03/06/22

Cura constante de Deus

      “Vede entre os gentios e olhai, e maravilhai-vos, e admirai-vos; porque realizarei em vossos dias uma obra que vós não crereis, quando for contada. Porque eis que suscito os caldeus, nação amarga e impetuosa, que marcha sobre a largura da terra, para apoderar-se de moradas que não são suas.Habacuque 1.5-6

      Na maior parte das vezes andamos espiritualmente cegos, não vemos o que Deus está realizando, e Deus trabalha o tempo todo em nossas vidas. Não se assuste, mas o instrumento principal de trabalho de Deus é o sofrimento, assim, os que de alguma forma não se permitem sofrer, negam o trabalho de Deus. Sem Deus trabalhar não há cura, portanto permanecemos doentes e assim com mais sofrimento, não o útil e que leva à cura, mas o inútil e vazio. Não vou me aprofundar no contexto histórico do texto bíblico inicial, mas resumindo, Deus diz que a nação de Israel, que no momento era cativa pela Assíria, seria livrada por uma terceira nação, a Babilônia dos caldeus, mais forte e que libertaria Israel por ordem de Deus. 
      O ponto é a afirmação, “realizarei em vossos dias uma obra que vós não crereis quando for contada”, portanto o fato de Deus agir de maneiras que nos são desconhecidas. Uma forma mais óbvia de interpretar o texto como lição para nós hoje é em áreas materiais. Se estamos andando com sabedoria, mas ainda assim falta a nós e a nossa família o mínimo para termos vidas materiais dignas, sigamos vigilantes, mas crentes. Não nos fiemos no que os olhos veem, nas possibilidades conhecidas, mas confiemos que Deus pode nos abençoar de maneiras que achamos extraordinárias, que denominamos milagres. Isso pode ser um aumento de salário, um novo emprego, enfim, algo que não sabemos e que já pode estar sendo providenciado. 
      Contudo, nossas jornadas no mundo, nossa convivência com necessidades e surpresas, nossas relações com outras pessoas, nossas escolhas afetivas e profissionais, tudo isso pode ser instrumento de Deus. Para quê? Para aperfeiçoar nosso caráter, nosso homem interior, nosso espírito. Se não doer não funciona, assim um trabalho novo do Senhor em nossas almas sempre causará, a princípio, sofrimento. Não confunda essa dor com culpa por pecado, mesmo com tratamentos injustos dos homens, com as aflições do mundo, isso pode ser usado. Mas Deus trabalhando em nós dói porque é sua mão extraindo algo ruim que está profundamente encravado em nós, tanto que achamos que faz parte de nós e que não podemos existir sem. 
      Interessante como nos apossamos de coisas ruins achando que são coisas boas, imprescindíveis, de muletas, achando que são pés, de óculos, jurando que são olhos, o espírito não precisa de artifícios. A questão é que não sabemos o que é necessário no tratamento, do gosto amargo que o remédio poderá ter, mesmo de efeitos colaterais, ainda que passageiros, mas desagradáveis. Enquanto você espera a resposta de emprego, achando que uma necessidade material tua precisa e será satisfeita pela mão de Deus no universo, o Senhor pode estar trabalhando para que você aprenda a ser paciente. O paciente não sofrerá com a ansiedade, e não buscará fuga nos vícios para dar prazer ao corpo que dói porque a alma não sabe esperar. 
      O que é mais importante, o emprego ou a paciência? Ambos, e viver neste mundo é achar o equilíbrio entre a matéria e o espírito, entre a sobrevivência diária no plano físico com honestidade e trabalho, e o aperfeiçoamento moral de nossos espíritos. Mas não nos esqueçamos, na eternidade não seremos julgados pelas nossas posições profissionais, mas pelo nosso nível moral. Melhorar dói, e dói o tempo todo, assim temos que buscar o Senhor o tempo todo. Aquela oração especial que fazemos no final do dia é de suma importância para aceitarmos e assentarmos o trabalho do Senhor dentro de nós, e quando estamos no ápice de um trabalho interior de Deus pode não ser fácil sairmos dessa oração em paz e confiantes. 
      Fé ajuda a abrir a porta, mas são as obras que nos fazem passar pela porta e conhecermos o que há dentro da sala. Não basta crer e estacionar, ficar contemplando o conhecimento de Deus, precisamos interagir com ele, colocá-lo em prática, ter coragem para vivenciar novos entendimentos, nos livrar de hábitos antigos que ficaram na sala anterior. Muitos param na porta porque ela mostra o desconhecido, assim até olham a próxima sala, mas com medo voltam atrás, afinal já estavam bem acostumados e confortáveis com o que havia na sala anterior. Mas a cura pede que sigamos em frente, com fé e trabalho que persistem em entrar ainda que o local seja desconhecido, só crescemos desafiando o desconhecido. 

02/06/22

Sofrimento como correção

      “Porque o Senhor corrige o que ama, E açoita a qualquer que recebe por filho. Se suportais a correção, Deus vos trata como filhos; porque, que filho há a quem o pai não corrija? Mas, se estais sem disciplina, da qual todos são feitos participantes, sois então bastardos, e não filhos.Hebreus 12.6-8

      Estarmos tristes pode ser por causas até patológicas, que necessitam de tratamento psicoterápico ou até de medicação, mas ainda que isso seja feito (e deva ser), Deus tem sempre um propósito em nos dar especificações de fábrica, principalmente aquelas que nos impedem de fazer certas coisas. São maneiras de nos colocar no caminho certo, de nos impedir de pecarmos, de buscarmos elevação moral e santidade espiritual. O humilde e temente a Deus verá as coisas sob esse prisma, e ainda que não se acomode, saberá que se respeitar certos limites e responder corretamente a alguns sofrimentos crescerá e terá aprovação de Deus. 
      Muitos limites existem para serem superados, eles nos impulsionam a trabalhar para que alcancemos a vontade melhor de Deus, nos permitem conquistas no mundo, mas também vitórias sobre passado, culpas, mágoas, vícios e ansiedades. Contudo, depois de buscarmos a Deus com todo o nosso coração, de nos avaliarmos e reavaliarmos, de nos reconhecermos e nos esforçarmos muito, entenderemos que certos limites que temos, em nossas facilidades ou dificuldades para fazer certas coisas e viver com certas pessoas e em certos lugares, não podemos e não devemos ultrapassar. Eles não existem para o nosso mal, mas para o nosso bem. 
      Se insistirmos perderemos mais que ganharemos, e então, não só nós mesmos, mas a própria vida e os homens nos resistirão com autorização de Deus. Deus usa nossos limites para nos orientar quando nos dá características físicas e emocionais, mesmo enfermidades. Sabe quando você se sente mal por ter feito algo e desconta na comida, mesmo sabendo que isso o engordará? Eis um limite teu, mas Deus também coloca perto de nós, principalmente na família, duros sentinelas, que a qualquer erro nosso nos cobrará. Alguns podemos evitar, mas com outros temos que conviver sempre, esses também são delimitadores permitidos pelo Altíssimo.
      Limites certos não nos impedem de fazer o bem, mas de fazer o mal, ainda que a princípio nos pareçam coisas boas, esses limites nos fazem sofrer e é importante que entendamos que nem todo sofrimento é negativo. Vivemos especialmente um tempo onde as pessoas não querem sofrer, muitos coaches, palestrantes motivacionais, livros de autoajuda e mesmo pregadores cristãos, têm exagerado na orientação dada a coachees mimados, burgueses e orgulhosos, que todos podem ter uma vida onde os sonhos podem ser realizados (frase tão presente em filmes da Disney), assim muitos fogem do lado positivo do sofrimento. 
      Todos não podem tudo e sempre, só Deus pode tudo e sempre. Mas como sistema de alerta para o mal, Deus pode nos permitir sofrer diretamente por ações espirituais. Sim, Deus pode usar anjos e demônios, uns para nos consolar e os outros para nos atormentar, e nesse último caso temos que buscar o Senhor urgentemente e colocar nossas vidas em ordem. O mundo espiritual tem grande influência sobre nós, principalmente sobre nossas mentes e sentimentos, isso é algo que a maioria dos evangélicos não liga muito, crê que o diabo impede-os de ganhar dinheiro, não de usufruir paz, não entende que o mal pode ser mental. 
      Obviamente é preciso sabedoria nessa percepção, se não poderemos ser levados a colocar a culpa do nosso sofrimento em algo externo, não assumindo nós mesmos responsabilidade por eles, e Deus só autoriza opressão em nossas vidas quando nós legalizamos essa ação antes, fugindo para as trevas. Quem anda na luz o mal não toca, seus sentimentos são tranquilos e felizes. O importante é sofrermos como filhos de um pai que nos ama, que é impedido de nos abençoar por nós mesmos, que não tem prazer nisso, mas que precisa autorizar isso para que aprendamos o melhor caminho para sermos vitoriosos, felizes e crescermos. 
      Alguns sofrem com qualquer coisa que lhes digam, mas eles não se poupam de jogar seus pontos de vista na cara dos outros, querem falar, mas não sabem ouvir. Se não sabe ouvir, não fale, sentir-se ofendido por muitas coisas não é fraqueza tua, mas limite permitido por Deus para que você não fale demais. Muitas vezes isso pode ser nem porque o que você tem a dizer seja algo errado, mas simplesmente porque não é para ser dito. Termos algo a dizer não nos confere legitimidade para dizer, não se quisermos andar na vontade de Deus, pode ser só para que oremos pelos que sentimos em Deus que estão enganados sobre algumas coisas.

      “Nos muitos cuidados que dentro de mim se multiplicam, as tuas consolações me alegram a alma.” Salmos 94.19

01/06/22

Para que vingança se há culpa?

      “Não vos vingueis a vós mesmos, amados, mas dai lugar à ira, porque está escrito: Minha é a vingança; eu recompensarei, diz o Senhor.Romanos 12.19

      Para que se vingarem de nós, quando temos que viver com culpa por nosso erros? Perdemos tempo e energia tentando destruir quem nos machuca, seja a ferida por causa de injustiça alheia ou devido a nossos melindres. Vingança é homicídio, ainda que fique só dentro de nós, é mais que dar o troco, é querer aniquilar quem nos feriu, a desejamos quando só achamos que ela pode aplacar nossas dores. Contudo, ainda que ela anule quem nos atacou, não anulará nossa tendência de vingança, essa seguirá conosco, tornando-nos violentos, rancorosos, instrumentos destrutivos.
      Quem acha na vingança um meio de resolver problemas não se atenta a algo básico, a culpa, que fica na alma de quem comete violência e injustiça, ela é a vingança natural que o universo usa. Culpa independe do outro, mesmo de dor que se causou a outro, pode nem depender de um mal real feito, visto que muitos se sentem culpados sem terem feito algo numa determinada situação, podem só terem culpas acumuladas. Mas mesmo na intenção da vingança, que quer que o outro sofra como fez sofrer, que dor é maior: a de um momento de vingança ou a de alguém ter que viver com culpa? 
      Pode-se argumentar, “quem me magoou nem se deu conta disso, não sofre pelo que me fez, vive como se nada tivesse feito, merece sofrer e já”. Engana-se quem pensa assim, muitos podem até não aparentar a dor da culpa, mas colherão o fruto do que fizeram, e quando isso acontecer a cobrança será muito mais adequada que qualquer vingança. Mas desejo de vingança revela dois problemas, o problema do outro, que pode ter feito algo errado contra nós, e o problema nosso, que temos uma mágoa não curada. A cobrança, por vingança ou não, resolve o problema do outro, não o nosso. 
      O nosso problema só é resolvido com perdão em amor, e isso não é passar a mão na cabeça do errado, não é não ser justo, é “anular” de fato o outro, não sua pessoa, mas o mal que ele criou e manifestou contra nós. Nossa “vingança”, e desculpe-me por usar esse termo, deve ser contra o mal, não contra o malvado. Quem mata o malvado deixa viver o mal dentro de si, e na verdade não resolve problema algum. Mesmo morto o outro, o mal ainda terá prevalecido, então, de vítima o vingador passará a agressor, suscitando vingança de terceiros e mantendo vivo o mal em seu interior. 
      Anular o desejo de vingança também nos livra do equívoco de estarmos feridos por vitimismo nosso, não porque de fato alguém fez um mal contra nós. Muitas vezes ficamos magoados com pessoas que nem sabem que existimos, que nem tiveram intenção de nos fazer mal, e podemos estar feridos só por nos sentirmos desprezados. Contudo, que culpa tem alguém de não nos conhecer? Que culpa tem alguém de sermos recalcados e inseguros? Querermos nos vingar de alguém por simplesmente ser quem é e por isso nos causar inveja, é um mal dobrado que causamos a nós mesmos. 
      Nos curemos antes de querermos curar os outros, nos resolvamos antes de tentarmos achar no outro a culpa de problema que é só nosso, anulemos o mal dentro de nós e não seremos feridos por qualquer coisa e nem desejaremos vingança. O problema do outro é do outro, não nosso, mas se mantemos desejo de vingança o problema do outro passa a ser nosso, e o mal consegue seu intento, continuar vivo e ativo. O mal é como vírus, existe dentro de hospedeiro, Deus não produz o mal, esse foi gerado por seres, humanos e espirituais, acabar com ele depende do livre arbítrio nosso.
      Jesus foi o exemplo de quem de fato merecia vingança, porque ele sofreu sem ter merecido, mas nesse caso não só seu sofrimento como homem teve uma utilização alta e poderosa nas mãos de Deus, a salvação de todos nós, como mereceu reação de Deus, não contra Iscariotes ou os líderes religiosos judeus, mas contra o mal em si, geral e presente em toda a humanidade. A lei colhe-se o que se planta foi exercida em toda a sua abrangência, de maneira singular para todos os seres humanos, mas só porque Cristo não se vingou e agiu do jeito certo, amou, perdoou e esperou Deus reagir. 

31/05/22

Vinte anos de ensaio, vinte minutos de show (2/2)

      “Sendo, pois, Abrão da idade de noventa e nove anos, apareceu o Senhor a Abrão, e disse-lhe: Eu sou o Deus Todo-Poderoso, anda em minha presença e sê perfeito. E porei a minha aliança entre mim e ti, e te multiplicarei grandissimamente. Então caiu Abrão sobre o seu rosto, e falou Deus com ele, dizendo: Quanto a mim, eis a minha aliança contigo: serás o pai de muitas nações; e não se chamará mais o teu nome Abrão, mas Abraão será o teu nome; porque por pai de muitas nações te tenho posto; e te farei frutificar grandissimamente, e de ti farei nações, e reis sairão de ti” Gênesis 17.1-6

      Algo que me chama a atenção nas vidas de Abraão e Moisés (Êxodo 7.7) é a idade na qual eles, enfim, estavam preparados para servirem aos propósitos da providência divina, não eram nem um pouco novos, aliás, para os padrões atuais, eram bem idosos. Isso antagoniza com a ideia que equivocadamente temos de achar que a vida tem que se resolver rapidamente, se isso não acontece nos frustramos, desistimos e ficamos, qual crianças mimadas, desejando a morte. A morte chega para dois tipos de pessoas, para as que a merecem e para as que já gastaram todas as oportunidades que podiam ter para cumprirem suas missões. Não entendemos que muitas vezes o que chamamos de fim é só o novo e talvez o mais importante começo. 
      Não desista, talvez você esteja precisando só de um upgrade para cumprir tua missão, crer sem ver, receber novo nome e entender que ser amigo de Deus é melhor que ser amigo do mundo, como Abraão. Há um símbolo importante em receber novo nome, isso é uma das promessas aos salvos descrita no livro de Apocalipse (2.17). Espiritualmente nome é posição espiritual cuja mudança implica em aquisição de novos direitos espirituais, quando Abrão teve o nome mudado para Abraão foi colocado como “pai de muitas nações”. Só pela fé um homem de quase cem anos, sem filhos e com uma esposa de noventa anos (Gênesis 17.17), podia receber de Deus tal posição, mas ele creu e isso valeu para que nações e reis viessem a existir. 
      Não somos máquinas com datas de validade, somos filhos de Deus, se um celular a partir de um modelo não pode mais receber atualizações de sistema operacional, para nós não há limites se Deus quiser e puder agir. Deus sempre quer, mas nós precisamos autorizar, nem Deus vai contra nosso livre arbítrio, e muitos de nós só escolhem obedecer já envelhecidos. Contudo, bem-aventurados os que ainda que idosos, podem ser instrumentos do plano divino, para cumprirem suas missões de servir os homens. Por outro lado, tempo nada significa para Deus, ele nos usa com vinte anos ou com sessenta. Não faz diferença ele ter que esperar quarenta anos para estarmos prontos para uma missão, Deus não se cansa de esperar por nós, nunca. 
      Neste mundo, presos a corpo físicos, sofremos justamente por nos importarmos demais com o tempo, é claro que parte desse sofrimento é legítima, envelhecemos, adoecemos, ficamos mais frágeis e nossos corpos doem e nos limitam. Mas grande parte do nosso sofrimento, e que pode ser responsável por fragilizar nossos corpos, é sofrimento pelo orgulho, nos comparamos com outras pessoas e achamos que elas aproveitaram o tempo melhor que nós. Nos esquecemos do fato das pessoas virem a esse mundo com especificações diferentes dadas por Deus, portanto com provações diferentes, e consequentemente com oportunidades de configurações, updates e upgrades diferentes, assim sendo, tendo missões distintas. 
      Aceitarmos que não somos e não precisamos ser iguais a outras pessoas é vital para termos paz, assim, não precisamos nos sentir cobrados por ninguém, não se estivermos em comunhão com Deus. Se um parente é financeiramente mais bem sucedido que nós, que importa, se um colega tem mais facilidade para estudar e por isso é mais promovido profissionalmente que nós, que importa, se um irmão prega ou canta melhor que nós, que importa. Importa é descobrirmos em Deus quem somos, trabalharmos, com coragem e fé, para sermos melhores e melhores principalmente moral e espiritualmente, mais amorosos, mais justos, mais santos. Importa obedecermos e agradarmos a Deus, que nos fez e sabe o que temos que fazer e ser.
      Se puder leia os textos bíblicos com as histórias de Abraão e de Moisés, mas as histórias de Jó, José, Rute e Davi também são interessantes para entendermos quantas coisas e por quanto tempo o ser humano precisa passar para ser burilado pela vida e pelo mundo para estar pronto para uma missão. A regra é que a vida é longa e desconhecida, por tentar abreviá-la ou achar que pode ser previsível, é que muitos vivem sem nunca viverem, e permanecem só como figurantes da própria história, nunca experimentando o próprio protagonismo. Mas sempre há tempo, enquanto estamos por aqui, e muitas vezes só depois de vinte anos de ensaio, é que o palco se ilumina para que façamos vinte minutos de um show que mudará muitas vidas.

Leia na postagem de ontem
a 1ª parte desta reflexão
José Osório de Souza

30/05/22

Especificações, configurações, updates e upgrades (1/2)

      “E cumpriu-se a Escritura, que diz: E creu Abraão em Deus, e foi-lhe isso imputado como justiça, e foi chamado o amigo de Deus.” Tiago 2.23

      Updates e upgrades aperfeiçoam o processamento e disponibilizam novos recursos nas configurações, corrigindo e otimizando o funcionamento de softwares, sem que mudem as especificações originais do hardware, procedimentos que aprendemos a administrar para usar com eficiência computadores, tabletes e celulares. Eles também se aplicam às nossas jornadas neste mundo, ainda que sejamos superiores a máquinas, um exemplo disso foi a vida do patriarca Abrão. Era um bom homem, rico, casado, mas que fez uma aliança com Deus, teve o nome mudado para Abraão, entendeu o que é acreditar sem ver, e foi chamado amigo de Deus, eis alguém que passou por um processo de mudanças para cumprir um objetivo. 
      Devemos reconhecer e aceitar nossas especificações, elas nos acompanham por toda a vida, são nossa identidade, diferencia-las de configurações e melhorias é imprescindível para exercermos o que podemos fazer de melhor e sermos felizes com isso. Especificações tem a ver com vocações, dons, talentos naturais, que nascem conosco, facilidades que temos no desempenho de muitas coisas que independem de fatores externos ou do tempo. É claro que educação, formação e experiência aperfeiçoam nossas especificações de fábrica, mas não as modificam radicalmente. Muito de nossa felicidade está relacionado a gostar do que somos e sermos o que gostamos, numa sinceridade que é humilde e não é negligente ou invejosa. 
      Temos que conhecer nossas configurações e ajustá-las para que sejamos mais eficientes. Quando compramos um celular, lá naquele ícone com uma circunferência dentada, parecendo uma engrenagem, acessamos diversos parâmetros, eles nos permitem customizar o aparelho, deixá-lo mais confortável a nossas necessidades e preferências. Como seres humanos também podemos fazer escolhas, de atividades, de companhias sociais e de lugares, onde podemos ser mais eficientes. Todos não podem fazer tudo e bem, assim temos que aceitar especificações, mas podemos ajustar nossas vidas para que elas funcionem melhor, configurando nossas interações com nós mesmos, com as pessoas, com o espaço e com o tempo.
      Especificações não podem ser mudadas, mesmo com as melhores configurações, mas podermos fazer escolhas nos melhoram, ainda serão ajustes ao que sempre fomos, mas podem trazer à tona recursos que nem sabíamos que tínhamos. Essas escolhas podem ser pequenas ou grandes alterações, simples atualizações (updates) para nos adaptar a mudanças, ou extensas aquisições de recursos (upgrades), que utilizarão com mais eficiência nossas características originais. É preciso coragem, trabalho e fé para fazermos, não só ajustes de configurações, mas updates e upgrades, e só em Deus nos é possível entender e pôr em prática características importantes, que muitos passam a vida sem saber que as possuem. 
      Nascemos com especificações, na infância e juventude recebemos criação familiar e estudos que fazem updates nelas, mas é só na maturidade que aprendemos a ajustar nossas configurações para sermos mais eficientes. Contudo, com coragem, trabalho e fé, podemos receber em Deus grandes upgrades, que nos farão achar até que somos equipamentos diferentes dos originais, mas são só aquisições de conhecimentos que farão emergir aquilo que somos de melhor. As escolhas durante todas essas fases são provações, que nos melhoram como seres humanos, mas usar tudo isso para servir os outros são nossas missões. Só teremos jornadas completas se formos aprovados nas provações e cumprirmos nossas missões. 
      Todas essas simbologias usadas aqui significam que estamos presos a limites e destinos? Sim, mas isso não torna a vida menos surpreendente e instigante, pelo simples fato que não sabemos, pelos menos a princípio, quais são nossos limites e destinos. A aventura de viver é justamente testar, descobrir e vivenciar esses parâmetros, e muitos passam toda uma existência e nunca entendem isso. O desconhecimento de limites e destinos é propósito de Deus que nos leva a trabalhar, com coragem e fé, para que descubramos como ser felizes como seres humanos e úteis nas vidas de outros seres humanos. Não somos máquinas insensíveis, sofremos e nos alegramos, nos entediamos e nos apaixonamos, assim nos definimos.
 
Leia na postagem de amanhã
a 2ª parte desta reflexão
José Osório de Souza

29/05/22

Forte é quem pode dar vida

      “Mas contigo está o perdão, para que sejas temido.Salmos 130.4

      Quem é mais forte, quem dá a morte ou quem dá a vida? Quem faz morrer vence o outro, anula de vez um opositor, mas quem vence pelo ódio sempre terá novas pessoas para odiar. Quem faz viver, mesmo o que merece morrer, vence o outro e a si mesmo, e fechará a porta para ter novos opositores, pelo menos de sua parte. Vence a si mesmo porque supera sua vontade de matar, seu ódio, a insegurança de achar que só a morte de um opositor dará cabo a riscos para sua vida. Mas quem dá a vida vence também o outro, porque dá a oportunidade de um inimigo se tornar um amigo, grato por ter recebido misericórdia, não condenação, a vida, não a morte.
      Tantas vezes somos fortes para matar, mas não para dar vida, matamos não só corpos com tiros e facadas, mas também almas com palavras, e mesmo com sentimentos silenciosos, sem que ninguém saiba, podemos matar as pessoas dentro de nós. Mas essa é a maior mentira da violência, da vingança, do desabafo que achamos que temos direito de fazer verbalmente contra alguém que achamos que nos prejudicou, vencer o mal com o mal. Mal não anula mal, só o multiplica, só o bem anula o mal e cria mais bem, na exteriorização do mal não existe força, mas fraqueza, só o bem nos torna mais fortes, ser forte pode ser não fazer nada. 
      “O que despreza o seu próximo carece de entendimento, mas o homem entendido se mantém calado” (Provérbios 11.12), não fazer nada não é desprezar alguém, aí ainda que pareça reação de alguém superior é só arrogância, arrogância é se achar tão melhor que não precisa reagir a pessoas que considera inferiores. Mas o arrogante não aparentará superioridade para sempre, em algum momento será traído pelo ódio e pela insegurança que tentou esconder dentro de si e será revelado. Só o amor cala em paz a vingança, dando a vida, não a morte, Jesus não suportou injustiça por arrogância, mas por amor, ainda que soubesse que era filho de Deus
      Quem dá vida quando podia dar a morte, ainda que não seja amado será temido, e um temor muito mais legítimo que o que se tem pelo que mata, pois é temor da luz, não das trevas. As trevas amedrontam mas atraem os que querem permanecer nelas para um confronto ainda mais violento, já a luz causa temor e afasta os que querem continuar nas trevas. A luz vence silenciosamente e sem agredir pois ela dá liberdade para a presença de Deus, o Senhor da luz, que luta pelos que amam a vida, não a morte, pelos que perdoam e não respondem mal com mal. Vencer a morte é vencer primeiro a nós mesmos, para depois podermos dar ao outro a vida. 

28/05/22

Não brinque com pecado

      “Depois Jesus encontrou-o no templo, e disse-lhe: Eis que já estás são; não peques mais, para que não te suceda alguma coisa pior.João 5.14

      Brincar com o “pecado” é reincidir nele depois de ter noção que ele é errado e prejudica a nós e aos outros. Coloquei entre aspas porque nesta reflexão “pecado” pode representar vários tipos de erros que seres humanos, cristãos ou não, cometem. Alguns sabem que jogar lixo na rua é errado, mais ainda estando próximos a lixeiras, mas fazem, outros sabem que comer demais prejudica sua saúde, mas continuam comendo sem controle, outros já entenderam que trair o cônjuge machuca a si e ao outro, mas não cessam as traições. Citei três tipos distintos de “pecados”, um social, um físico e outro moral, qual é o meu?
      O pior tipo de irresponsabilidade é ter uma vida de pecado, principalmente na área sexual e conjugal, e usar o púlpito, e nem digo ir de vez em quando à frente do templo para falar alguma coisa, mas para pregar, tendo título oficial de pastor, pregador ou outro. Que escândalo, esses que não abrem mão da vaidade de serem vistos e aplaudidos por muitos, causarão quando seu pecado vier a público, que vergonha para o evangelho, mas também que preço caro pagarão. Brincar com o pecado, não levá-lo a sério e ainda posar de cristão, de “ungido”, de celebridade gospel seja na palavra ou na música, tem preço alto e doloroso.
      Com 62 anos de vida (45 de convertido) já vi muitos pagarem preços amargos por terem brincado com pecado, principalmente por terem sido irresponsáveis com chamadas ministeriais. De vergonha pública e destruição de famílias, a doenças terríveis, mortes por acidentes estúpidos e mesmo suicídios, isso porque muitos que passaram a vida como pastores não conhecem outro meio de sobrevivência, não só social como profissional, perder tudo isso pode ser algo que não dá para ser encarado. Não foi Deus que se vingou, Deus não se vinga, foram as leis divinas do universo cobrando efeitos ruins de causas ruins. 
      É preciso repetir aqui algo: as pessoas, principalmente protestantes, não entendem como Deus trabalha nas vidas dos seres humanos. Muitos cristãos acham que quando alguém vem para uma igreja, se batiza, tem seu nome no rol, e mais ainda, quando faz seminário e se torna pastor ou reverendo, a vida dessa pessoa é transformada como que num passe de mágica. Acham que essa pessoa já está pronta e nunca mais pecará, pelo menos aqueles pecados que tais consideram os maiores (como se pecado tivesse tamanho). Deus pode até trabalhar assim em algumas vidas, mas não em todas, cada pessoa tem história exclusiva. 
      O que Deus tem para as pessoas só saberemos quando elas partirem deste mundo, até lá a “temporada” de reformas, desconstruções e reconstruções, está aberta. Infelizmente, por não entenderem isso é que muitos pastores persistem em esconder assuntos que sabem que destruirão suas carreiras, persistindo na hipocrisia, consequentemente dando um alimento contaminado às ovelhas, mas principalmente, não resolvendo-se. Penso que o pecado pior nem é o pecado em si, e pecado todos nós cometemos, mas é esconder o pecado, isso impede Deus de trabalhar, aumenta o pecado pela mentira e perde-se tempo. 
      Divórcio? Às vezes causado porque o homem ou a mulher nem heterossexuais são? É algo muito triste, dolorido para as famílias envolvidas e mais ainda para filhos se houver, mas é melhor que a hipocrisia. A verdade é sempre melhor, nela Deus pode agir, reconstruir, mas para enfrentá-la há de se ter humildade e coragem. Grandes erros ocorrem por causa de grandes teimosias que existem por causa de grandes orgulhos, a revelação desses implicará em enormes humilhações, que desencadearão mudanças extremas. Mas ninguém se sinta só nisso, muitos precisam disso, mais gente que achamos, ainda que não assuma.
      O que leva à hipocrisia é achar que a vida tem que se resolver depressa, que tem que dar certo de cara, que não se pode errar. Muitos protestantes veem a vida assim, como veem de forma errada suas denominações e suas igrejas, considerando-as pedaços do céu, onde os que pisam não podem mais cometer grandes pecados, isso é arrogância. Isso é menos comum em igrejas pentecostais, que por receberem público com menor poder aquisitivo e pior formação cultural e estrutura familiar, em outras palavras, gente com perfil da maioria dos brasileiros atuais, são mais complacentes com quedas e reerguidas humanas. 
      Mas nas chamadas igrejas protestantes tradicionais, sem generalizar, o falso moralismo pode ser maior, por isso doenças psicológicas e até suicídios de líderes podem ocorrer. Novamente nos deparamos com o questionamento alarmante: que evangelho está sendo pregado nas igrejas cristãs? Aquele que dá novas oportunidades em amor aos humildes, ou o falso, que exige vida religiosa de aparências? Pecado é pecado em qualquer lugar e para todos, não deve ser suportado, mas cura para ele nem sempre é rápida e milagrosa, pode ser um longo processo no tempo, realizado no amor de Deus, e se possível, dos homens.