28/09/23

Seres independentes (5/7)

      “E disse-lhe alguém: Eis que estão ali fora tua mãe e teus irmãos, que querem falar-te. Ele, porém, respondendo, disse ao que lhe falara: quem é minha mãe? e quem são meus irmãos? e, estendendo a sua mão para os seus discípulos, disse: Eis aqui minha mãe e meus irmãos; porque, qualquer que fizer a vontade de meu Pai que está nos céus, este é meu irmão, e irmã e mãe” Mateus 12.47-50 

      Cristo priorizou a ligação do homem com Deus. Se isso hoje é uma revolução nas relações sociais, mais ainda no século um, numa sociedade baseada no patriarcado, no trabalho braçal, na manutenção de heranças, onde se priorizava filhos homens, para que o negócio da família fosse mantido. Jesus fez essa revolução estabelecendo uma nova espiritualidade, onde se constrói um novo tipo de relação entre Deus e o ser humano, um Deus não mais só o todo-poderoso distante e exigente, Senhor dos exércitos, destruidor dos inimigos, mesmo criador do universo, mas simplesmente amigo. Entendamos certo, Jesus não desprezou sua família, mas se houve alguém que deixou pai e mãe e se tornou um ser humano independente, foi ele, contudo, mais que autonomia social e financeira, Jesus tinha consciência de sua missão espiritual. 
      Normalmente, a quem somos mais achegados, a quem amamos mais, quem mais nos conhece e mais conhecemos? A família. Infelizmente isso não é regra, a vida não é filme e muitos de nós convivem com famílias machucadas, mal formadas, que nos deixaram marcas profundas de dor e solidão. Mas Jesus se refere à família ideal, que aprouve a Deus, por algum mistério, dar a ele como homem, eu creio nisso. Pois bem, Jesus disse que aquele que fizer a vontade de Deus, seu pai maior, pai de todos os espíritos, esse tem conexão mais íntima e importante com Deus que com seu pai no mundo, ou com outro membro de sua família. Diz-se que família não se escolhe, amigos, sim, nossa amizade com Deus não é imposta, é escolha que ele permite-nos fazer. Feliz aquele que é amigo de Deus e que faz sua vontade.
      Um ser humano relativizado, que era alguém por ser filho, neto, bisneto de alguém, conceito que fica claro nas incansáveis árvores genealógicas que lemos mesmo no novo testamento, legitimando a descendência davídica de Jesus (Mateus 1), cede lugar a um espírito independente. Algo significativo na vida do Cristo homem é o fato dele ter sido solteiro, não foi casado ou teve filhos, isso reforça ainda mais o novo conceito de espiritualidade que ele entregou, onde o ser é importante em si mesmo, não por fazer parte de um coletivo, seja de um povo ou de uma religião. Ainda assim a Igreja Católica, desde sempre, e as igrejas evangélicas, especialmente hoje por seu grande número, querem viver uma espiritualidade ultrapassada, fora do Cristo verdadeiro, onde são salvos só os que fazem parte de suas fileiras de adeptos. 
      Independência pede pela liberdade e a conquista. Somos seres livres? O evangelho ensina-nos só uma conexão, a do amor, se somos presos a alguém é por amor. Amor, contudo, verdadeiro e puro, conhece-se e a quem ama, não deixa-se ser oprimido e não oprime, amor não sente-se cobrado e não cobra, amor não teme. Liberdade com amor leva-nos a nos respeitar sem sermos egoístas e manipuladores, sermos felizes e não deixarmos outros infelizes por causa disso. Só somos de fato independentes com liberdade em amor. Quando acordarmos livres do corpo físico na eternidade, a avaliação a qual seremos submetidos, nos olhará como seres independentes, não como filhos de quem quer que seja, membros de igreja, de ordem secreta, de grupo religioso. Só viemos e sozinhos voltaremos, sejamos independentes, mas livres em amor. 

27/09/23

Jesus andava com pecadores (4/7)

      “Porquanto veio João, não comendo nem bebendo, e dizem: Tem demônio; veio o Filho do homem, comendo e bebendo, e dizem: Eis aí um homem comilão e beberrão, amigo dos publicanos e pecadores; mas a sabedoria é justificada por seus filhos” Mateus 11.18-19 

      Comparado ao ministério de João Batista, Jesus estabelece dois tipos de espiritualidade, aparentemente opostos, mas ambos úteis aos propósitos divinos. João é o arquétipo da negação de prazeres e vaidades da matéria, usando o isolamento para se manter forte, ele não devia ser alguém agradável, mas também não era subjetivo. João representava o típico profeta do velho testamento, aliás, ainda que sua vida tenha sido registrada em textos do novo testamento, foi o último profeta de Israel. Seu ministério tinha urgência, avisava que o velho estava acabando e que o novo começaria, mas em sua estética bruta, que deixava claro que o reino de Deus na Terra tinha sido abrangido para os céus, foi visto como endemoniado. Isso não devia fazer diferença para ele, sabia a vontade de Deus e a fazia, ainda que fazendo inimigos.
      Jesus apresentava uma nova espiritualidade, não mais para viver em riqueza no mundo, mas para gerar valores para o outro mundo, enquanto se vive aqui com serenidade discreta, ainda que no meio dos homens. É impossível esconder a luz mais alta num mundo em trevas, e ainda que soubesse calar para amar, os homens o identificaram e o mataram. Jesus homem não tinha vaidades, nem se fiava nas referências dos religiosos para viver uma espiritualidade que os agradasse e que os convencesse nas regras de seus jogos, ele tinha amigos no mundo, não na liderança religiosa. Onde fazemos mais amizades que em mesas de bar? Não estou dizendo que Jesus era alcoólatra e fútil, mas não era um falso moralista, fazia aquilo que os que se consideravam espirituais achavam mundano e isso deixava genuínos falsos moralistas confusos. 
      João Batista é bíblico, sua história está na Bíblia e podemos aprender muito com ela, contudo, ele não é o exemplo mais alto de espiritualidade para nós hoje, Jesus é. Há muitos evangélicos achando que santidade e consagração é viver nos moldes de profetas do antigo testamento, ir às praças pregar o fim do mundo e arrependimento para escapar do inferno, sim, Jesus fazia isso, mas de um jeito novo, o jeito que ele veio entregar à humanidade. Espiritualidade hoje não é se abrigar no templo e lutar por um reino de Deus na Terra, como os judeus faziam, mas é ser o templo do Espírito Santo e se preparar para o reino de Deus na eternidade, para isso temos que ser luz no mundo, singulares por dentro, mas plurais por fora.
      Será que entendemos a provocação do Cristo de andar com pecadores? Não é frequentar bares com amigos não cristãos, também não é ser assíduo em templos. Jesus andava com pecadores por amor, não por fuga ou prazer material, aliás, o que movia o Cristo em tudo era o mais alto e puro amor de Deus. Há uma certa esquizofrenia hoje em dia, e perdoem-me o termo que deve ser respeitado, muitos evangélicos conseguem ser uma coisa nas igrejas e outra em outros ambientes. Falam coisas diferentes, se portam diferentemente, têm dificuldades para serem íntegros, quando são os mesmos, são sem amor. Cristianismo do Cristo não é algo fácil de se viver, é preciso coragem, a que João e Jesus tiveram, ainda que sujeitando-se a fins terríveis. 

26/09/23

Cristo não veio trazer paz (3/7)

      “Não cuideis que vim trazer a paz à terra; não vim trazer paz, mas espada; porque eu vim pôr em dissensão o homem contra seu pai, e a filha contra sua mãe, e a nora contra sua sogra” Mateus 10.34-35 

      Seguindo na série de reflexões “Provocações do Cristo”, mais um texto bíblico que precisa ser entendido certo. Jesus não veio unir, veio separar. Esse ensino completa o ensino de Mateus 8.21-22, e de uma forma mais abrangente, aqui o Cristo revela que a diferença entre os seres humanos que o seguem em relação a outros, não só mudaria as prioridades do homem, pondo em segundo lugar mesmo pais e família, mas colocaria o homem em situação de confronto. Citando espada, Jesus fala de guerra física, obviamente esse é mais um daqueles textos bíblicos que temos que reinterpretar as palavras que foram usadas originalmente para falar ao homem do passado. Nesse caso é preciso fazer isso com muita ênfase, já que o ser humano, naturalmente propenso a embates violentos, pode se achar ainda com direitos mais legítimos a isso se acreditar que está lutando numa guerra santa em nome de Deus. 
      A Igreja Católica fez isso por séculos, perseguiu e matou em nome da religião, o pior pecado dessa religião, que ao meu ver inviabiliza qualquer possibilidade de vê-la como representante oficial e exclusiva do Cristo na Terra. Como sempre digo aqui, ainda que Deus tenha usado e use o catolicismo para entregar Jesus à humanidade, violência, de qualquer espécie, e evangelho, não se casam. Mas, então, por que Jesus usou palavras tão extremas no texto acima? Porque a diferença entre trevas e luz é extrema, para ser treva basta um por cento de escuridão, já a luz é sempre cem por cento clara. Novamente o ensino de Jesus é: conhecer a fazer a vontade de Deus é prioridade para qualquer ser na Terra, acima de qualquer outra aliança, ainda que a prática disso seja em amor, humildade, santidade e paz. 
      Se o texto bíblico inicial não nos autoriza de forma alguma a exercer qualquer espécie de violência em nome do Cristo, ele nos alerta que não existe forma de vivermos na prática o evangelho sem termos desafetos, e muitas vezes dentro de nossos círculos familiares mais próximos. O cristão não é inimigo de ninguém, ama a todos, ora por todos, abençoa a todos, mas os outros podem, ainda que às vezes de maneiras bem sutis, se colocarem na posição de inimigos dele. Desanimarmos, querermos desistir da fé, acharmos que é injustiça de Deus, é entendermos a coisa erradamente, provar certas injustiças e reagirmos a elas com espiritualidade é prova que estamos no caminho certo em direção a Deus. Preocupados devem ficar os que têm no mundo só amigos e quem aprove seu estilo de vida plenamente.
      Ser diferente sem ser alienado, eis o desafio. Ser conhecedor de mistérios sem ser arrogante, eis a vocação dos amigos de Deus. Ter entendimento para ser mestre, maturidade para ser ouvido, experiência para curar, mas ainda assim ser sempre aluno, ouvinte e submeter-se humildemente à cura, como irmão de todos, não como patrão ou juiz, eis a experiência que Jesus viveu e nos chama a viver. O mais importante é entendermos que luz e trevas, reino de Deus e reino do mundo, glória do céu e glória do homem, são incompatíveis. Isso pode legitimar ataques de imaturos, alimentar guerras religiosas e moralistas, incentivar agenda de costumes na política, mas fortalecerá no espiritual o foco em Deus. Cristão de verdade não entra em conflitos e dá ao ser humano direito ao livre arbítrio, como Deus dá, respeitando diferenças em paz. A guerra existe, mas está fora, não dentro do amigo de Deus. 

25/09/23

Que os mortos enterrem os mortos (2/7)

      “E outro de seus discípulos lhe disse: Senhor, permite-me que primeiramente vá sepultar meu pai; Jesus, porém, disse-lhe: Segue-me, e deixa os mortos sepultar os seus mortosMateus 8.21-22

      Deixem que os mortos enterrem seus mortos, se formos entender e aceitar o que de fato Jesus disse com essas palavras, aplicando-as a nossas vidas ou nas vidas de muitas pessoas que dão valor e respeito enormes a pais, avós e outros familiares próximos, acharemos a orientação do Cristo dura, mesmo, insensível. Não existe até um mandamento de Moisés que orienta honrar os progenitores? (Êxodo 20.12) Pois bem, a chamada espiritual que cada um de nós tem, dada por Deus, pode ter mais relevância mesmo sobre algo tão sério como enterrar um pai. O ensino, contudo, tem um mistério que pode passar desapercebido, deixa os mortos sepultar os mortos. Estamos mortos ou vivos? Quais nossas prioridades, Deus ou os homens? Amamos nossos pais, mas temos Deus à frente deles, ou somos escravos de tradições humanas? 
      Jesus não manda que desrespeitemos ou desprezemos os pais, mas ele diz que aqueles que ainda não nasceram de novo, que não possuem uma conexão espiritual com o Deus vivo, sabendo e fazendo sua vontade, esses estão mortos. Como tais, não possuem outras prioridades neste mundo senão a morte, e tudo que é feito neste mundo sem ligação íntima com Deus, segue para um único destino, a morte do corpo. Essa poderá revelar também a situação do espírito, que já havia no plano físico, a morte espiritual ou segunda morte, que só será manifestada no plano espiritual entregando o ser humano a um inferno. O que busca em primeiro lugar o reino de Deus tem sabedoria, conhece as prioridades de Deus, sabe o que fazer e o que não fazer, e terá coragem para obedecer a Deus, ainda que homens não entendam, condenem e o persigam. 
      Qual a sua prioridade na vida, está seguindo para a vida eterna ou ainda está enterrando mortos? Todos temos a obrigação em amor de cuidar dos nossos idosos, assim como esperamos em Deus que sejamos cuidados quando envelhecermos, mas que não façamos disso nossa missão principal. Muitos passam a vida em velórios, celebrando cadáveres, não necessariamente de pessoas, mas de memórias, esses valorizam a morte, mas não como passagem, como fim. É importante nos prepararmos para a morte, mas focando no que vem depois, na avaliação que a luz de Deus nos fará, na qualidade do céu que teremos, a morte é só um parto, por mais dolorida que seja é só um evento antes da vida melhor. Um feto está vivo dentro da mãe, mas de maneira limitada, só com a morte do corpo físico é que teremos a melhor liberdade, a espiritual. 
      Celebrar a morte é prender-se ao passado, tanto para o bem quanto para o mal. Manter velórios na mente é não ter esperança num futuro melhor, mas amarrar-se a coisas boas do pretérito. Mas isso pode ser mais fantasia que realidade, construções mentais podem ser mentira, ainda que baseadas em fatos passados. O passado na verdade nem foi tão bom quanto achamos hoje, não era quando o vivemos. Deus leva-nos a trabalhar para construirmos presentes melhores, com futuros gloriosos que priorizam virtudes morais, não prazeres vãos deste mundo. Contudo, a morte pior que armazenamos na cabeça é mágoa dos outros e culpas nossas, vivendo no presente baseados no pior nosso e dos outros, que hoje pode nem mais ser realidade. Nós podemos mudar assim como os outros, assim tenhamos vida no Espírito de Deus e esqueçamos de vez os mortos. 

24/09/23

Provocações do Cristo (1/7)

      “Naquele tempo, respondendo Jesus, disse: Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, que ocultaste estas coisas aos sábios e entendidos, e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque assim te aprouve.Mateus 11.25-26

      Se alguém hoje em dia acha que Jesus foi um religioso conservador, engana-se, Jesus homem era progressista e Cristo Deus continua sendo, hoje e para sempre. Jesus confrontou a religião oficial de seu povo, por isso ganhou antipatia e ódio de líderes religiosos judeus que acabaram levando-o à morte. Quem matou o Cristo não foi o mundo, mas a igreja de sua época e de seu povo, justamente porque ele disse não à tradição de Moisés, opôs-se à religião que se dizia dona da verdade só por ser conservadora de tradições. Ainda que o evangelho que ofereceu cumpra a velha aliança e de forma plena, Cristo entregou à humanidade uma novidade, que ainda que catolicismo e protestantismo teimem em engessar para poderem ter controle e mandar no mundo pela religião, segue atual e progressista. 
      A luz de Deus é sempre a mesma, mas o ser humano aperfeiçoa sua capacidade de ser exposto a ela e conhecer os mistérios do Altíssimo, dessa forma é impossível enclausurar o Espírito Santo, conservar numa cela o que é vivo, invisível, intocável e espiritual, que por isso está além de qualquer estagnação, assim como é impossível impedir a humanidade de evoluir. A igreja católica tentou fazer isso, muitos evangélicos que se denominam conservadores tentam fazer isso, ainda que se dizendo liberais na economia, e mesmo que não entendam que o ser conservador deles não é ser fiel a um Deus imutável, mas é prender-se a óticas passadas e humanas desse Deus, chamadas tradição. Nem o progressismo passado conservado se torna melhor por isso, o progressismo genuíno não pode ser conservado. 
      Por favor, entendam certo este texto, quando me coloco como progressista não estou dizendo que concordo com todas as causas de muitos que se dizem progressistas hoje no Brasil. Não sou, por exemplo, a favor do aborto, considero isso assassinato, baseado na mesma justificativa que muitas mulheres usam para apoiar o aborto, “meu corpo, minhas regras”. Um feto não é um corpo, ainda que dentro de outro corpo? Alguém pede autorização para ele quando realiza o aborto? E nem pode pedir, porque ainda que seja uma vida, corpo com espírito, não está desenvolvida o suficiente para responder por si, assim, deve ser protegida pelos outros. Matar o feto na barriga da mãe é o mesmo que matar um bebê recém-nascido, ou uma criança ainda imatura intelectualmente. Sim, há excessões, mas a regra é não matar. 
      Não sei para quem exatamente escrevo aqui, mas sei, pelas informações que o Blogspot me dá, que muita gente lê, tenho paz que é assim que tem que ser, sei de minha chamada e a cumpro com alegria, indiferente de aprovação pública de homens. Mas sei outra coisa, quem Deus traz para ler os textos da página “Como o ar que respiro” acha nela palavras que o abençoam, assim como sei que para quem não escrevo não há argumento que o faça mudar de ideia. A esse respeito, e de forma alguma me acho maior que ele, nem menor, na eternidade entenderemos os modos que Deus usou para aperfeiçoar as pessoas. Não tenho a pretensão de convencer cristão que se identifica como conservador, não há utilidade nisso, mas os que veem Jesus além da tradição de homens serão abençoados aqui. 
      Nas próximas seis postagens seguem reflexões sobre passagens bíblicas que mostram o Cristo progressista, em cada uma delas pode conter, numa leitura rápida e numa interpretação rasa, incoerências, pelo menos entre o Jesus real e aquele que nos foi ensinado nas igrejas. Como já disse outras vezes aqui, a religião que professamos, católica ou protestante, doutrinas, cânones bíblicos, liturgias, dogmas, sacramentos, são construções humanas. Jesus não escreveu nada, nem existe dele uma ordem dizendo que surgiria uma religião, uma denominação, uma Bíblia, que seriam representantes oficiais de seu ministério. Ainda que Deus tenha permitido e ainda use catolicismo e protestantismo, podemos questionar tudo isso, quem quiser verá que muita coisa não é assim como os homens dizem que é.

23/09/23

Perfeito com os perfeitos

      “Sede vós pois perfeitos, como é perfeito o vosso Pai que está nos céus.Mateus 5.48

      Deus é perfeito com os perfeitos! Mas quem é perfeito, ou melhor, quem é perfeito segundo a vontade de Deus? O que de fato é perfeição? O que Deus espera de nós como perfeição? Interessante que muitas pessoas procuram obstinadamente justamente o contrário em nós, imperfeição, mas é uma tendência de todos, não sejamos hipócritas, buscar defeitos nos outros para justificar mantermos em nós defeitos não resolvidos. O olhar de amor do Senhor sempre vê o copo meio cheio, acha e exalta nossas qualidades, revela nossos acertos, nos vê mais próximos deles, não mais distantes. O perfeito olha imperfeitos como merecedores de sua atenção, de suas virtudes, o perfeito é humilde e generoso.
      Isso já lança ao chão a noção equivocada que temos de superioridade, de perfeição, o perfeito abraça, não distancia, trabalha e serve, não usufrui de privilégios à distância. Quem é perfeito? Só Deus. Quem é perfeito segundo a vontade de Deus? Sob uma ótica eterna, ninguém, mas sob a visão do presente, daquilo que Deus pede de nós agora e aqui, por mais incrível que pareça, todos nós podemos ser. Muitos sofrem com sinceridade porque se sentem culpados e frustrados, porque não se acham perfeitos, e isso não ocorre só com religiosos e cristãos. Materialistas e ateus também cobram de si mesmos mais que o necessário, porque querem aparentar para os homens virtudes que não conseguem viver. 
      Que referências usamos para definir perfeição, a Bíblia, o próprio Deus, Jesus homem? A melhor resposta é Jesus, através de sua encarnação Deus ensinou ao homem como ele pode ser perfeito neste mundo de forma objetiva e simples. Mas Jesus tinha seu nível de espiritualidade, assim como sua missão, ainda que ele seja nosso objetivo, nós não somos ele e nem precisamos ser, não hoje, talvez na eternidade. Deus pede pouco de cada um de nós para que possamos nos sentir felizes por agradarmos a ele plenamente, descobrirmos e vivermos isso é segredo de felicidade. A religião pede muito, homens cobram demais, nos estabelecemos objetivos a alcançar desnecessários, que só nos desviam do alvo. 
      O que é perfeição? Ela é relativa e nascemos com ela dentro de nós, viver é nos lembrarmos do que sempre fomos, mas que tínhamos medo de assumir, então, perseverar nisso para que não seja ideias em nossas cabeças, utopias, mas verdades de nossos espíritos. O ser humano que envelhece bem e amadurece corretamente poderá chegar a um momento de sua vida que se sinta bem resolvido, consigo, com o mundo, com Deus. Isso não é se deitar nos louros antes do tempo, desistir ou se achar perfeito, mas é sentir-se em paz. Teremos que segurar isso até o final de nossas vidas no mundo, isso é certo, ainda com trabalho no Espírito Santo, mas já estaremos iluminados o suficiente para sabermos quem somos e o que Deus pede de nós. 
      Coisa boa é ver a perfeição de Deus em nossas vidas, como as coisas, mesmo as difíceis, ocorreram do jeito certo, isso não é só o homem buscando sentido em sua existência, é harmonia do ser com Deus numa íntima amizade. Quem está no centro da vontade do Senhor verá a perfeição do Altíssimo até o final, numa velhice satisfeita e numa morte tranquila, colherá frutos bons e duradouros de sementes que foram plantadas no tempo certo, quando se fez tudo que se podia e nada se deixou para depois. Deus é perfeito com os perfeitos, se alguém não acredita nisso o problema não está em Deus, na vida, nem nas outras pessoas, mas em si. O humilde, contudo, sempre achará a perfeição a tempo. 
      A verdade é que o humilde está sempre numa posição perfeita, pois descansa em Deus. Não pensa de si mais que é, nada exige dos outros, não tem felicidade dependente do temporário e do ilusório, põe Deus na origem e no destino de tudo que acontece e faz em sua vida. Ao humilde não falta e nem excede, tem na medida, assim interpreta perfeição no que tem, gosta do que é e é o que gosta. O humilde não se culpa pelo passado, nem sofre pelo futuro, vive um presente eterno, o tempo dos espirituais, o tempo de Deus. Por isso é leve, puro e santo, assim eleva-se a cada dia para mais perto do Altíssimo, vivendo virtudes morais e segurando-as em paz. A perfeição está na humildade, na humildade somos perfeitos. 

22/09/23

Não temos que ser invencíveis

      “O Egito se tornará o mais humilde dos reinos e nunca mais se exaltará sobre as nações. Eu os diminuirei, para que não dominem sobre as nações.Ezequiel 29.15

      Para vencermos algumas fraquezas temos que aceitar que outras fraquezas são invencíveis. Vencedor não é quem vence tudo, mas quem vence o que importa, contudo, o único que pode nos mostrar o que importa vencermos é Deus. Posso testemunhar que só tive vitórias importantes em minha vida, de questões que passei muitos anos tentando vencer e não vencia, quando parei de lutar certas batalhas, dei por perdido certos assuntos, entendi o que Deus queria de mim e lutei as batalhas que ele me orientou lutar. Nas batalhas que Deus nos manda lutar sempre somos vencedores. Se você não está tendo vitória é porque está querendo vencer todas as batalhas, isso glorifica você, mas não faz a vontade de Deus nem o honra. 
      Algumas pessoas querem e bastante serem limpas moralmente, serem fiéis às suas alianças afetivas, serem santas, mas não abrem mão de humildade em outras áreas, por exemplo, na área profissional. Assim trabalham e trabalham, mas nem ganham o suficiente para satisfazerem suas vaidades e nem conseguem ser fiéis a seus cônjuges, desperdiçam energia nas lutas erradas e perdem a batalha principal. Não podemos vencer todas, algumas temos que perder para vencer outras, muitos até são vistos como vitoriosos financeiramente, mas têm vidas afetivas derrotadas, são escravos de ciúmes e de vícios secretos. O ponto não é sermos vitoriosos individualmente, mas sermos vencedores conectados ao Deus Altíssimo.
      Pecado é termo usado demais no cristianismo, tanto que muitos que se opõe ao cristianismo zombam do termo, acham-no coisa de gente insegura e cheia de culpas. Mas na verdade só existe um pecado, sendo as obras da carne e os vícios do corpo e da alma consequências desse, o pecado é: estar desligado de Deus. Veja que não precisamos ser ateus, promíscuos, criminosos, sem religião, não naquilo que aparentamos na sociedade, para estarmos desconectados de Deus. Mas até aquele que aparentemente não tem religião ou não acredita em Deus, pode estar conectado interiormente a Deus. Quem de fato anda com Deus é conhecido de Deus, sabe perder certas batalhas para vencer as que de fato importam, esse é humilde.
      Estar ligado a Deus não é só ser bom cidadão, trabalhador honesto, religioso atuante e fiel a doutrinas, estar ligado a Deus é pô-lo como início e fim da vida, assim fazer o que Deus orienta e ser vitorioso nisso para a glória de Deus. Desconectado de Deus, ainda que virtuoso, ou pelo menos aparentemente assim, em seu âmago busca honra para si, não achou e não vive a humildade que precisa perder para ganhar, morrer para viver, abrir mão diante do homem para ter o reino de Deus. Eu disse aparentemente porque o desligado de Deus não pode ser virtuoso. Não basta Deus ser parte da narrativa, mesmo o protagonista dela, deve ser origem e destino dela. Contudo, insisto, precisamos entender o que é estar ligado a Deus do jeito certo. 
      “Deus é Espírito, e é necessário que os seus adoradores o adorem em espírito e em verdade” (João 4.24). Por mais sinceros que vivamos, por mais fé que tenhamos, por mais religiosos e bem intencionados que sejamos, só tem um jeito de estarmos ligados a um Deus espiritual, pelo Espírito Santo, simples assim. Sim, Deus ouve a todos e sempre, mas o próprio Deus fica limitado em sua ação quando nossa relação com ele é só racional, e mesmo que seja emocional, encharcada de lágrimas, se não houver ligação pelo Espírito Santo não retornará do Altíssimo trazendo a melhor bênção. Se isso não acontecer continuaremos querendo vencer sempre, mas desperdiçando tempo e energia em lutas erradas, porque estamos lutando sozinhos. 
      Não temos que ser invencíveis, mas podemos ter a paz que excede todo o entendimento (Filipenses 4.7). Por isso vemos na Bíblia histórias como a do Egito, relatada no texto bíblico inicial, nações terem que ser humilhadas, espalhadas, diminuídas, para que, só então, não se exaltem sobre outras nações e sejam humildes. Infelizmente como vemos pessoas assim, se esforçando tanto, mas nas lutas erradas, porque querem ser exaltadas, como profissionais, diante da sociedade, da igreja, dos amigos, no meio familiar ser o filho, o cunhado mais próspero. Na exaltação não há felicidade, nem vitória sobre vícios e carências, vitória sempre está na humildade, que sabe perder para ganhar o que importa em Deus.