21/01/22

Prazer e identidade

      “Também os teus testemunhos são o meu prazer e os meus conselheiros.Salmos 119.24
      “Porque eu vos dei o exemplo, para que, como eu vos fiz, façais vós também.João 13.15

      Na minha ótica, já disse várias vezes que o papel de drogas ilícitas, maconha e cocaína por exemplo, é oferecer um prazer que anule uma dor insuportável. Talvez eu veja as coisas assim porque sempre tive uma luta muito grande contra a dor da alma, que a princípio não conseguia anular com vida com Deus, nem com os pecados mais convencionais e menos danosos, digamos assim, sexo, bebidas alcoólicas e outros prazeres mais lícitos do mundo. É certo que enfrentei sérias consequências na vida conjugal e profissional por causa disso, mas nunca recorri à maconha, cocaína e tabagismo. 
      Deus usou efeitos vergonhosos de más escolhas que fiz a princípio para anular a dor. Falsos cristãos, mais interessados em condenar que em curar, não ajudaram, e concordo que corroborados em sua falta de amor pela meu distanciamento. Mas como alguém que sempre viveu submerso pode saber que está afogado? Exigiram de mim lucidez que eu não tinha, que só obtive à medida que me esforcei sozinho, colocando a cabeça para fora, entendendo minha situação e permitindo que a mão de Deus me levasse à terra firme. Lutas solitárias têm um benefício, nos ensinam a confiar só em Deus. 
      Mas voltemos ao assunto, ninguém começa a usar drogas porque é ruim, usa porque é bom, incentivar jovens a não usarem drogas argumentando que elas são ruins é mentiroso e ineficiente. A solução, para não recorrer a prazer ilícito, ou que depois se torna vício, sendo, então, consumido não para se ter prazer e anular dor inicial, mas para anular a dor da abstinência do que viciou, é curar a dor inicial, aquela que fomentou o primeiro uso de droga. Quem tem dor da alma bem administrada, ainda que prove drogas uma vez, não se viciará, e isso não é incentivo para se provar uma única vez drogas.
      Contudo, muitos jovens usam drogas não só pelo prazer que elas dão ajudando a viver com uma dor terrível de alma, usam pela identidade que ela confere, sim, drogado tem uma identidade, de descolado e de poderoso. O drogado não se sente menos por ser drogado, mas mais, não só pela sensação de capacitação que a droga oferece, mas por lhe entregar um estilo de vida, jeito de falar, de andar, de se portar, de ouvir música, ele se sente um super homem, enquanto os outros são vistos como trouxas, otários, caretas. Por isso o drogado não se esconde, mas exibe com orgulho sua identidade alterada.
      No passado jovens já se escondiam na identidade alterada de drogado, aqueles sem caráter fortalecido para enfrentarem as consequências de vícios, já que droga ocupa o tempo e usa a força que as pessoas deveriam usar para estudar e trabalhar. Nos últimos tempos, contudo, isso tem se tornado mais comum, hoje todo mundo quer ter uma identidade descolada, isso parece até mais importante que simplesmente usufruir do relaxamento e da euforia que as drogas injetam no corpo e na mente. Ninguém quer ser normal, querem aparentar-se no controle, assim, parecer drogado está na moda, é chique.
      Por que essa obsessão atual por querer se parecer o que não se é, de se ter vergonha de ser visto como alguém bom e manso, de achar que ser humilde e santo são sintomas de fraqueza? Hoje é bonito ser feio e é feio ser bonito, e me refiro à beleza moral interior, não à aparência do corpo. Enquanto o corpo parece vagar sem rumo, enquanto o olhar malicioso olha algo que ninguém mais vê, enquanto as palavras são codificadas por gírias, para deixar claro que se está acima da realidade, não se importando com o que os outros pensam, o espírito está em trevas, feio, intimidado, fugitivo, atormentado. 
      Precisamos ser justos, essa busca de identidade no caos, no sujo, no alienado, não representa todo mundo, tem o outro lado. Nesse lado estão os de poder aquisitivo um pouco mais alto, que zelam pela saúde física e mental, que buscam na ioga serenidade e auto-controle, mas penso que esses são até mais alienados e mimados que os pseudo-drogados, e se consideram sinceramente superiores. Onde fica o exemplo de Jesus homem nisso tudo? Esse exemplo parece antiquado e falso, desconstruído como foi por um catolicismo e um protestantismo hipócritas e materialistas. Cristo hoje parece feio.
      Prazer na palavra recebida diretamente do Santo Espírito e identidade baseada no exemplo de Jesus homem, isso protege de ilusões da carne e da falta de amor do mundo. Até hoje luto contra as satisfações artificiais e passageiras da matéria, entendi que pessoas com problemas extremos precisam, não como escolha, mas como obrigação, de soluções extremas. Se outros podem ser dar ao luxo de terem comunhão espiritual com Deus até um ponto, pessoas como eu, viciáveis e escapistas, não, a nós só resta ter intimidade profunda com o Senhor, mas nós temos um privilégio, unção singular de Deus. 

20/01/22

Sopro de Deus!

      “E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra, e soprou em suas narinas o fôlego da vida; e o homem foi feito alma vivente.” Gênesis 2.7

      “Mas, vindo a plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei, para remir os que estavam debaixo da lei, a fim de recebermos a adoção de filhos. E, porque sois filhos, Deus enviou aos vossos corações o Espírito de seu Filho, que clama: Aba, Pai. Assim que já não és mais servo, mas filho; e, se és filho, és também herdeiro de Deus por Cristo.” Gálatas 4.4-7

      “Para que todos sejam um, como tu, ó Pai, o és em mim, e eu em ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste.João 17.21

      Já abordamos aqui ser amigo de Deus e não só soldado dele, e sobre ser íntimo de Deus e não só vitorioso em guerras físicas, desta vez vamos nos aprofundar na essência espiritual que todo ser humano tem e que o conecta com Deus. Se fôssemos só seres com o objetivo de nos aproximarmos de Deus para sermos melhores, nossa existência já teria sentido, mas só isso seria solitário e bem mais difícil de ser feito. Como filhos temos uma parte de Deus em nós, aliás nossa parte principal e eterna, o fôlego de Deus. 
      É o nosso espírito que consegue se comunicar com o Deus Altíssimo através do Espírito Santo enviado por Jesus. Jesus é início e fim, é começo pois enviou o Espírito Santo e é fim pois é a porta mais alta que recebe nosso espírito nas “asas” do Espírito Santo e o coloca nas regiões espirituais mais altas. O Espírito Santo vem à terra, toma nossa intenção e a leva a Jesus, a porta direta para Deus, acima de potestades, principados e outras potências e seres espirituais, existe um mistério muito importante nesse processo. 
      Negar a Deus não é negar algo fora de nós, é negar nossa essência, nossa razão de existir, o fôlego de vida que nos habita suspira pelo Espírito Santo, precisa dele para viver, se negamos essa vocação intrínseca morremos. Conhecer a Deus e seguir em sua direção não é só questão de opção, ainda que Deus respeite nossas escolhas contrárias a ele, também não é fraqueza de ignorantes e manipulados, mas é aceitar e viver aquilo que temos de mais profundo dentro de nós, a vida eterna. Nossa vocação maior é espiritual. 
      O trabalho mais nobre que o ser humano pode fazer, que o evoluirá para seu mais alto potencial, é não fazer nenhum trabalho. O paradoxo espiritual é deixar livre a essência interior que naturalmente deseja Deus e é atraída pelo amor de Deus. Tudo que pesa e amarra nos deixa parados espiritualmente e nos separa de Deus, espiritualidade nada mais é que leveza moral e emocional que se move para o Altíssimo sem amarras, deixando para trás toda ilusão da matéria e de seus prazeres, egoísmo, vaidades e maldades. 
      Contudo, o trabalho de permitir elevar-se o espírito não é algo fácil, na verdade é o trabalho mais difícil que existe, justamente por ser o mais simples, eis novamente o paradoxo que só entende quem busca humildemente o Senhor com todo o coração, o conhece e o segue. Aumentar a sensação de culpa, tentando mantê-la na alma por mais tempo possível, é uma falsa espiritualidade que muitos criam para tentarem provar a si mesmos e aos outros que ainda que pequem não gostam disso, isso só gera hipocrisia e peso. 
      Muitos provam infernos, não por odiarem o rei, mas por ser acharem mais reais que o rei. Muitos acreditam em Deus, mas por não conseguirem vivenciar sua vontade infringem a si mesmos remorsos infindáveis, não percebem que isso também é vaidade, é trabalho em vão. Deixemos a culpa como a uma mochila pesada que apesar de podermos ter levado por anos não faz parte de nós. Sermos simples para executarmos isso nos dá a paz que nos fortalece para não fazermos as coisas erradas e fazermos as certas. 
      Os autores bíblicos usaram vários termos na tentativa de definirem a relação seres humanos com Deus, criatura com criador, filho com pai, servo com senhor, amigo com amigo, como sempre, mistérios espirituais são difíceis de serem entendidos com conceitos do plano material, porque são espirituais. A verdade é que todos os seres estão ligados uns aos outros e a Deus, seja no plano material com limites, seja mais plenamente no espiritual. Viver esse mistério no Espírito Santo é se entender no universo e ser útil. 

Esta reflexão é uma resposta
à reflexão anterior, se puder leia-a
para entendimento melhor do assunto.
José Osório de Souza, 16/07/2021

19/01/22

Criatura, filho, servo ou amigo?

       “E criou Deus o homem à sua imagem: à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou.Gênesis 1.27

     “Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, aos que crêem no seu nome; os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus.João 1.12-13

      “Porque, quando éreis servos do pecado, estáveis livres da justiça. E que fruto tínheis então das coisas de que agora vos envergonhais? Porque o fim delas é a morte. Mas agora, libertados do pecado, e feitos servos de Deus, tendes o vosso fruto para santificação, e por fim a vida eterna.Romanos 6.20-22

      “Já vos não chamarei servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor; mas tenho-vos chamado amigos, porque tudo quanto ouvi de meu Pai vos tenho feito conhecer.” João 15.15

      Qual a nossa ligação com Deus? A teologia tradicional protestante trata todos como criaturas de Deus, mas filhos só os convertidos por Cristo, o catolicismo leva isso ainda mais a sério batizando bebês para que esses deixem o paganismo e sejam cristãos o mais rapidamente possível. O espiritismo e outras religiões são menos radicais, creem que todos são criaturas e são filhos de Deus, indiferente se servem ou se são amigos de Deus, com uma relação mais próxima das boas obras. 
      Os evangélicos gostam de usar o termo servo para diferenciar do simples filho, para eles o servo é um cristão mais consagrado que trabalha com mais esmero nos ministérios das igrejas evangélicas. Jesus disse que não chamaria seus seguidores de servos, ensinou que ainda que servos sejam obedientes a ele, não conhecem sua vontade com mais profundidade. Ele chamaria os homens de seus amigos, amizade essa que é possível não por qualquer religiosidade, mas pelo evangelho. 
      Numa relação de pai e filho existem coisas que não existem em relações de senhor e servo e de general e soldado. Por mais útil que possa ser comparar Deus a um senhor e os homens que trabalham para ele a servos, ou Deus a um general que lidera os homens que o obedecem como soldados numa guerra, a obediência de um filho a um pai envolve afeto. Não precisamos gostar, sermos mais próximos ou mesmo passar momentos de lazer com chefes, sejam empresariais ou militares.
      Nós servimos a patrões e capitães enquanto desempenhando uma tarefa, depois nos afastamos deles, mesmo que sirvamos com eficiência profissional eles podem nem nos conhecer intimamente ou terem características pessoais em comum conosco, eles só precisam de nossas habilidades e capacidades como funcionários e subalternos militares. Não é assim a relação de filho e pai, ela pode ter eficiência, mas nela existe uma parte afetiva forte assim como semelhanças mais profundas.
      A diferença é que um filho tem em sua estrutura os mesmos elementos que existem no pai, senão físicos, carne e sangue, semelhanças faciais e de outras partes do corpo, mas também e principalmente elementos emocionais, adquiridos por anos numa criação próxima, compartilhando o mesmo lar, a mesma casa, o mesmo estilo de vida, os mesmos sonhos e lutas. Um filho é um pedaço do pai, e repito, muito mais emocionalmente que fisicamente, é uma extensão dele, mesmo que negue isso.  
      “E ele negou outra vez com juramento: Não conheço tal homem. E, daí a pouco, aproximando-se os que ali estavam, disseram a Pedro: Verdadeiramente também tu és deles, pois a tua fala te denuncia. Então começou ele a praguejar e a jurar, dizendo: Não conheço esse homem. E imediatamente o galo cantou.” (Mateus 26.72-74). Pedro tentou convencer os homens que não tinha ligação com o Cristo, mas seu jeito o denunciou, quem anda com Deus é marcado para sempre. 
      Somos tudo, criaturas que nascem inferiores e que tendem à superioridade, só Deus é incriado. Somos filhos, ligados a Deus pelo amor, isso não é frio e “científico”, mas encharcado de carinho e cumplicidade. Somos servos, o trabalho mais nobre do ser é servir, a Deus e aos outros seres, é assim sempre e também será na eternidade, quanto mais superior é o ser mais deve servir. Somos amigos, íntimos de um Deus que por mais alto que seja nos trata como semelhntes e nos revela seus mistérios. 

Esta reflexão faz uma pergunta,
se puder leia a próxima reflexão, 
onde concluiremos o assunto. 
José Osório de Souza, 16/07/2921

18/01/22

Pôs meus pés sobre uma rocha

      “Esperei com paciência no Senhor, e ele se inclinou para mim, e ouviu o meu clamor. Tirou-me dum lago horrível, dum charco de lodo, pôs os meus pés sobre uma rocha, firmou os meus passos. E pôs um novo cântico na minha boca, um hino ao nosso Deus; muitos o verão, e temerão, e confiarão no Senhor.Salmos 40.1-3

      Um daqueles salmos onde o autor usa com primazia metáforas da natureza para descrever um ambiente emocional interior. Tirou-me dum lago horrível, dum charco de lodo, pôs os meus pés sobre uma rocha, isso é perfeito, pelo menos para mim, como me sinto tantas vezes nessa situação, diante de certas pessoas, tendo que enfrentar uma decisão, ou mesmo superar um passado que já pensava ter superado. Não achamos o chão, isso significa não conseguirmos ver referências que nos mantenham firmes, tudo parece rodar, se mover, nos esquecemos quem somos e o que conquistamos até então. 
      Como sempre, só nos resta orarmos a Deus, com muita humildade, com todo o coração e cheios de fé, pedindo que ele nos dê a mão, nos ponha de pé e nos firme sobre sua palavra, uma promessa de esperança. O que ocorre depois é simplesmente uma mudança de olhar, nos desprendemos do chão movediço, do charco de lodo, que no meio da luta parecia envolver tudo, e olhamos para o Deus Altíssimo. Achamos o ar, liberdade para respirarmos, perdão para darmos aos outros, forças para superarmos os ataques injustos do homem egoísta e falso, voltamos a viver, achamos de novo a paz. 
      No final de provas assim o louvor ganha legitimidade, fica novo, pois o Espírito Santo tem facilidade para descer, nos tocar e nos levar para o alto, o caminho espiritual para Deus fica desimpedido. O chão, antes um lago horrível, se transforma numa rocha, confiável, nos lembramos de quem somos, do que trabalhamos para ser o que somos, tomamos posse do que já nos foi dado e obtemos um bem precioso. Esse bem é um testemunho verdadeiro de uma experiência profunda com o Senhor, esse testemunho poderá ajudar a outros, cumprirá nosso propósito no mundo, sermos luzeiros. 
      Se as pessoas precisam de nossa paciência, se nós mesmos necessitamos de tempo para digerirmos as coisas e fazermos as melhores escolhas, Deus também necessita de nossa paciência, não por alguma limitação dele, mas por limitações de outras variáveis do universo que ele pode estar esperando resolverem-se para nos responder. É a isso que o salmista se refere quando diz “esperei com paciência no Senhor e ele se inclinou para mim”. Você tem tido paciência com Deus ou fica exigindo que ele resolva as coisas imediatamente, quando você pede? Ter paciência é ato de amor verdadeiro.

17/01/22

Não há virtude na ansiedade

      “Não estejais inquietos por coisa alguma; antes as vossas petições sejam em tudo conhecidas diante de Deus pela oração e súplica, com ação de graças. E a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará os vossos corações e os vossos sentimentos em Cristo Jesus.Filipenses 4.6-7

      O ansioso deseja uma coisa que ainda não aconteceu, mas acreditando que algo ruim pode ocorrer. Já o esperançoso também aguarda algo, mas na certeza que as coisas de algum jeito vão dar certo. Ansiedade só se transforma em esperança quando temos uma experiência viva com Deus em oração, onde conseguimos entregar algo, abrindo mão de querer ter controle sobre as coisas, confiando que Deus tem a posse do que entregamos e fará o melhor.
      Essa transformação requer consciência racional, mas também experiência emocional, e ambas só são possíveis com profunda comunhão espiritual em Deus. Disso assenta-se em nós a paz maior, que nos protege das acusações dos maliciosos e do ceticismo dos que não temem ao Senhor. Você sempre tem direito à paz, não se esqueça disso, assim não permita que situações ou pessoas construam contingências desnecessárias em você. 
      Ansiedade não alia trabalho a alguém, não há vantagens em andar ansioso, nos mostrarmos ansiosos não exibe para os outros que somos pessoas responsáveis, esforçadas, ocupadas, ansiedade não é virtude, não se ganha horas extras sendo ansioso. Ansiedade é oração que não foi feita, é doença construída em nossos corpos e mentes, é vaidade e incredulidade, é ver o problema maior que Deus, portanto, confiar em ídolo vazio, não no Senhor. 
      Muitos de nós, talvez a maioria, são ansiosos crônicos, disso nascem vícios buscados para que prazeres fáceis anulem a dor da ansiedade. Se todos devem ter vidas diárias de oração, muito mais os ansiosos, que podem transformar pequenos problemas em torturantes sofrimentos. O ansioso aguça sua criatividade de forma negativa, vive mais no plano imaginário e mental que no físico e real, a esse só experiência espiritual com Deus traz cura e paz. 

16/01/22

Abrir mão da coisa certa

      “Pois os braços dos ímpios se quebrarão, mas o Senhor sustém os justos. O Senhor conhece os dias dos retos, e a sua herança permanecerá para sempre. Não serão envergonhados nos dias maus, e nos dias de fome se fartarão.Salmos 37.17-19

      Em algumas situações, por mais que queiram e mesmo que se esforcem, muitos não conseguem mudar suas vidas, aceitar isso com humildade, seguindo com honestidade, principalmente quando o que tem que ser aceito é na área financeira, pode levar as pessoas a crescerem espiritualmente. Ainda que possa ser, não resiliência legítima, mas só aceitação passiva de uma situação onde se acomoda a ela, podemos crescer quando aprendemos a viver com a falta de algumas coisas. Mas e aquilo que temos e merecemos ter, conseguimos administrar bem, possuindo ou abrindo mão de possuir? 
      Com o que recebemos sem merecermos podemos nem nos sentir na responsabilidade de administrar, e isso em nada pode contribuir para nosso crescimento, ganhar uma fortuna em loteria pode até nos prejudicar e nos fazer piores que éramos antes de ganhar, o que fácil vem, fácil vai. Mas ter algo sabendo que se merece de alguma maneira, seja por se ter trabalhado para ter, ou por se ter recebido como herança e na herança há o mérito de se ser ligado legitimamente a alguém que tem algo, ter que abrir mão disso depois pode amadurecer muito mais que só aceitar uma situação de falta. 
      Citei a condição de herança porque um não tem culpa de nascer rico, como não tem culpa outro de nascer pobre, e tentem explicar a justiça de Deus diante disso, cristãos, baseados em sua doutrina tradicional. Tenho certa dificuldade de explicar isso assim, mas esse não é o ponto desta reflexão, o ponto é que indiferente do que recebemos podemos crescer espiritualmente neste mundo. O que não podemos é nos achar melhores, desconsiderando quem não tem, ou piores, odiando quem tem, a todos cabe humildade e ajudar quem não tem, e sempre há alguém que tem menos que nós. 
      A verdade é que quantidade não importa, todos podemos abrir mão de algo para que aprendamos a viver com menos, a não vangloriar-nos pelo que temos, para que cedamos um direito nosso por amor a alguém que precisa mais que nós. Quem dá nove partes de dez dá tanto quanto quem dá noventa partes de cem, mas quem dá uma parte de uma dá muito mais. Não somos avaliados espiritualmente baseados em aparência no mundo, em riquezas materiais, naquilo que a maioria dos homens considera muito ou valoroso, mas nas virtudes morais que nos permitem ser humildes e amorosos. 
      Muitos abrem mão de tempo de amar para trabalharem mais e serem prósperos materialmente, quando cresceriam mais espiritualmente se contentassem-se com menos, podendo trabalhar menos e amar mais. Outros são ociosos, têm tempo de sobra para amar e não amam, porque no excesso material sempre há dolo e negligência, mas deixando de trabalhar não beneficiam materialmente os que dizem amar. É tudo muito relativo, só Deus sabe o que alguém tem que abrir mão para crescer, se do excesso ou da falta, se de fazer ou de não fazer, se de reter ou de conceder, se de falar ou de calar.
      Não julguemos ninguém, mas não façamos as coisas para sermos vistos por homens, o excesso material sempre tem razão de existir na vaidade e no egoísmo, nos preocupemos com o que Deus pensa de nós, com o que ele quer de nós. Cada um de nós veio a este mundo com uma prova principal, ainda que muitas coisas aconteçam a nós, muitas perdas e muitos ganhos, existe uma coisa que nos é pedida que definirá toda nossa eternidade. Descobrir que coisa é essa, aceitá-la com humildade e vivê-la com temor a Deus, é o que nos dá o crescimento espiritual que nos acompanhará no outro mundo. 
      Tantos fazendo e acontecendo na vida, outros sofrendo e reclamando de homens, mas sempre fugindo dessa prova principal, assim têm existências inúteis, ainda que com tipos distintos de excessos. “Pois os braços dos ímpios se quebrarão, mas o Senhor sustém os justos… não serão envergonhados nos dias maus”, o que adianta se esforçar sem confiar em Deus? Dias maus chegam a todos, nesses dias uns não terão mais forças, porque se esforçaram no momento errado, outros acharão forças e paz quando muitos não acharem, porque confiam em Deus em todos os momentos e a ele são gratos.

15/01/22

Hobby, estilo de vida ou trabalho?

      “Mas tu, sê sóbrio em tudo, sofre as aflições, faze a obra de um evangelista, cumpre o teu ministério.II Timóteo 4.5

      Como você desempenha suas atividades religiosas, a oração, o estudo bíblico, os cultos: como hobby, como estilo de vida ou como trabalho? Alguns exercem religiosidade como hobby, gostam de ir a cultos e outras reuniões, sentem-se bem nessas atividades, têm respondidas questões importantes nelas. Esses apreciam o convívio social que essas atividades proporcionam, a sensação de pertencimento a algo maior, serem aprovados por um grupo, terem cúmplices, querem Deus, mas amam as pessoas que falam o que eles querem ouvir sobre Deus. Esses separam as coisas, têm outras vidas em outros lugares, usam uma sala de seus corações para religião, mas não ocupam a casa inteira com ela, por pouca coisa se mudam de igreja.
      Muitos têm nas atividades religiosas um estilo de vida, são os mais assíduos em cultos e conhecem profundamente suas doutrinas. Geralmente foram criados em igrejas, têm uma tradição familiar em suas crenças, se não se agruparem nos templos suas vidas não terão sentido, se pudessem viveriam dentro de igrejas, suas religiões são o único jeito que aceitam para viver e as aceitam sem críticas. Não dependem de opinião alheia para serem o que são e crerem no que creem, todavia, como amam extremamente algo, podem não gostar com mesma intensidade de outras coisas, mesmo que não externem isso e sejam educados com todos. Ligados à religião de homens, creem nela como a verdadeira e para mudar o mundo. 
      Outros exercem religião como trabalhadores profissionais, não precisam sentir para fazer, fazem porque é preciso, liderança de igreja é a que mais vê vida religiosa assim. Mas eles não são só líderes remunerados, há outros profissionais nas igrejas, que se sentem bem servindo, mesmo que não ganhem nada por isso, abrem e fecham templos, participam de vigílias em horários e lugares mais difíceis. Os hobistas saem e voltam, os “estilo de vida” são, digamos assim, meio alienados, mas os profissionais são a base de trabalho dos ministérios e a ligação desses com o mundo. A diferença entre eles e os outros é que são pragmáticos, têm noção que suas religiões não são perfeitas, e são mais politicamente corretos com outras religiões. 
      Você se identificou com alguma das análises? Sabe qual é o tipo mais correto? Na verdade os três, um pouco de cada um. Muitos precisam ver religião como algo socialmente sadio, não como um deus, mas como um meio para conhecer a Deus, e sempre achando algo bom, que faça bem, e se não fizer, que se mude, não de Deus, mas de templo, de igreja, mesmo de religião. Muitos precisam descobrir a felicidade que é ter na vida com Deus um estilo de vida, ao invés de ter isso na vida de bares, da noite, da bebida e das relações afetivas rápidas, mas novamente, não estilo de vida religiosa, mas de amizade com Deus, de forma natural. Outros, contudo, precisam entender a utilidade de trabalhar, não para uma religião, mas em Deus. 
      O que me levou a esta reflexão foi a experiência de vida com Deus como trabalho, e entenda certo, não com frieza, não no mau sentido de trabalho religioso profissional, que leva muitos a usar ministério como empresa com fins lucrativos materiais. Também não me refiro ao trabalho pela sobrevivência no mundo, que pode não precisar de qualidade moral, só de força física e preparo intelectual. Há um meio termo, e muitos são sustentados por Deus e de maneiras diversas para alimentarem os espíritos humanos com o pão da vida. Esses não ganham de igreja salário para desempenharem atividades em tempo integral, nem são reconhecidos como obreiros por homens, mas trabalham em segredo, servindo diretamente ao Senhor. 
      Deus chama muitos para esse trabalho direto, mesmo entre os que têm profissões seculares, entregando horas diárias para empresas para ganharem o suficiente para terem vidas dignas no mundo. O trabalho espiritual legítimo não depende de quantidade, mas de qualidade e fidelidade, quem é chamado para fazê-lo deverá estar disponível, não necessariamente para uma igreja ou para líderes cristãos, mas para o Espírito Santo de Deus. Os que têm essa chamada sentem uma inclinação forte, clara e em amor para ajudar os outros, mesmo que seja só intercedendo em oração. Apesar disso ter que ser encarado como trabalho, não é algo frio, mas vivido no calor do fogo do Espírito Santo e feito com humildade, de um jeito ou de outro. 
      Tenha religião como um hobby, tenha a amizade com Deus como estilo de vida, mas tenha o amor com que deve tratar os outros, ajudando-os, orando por eles, abençoando-os, como um trabalho, que deve ser feito todos os dias, pela fé, independente de como você se sente. Isso não é fazer a obra de Deus de qualquer jeito, mas é se esforçar para estar de pé, crente, mesmo com as lutas do mundo, com as injustiças dos homens, com as inconstâncias de nossas almas, mesmo com pecados do dia a dia (assumidos e perdoados), para ser instrumento do Espírito Santo para ser luz do Altíssimo no universo. Hobby pode ser vivido às vezes, estilo de vida é algo natural, mas trabalho é duro, e se não fizermos, ninguém fará por nós. 
      Que ninguém se escandalize ao ler que religião deve ser hobby, nisso, como sempre fazemos aqui no “Como o ar que respiro”, separamos religião de Deus. O ideal seria que nossas religiões e nossas igrejas representassem perfeitamente a vontade de Deus para os homens, no mundo e na eternidade, mas a história do cristianismo já provou que isso não acontece. Não é por isso que não devemos participar de igrejas, nem é por isso que não podemos descobrir o maravilhoso estilo de vida de Jesus, mas de um jeito ou outro todos somos chamados para trabalhar em Deus pelo próximo. Esse trabalho, mais que qualquer outra atividade, remunerada ou não, é o que leva os homens a crescerem e serem felizes, sentindo-se úteis no universo.