07/02/22

Deus e deuses para Israel (8/90)

      “Ouve, Israel, o Senhor nosso Deus é o único Senhor.” 
Deuteronômio 6.4

      Numa reflexão sobre eternidade, inferno e céu, pode ser interessante, para entendermos que o que Bíblia diz e as tradições ensinam sobre as coisas do fim podem não ser uma verdade atemporal, mas algo ligado a entendimentos de homens de outros tempos, vermos que também existem entendimentos limitados a um tempo sobre o início de tudo e o começo da relação de Deus com a humanidade. O senso comum cristão diz que Deus escolheu um homem, Abraão, depois um filho, Isaque, depois um neto, Jacó, depois um descendente desse, Davi, e finalmente um descendente desse descendente, Jesus, para manifestar à humanidade sua vontade. Mas essa escolha na verdade começou em Adão, passando por Sete, Noé e então Sem, para assim chegar a Abraão. Seja como for a Bíblia conta a história de uma nação específica. 
      Você já pensou o que achariam os seres humanos que viviam no extremo oriente, no sul da África, nas Américas, na Austrália, se soubessem da promessa que os judeus dizem que Deus fez a Abraão sobre a nação de Israel em Gênesis 22? Pensariam que Deus escolheu um homem, ou um povo, e desprezou os outros, ou você acha que existiam naquele momento só descendentes da família de Noé no planeta? A arqueologia já encontrou restos humanos em várias partes de mundo e não é possível que todos sejam descendentes de Noé. Mesmo que fossem, não poderiam mudar tanto de aparência (compare um árabe com um japonês, com um africano, com nativo peruano, com um aborígene australiano), e viajarem para tão longe do oriente médio, não em pouco tempo, onde a Bíblia diz que foram criados os primeiros homens. 
      Isso nos faz pensar em muitas coisas, não só sobre o fim, como sobre o início, se de fato toda a humanidade foi originada de um único casal do oriente médio. Não seria Gênesis, como todo o antigo testamento, mitos da história, não da humanidade, mas de um único povo, do qual hoje sobrou uma tribo, a dos judeus? Ou você tem alguma explicação de como os filhos de Noé conseguiram se reproduzir e darem origem a povos de todo o globo terrestre. Mas se pegarmos só Sete, com quem ele teve relações sexuais e formou famílias, com suas irmãs, com a descendência de Caim? A Bíblia, do começo ao fim, não pode ser interpretada ao pé da letra, mesmo Jesus foi um messias profetizado para o povo judeu, teve seu ministério entre judeus, ainda que seus ensinos tenham alcançado, a princípio, pelo menos a civilização ocidental. 
      Outra coisa importante para entendermos é o monoteísmo, na prática não existia nos tempos do antigo testamento. Nós evangélicos nos acostumamos a ler e compreender a Bíblia pelo senso comum que temos hoje, já sob a ótica das tradições teológicas, e não é bem assim. A Bíblia tem registros de momentos históricos diferentes, ela não foi toda escrita de uma vez, o antigo testamento sofreu alterações pelo próprio povo hebreu, vários  homens a escreveram. Isso ainda que alguns tenham escrito vários livros, como Moisés que escreveu o Pentateuco (cinco primeiros livros da Bíblia), Salomão que escreveu Provérbios, Eclesiastes, Cântico dos Cânticos (ou Cantares), Sabedoria (só nas Bíblias católicas), e alguns Salmos, Paulo que escreveu várias cartas, e João que escreveu um evangelho, cartas e o livro de Apocalipse. 
      A teologia tradicional é uma fábrica de argumentos para tentar explicar a Bíblia como os teólogos acham que a Bíblia tem que ser, não como realmente é. Mesmo a nação de Israel tinha dificuldades para aceitar seu Deus como único Deus, cria que seu Deus era o mais poderoso e que era uma nação privilegiada por ter sido escolhida por esse Deus, mas não estava certa que só existia esse Deus. Tanto era assim que volta e meia Israel deixava de adorar esse Deus, que identificava como o “Deus de Abraão, de Isaque, de Jacó”, e adorava outros deuses. Mas Israel não devia achar que estava indo para o lado do diabo por isso, mas só para outro deus, essa concepção maniqueísta que temos hoje, que divide poderes espirituais entre bem e mal, de Deus e do diabo, só ficou clara para a humanidade com o cristianismo católico.  
      Não significa que não havia homens com experiências espirituais profundas, que sabiam da existência de um único Deus acima de tudo, e que muitos desses registraram textos bíblicos importantes, mas faziam isso sob relevâncias de seus contextos, o que queriam promover para suas sociedades. Uma sociedade que se mantinha com guerras, dava valor a um Deus que desse vitória em guerras, um homem que separava o mundo entre seu povo e seus inimigos, não podia entender direitos iguais para toda a humanidade. Um povo materialista via a necessidade de qualidades morais para ter favores de Deus, mas favores no plano físico, não no espiritual. Israel não pensava em eternidade espiritual, e mesmo seres espirituais do mal não eram parte importante de sua prática religiosa, Israel via um reino de Deus no mundo, não na eternidade. 
      Mesmo que outras nações não estivessem em guerra com Israel, portanto fora da condição de inimigas, Israel não se via comissionada a evangelizá-las. Israel não se achava em papel missionário, ainda que homens como Daniel e Jonas tenham testemunhado Deus a outras nações. Pela ótica do antigo testamento parece-nos que só Israel conhecia o Deus verdadeiro no mundo, mais ninguém, você nunca achou isso estranho? O objetivo era obedecer a Deus dentro de uma nação com uma religião exclusiva, não havia o conceito de salvação pessoal, israelitas não viam homens de outros povos como semelhantes, eram gentios que não tinham privilégios em sua religião, apesar de haver regras para bom tratamento de estrangeiros. Por causa disso, será que é justo usar a religião de um povo fechado como referência para todo o mundo? 

Esta é a 8ª parte da reflexão
“Quem você será na eternidade?”
dividida em 90 partes, para melhor
entendimento leia toda a reflexão.

José Osório de Souza, março de 2021

06/02/22

O cristianismo e o tempo (7/90)

      “Ora o Senhor encaminhe os vossos corações no amor de Deus, e na paciência de Cristo.” 
II Tessalonicenses 3.5

      Quem você será na eternidade? A verdade é que pode ser melhor você nem se importar com isso. Seja teu melhor aqui e agora, é isso que você levará à eternidade, nem mais nem menos, o céu construímos no mundo e dentro de nós, o resto é fantasia, é superstição, manipulação de líderes religiosos para controlarem e explorarem os homens. Seremos melhores se bebermos da fonte original do cristianismo, principalmente as palavras diretas do Cristo nos evangelhos. O ensino da Bíblia feito em muitas igrejas sérias e bem intencionadas atuais, ainda que num número menor que há trinta anos atrás, muitas vezes mais confunde que ajuda, principalmente as últimas gerações, avessas à leitura e aprendizagem mais profunda de qualquer coisa, que querem aprender tudo com tutoriais em vídeos curtos, que mal sabem escrever o português. 
      Quem tem cabeça hoje para entender os protocolos da religião israelita do antigo testamento, os detalhes da construção do templo de Salomão, ou as profecias de Daniel e de João? Se aprendessem sobre a vida de Jesus já entenderiam o principal, já poderiam ter homens interiores melhores preparados para a eternidade. Por outro lado, aproveitando-se desse desinteresse por profundidades, é que as heresias se proliferam, simplificando o cristianismo à fé, aos dízimos, a não beber e não fumar, a legalizar o último casamento. Será que isso basta para termos direito ao céu, a melhor eternidade de Deus para os homens? Para muitos até pode bastar, Deus é amor e usa o que está disponível para alcançar os homens, não nos enganemos sobre isso, mas aproxima-se o momento em que será exigido mais da humanidade. 
      Já passamos tempo demais sendo alimentados com leite, logo, se não tivermos alimento sólido, não conseguiremos viver em Deus e muitos poderão negar de vez o cristianismo. Tudo que o cristianismo católico-protestante podia explorar da humanidade, já foi explorado, o que Deus pôde fazer, mesmo através desse cristianismo mutilado, logo não será mais o suficiente, não para salvar uma humanidade com acesso à ciência, que liberta de superstições e que facilita uma existência na Terra sem que os homens façam uso de crenças infantis no sobrenatural. O misticismo não basta mais, nem o da esquerda e nem o da direita, não é só o Deus ensinado pelo cristianismo que está caindo em descrédito, o diabo também está, e enganam-se os cristãos que acham que o mal está se fortalecendo e preparando um final onde possa prevalecer. 
      A noção de tempo do cristianismo sempre foi equivocada, isso não é privilégio de evangélicos atuais. A maioria dos cristãos, como ocorre com outros religiosos, se apaixona por suas crenças, pelo menos a princípio, nessa paixão quer deixar o mundo e se unir a Jesus no céu o quanto antes. Cristãos primitivos achavam que Jesus voltaria ainda no primeiro século, católicos também poderiam ter essa perspectiva principalmente durante crises mundiais como no período da peste negra que dizimou milhões. No século XX teve muito cristão que achou que o mundo acabaria nas guerras mundiais, há relato de seita que subiu a monte esperando a volta de Cristo. Sempre que um avivamento carismático ocorre, movimento que naturalmente infla os corações de paixão, as pessoas creem que o fim e a volta de Jesus são próximos. 
      Assim, cuidado, dizer “Jesus está voltando e temos que nos preparar”, pode não ser discernimento espiritual de gente mais ungida que as outras, mais santa que as outras, mas pode ser só paixão humana. Estar sempre preparado é o entendimento mais sábio, não esperando ou querendo que o mundo acabe, mas vivendo em vigilância todos os dias, mesmo que o Cristo só volte daqui a um bilhão de anos. Esse é um cristianismo maduro, o que se prepara mesmo sabendo que vai demorar muito, não por medo do inferno ou por sentir um final iminente, mas por amor a Deus que trabalha sempre a longuíssimo prazo, esse foi o ensino original de Jesus. Espiritualidade não gera ansiedade, mas serenidade e paciência, e ansiedade por coisas espirituais também pode ser pecado e conduzir a formidáveis enganos, abramos os olhos. 
      Nossa sensação de tempo, que pode importar mais que o tempo de fato, aquele medido pelo relógio e indicado pela rotação e translação da Terra, está bastante relacionada com nossa paz interior, quem tem paz, tem paciência, e quem tem paciência nem se liga ao tempo. Eternidade é existir desprendido de matéria, espaço e tempo, mas penso que tempo tenha uma relevância especial no plano espiritual, porque mesmo com um corpo transformado, não constituído de matéria física, e com liberdade para ir e vir na velocidade do pensamento, se houver no espírito “inferno”, a sensação de tempo será eterna. Já ao espírito que estiver em paz no amor de Deus, isso é, no céu, nem dará conta que tempo existe, quando estamos felizes não sentimos o tempo passar, se é assim no plano físico, muito mais será no plano espiritual. Glória a Deus! 

Esta é a 7ª parte da reflexão
“Quem você será na eternidade?”
dividida em 90 partes, para melhor
entendimento leia toda a reflexão.

José Osório de Souza, março de 2021

05/02/22

Verdades sobre o inferno (6/90)

      “Os ímpios serão lançados no inferno, e todas as nações que se esquecem de Deus.” 
Salmos 9.17

      Será que Deus criou um lugar especial, com um fogo que não para de queimar, para que lá sejam lançados aqueles que morrem sem Cristo? Ou será que os que estão longe de Deus, por estarem em pecado, já possuem dentro deles um sofrimento imenso, causado não por fogos externos, mas por culpa, por orgulho, por egoísmo, ódios e invejas, por desejo de saciar vícios que não podem ser satisfeitos, sendo essa condição de danação interna de fato o inferno real? Será que essa condição é eterna ou permanece só até o homem se arrepender? 
      O conceito do inferno que Jesus usou era o que estava disponível no tempo de sua encarnação, não era um conceito exclusivo da religião judaica ou trazido como novidade pelo evangelho, era um conceito das religiões pagãs, grega, romana e outras. Será que Jesus quiz dizer com aquilo que lemos, em várias passagens do novo testamento, que o inferno era uma região localizada no interior da Terra com um fogo perene para a danação, não dos corpos físicos, mas dos espíritos dos que morrem longe de Deus? Ou será que isso nem importa? 
      A verdade é que para aquele momento, no século I, não importava descrever o inferno como é de fato, com conceitos espirituais, morais e emocionais, importava é que as pessoas soubessem que há efeitos para as causas, e para aqueles que persistem em andar longe de Deus há tormento. Um povo com uma cultura que achava legitimidade divina para dizimar inimigos, incluindo mulheres e crianças, não poderia entender inferno de outro jeito, se não com referências de castigo físico, e não com dores mais subjetivas, morais e emocionais. 
      O ser humano só começou a entender e a aceitar seu mundo psíquico no século XIX, pelos estudos de Sigmund Freud que mapeou a psiquê humana. Conceitos tão popularizados hoje em dia, como depressão, síndrome do pânico, ansiedade aguda, não existiam para pessoas comuns de séculos passados, no máximo tinham noção de dores físicas e de opressões espirituais, essas últimas baseadas em superstições bíblicas. Não se sabia nem da existência de vírus e de bactérias e de suas influências no corpo, se acreditava no que se podia ver a olhos nus. 
      Por isso o inferno ensinado tinha que ser físico e visível, usando conceitos conhecidos como do fogo. Mas o espírito não pode ser consumido em sua matéria porque essa é espiritual, espíritos são eternos, não morrem, não perdem substância nem envelhecem. Por outro lado eles têm consciência e moral, e de uma forma muito mais livre que temos encarnados no mundo, se nossa consciência pesa aqui, pesará muito mais lá. Lá não haverá noites de sono, comida e bebida, relações sexuais e outros prazeres para apaziguarem consciências pesadas. 
      Outra verdade é que o que consideramos barbárie hoje em dia era estilo de vida da civilização do século I e de séculos anteriores. Ainda assim muitos púlpitos, centenas de anos depois, tentam achar coerência entre o Deus de amor do evangelho com o Deus vingador do antigo testamento, isso é insano. Essa é uma causa perdida porque é impossível de ser vencida, e não pode ser vencida porque é baseada numa mentira. Muita coisa que dizem que Deus é e faz na verdade é só a leitura de culturas ultrapassadas sobre o que Deus é e faz. 
      Lembremos que Jesus não escreveu nada, o que lemos de suas palavras foi registrado por outros, também doutrinados e acostumados com o senso comum sobre o inferno de seus tempos. Será que se tivéssemos palavras de próprio punho do Cristo elas seriam diferentes das que temos registradas no novo testamento que nos chegou? O erro, contudo, está em interpretarmos a Bíblia ao pé da letra, nos fiando na tradição religiosa e desprezando o ensino do mestre que sempre está conosco e que foi enviado pelo próprio Cristo, o vivo Espírito Santo. 
      O conceito do inferno como local criado especificamente para castigo eterno não bate com o conceito de um Deus de amor, mas se você quiser continuar aceitando isso sem pensar mais a respeito, a escolha é tua. Contudo, para quem conhece de fato o Senhor e quer viver seu amor, isso não importa, quem quer ser um ser humano melhor o faz porque isso é agradável a Deus, não porque entende de teologia ou conhece o mundo espiritual real. Quem teme a Deus não teme o inferno, seja ele exterior e eterno ou interior e temporário. 

Esta é a 6ª parte da reflexão
“Quem você será na eternidade?”
dividida em 90 partes, para melhor
entendimento leia toda a reflexão.

José Osório de Souza, março de 2021

04/02/22

Infernos interiores (5/90)

      “Portanto, irmãos, procurai fazer cada vez mais firme a vossa vocação e eleição; porque, fazendo isto, nunca jamais tropeçareis. Porque assim vos será amplamente concedida a entrada no reino eterno de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.” 
II Pedro 1.10-11

      Inferno e céu têm a ver com duas coisas: humildade do homem e amor de Deus. Deus sempre ama, mas o homem nem sempre é humilde. Trevas é ausência de humildade, inferno são as trevas de muitos seres arrogantes reunidos, não é um lugar, mas a reunião de consciências sem luz, que se negam caminhar para o amor de Deus. Não meus queridos, não nos basta viver um evangelho racional, cheio de argumentos, que nos dá abrigo em dogmas e teologias, que nos oferece explicações confortáveis. É preciso um comprometimento moral, que arranca do fundo dos nossos corações uma oração de quebrantamento, que persiste pelos anos, que não desiste mesmo que os homens nos desapontem, mesmo que as religiões sejam hipócritas, mesmo que as tentações da carne e do orgulho sejam avassaladoras. Céu se constrói. 
      A possibilidade de ver um inferno não eterno não nos faz mais frouxos com Deus, ao contrário, leva-nos a assumir mais ainda responsabilidades que são só nossas, de mais ninguém, essa é a ótica de adultos espirituais, não de crianças que só fazem o certo se o castigo for enorme. O mais adulto é fazer o certo ainda que não haja castigo, é deixar de fazer o errado ainda que não exista recompensa. O bem já é uma recompensa em si mesmo para os que veem a existência além do plano físico, mas uma eternidade espiritual. O tempo de sermos crianças que precisam de leis para nos mostrarem o que devemos fazer passou. Se o cristianismo no mundo tivesse entendido de fato o que o Cristo ensinou, o Espírito Santo já teria ensinado sobre isso, mas não entendeu, fechou os ouvidos para o mestre e seguiu infantil. 
      Duas lições importantes tiramos do texto inicial, a primeira é que o que nos protege de tropeços não é fazermos isso ou aquilo, muitas vezes só para termos aprovação de homens e mesmo de igrejas. O que nos protege é obedecermos a vocação e a eleição que Deus nos deu. Se tua vocação for ser um bom evangélico, seja-o, conheço crentes, de denominações variadas, que são seres humanos de qualidade por serem fiéis às doutrinas de suas igrejas, são assíduos nos cultos e abençoam muitos. Eles até podem crer numa eternidade “tradicional”, mas tenho certeza que são humildes e os humildes não serão surpreendidos na eternidade, não para pior, e muito provavelmente para melhor. Contudo, se você sente em Deus uma inclinação para ir além, e repito, se isso for vontade de Deus para você, você só será feliz se obedecer essa chamada. 
      A segunda lição que o texto inicial nos ensina está em “assim vos será amplamente concedida a entrada no reino eterno”, outra versão diz, “assim vocês estarão ricamente providos quando entrarem no Reino eterno” (NVI). Tenho a impressão, interpretando esse texto, que a melhor eternidade não será um céu único para todos, contudo, não é o espaço espiritual que poderá ser diferente, mas será o homem interior dos seres humanos que poderá variar, assim céu e inferno poderão ser, não lugares, mas posições espirituais interiores e individuais. A intenção deste texto não é achar na Bíblia apologia para teorias, não tenho interesse em forçar uma interpretação para provar algo. O propósito aqui é obedecer a voz do vivo Espírito Santo, nosso mestre maior, no qual não reside engano. Do que falo tenho certeza e autorização de Deus para dizer.
      Você com certeza já esteve num local que lhe parecia desconfortável, ainda que estivesse realizando-se lá uma festa, o ambiente parecia ruim porque você não estava bem, era seu interior que estava mal, não o lugar. Imagine um grupo de pessoas parecidas reunidas num mesmo lugar, angustiadas, desesperadas, remoídas em remorsos, sentindo-se sujas com vícios não resolvidos, pesadas com crimes e todo tipo de violência, pecados não perdoados e não esquecidos. Poderíamos chamar esse lugar de inferno, ainda que fosse um lindo jardim, com um vento calmo e fresco soprando, à beira de um lago de águas limpas. Sim, meus queridos, o inferno está dentro de nós, e o levamos para onde quer que formos. Deus não criaria um lugar assim, simplesmente porque não precisa criar, às pessoas bastam suas autoinflingidas penas.
      Não temamos o inferno, mas as coisas ruins não resolvidas acumuladas dentro de nós, não temamos o diabo, mas nos aproximemos do amor de Deus e nos sintamos satisfeitos. Ainda que se expulse os demônios, se a casa não for enchida com o Espírito de Deus o mal volta pior (Lucas 11.24-26), assim o perigo não está no mal, mas na ausência do bem, que deixa espaço livre para o mal. O inferno será eterno? Se você não tem fê para crer que não será, tudo bem, o cristianismo, ainda que limitado, conduz o mundo à Deus com essa doutrina há quase dois mil anos, Deus sabe o que faz. Contudo, creia num Deus de amor, não num Deus vingador, creia num Deus inclusivo, não num Deus que faz acepção de pessoas, creia num Deus maior que os dogmas, que ainda tem muito a revelar, assuma-se criança que pouco sabe e saberá mais. 

Esta é a 5ª parte da reflexão
“Quem você será na eternidade?”
dividida em 90 partes, para melhor
entendimento leia toda a reflexão.

José Osório de Souza, março de 2021

03/02/22

Crianças ou adultos? (4/90)

      “Quando eu era menino, falava como menino, sentia como menino, discorria como menino, mas, logo que cheguei a ser homem, acabei com as coisas de menino.” 
I Coríntios 13.11

      Você não diz a uma criança que ela deve olhar para os dois lados da rua antes de atravessar, você diz, não atravesse sem dar a mão para o pai, senão você será atropelada. Uma criança ainda não tem inteligência desenvolvida o suficiente para verificar a situação e fazer a melhor escolha, para ela, o medo de algo inflexível ocorrer, é o melhor ensino para livrá-la do pior. É verdade que se ela atravessar sem dar a mão para o pai ela será atropelada? Não de todo, há a possibilidade dela atravessar e, ainda que não olhe, nenhum carro esteja vindo e ela não sofra nada. Ela também pode ser uma criança com inteligência acima da média, que entenda que precisa olhar os dois lados, esperar ou não, e então atravessar, mas aí, ainda que tivesse consciência do que estivesse fazendo e de não sofrer nada com sua ação, ela poderia se vista pelos outros como uma criança desobediente.
      Essa metáfora não indica que a Bíblia minta, mas que é adequada aos homens dos tempos em que ela foi escrita, mesmo nela há ensinos antagônicos, sobre o amor, por exemplo, o antigo testamento nega amor aos inimigos, no evangelho é orientado a todos (Mateus 5.44). Se nós, como indivíduos, crescemos, melhoramos, adquirimos inteligência intelectual, porque isso não ocorreria com a humanidade? Não é óbvio, por tudo que temos visto da ciência, principalmente no século XX, que o homem tem se desenvolvido? E sobre os costumes sociais, sobre o casamento, sobre o papel de homem e de mulher, sobre os preconceitos com raça e sexualidade, não temos visto uma evolução desde o século XIX? Foi justamente para tentar negar, frear e controlar o desenvolvimento científico e social da humanidade, que a Igreja Católica tanto mal fez, tantos queimou nas fogueiras, torturou, enclausurou.
      Meus queridos, os ideais morais e espirituais nunca mudam, equivocam-se os que acham que textos como esse e outros, tanto do “Como o ar que respiro” como de outros autores, estão tentando defender o pecado e o diabo e desviar-se da Bíblia, do cristianismo, de Deus. Por este espaço eu defendo em alto, mas não mal educado som, que creio num Deus santíssimo, todo-poderoso, que enviou Jesus para que sejamos salvos à medida que praticamos seu amor, e crer em Jesus com salvador é só o primeiro passo para uma jornada em direção ao Deus altíssimo, onde está a luz mais clara de virtudes. Amo a Bíblia, é o texto religioso que por mais tempo tem iluminado a humanidade, com sabedorias eternas, na qual estão contidos mesmo mistérios que o homem atual, na média, não pode entender, nem viver. Contudo, existe amor divino num inferno eterno? Pense profundamente nisso, por favor.
      Quem você será na eternidade? Talvez exista a possibilidade de acordarmos na eternidade mentalmente da mesma maneira como saímos do mundo, apesar de com outra forma de corpo, composto de uma substância não material, seja lá qual for ela, semelhante àquela que Jesus tinha depois de ressuscitado, mas com o mesmo conteúdo moral que tínhamos antes da morte do corpo físico, com consciência, identidade e mesmo com limites. A Bíblia diz que depois da morte vem o juízo (Hebreus 9.27-28), não estamos negando isso, a questão é quanto dura a pena promulgada pelo juízo e a relação dessa com o amor divino. Talvez para muitos pode durar uma eternidade, mas talvez todos provaremos algum inferno, ainda que só por algumas horas. O que vai fazer com que isso varie? O aperfeiçoamento moral que fizemos com o nosso homem interior no mundo físico.
      Quem vigiou mais, buscou mais a Deus, se humilhou mais, praticou mais o evangelho verdadeiro, lutou mais contra suas capas e máscaras, não teve medo mesmo de parecer fraco e louco diante de homens, para agradar a Deus e deixá-lo aparecer e não o seu ego, esse poderá ir direto ao céu. Nosso melhor homem interior aparece fácil quando passamos a vida lutando para deixá-lo se manifestar, isso não mudará na eternidade. Contudo, os que viveram, ainda que no coração crendo em Deus, mas mantendo aparência de fortes, para não terem orgulho próprio riscado, para não mostrarem fraqueza, para pousarem-se sempre de vitoriosos e donos da verdade, esses terão certa dificuldade para serem humildes no pós-morte (Filipenses 2.9-11), quando todos teremos que nos curvar diante do Cristo, a manifestação mais plena de Deus no mundo, esses poderão provar “infernos”. 
      Não esperem aqui textos bíblicos que provem um ponto de vista, os que guiam suas vidas com Deus só naquilo que está explicitamente no cânone bíblico nem levem em conta esta reflexão. A crianças convém andarem de mãos dadas com seus pais, não tentarem fazer escolhas próprias, mas só seguirem as escolhas que outros fazem por elas. Isso está errado? De forma alguma, importa sermos coerentes com o que queremos acreditar e agradarmos a Deus nisso. Contudo, se a dúvida daquilo que você creu até hoje te encaminhar para uma vida mais santa, humilde e amorosa com o próximo, se novos questionamentos te fizerem um ser humano melhor, então, ouse. Mas faça isso conversando com Deus, buscando na paz e nos bons frutos autorização para aprender, e saiba, aos que estão preparados muito há para aprender, se o inferno pode não ser infinito, o céu é. 

Esta é a 4ª parte da reflexão
“Quem você será na eternidade?”
dividida em 90 partes, para melhor
entendimento leia toda a reflexão.

José Osório de Souza, março de 2021

02/02/22

O amor de Deus e o inferno (3/90)

      “Porque estou certo de que, nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as potestades, nem o presente, nem o porvir, mem a altura, nem a profundidade, nem alguma outra criatura nos poderá separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus nosso Senhor.” 
Romanos 8.38-39

      Quem você será na eternidade? Vou fazer uma conjectura, que pode não bater com a doutrina cristã tradicional, assim peço que a princípio você a considere assim, como uma possibilidade, uma pergunta para você tentar responder. Será que imediatamente após morrerem no corpo, aqueles que têm a convicção que são novos nascidos por Cristo, se acharão como novos seres, com corpos diferentes, sem os limites de matéria, tempo e espaço, será que serão seu melhor homem interior? Será que já estarão livres de culpas, de medos, de dúvidas, de ansiedades, de dores, e gozarão imediatamente de uma disposição “emocional” de paz? A doutrina cristã tradicional, pelo menos a protestante e a evangélica, não a católica que levanta a possibilidade do purgatório, ensina que sim. Se for isso, bom e fácil para todos os que vão para o céu.
      Por outro lado, e não podemos nunca nos esquecer dos dois lados e do caráter implacável da doutrina das penas eternas, essa “transformação” imediata e definitiva é terrível para os que são condenados ao inferno, não haverá jamais oportunidade para arrependimento ou comunhão com o amor de Deus. Assim, o amor dito eterno e geral de Deus, na eternidade só existirá para o salvos, não para os condenados. Você já se perguntou como um Deus perfeito e imutável pode existir num determinado momento cósmico “partido”, com suas virtudes divididas? Como pode ele seguir existindo sabendo que seres que criou e que um dia amou, estão num sofrimento irremediável? E se considerarmos a doutrina da predestinação isso fica ainda mais sério, Deus sabia de antemão que estava criando uns para o céu e outros para o inferno.
      Isso deixa ainda mais estranho o conceito do amor divino, se no céu estarão os que ele ama, no inferno estarão os que ele odeia, conclusão lógica, não existe outra maneira de existir um lugar ou uma posição espiritual como o inferno, que não é criação do diabo já que esse nada cria, sem que admitamos que é consequência de uma disposição divina oposta ao amor. Então, outra pergunta se levanta: Deus pode odiar, ter um sentimento assim tão humano? Bem, se interpretarmos a Bíblia ao pé da letra, de forma atemporal e como palavra direta de Deus, não como registro de interpretações humanas conectadas à cultura e à moral de tempos passados, creremos que Deus não só odeia (Deuteronômio 12.31), como se arrepende (Gênesis 6.7) e se vinga, tanto de seu povo quanto dos inimigos de seu povo (Levíticos 26.25 e Números 31.3). 
      Pode-se argumentar, Deus odeia o pecado, não o pecador, mas isso seria mais um argumento para inferno eterno não existir, pois que diferença há entre a consciência do homem no mundo e na eternidade? Na eternidade não pode haver arrependimento? Depois de uns mil anos de inferno penso que os seres humanos teriam muita chance de se arrependerem, contudo, a doutrina cristã ensina que ainda nessa possibilidade não haverá perdão com direito à melhor eternidade do Senhor, à luz mais alta no amor de Deus (Lucas 12.58-59 abre uma possibilidade da pena ser longa, mas não infinita). Minha intenção aqui não é concluir por você, mas te fazer pensar no que você diz crer, não basta aceitarmos doutrina cristã como dogma, é preciso, como sempre dizemos aqui, reavaliarmos baseados no Espírito Santo e na sensatez. 
      Talvez só exista um jeito de entendermos a verdade maior de Deus, aceitando que a Bíblia é construção de homens, principalmente de religiosos judeus e católicos, e depois entendendo que o termo sem fim, aplicado às penas, não é adequado. Será que inferno não terá fim ou só existirá enquanto o homem não se arrepender? Mas aí levantamos a possibilidade de haver arrependimento na eternidade, isso a Bíblia não ensina, mas se existir, por que a Bíblia não ensinou? Há uma resposta: homens de Deus, não negamos isso, falaram a homens de seus tempos de acordo com entendimentos de Deus de seus tempos, e usando recursos de convencimento para conduzirem a Deus os homens de seus tempos. Homens são homens em qualquer tempo, limitados, nem Jesus homem disse tudo, e como homem respeitou os homens de seu tempo.

Esta é a 3ª parte da reflexão
“Quem você será na eternidade?”
dividida em 90 partes, para melhor
entendimento leia toda a reflexão.

José Osório de Souza, março de 2021

01/02/22

Nosso homem interior (2/90)

     “Por causa disto me ponho de joelhos perante o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, do qual toda a família nos céus e na terra toma o nome, para que, segundo as riquezas da sua glória, vos conceda que sejais corroborados com poder pelo seu Espírito no homem interior; para que Cristo habite pela fé nos vossos corações; a fim de, estando arraigados e fundados em amor, poderdes perfeitamente compreender, com todos os santos, qual seja a largura, e o comprimento, e a altura, e a profundidade, e conhecer o amor de Cristo, que excede todo o entendimento, para que sejais cheios de toda a plenitude de Deus.” 
Efésios 3.14-19

      Quem você será na eternidade? Saber quem seremos não é tão difícil assim, talvez não seja o ideal de ser humano que aprendemos que temos que ser pelos púlpitos e pregadores, e que nunca conseguimos ser, mas poderá ser o melhor ser humano que conseguimos ser, ainda que interrompidos por momentos quando não somos. Quem já teve pelo menos um encontro real com Deus, e nisso somos confrontados com nossa natureza mais fraca, nisso imploramos por perdão, nisso alcançamos uma humildade real, nisso adoramos a Deus como ser espiritual mais alto, santo e poderoso, e nisso ganhamos uma misericórdia e um amor fáceis pelos outros, quem já experimentou isso viu o caminho melhor e mais rápido para o Senhor. Essa experiência nos marca e depois dela sabemos o melhor que podemos e temos que lutar para sermos. 
      Cristãos chamam essa experiência de conversão ou novo nascimento, o que ocorre nela é o que ensina Paulo no texto inicial, somos corroborados com poder pelo Espírito de Deus em nosso homem interior, Cristo passa a habitar pela fé em nossos corações e assim, arraigados e fundados em amor, podemos perfeitamente compreender a largura, o comprimento, a altura e a profundidade do amor de Cristo. Aproximar-se de Deus é colocar-se em seu amor, ser inundado por ele, é importante entendermos isso pois muitos querem se aproximar de Deus para possuírem poder para serem e terem, terem mais até que serem, e terem no mundo. Só o amor de Deus permite-nos ser nosso melhor moral, isso definirá nossa eternidade, o gérmen desse melhor está no que Paulo chama de homem interior, promessa de céu em todos nós. 
      Como você vê as pessoas? Como inimigas, opositoras, objetos de inveja, devedoras a você de atenção, de honra, de amor? Nossa vida no mundo é luta e dor, se não fosse assim não precisaríamos estar aqui, é isso que nos aprimora, e se precisamos ser aprimorados é porque não estamos prontos para a melhor eternidade com Deus. A eternidade, assim como o mundo material, tudo em fim, pertence a Deus, nesse universo ele atrai as pessoas para o seu amor, estejam elas onde e quando estiverem. Qual é a pior eternidade? É aquela em que as pessoas estão mais distantes do amor de Deus, não porque ele se afaste delas, mas porque as pessoas se afastam dele. No mundo ocorre o mesmo, Deus só entrega bênçãos do seu amor àqueles que querem, que escolhem estar próximos a ele. Os outros sofrem sozinhos por opção. 
      Quem tem uma experiência no amor de Deus vê as pessoas pelo olhar do amor de Deus, ainda que erre, que se enfraqueça, bastará uma oração para ser iluminado e enxerguar a si e aos outros pelos olhos de Deus. Na eternidade poderemos ser assim em todo o tempo, por isso Paulo enfatiza tanto a importância do amor (I Coríntios 13.13). Queridos, amor é mais que um sentimento, que aqui no mundo nos acostumamos a aliar com relação afetiva e sexo, é muito mais que isso. Deus ama o tempo todo, se ele deixasse de fazer isso por um segundo que fosse, o universo estaria em trevas terríveis e absolutas, haveria caos total. É o amor de Deus que mantém vivos, tanto seres humanos encarnados, como todos os espíritos e outros seres no plano espiritual. O amor de Deus é que move o universo para sua posição mais alta de luz e virtudes morais. 
      É difícil aceitar alguém que se diz cristão e membro de igreja e que não consegue amar as pessoas com o coração de Deus. Mesmo com as limitações afetivas que todos temos, na luta diária por sobrevivência, aceitar que um cristão não ache ao menos um instante do dia para ter um momento sincero e profundo de oração quando possa abençoar os outros em amor. Se temos o Santo Espírito em nós podemos receber e oferecer o amor de Deus, podemos dar liberdade ao nosso ser espiritual para ver o ser espiritual, que Paulo chama no texto acima de homem interior, dos outros. Sim, porque assim como nós temos dentro de nós, muitas vezes encapado por camadas e camadas de proteção que a dura realidade nos impôs, alguém puro, sincero, benigno, humilde, os outros também têm. Amar é poder ver o homem interior dos outros e sorrir. 
      Você consegue enxergar o homem interior dos outros, ou só enxerga capas e maquiagens? Quem não se conhece não pode conhecer os outros, só nos conhecemos quando conhecemos o Senhor, conhecer a Deus é experimentar o seu amor, esse nos transforma de dentro para fora. Como eu e você, muitos que aparentam “casca grossa”, certa estupidez, ou distanciamento, mesmo frieza, ou por outro lado emoções descontroladas, choram demais, riem demais, têm dentro deles um ser espiritual diferente desejoso de se manifestar. Viver neste mundo é uma oportunidade para que esse homem interior se manifeste. Alguns conseguem isso em menos tempo, muitos têm que ser humilhados para darem liberdade a esse ser, mas infelizmente, outros vivem e vivem e nunca deixam seu ser espiritual, sua verdade mais profunda, livre. 

Esta é a 2ª parte da reflexão
“Quem você será na eternidade?”
dividida em 90 partes, para melhor
entendimento leia toda a reflexão.

José Osório de Souza, março de 2021