamente ao corpo físico, apesar da inteligência moral e intelectual dos tempos bíblicos achar que se referia. Carne é tudo aquilo que nos afasta de um Deus Altíssimo que é puramente espiritual, assim os espíritos do mal, apesar de serem espirituais em suas constituições, são carnais em suas índoles. Já o homem neste mundo, ainda que encarnado, como Jesus foi, pode dar prioridade às virtudes morais superiores que o aproximam do Deus espiritual, e assim, ainda que num corpo físico, administrando necessidades físicas, ser espiritual. A carne não está necessariamente no corpo, nem a espiritualidade obrigatoriamente no espírito. 
      “Se sois guiados pelo Espírito, não estais debaixo da lei”, a lei é a primeira aliança que Deus fez com o homem através de Moisés, e ela é simples, quem obedece vive e quem não obedece morre, não necessariamente no corpo, mas no espírito, a segunda morte, visto colocar o ser distante de Deus. Mas quem consegue ser espiritual sozinho, sem a ajuda do Espírito Santo? Ninguém, por isso entendemos hoje que a lei evidencia a morte, mas não entrega vida. Temos vida por Jesus que nos dá de seu Espírito, esse nos atrai a Deus, se nos deixarmos ser guiados por ele, guia que se faz por uma voz mansa e clara em nossos corações, que nos conduz em vitória sobre a passageira carne e rumo à vida espiritual eterna. 

Leia na postagem de amanhã 
a 2ª parte desta reflexão 
José Osório de Souza, 17/02/2021