quinta-feira, setembro 28, 2023

Seres independentes (5/7)

      “E disse-lhe alguém: Eis que estão ali fora tua mãe e teus irmãos, que querem falar-te. Ele, porém, respondendo, disse ao que lhe falara: quem é minha mãe? e quem são meus irmãos? e, estendendo a sua mão para os seus discípulos, disse: Eis aqui minha mãe e meus irmãos; porque, qualquer que fizer a vontade de meu Pai que está nos céus, este é meu irmão, e irmã e mãe” Mateus 12.47-50 

      Cristo priorizou a ligação do homem com Deus. Se isso hoje é uma revolução nas relações sociais, mais ainda no século um, numa sociedade baseada no patriarcado, no trabalho braçal, na manutenção de heranças, onde se priorizava filhos homens, para que o negócio da família fosse mantido. Jesus fez essa revolução estabelecendo uma nova espiritualidade, onde se constrói um novo tipo de relação entre Deus e o ser humano, um Deus não mais só o todo-poderoso distante e exigente, Senhor dos exércitos, destruidor dos inimigos, mesmo criador do universo, mas simplesmente amigo. Entendamos certo, Jesus não desprezou sua família, mas se houve alguém que deixou pai e mãe e se tornou um ser humano independente, foi ele, contudo, mais que autonomia social e financeira, Jesus tinha consciência de sua missão espiritual. 
      Normalmente, a quem somos mais achegados, a quem amamos mais, quem mais nos conhece e mais conhecemos? A família. Infelizmente isso não é regra, a vida não é filme e muitos de nós convivem com famílias machucadas, mal formadas, que nos deixaram marcas profundas de dor e solidão. Mas Jesus se refere à família ideal, que aprouve a Deus, por algum mistério, dar a ele como homem, eu creio nisso. Pois bem, Jesus disse que aquele que fizer a vontade de Deus, seu pai maior, pai de todos os espíritos, esse tem conexão mais íntima e importante com Deus que com seu pai no mundo, ou com outro membro de sua família. Diz-se que família não se escolhe, amigos, sim, nossa amizade com Deus não é imposta, é escolha que ele permite-nos fazer. Feliz aquele que é amigo de Deus e que faz sua vontade.
      Um ser humano relativizado, que era alguém por ser filho, neto, bisneto de alguém, conceito que fica claro nas incansáveis árvores genealógicas que lemos mesmo no novo testamento, legitimando a descendência davídica de Jesus (Mateus 1), cede lugar a um espírito independente. Algo significativo na vida do Cristo homem é o fato dele ter sido solteiro, não foi casado ou teve filhos, isso reforça ainda mais o novo conceito de espiritualidade que ele entregou, onde o ser é importante em si mesmo, não por fazer parte de um coletivo, seja de um povo ou de uma religião. Ainda assim a Igreja Católica, desde sempre, e as igrejas evangélicas, especialmente hoje por seu grande número, querem viver uma espiritualidade ultrapassada, fora do Cristo verdadeiro, onde são salvos só os que fazem parte de suas fileiras de adeptos. 
      Independência pede pela liberdade e a conquista. Somos seres livres? O evangelho ensina-nos só uma conexão, a do amor, se somos presos a alguém é por amor. Amor, contudo, verdadeiro e puro, conhece-se e a quem ama, não deixa-se ser oprimido e não oprime, amor não sente-se cobrado e não cobra, amor não teme. Liberdade com amor leva-nos a nos respeitar sem sermos egoístas e manipuladores, sermos felizes e não deixarmos outros infelizes por causa disso. Só somos de fato independentes com liberdade em amor. Quando acordarmos livres do corpo físico na eternidade, a avaliação a qual seremos submetidos, nos olhará como seres independentes, não como filhos de quem quer que seja, membros de igreja, de ordem secreta, de grupo religioso. Só viemos e sozinhos voltaremos, sejamos independentes, mas livres em amor. 

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