05/11/19

Trindade e Tricotomia (“Mapa espiritual cristão”, 1/4)

1ª parte do estudo “Mapa espiritual cristão”

      “Porque estou certo de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as potestades, nem o presente, nem o porvir, nem a altura, nem a profundidade, nem alguma outra criatura nos poderá separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus nosso Senhor.” Romanos 8.38-39 


       Um mapa do universo físico e espiritual, considerando Deus, o homem e os seres espirituais, a relação entre esses e as prioridades e possibilidades de cobertura espiritual, eis a pretensão deste estudo. Antes de começar a ler, por favor, veja a imagem acima com atenção, a ordem é sempre de cima para baixo e da direita para a esquerda quando há setas. O estudo é dividido em 4 partes, que serão postadas entre terça-feira, 5/11, e sexta-feira, 8/11, sendo que no sábado, 09/11, será postado estudo na íntegra.

1. Deus

      Deus se relaciona com todos e tem poder sobre todos, em todo lugar e sempre, bem, esse é o senso comum, o que todos dizem, e é isso mesmo, contudo, Deus não pode ir contra uma coisa, a única coisa contra qual ele não pode se opor, contra si mesmo, contra sua própria palavra, contra suas determinações, suas leis, suas promessas. Assim, muita coisa que achamos que Deus pode fazer, e ele pode, mas ele não faz, é por um motivo profundamente sábio (e muitas vezes totalmente misterioso a nós homens encarnados), por algo que ele determinou desde o início dos tempos. Quer um exemplo? Existem muitos exemplos, principalmente no universo material, leis que regem o mundo físico e que são válidas para todos, a principal delas é a de causa e efeito, ou como muitos dizem, “aqui se faz e aqui se paga”, ou ainda, “colhe-se o que se planta”. 
      Religiosos orientais chamam isso de carma, e no plano físico essa lei é inexorável, mesmo os salvos espiritualmente estão sujeitos a ela. Isso permite a todos que trabalham justamente colherem prosperidade financeira, assim como dá a todos que praticam algum tipo de criminalidade o castigo justo, de um jeito ou de outro, ainda neste mundo. Como relatado no livro de Jó, capítulos 1 e 2, os seres espirituais, caídos ou não, têm permissão de Deus para desempenharem seus papéis na obra maior de Deus, nada fazem sem que Deus autorize, isso é uma lei eterna. Deus também se relaciona com todos os homens, salvos ou não, filhos ou não, religiosos ou não, a todos ouve e em alguma instância a todos responde, Deus está sempre acessível, isso é outra lei (Isaías 59.1-2).

2. Jesus Cristo

      Jesus é especial, não mais um criador de religião, não outro profeta, não só um exemplo de moralidade e de caridade a ser seguido, ele é muito mais que isso. A obra singular de salvação realizada por nascimento, vida, morte e ressurreição de Cristo, a necessidade que todo homem tem de crer nessa obra para se tornar filho de Deus, e a diferença que tem um novo nascido em Cristo em relação aos outros homens, diferença que concede ao ser humano o privilégio de ser abençoado também no outro plano, isso é o que o evangelho verdadeiro prega. Em Jesus, mesmo o tal do “carma”, pode ser anulado, se não no plano físico, no plano espiritual, mas algumas vezes, não sempre, até no plano material. Com Jesus o homem se torna diferente, Deus o trata de maneira diferente, os seres espirituais o veem de maneira distinta, em Cristo o ser humano recebe de Deus uma blindagem espiritual que o leva diretamente ao centro da vontade do altíssimo, sem ziguezaguear por qualquer entidade espiritual, sem perder tempo com os complicados caminhos dos seres espirituais caídos (I Timóteo 2.5).

3. Espírito Santo

     Salvos por Cristo recebem a marca do filho de Deus, o selo do Espírito Santo, esse protege o homem de possessão espiritual e dá ao ser humano autoridade para expulsar demônios e apossar-se de alguns territórios espirituais e físicos. O Espírito Santo é o único representante oficial de Jesus na Terra, não religiões, não a Igreja Católica, muito menos os protestantes evangélicos, e menos ainda qualquer pastor ou líder humano. O Espírito Santo é professor, o único que pode nos ensinar a vontade de Deus, o único que pode nos fazer entender a Bíblia sem preconceitos ou apesar dos contextos culturais e históricos. O Espírito Santo é a presença de Deus em nós, que faz de homens templos do Senhor, aquilo que patriarcas israelitas, reis judeus e profetas do antigo testamento desejaram, quando o tiveram por algum tempo, temos o tempo todo a partir de nossas conversões. Se há uma voz que o mal quer calar é a voz do Espírito Santo, mais que as vozes de religiões, de igrejas, de teólogos, de pregadores, ela é a voz da verdade, a voz de Jesus, a voz de Deus (João 16.7-8). 

4. O ser humano

      Tricotomia é dividir algo em três partes, sob o ponto de vista teológico é dividir o homem em três partes, corpo, alma e espírito. O corpo é a parte material, os instintos de sobrevivência, de preservação da espécie etc. A alma é nossos pensamentos e nossos sentimentos, que vêm de nossa mente e de nosso “coração” (não o físico necessariamente, mas o centro de nossas emoções), é o que nos define como seres, que nos dão identidade e que sobreviverão junto do espírito. O espírito é a parte espiritual, o “sopro de Deus”, que nos diferencia dos animais e que nos permite ter um contato mais íntimo com o criador e com os seres espirituais. Essa divisão não é consenso, existem maneiras diferentes de se dividir o homem, mas eu penso que essa facilita e simplifica as coisas (I Tessalonicenses 5.23). Bem, em relação ao mapa universal sob o ponto de vista cristão, algumas coisas são importantes saber sobre a comunicação dessas partes com Deus, com os homens e com os seres espirituais.

- O homem, em algum nível, pode se comunicar com o homem: aliás, o homem é um ser social que precisa se relacionar com pares, para formar família, para trabalhar, para comungar valores religiosos, para se divertir. A solidão pode ser uma opção às vezes (e às vezes é bem útil), mas não é escolha extrema para seres humanos sadios física e emocionalmente. Seres humanos precisam de seres humanos, todo mundo precisa de alguém para amar, como diz a canção. 

- O homem pode se comunicar com seres espirituais: se for convertido, selado com o Espírito Santo, pode expulsar demônios (Mateus 17), e em situações muito especiais, depois de consultar a Deus, pode falar com anjos (Daniel 10.5-7), mas não deve tomar qualquer tipo de iniciativa para falar com eles, mesmo com seres espirituais não caídos, com anjos de Deus, simplesmente porque não é necessário, podemos falar diretamente com Deus através de Jesus, porque alguém deve falar com os empregados se tem acesso direto ao patrão? Eu, pessoalmente, acho que mesmo que tentemos, fora de situações especiais, não podemos falar com anjos do bem, e se falarmos, eles não nos responderão, contudo, quem pode responder são os do outro lado, os anjos caídos, fazendo-se passar pelos do bem. (Em situações especiais devemos perguntar antes a Deus, em espírito e não em voz alta, se a presença que está nos aparecendo é anjo ou é demônio, lembro que isso é bíblico, no antigo e no novo testamento anjos apareceram várias vezes aos filhos de Deus). Ocultistas, espíritas e outros espiritualistas, todavia, tomam a iniciativa de comunicarem-se com entidades espirituais e são enganados achando que falam com bons anjos, falam com os das trevas, via de regra Deus não usa anjos bons para falar com pessoas que não o buscam, e mesmo com seus filhos, Deus usa anjos para comunicação e não para defessa, repito, só em situações muito específicas. Para defesa, sim, anjos lutam por nós, vejam o exemplo do profeta Eliseu (II Reis 6.15-17), mas ainda assim não temos que dar ordem a anjos, esse comando pertence somente a Deus. Quando oramos devemos pedir a Deus através de Jesus, quando exercemos autoridade a fazemos no nome de Jesus, e por mais nada ou ninguém, sejam anjos, entidades, homens, “santos”, seja lá quem for.

- O homem pode se comunicar com Deus, mesmo antes de sua conversão, e Deus ouve e abençoa, contudo, salvação espiritual só através de Cristo, assim é preciso uma experiência real de salvação, de novo nascimento por Jesus, para se ter acesso direto a Deus. O não convertido pode se relacionar com Deus, Deus se relaciona com todos, mas não pode ter comunhão com Deus, não pode ser habitado por Deus. O não convertido, ainda que religioso e moral, não tem o selo do Espírito Santo. Isso é uma lei universal, Deus não passa por cima disso, dessa forma mesmo que haja sinceridade, vontade, se a pessoa não se entregar totalmente, não pedir perdão, não recebê-lo por Cristo (e por mais ninguém) e não se comprometer a mudar de vida, Deus não poderá se manifestar de maneira plena ao homem.

Esta é a 1ª parte do estudo, leia no blog as outras 3 partes
José Osório de Souza, 23 de outubro de 2019

04/11/19

Perdoe, perdoe, perdoe...

      “Olhai por vós mesmos. E, se teu irmão pecar contra ti, repreende-o e, se ele se arrepender, perdoa-lhe. E, se pecar contra ti sete vezes no dia, e sete vezes no dia vier ter contigo, dizendo: Arrependo-me; perdoa-lhe.” 
Lucas 17.3-4

      “Então Pedro, aproximando-se dele, disse: Senhor, até quantas vezes pecará meu irmão contra mim, e eu lhe perdoarei? Até sete? Jesus lhe disse: Não te digo que até sete; mas, até setenta vezes sete.” 
Mateus 18.21-22

      Os textos acima não precisam de explicação, de longos estudos, de profundas reflexões, só de simples prática, ou perdoamos ou não. Quem tem coração perdoador, misericordioso, não precisa de tempo para pensar, para que a mágoa passe, não diz “perdoar eu perdoo mas preciso de um tempo para esquecer a dor”, quem quer perdoar perdoa e pronto. Quem é pronto para perdoar? Quem é consciente de que também só tem paz porque é perdoado, o tempo todo por Deus. 
      Meus queridos, que felicidade tem o que perdoa fácil, mesmo uma agressão tamanha, mas será que quem perdoa fácil se sente assim agredido? Não se sente, porque não se vitimiza, ao mesmo tempo que não demoniza ninguém, só sabe que é ser humano e que o outro também é, sendo assim perdoar o outro é perdoar a si mesmo, é não se colocar acima de ninguém, mas tendo só Deus como juiz maior e santo, que a todos perdoa. 
      Perdoemos, perdoemos, perdoemos, quantas vezes quantas forem necessárias, e se o outro nem pedir perdão, se nem admitir que errou e muitas vezes ainda dizer que o erro foi nosso? Perdoe do mesmo jeito, não nos façamos de juízes, de acusadores, de ninguém, com razão ou não. Se feliz é o que perdoa, o que perdoa sem que perdão lhe fosse pedido é mais feliz ainda, isso é prova de verdadeira humildade, de maturidade, emocional e espiritual.

03/11/19

Sobre zumbis e lixo

      “Disse-lhes mais: Ide, comei as gorduras, e bebei as doçuras, e enviai porções aos que não têm nada preparado para si; porque este dia é consagrado ao nosso Senhor; portanto não vos entristeçais; porque a alegria do Senhor é a vossa força.” Neemias 8.10

      Quando injustiças, calúnias, invejas e outros males, são lançados contra nós, podemos tomar duas atitudes. Uma é jogar fora, num bate e volta espiritual onde não abrigamos o pecado que é do outro e que nada tem a ver conosco. Se isso é feito, metade do processo é realizado, não basta não acumular o mal, temos também que reter o bem, para que sejamos alimentados e permaneçamos vivos de um jeito sadio. A outra atitude é armazenar o mal alheio, isso encerra o processo, já que cheios não sentiremos necessidade de nos alimentar, usaremos o mal como alimento e seguiremos. Vivos? Não, como zumbis, cheios do mal do outro, alimentados de matéria espiritual morta que nos mantém de pé, mas de uma forma doentia. 
      Quando o evangelho ensina que para viver é preciso morrer, significa que devemos nos alimentar de Deus, não do mal que os outros nos lançam, e que o diabo, com sua astúcia, tenta nos convencer que devemos acumular e não jogar fora. Como o diabo tem vitória nesse convencimento? Quando nos sentimos vítimas do mal alheio, quando queremos nos vingar do mal alheio, quando queremos fazer justiça com as próprias mãos, quando tentamos lutar contra as mentiras que os outros dizem e pensam sobre nós, quando nos sentimos acusados e não confiamos em Deus. Nem sempre o diabo nos vence fazendo-nos mentir, algumas vezes ele nos vence levando-nos a lutar numa batalha pessoal pela verdade. 
       No sábado passado refletimos sobre o tema vítimas (se não tiver lido confira no link), mas o princípio da estratégia do inimigo é nos convencer que temos um bom motivo para sermos acumuladores de lixo alheio, ele sabe que cheios do mal não buscaremos nos alimentar com o bem. O segredo da vitória, contudo, não é desprezar o mal alheio, isso, por mais racional que formos, será impossível, se não estivermos alimentados com o bem. O segredo é não andar com fome, quem está satisfeito, quem se alimentou bem, não cai na tentação de comer qualquer bobagem por aí, quem está cheio de Deus não tem espaço em seu coração para lixos, assim não lutemos com o homem, mas busquemos a Deus.
      Sempre que o homem cresce em nossas vidas, é porque nossa comunhão com Deus apequenou-se, se a acusação insiste em ficar e em nos atormentar, é porque estamos vazios do Espírito Santo. Assim, não adianta tentarmos lugar contra a mentira, ainda que estejamos lúcidos, conscientes de que é uma mentira, sozinhos seremos derrotados, e o mal sabe disso. Busquemos ao Senhor, confessemos nosso pecado, Deus sempre perdoa o que busca perdão, entreguemos nossas vidas nas mãos de Deus e confiemos que ele fará o melhor, depois, o adoremos, em intimidade, no Espírito, conheçamos os mistérios do Senhor, isso nos fará forte e não nos levará à batalhas inúteis contra uma lixo espiritual que não nos pertence. 
      O diabo nunca nos tentará com algo que podemos vencer até sozinhos, entendamos isso, ele nos tentará e assoprará nos ouvidos dos fracos para que nos confrontem naquilo que é nosso ponto fraco. Muitas vezes achamos que estamos passando por uma luta estranha e maior que nós simplesmente porque não estamos vendo que é o diabo lançando sua seta em nossa maior fraqueza. Mas a vitória não está em conhecermos melhor o ataque do inimigo, ainda que isso seja útil, a vitória está em conhecermos melhor a defesa de Deus. Dessa forma, se a luta estiver grande demais, pare tudo e busque a Deus, no processo de perdão, entrega, adoração, esse processo nos dá a paz e a alegria que nos fortalecerá contra toda acusação. 

02/11/19

Será que de fato aprendemos a viver?

      “Que homem dentre vós, tendo cem ovelhas, e perdendo uma delas, não deixa no deserto as noventa e nove, e não vai após a perdida até que venha a achá-la? E achando-a, a põe sobre os seus ombros, gostoso; E, chegando a casa, convoca os amigos e vizinhos, dizendo-lhes: Alegrai-vos comigo, porque já achei a minha ovelha perdida. Digo-vos que assim haverá alegria no céu por um pecador que se arrepende, mais do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento.” Lucas 15.4-7

      Aprender a viver é descobrir o melhor da vida e por em prática, simples assim, muitos, contudo, vivem anos a fio cometendo os mesmos erros, se comprometendo com as coisas erradas, só repetindo o pior de seus antecessores. Não estou dizendo que repetir o que nossos pais fizeram é ruim, se eles conseguiram fazer melhor que o que os pais deles fizeram, então para eles bastou, mas isso não basta para nós. O ideal é evoluirmos e uma das facetas da evolução é usar o que aprendemos dos pais como base, como ponto de início, não como objetivo final, não como meta. Muitos, todavia, passam a vida como crianças imitando os pais, não crescem, não vão além disso, é claro que fazem isso porque existem algumas vantagens para se proceder assim. O álibi de ser tão bom quanto foram pais é muito forte, mas isso pode ser só uma zona de conforto para covardes.
      O que é o melhor da vida? São os valores espirituais, a virtudes que construímos nela e são as únicas riquezas que levaremos para a outra vida? Sim, isso é o principal, mas o grande mistério da vida é construir valores espirituais com ferramentas materiais, com o corpo em nossas relações com os outros homens. Quem pensa que ser espiritual é se isolar, negar os instintos materiais, dizer não aos apetites carnais, não constituir família e se tornar um ermitão numa caverna, se engana redondamente. Nem digo que Deus não chame alguns para viverem assim, mas isso é exceção não regra. O desafio é ser espiritual na carne e convivendo com a carne, e nisso, nossa relação com as pessoas é muito importante. Lembro que Jesus encarnado andava com gente, tinha amigos, participava de festas, tomava suas refeições com seus conhecidos.
      Mas para viver o melhor da vida é preciso coragem, principalmente de dizer não ao que os outros querem que sejamos, só conseguimos viver bem com quem importa quando dizemos não para viver com quem só nos quer para serem servidos. Não, eu não estou indo contra a lição espiritual que diz que é melhor servir que ser servido, isso é uma relevância do cristão verdadeiro sempre, mas isso também tem limites. O limite é a vontade de Deus, e acredite muitos vivem servindo, se escravizado, se anulando, sem que o Senhor tenha pedido isso deles, eles fazem só por comodismo, por covardia, enquanto isso, quem de fato poderia se beneficiar da proximidade deles, é desprezado. Quando servimos sob orientação de Deus, também somos servidos, num retorno maravilhoso e leve, que não pesa pra ninguém e que a todos faz bem. 
      Deve ter acontecido com você o que às vezes acontece comigo, de se aproximar de alguém, porque gostamos desse alguém, de investir em iniciativas, mas quando a pessoa ter que dar um retorno ela nos decepcionar, simplesmente porque ser escrava de tradições, de servir com mentiras a que não a faz feliz, mas que ela insiste em agradar por não ter coragem de se libertar. Enfim, temos que respeitar as escolhas alheias, mesmo que erradas, mesmo que sejam não estarem junto de nós. Amar também é aceitar que alguém não quer ser amado por nós, para essas pessoas restará uma vida pesada de servir gente errada, para nós, de seguir em frente em paz já que fizemos nossa parte. Não podemos insistir, amor forçado não é amor, mas devemos ser bons economistas afetivos, usando nosso melhor com quem de fato importa. 
      Viver bem é fazer bem às pessoas, isso é causa e efeito do amor, mas não precisa ser um grande número de pessoas, e o Espírito Santo é sempre bem sábio em nos orientar com quem devemos estar. Uma alma vale mais que o mundo todo, e se ganhamos um com a nossa verdade apoiada na verdade de Deus, então valeu a pena, e é isso que seremos cobrados no final, pelo bem que fizemos por escolha certa, a quem de fato precisava de nós. Na verdade, em certos momentos, entendemos que parece que nascemos e passamos tudo o que passamos simplesmente para vivenciar um momento com uma pessoa, fazendo essa pessoa feliz de um jeito que ninguém mais faria. Encontros assim, por mais rápidos que às vezes sejam, por menores que pareçam as atitudes que tomamos, constroem amizades que duram para sempre.
     Felizes os homens e as mulheres, contudo, que conseguem isso, antes de que com qualquer outras pessoas, com seus cônjuges, aqueles amigos super especiais com os quais fazemos alianças até a morte de casamento. Viver bem é muitas vezes deixar noventa e nove para lá para dar atenção a uma, se isso for a vontade de Deus valerá a pena e mostrará em nós alguém que se importa não com a aprovação de uma maioria, não com fama, não com tradições, mas com amar quem realmente importa, precisa e de fato dará valor à nossa iniciativa, mais do que noventa e nove pessoas. Essa é uma das grandes lições do texto inicial, amar alguém que naquele momento está precisando de um amor, de uma atenção especial, a despeito do que os outos podem dizer, a despeito mesmo do amor que se pode receber dos outros. 
      “Não vos esqueçais da hospitalidade, porque por ela alguns, não o sabendo, hospedaram anjos.” (Hebreus 13.2). Quando você sentir de abençoar alguém, quando for entregue a você uma oportunidade para fazer um bem a alguém, não pense demais, não deixe para depois, nem diga, “isso não é importante, deixa que outro faça”. Alguns compromissos podemos nos negar a realizar, com certeza nem tudo é para nós fazermos, muitas vezes é mais sábio sair que entrar, afastar-se que participar, calar que falar. Mas cuidado, em algumas situações você pode ser a única chance que alguém tem de ser abençoado, no sistema complexo e grandioso do universo, naquela situação, naquele momento, naquele lugar, se você não fizer, ninguém mais vai fazer, temos que ter sensibilidade para perceber isso.  
      Da tua iniciativa de amor, muitas vezes demonstrada em algo pequeno, que não te custa muito, pode resultar a diferença entre vida e morte de alguém. Contudo, muitas vezes, ainda que você seja negligente e não faça o que deveria fazer, ainda assim, a pessoa seguirá em frente, superará tua falha, tua ausência, tua covardia, tua displicência, contudo, nesse caso, o maior prejudicado poderá ser você mesmo, que teve uma chance para mostrar que sabe amar, que se preocupa com alguém mais de que com você mesmo, e falhou. Pior que a dor de não ser amado é não saber amar, ao desprezado Deus acolhe, cuida, consola, ainda que sofra muito pelo egoísmo humano, mas o que despreza o outro o faz porque na verdade já desistiu de si mesmo, antes mesmo que dos outros, não sabe amar a si mesmo, antes que aos outros, esse não receberá nem o amor de Deus simplesmente porque não acredita mais nele. 

01/11/19

Deus é grande

      “Levantarei os meus olhos para os montes, de onde vem o meu socorro. O meu socorro vem do Senhor que fez o céu e a terra. Não deixará vacilar o teu pé; aquele que te guarda não tosquenejará. Eis que não tosquenejará nem dormirá o guarda de Israel. O Senhor é quem te guarda; o Senhor é a tua sombra à tua direita. O sol não te molestará de dia nem a lua de noite. O Senhor te guardará de todo o mal; guardará a tua alma. O Senhor guardará a tua entrada e a tua saída, desde agora e para sempre.” Salmos 121 

      Deus é grande, maior que tudo, então olhe para ele, para mais nada, e siga sem medo. Lembre-se disso não para pedir por milagres materiais, pelo menos não só para isso, mas lembre-se disso para se sentir em paz, estabilizado, diante da injustiça humana, diante dos julgamentos ruins que outros fazem de nós, diante da calúnia e da inveja que tantos sentem ainda que não admitam e ainda chamem a nós de arrogantes e falsos. Olhe para o Senhor, que te amou, que te salvou, que tem guardado tua vida e a de teus queridos próximos, pelos quais você ora solicitando proteção divina, olhe para esse Deus e entenderá que tudo o mais é infinitamente menor. 
      Quando entrar num ambiente e sentir-se acuado, oprimido, olhe para Deus, adore-o e fique em paz, quanto ver que algumas portas não abrem simplesmente porque as pessoas não querem dar a você a chance de você mostrar o teu melhor, olhe para Deus, respire fundo, com a alma e o espírito, mais que com o corpo, e fique tranquilo. Se você já clamou a Deus, já levou a ele tua causa, já abriu o coração com sinceridade e humildade, confie no Deus que criou e que sustenta o universo, ele é muito maior que os homens, sejam eles quais forem e onde estiverem. Não se vingue, não se defenda, não ataque, mas permita que Deus te defenda. 
      Deus não tem que ser maior para as pessoas, nem precisa manifestar fisicamente seu poder para ser grande, basta que ele seja grandioso em nossos corações, que pela fé permitamos que ele cresça dentro de nós. Se isso ocorre, o resto, todo o resto, fica inexpressivo. O que só prova um Deus grande quando esse se revela no mundo, na verdade não quer uma experiência pessoal com Deus, mas quer convencer os outros que o Deus maior está do seu lado, isso é vaidade, pura imaturidade. O que crê, todavia, antes mesmo que haja manifestação física, já teve o melhor da comunhão com o Senhor, permitiu que Deus fosse reconhecido num coração humano, independente do que os outros achem.

31/10/19

A vida é curta

     “O que foi, isso é o que há de ser; e o que se fez, isso se fará; de modo que nada há de novo debaixo do sol. Há alguma coisa de que se possa dizer: Vê, isto é novo? Já foi nos séculos passados, que foram antes de nós.Eclesiastes 1.9-10

      Nos tempos atuais o produto mais difícil de se achar é a originalidade, tudo de alguma forma já foi feito em algum lugar e por alguém. Interessante que o sábio Salomão já fazia essa constatação há milênios atrás, e nisso há uma originalidade, uma sabedoria que só o Espírito Santo pode dar. Assim, ainda que viver se torne um tédio, o Espírito Santo pode nos renovar fazendo com que a vida tenha graça e uma razão. A vida é uma chatice quando é sem Deus, e Deus só se prova através de Jesus que nos dá do seu Santo Espírito. Sem Jesus a vida nunca será o bastante, e mesmo que reencarnação fosse plano de Deus para nos evoluir, não seria suficiente, seria o inferno, um retorno constante ao mesmo mundo, num invólucro frágil e inviável para reter a graça do criador. Se o inferno é um sofrimento eterno, viver no mundo eternamente sem Deus é um inferno quase semelhante. 
      Contudo, a vida é curta, principalmente para quem a vive de verdade e não tem medo de se aventurar. Assim dias se tornam meses, meses em anos, anos em décadas, quando vemos temos filhos que estão sonhando os nossos velhos sonhos, de serem famílias e terem filhos. Quando vemos a música que amamos se torna antiga, flashback, ultrapassada para alguns e clássica para muitos. Quando vemos ter cinquenta não é mais ser velho, mas é um jovem que fomos há dez anos atrás, setenta, sim, parecem velhice, mas isso também vai mudar. Quando nos damos por conta os cabelos embranqueceram, nervos e ossos doem, e muitos problemas que antes vinham e iam, agora vêm e ficam. A vida passa depressa e então percebemos que muitos sonhos nunca se tornarão realidade porque eram meras ilusões, que muitos erros não poderão ser corrigidos, que com muitos problemas teremos que conviver aceitando que não têm solução. 
       Curta é a vida, principalmente em nosso corpo material, mas ainda que sejamos confrontados com muitas realidades quando a vida se aproxima do fim vemos que em muitos aspectos continuamos os mesmos, ainda que o corpo esteja cansado a alma ainda é criança. Mesmo que não possamos realizar mais e que saibamos disso claramente, ainda assim temos esperanças, com o passar dos anos não temos mais ilusões, mas ainda temos esperança. Ainda bem, esperança é o que nos mantêm vivos, jovens por dentro, e com o tempo, ainda que saibamos que muitas coisas são impossíveis, ainda assim nos apaixonamos, ainda assim continuamos sonhando. O grande desafio da velhice é desligar o corpo da alma, e isso só pode ser feito quando o espírito é livre, bem, liberdade espiritual só é possível através de Jesus, de mais nada ou ninguém. 
      A vida é curta, mas só percebemos isso de fato quanto nos distanciamos da eternidade e a distância só é maior na velhice, na infância estamos próximos da eternidade, porque estamos mais perto do nosso nascimento, nascer é passar do estado espiritual eterno para o estado físico. Assim, à medida que vivemos nos afastamos da eternidade, ainda que nos aproximemos da morte. A aproximação da morte só nos distancia do espírito e nos prende à matéria, por isso é preciso fé, acreditar sem saber, sem ver, sem sentir, que a morte é a passagem para algo não estranho, mas conhecido, para o estado que tínhamos antes de encarnarmos. Os que conseguem fazer a segunda passagem desprendidos da matéria, ainda que tenham passado muito tempo conscientes nela, os que conseguem ter fé numa existência puramente espiritual e melhor, ainda que impregnados de matéria, esses não serão pegos de surpresa pelo final da vida.
      Mas a vida é curta, cabe-nos vivê-la bem, mas sem idolatrá-la, usufruirmos dela, mas sem nos viciarmos nela, sermos satisfeitos com ela, mas sem acharmos que ela é um fim em si mesma, lutarmos nela e por ela, mas abrirmos mão dela principalmente à medida que ela se acaba. A vida é só um teste, um pequeno teste com uma única pergunta, uma pergunta que nos é feita de tempos em tempos, qual é essa pergunta? Ela não é a mesma para todos, mas seu objetivo é o mesmo, nos questionar até que ponto estamos preparados para morrer, não para viver. Morre-se abrindo mão de direitos, de egoísmos, de honra pessoal, de atenção demasiada, de posição, de status, de holofotes, morre-se diminuindo e deixando que o outro aumente, sumindo e permitindo que o outro apareça. 
      Morre-se servindo e abrindo mão de ser servido. Como servimos? Dando aquilo que temos de melhor sem fazer exigências, só para que o outro seja beneficiado. Servimos sendo em primeiro lugar servos de Deus, não de causas sociais, de ideologias humanas, de justiças e ciências, nem de religiões e espiritualidades, mas do Altíssimo. Servir a Deus é o jeito mais eficiente e justo de servir o próximo, quando fazemos isso mesmo a vida curta ganha sentido, tem razão de ser, nos dá as virtudes que seguirão conosco após a morte. Que pergunta tem sido feita a você dia após dia? Você entendeu qual é o seu objetivo? Não se prenda a essa vida, ainda que seja responsável com ela e com todas as alianças que você faz nela, cônjuge, filhos, amigos, mas abra mão dela, sirva a Deus e através dele sirva ao próximo, quem faz isso vive eternamente.

30/10/19

Dor insolúvel de viver

      “Senhor, não me repreendas na tua ira, nem me castigues no teu furor. Tem misericórdia de mim, Senhor, porque sou fraco; sara-me, Senhor, porque os meus ossos estão perturbados. Até a minha alma está perturbada; mas tu, Senhor, até quando? Volta-te, Senhor, livra a minha alma; salva-me por tua benignidade. Porque na morte não há lembrança de ti; no sepulcro quem te louvará? Já estou cansado do meu gemido, toda a noite faço nadar a minha cama; molho o meu leito com as minhas lágrimas, já os meus olhos estão consumidos pela mágoa, e têm-se envelhecido por causa de todos os meus inimigos. Apartai-vos de mim todos os que praticais a iniqüidade; porque o Senhor já ouviu a voz do meu pranto. O Senhor já ouviu a minha súplica; o Senhor aceitará a minha oração. Envergonhem-se e perturbem-se todos os meus inimigos; tornem atrás e envergonhem-se num momento.
Salmos 6

      Por favor, se possível leia esta reflexão até o fim, penso que assim poderá entendê-la melhor. 

      Não culpo os homens, não mais, nunca culpei Deus, nunca, uma das poucas virtudes que tenho, também não me culpo, sei que assim como eu tenho motivos para sofrer outros tiveram motivos para me fazer sofrer, e vice-e-vesa, eu entendi que ninguém tem culpa do que ocorre de ruim neste mundo, a coisa simplesmente é assim e pronto. Contudo, sinto dor, a dor insolúvel de viver, a dor infinita, minha dor, meu direito pessoal e intransferível. Depois que o nosso pecado é confessado e o perdão é assumido, depois que os homens são perdoados e entendidos, depois que Deus é buscado e se aceita o que ele pode e não pode fazer, e não pode não por limitação de poder, mas por coerência cósmica, depois de tudo isso, a dor ainda resta, pequena, profunda, mas incisiva, brilhante como a ponta de uma faca de prata virgem, como um segredo íntimo. 
      Desse jeito devemos continuar com a dor, guardando-a como um segredo, ninguém tem culpa dela existir, ninguém também precisa ser importunado com ela, que ela permanece assim, encravada em nossa carne, isso, todavia, não é fácil. Quando ela fala alto nós cobramos atenção de alguém, a tristeza sempre quer companhia, contudo, todos estão ocupados com suas próprias dores, não querem dividir os corações com dores alheias, dessa forma, ainda, que manifestemos um grito sufocado para chamar a atenção, logo nos calamos, engolimos o choro e nos retiramos com nossos dores, envergonhados, humilhados, e de nenhuma forma compreendidos por alguém.
      Muitos, todavia, conseguem se convencer que a dor tem cura, assim buscam a religião, eu disse a religião, não Deus, ainda que pensem estarem buscando Deus, e mesmo que sejam ouvidos por um Deus cheio de amor. Deus é só misericórdia, ainda que as pessoas não o conheçam, ainda que digam dele coisas que ele não é, ainda que peçam a ele coisas que ele não pode dar, ainda que o importunem anos a fio com assuntos menores, baixos, inúteis, ainda assim ele pacientemente ouve e dá algumas coisas, as necessárias para que as pessoas não desfaleçam de vez. As pessoas não entendem que recebem porque insistem demais, e que pai nega algo a filhos insistentes, ainda que ele saiba que são coisas que não resolverão de fato o problema? 
      Por isso Deus levanta pregadores nos púlpitos, que digam às pessoas não o que elas precisam ouvir, mas o que elas querem ouvir, por isso Deus dá doces e guloseimas ainda que estraguem os dentes, por isso Deus trata como crianças a velhos que já têm idade suficiente para viverem como adultos. Ah se não fosse assim, há se Deus nos tratasse como nos precisamos, ou pior, como nos merecemos, ah se Deus pai nos tratasse como nos tratam alguns pais, não com mimos, mas com a realidade nua e crua. Por isso Deus é incognoscível, ainda que tantos jurem que o conheçam bem, que o provam bastante, a maioria prova da misericórdia, não da real essência divina, mas o que importa para nós, seres humanos? A misericórdia de Deus nos basta para nos manter vivos neste mundo à medida que empurramos para lá e para cá nossas dores. 

      As pessoas buscam nos púlpitos palavras de incentivo, de superação, de vitória, aquelas que elas estão acostumadas a ler nos Salmos, mas elas não entendem que para Davi ter concluído um salmo com uma palavra assim muita dor ele teve que sentir, muita solidão, muita injustiça, existiram muitos assuntos sem solução com os quais ele simplesmente teve que aprender a conviver. A mesma coisa com os profetas, é bom ler que Elias foi vitorioso sobre os profetas de Baal, mas e todos os anos que ele passou como marginal, fugindo, dependente de uma viúva e de um corvo? A mesma coisa com Paulo e seu espinho na carne. O início dessa reflexão foi o relato de um processo que muitos passam, mas que pouco hoje em dia admitem, já querem ir diretamente para o final feliz da história, sem compartilhar toda a dor que existiu durante todos os outros capítulos. 
      Mas será que alguma história tem final feliz de fato? Eu concluí que não, e quem pensa diferentemente acha que a vida é filme, romance, não a verdade, nem os personagens bíblicos tiveram finais felizes, muitos leem e leem a Bíblia e não percebem isso, buscam nos textos sagrados o que eles nunca disseram. O único final feliz está no perdão espiritual que Jesus nos dá, e isso foi conquistado com o pior dos finais de história de todos os tempos, a tortura e a morte de cruz do homem mais justo de todos, o desprezo da humanidade, principalmente de um povo que tanto deve a Deus, a começar por simplesmente ser um povo, o povo judeu, ao filho desse Deus, que só fez o que fez para salvar esse povo. 
      Existir neste mundo é carregar um fardo que é só a dor insolúvel de viver, enquanto isso nos apaixonamos, pela garota, pelo garoto, pela música, por uma profissão, pelos filhos, pela igreja, por nós mesmos, por um cachorro, por uma taça de bebida, por um prato de comida, por um carro, pela Bíblia, pela religião, pela literatura, por um autor, por um compositor, por um ator, por um diretor, por um amigo, pela natureza, pelas manhãs, pelos entardeceres, pelas noites, pelo sol, pela lua, pelas estrelas, pela morte, por Deus. Eu cheguei ao nível final do jogo da vida, sou apaixonado por Deus, e isso é maior que tudo, é melhor que tudo, a dor ainda existe, e sempre existirá. 
      Contudo, olhar para o Deus verdadeiro, sem os filtros da religião, do cristianismo, dos loucos que buscam a Deus mas de fato não o querem, querem aquilo que querem que Deus seja, assim querem ídolos, não Deus, olhar para a luz pura e altíssima do Senhor me dá forças. Não são forças para fazer milagres, para mover uma montanha daqui para lá, para ressuscitar mortos, mas forças para acordar de manhã, respirar fundo e não me entregar às trevas, o que são as trevas? Trevas é a loucura, os extremos, os dois extremos, tanto dos que odeiam Deus quanto dos que o idolatram. Deus não quer se idolatrado, ele não precisa disso, idolatrar Deus é prendê-lo numa estátua, seja de gesso ou de ideologias, Deus é livre e quer nos fazer livres, ser livre é seguir com o fardo da dor, sem negar o fardo, sem buscar um remédio impossível para ele, mas continuar caminhando com ele, rumo a Deus. 

José Osório de Souza, outubro de 2019