21/05/22

Movendo-se pelo Espírito

      “E Jesus, cheio do Espírito Santo, voltou do Jordão e foi levado pelo Espírito ao deserto; e quarenta dias foi tentado pelo diabo, e naqueles dias não comeu coisa alguma; e, terminados eles, teve fome.
      “E, acabando o diabo toda a tentação, ausentou-se dele por algum tempo. Então, pela virtude do Espírito, voltou Jesus para a Galiléia, e a sua fama correu por todas as terras em derredor. E ensinava nas suas sinagogas, e por todos era louvado.” 
      “E, chegando a Nazaré, onde fora criado, entrou num dia de sábado, segundo o seu costume, na sinagoga, e levantou-se para ler. E foi-lhe dado o livro do profeta Isaías; e, quando abriu o livro, achou o lugar em que estava escrito: 
      “O Espírito do Senhor é sobre mim pois que me ungiu para evangelizar os pobres, enviou-me a curar os quebrantados do coração, a pregar liberdade aos cativos e restauração da vista aos cegos, a pôr em liberdade os oprimidos, a anunciar o ano aceitável do Senhor”. 
      E, cerrando o livro, e tornando-o a dar ao ministro, assentou-se; e os olhos de todos na sinagoga estavam fitos nele. Então começou a dizer-lhes: “Hoje se cumpriu esta Escritura em vossos ouvidos”.”
Lucas 4.1-2,13-21

      Os primeiros quinze versículos do capítulo quatro do evangelho de Lucas (assim como Mateus 4.1-11) descrevem a tentação que Jesus sofreu antes de iniciar seu ministério, já refletimos várias vezes sobre as três tentações finais que o Diabo fez a Jesus (em especial cito a postagem “Três testes para a espiritualidade”). Desta vez não me atentarei aos três testes, que ao contrário do que muitos pensam não foi a tentação, mas só o final dela, feitos pelo diabo após quarenta dias de outros testes que a Bíblia não descreve o que foram exatamente. Depois disso, quando Jesus já estava fisicamente fragilizado, é que as três tentações finais foram feitas, o uso de textos bíblicos mostra como o diabo pode ser ardiloso. 
      O ponto desta vez são os registros feitos no capítulo quatro do evangelho de Lucas sobre o Espírito Santo. Jesus foi batizado por João Batista, esse exercia seu ministério próximo ao rio Jordão (Lucas 3.3), por isso o texto diz que Jesus voltou do Jordão, quando isso aconteceu já estava “cheio” do Espírito Santo, que desceu sobre ele em forma de pomba durante o batismo (Lucas 3.22). Depois pelo Espírito foi conduzido ao deserto para ser tentado e pelo mesmo Espírito voltou à Galiléia onde efetivamente iniciou seu ministério. Jesus era judeu, sua profissão era professor das escrituras religiosas judaicas, uma atividade desenvolvida nas “igrejas” judaicas (sinagogas), nisso vemos que a obra do Cristo iniciou focada nos judeus. 
      “Veio para o que era seu e os seus não o receberam, mas a todos quantos o receberam deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, aos que crêem no seu nome” (João 1.11-12). Por esse texto do evangelho de João entendemos que o plano original era um redentor para os judeus, não que Deus não quisesse salvar os gentios, mas talvez, depois de salvos, caberia aos judeus a obra de evangelização das outras nações. Contudo, os judeus no papel de sua liderança religiosa, não aceitaram a Jesus, o perseguiram e o crucificaram, ainda que muitos tenham sido abençoados pelo Cristo. Quando negamos um favor de Deus o favor passa para outro, Deus não desperdiça dádivas, a chuva que ele lança sempre alcança a terra certa.
      Pergunto até que ponto os cristãos, tanto católicos quanto protestantes, entendem de fato a ação e a relevância do Espírito Santo. Mesmo carismáticos e pentecostais, que provam a liberação dos dons espirituais em seu emocional, será que sabem de fato como funciona a obra do Espírito Santo e a provam de forma realmente plena? Os textos bíblicos não deixam de testificar sobre a importância do Espírito Santo na vida de Jesus homem, e isso segue no livro de Atos, nas cartas e em Apocalipse, ele não é um conceito subjetivo, só um estado emocional, mas um ser ativo e decisivo. Sendo uma “pessoa” podemos dialogar com ele, falarmos e sermos ouvidos, assim como ouvirmos quando ele fala, de forma objetiva.
      O meio que essa comunicação se estabelece é mental, não é fisico, se vemos ou ouvimos é em nossa mente, que depois pode refletir nos outros sentidos. Mas apesar de ser mental não é mera imaginação humana, isso precisa ficar claro, senão podemos confundir qualquer delírio ou alucinação com experiência espiritual. Eis-me aqui de novo tentando explicar o inexplicável, que só entende quem experimenta em primeira mão, mas que as palavras sirvam para despertarem alguns, na dúvida nasce a curiosidade e essa pode levar a novas descobertas. Em se tratando do Espírito Santo o provam os que Deus permite e que estão preparados, à vontade de Deus que acha a vontade do homem em sintonia muita coisa é possível. 
      Jesus tinha uma relação íntima com o Espírito Santo, e como homem precisou ter, senão não teria forças para desempenhar sua missão. Nossa missão não é tão grande, é mais pessoal, apesar de todos sermos chamados para servir a todos, mas precisamos do Espírito Santo igualmente, contudo, existem falsificadores do poder espiritual de Deus. Muitos pregam e constróem ministérios gigantescos só com a “unção do mundo”, a mesma energia que artistas, músicos e cantores usam para encantarem estádios cheios de fãs e outros locais de espetáculos. Essa tal “unção do mundo” é o emocional humano apaixonado e focado, o Espírito Santo também mexe e muito com nossos sentimentos, mas isso é efeito de sua ação. 
      Os falsificadores da unção do Espírito Santo insuflam o emocional pela carne, não com uma comunhão santa com Deus, por isso tantos pregadores famosos acabam sendo descobertos como viciados principalmente em sexo. Severa é a mão da justiça sobre os que colocam palavras santas em livros sujos, com os que usam o nome de Jesus em templos impuros, que se dizem servos de Deus quando só servem a si próprios, grande é o pecado desses. Jesus teve a unção mais poderosa que esse planeta já viu porque servia a Deus o pai, não a si mesmo, e isso para salvar os outros, mesmo tendo que pagar com a própria vida. Por isso ele se movia perfeitamente no Espírito Santo e o Espírito Santo se movia livremente por ele. 
      Se a velha aliança é a Lei de Deus no mundo recebida por Moisés, a nova aliança é o Espírito de Deus no mundo autorizado pela obra de Jesus. E quanto a nós, até que ponto temos com o Espírito Santo a interação que podemos ter? Ele tem liberdade em nós ou limita-se a agir quando deixamos, quando não estamos agindo em prol de nossos interesses, de nossos prazeres egoistas, de nossas vaidades e maldades? Jesus não foi só um exemplo, um ideal distante e impossível de ser vivido, Jesus foi o inaugurador de uma era, a era do Espírito Santo na Terra nos corações dos homens. A promessa a seguir, feita no antigo testamento (Jeremias 31.34) e dita como cumprida no novo testamento, só é possível pelo Espírito Santo:

      “Porque esta é a aliança que depois daqueles dias farei com a casa de Israel, diz o Senhor; porei as minhas leis no seu entendimento, e em seu coração as escreverei; e eu lhes serei por Deus, e eles me serão por povo; e não ensinará cada um a seu próximo, nem cada um ao seu irmão, dizendo: Conhece o Senhor; porque todos me conhecerão, desde o menor deles até ao maior.” Hebreus 8.10-11

20/05/22

Cegos sob o Sol

      “E vi outro anjo forte, que descia do céu, vestido de uma nuvem; e por cima da sua cabeça estava o arco celeste, e o seu rosto era como o sol, e os seus pés como colunas de fogo; e tinha na sua mão um livrinho aberto. E pós o seu pé direito sobre o mar, e o esquerdo sobre a terra; e clamou com grande voz, como quando ruge um leão; e, havendo clamado, os sete trovões emitiram as suas vozes. E, quando os sete trovões acabaram de emitir as suas vozes, eu ia escrever; mas ouvi uma voz do céu, que me dizia: Sela o que os sete trovões emitiram, e não o escrevas.Apocalipse 10.1-4

      Se fecharmos os olhos e mirarmos o Sol, ao meio-dia, num céu limpo, sem nuvens, nossas pálpebras ficarão aquecidas e brilhantes, perceberemos uma cor alaranjada, quase vermelha, mas não veremos o Sol. Neste mundo, presos a corpos físicos, é assim nossa experiência com Deus, ainda que nos preparemos moralmente, nos coloquemos racionalmente em sua direção e nos concentremos em ver sua face espiritual, enxergaremos só contornos embasados, nossa carne funcionará como grosso filtro, que nos impedirá de ver o outro mundo. Obviamente estou usando metáforas, comparando coisas espirituais com materiais.
      Existe algo que permeia as reflexões deste blog, principalmente nos últimos tempos, não é experiência exclusiva, mas é algo que tem crescido em minha vida com Deus, ainda que saiba que tenho essa vocação desde criança e que ganhou relevância com minha conversão ao cristianismo na adolescência. É uma experiência sensorial com o Espírito Santo, que conhece a vontade de Deus através dos dons espirituais interagindo com os sentidos físicos, audição, visão, tato. Não se escandalize, isso não é desvio doutrinário nem está fora da Bíblia, é vivência tanto de homens de Deus do antigo testamento quanto do novo. 
      Homens do antigo testamento registraram fortes experiências com Deus, Moisés falava com Deus face a face (Êxodo 33.11), Sansão adquiria força física com a unção do Espírito (Juízes 16.28), Davi era tomado pela glória de Deus de forma poderosa (I Samuel 16.13), Ezequiel foi transportado fisicamente pelo Espírito (Ezequiel 8.3), Daniel viu um ser espiritual fantástico (Daniel 10.5-7). Mas personagens do novo testamento também tiveram íntimas experiências espirituais, Pedro, João e Tiago viram Jesus transfigurado com os espíritos de Moisés e de Elias (Lucas 9.28-36), Paulo foi arrebatado ao “terceiro” céu (II Coríntios 12.1-4).
      A Igreja Católica tratou de podar os galhos que se alcancem ao Sol, queria manter a árvore nanica, dentro de suntuosa catedral, mas sobrevivendo só com os raios, ainda que do astro rei, filtrados por multicoloridos vitrais. O que já era limitado tornou-se mais restrito, os que quisessem aprender sobre Deus que ouvissem os sacerdotes, não a voz viva do Espírito Santo. Essa voz poderia dar lugar a subjetividades e liberdades que tornariam impossível ao homem dominar homens, mesmo usando o nome de Jesus. Mas o nome do Filho tem poder em si mesmo, quem o ouve, esteja onde estiver, pode se achegar ao Pai.
      As trevas podem ser contidas, a luz, não, a mentira tem existência breve, a verdade é perenal, a vaidade brilha por um início de noite, a humildade resplandece dias e dias mesmo com o Sol a pino. Luz, verdade e humildade são simpáticas aos raios mais claros de Deus, o Espírito Santo vive e atrai os homens a Deus, religiões e matéria não podem detê-lo. Aproxima-se o tempo quando, antagonizada pela incredulidade materialista que ela mesma alimentou e pelo diabo e o inferno que ela mesma inventou, a falsa igreja cristã será derribada, cairá como caem os impérios autoritários no mundo, babilônias que tentam tocar o céu.
      Os limites para interagirmos de forma mais plena com Deus, não nos são impostos pelo pai como punição ou por algum capricho seu, eles nos protegem e nos incentivam para que cresçamos. Por desígnios que só Deus sabe importa-nos viver por algum tempo num mundo material, mas com um desejo intrínseco do mundo espiritual, e ainda que não possamos sequer provar fisicamente que o plano espiritual existe, sabemos que dele viemos e para ele voltaremos. Pela fé quase vemos a Deus, mas não conseguimos segurar essa experiência, por mais que ela nos impressione, logo dela nos esquecemos, e seguimos assim. 
      Fitarmos o Sol, mesmo com os olhos fechados, se ficarmos demais nessa posição poderemos até ter a visão prejudicada quando abrirmos os olhos e tentarmos ver a terra. No mundo a experiência espiritual deve ser temporária, temos que estar lúcidos para administrar a sobrevivência do corpo físico. Contudo, como é prazeroso mirar o Sol, sentir seu calor nas pálpebras, ver que seja só um esboço da realidade, porque a vida material no mundo é que é a ilusão. A existência na Terra é só o sonho de uma noite curta, do qual nossos espíritos anseiam por acordar, para despertarem por Jesus, no dia eterno de paz e do amor do Altíssimo.

19/05/22

Não precisamos mover montanhas

      “Porque ainda que a figueira não floresça, nem haja fruto na vide; ainda que decepcione o produto da oliveira, e os campos não produzam mantimento; ainda que as ovelhas da malhada sejam arrebatadas, e nos currais não haja gado; todavia eu me alegrarei no Senhor; exultarei no Deus da minha salvação. O Senhor Deus é a minha força, e fará os meus pés como os das cervas, e me fará andar sobre as minhas alturas.Habacuque 3.17-19

      Não é a primeira vez que medito nesse texto bíblico e não será a última, uma das passagens mais poéticas da Bíblia. “Ainda que falte tudo eu me alegrarei”: podemos de fato vivenciar isso? Duas coisas são necessárias para vivermos a experiência de Habacuque, e a primeira delas não é boa: uma grande e difícil necessidade, uma montanha a ser ultrapassada. Só adquire uma grande fé quem precisa exercer uma grande fé para vencer um grande problema, caso contrário se permanece crendo o minimamente possível já que isso basta para viver e seguir vivendo. 
      Cuidado, quem pede a Deus por fé que mova montanhas (Marcos 11.23), esse na verdade está pedindo que uma montanha esteja entre ele e suas necessidades, uma montanha que nada pode anular, a não ser a fé adequada. Nós seres humanos nos prendemos à quantidade mais que à qualidade, quantidade é aparente, pode ser exibida mais facilmente aos outros, nossas vaidades gostam de ter, mas mais para parecer do que para usufruir. Por isso muitos querem poder, mais que dinheiro, poder dá-nos mais que posse de coisas, dá-nos controle sobre pessoas. 
      Podemos achar que mover montanhas pode mostrar a nós mesmos e aos outros que somos espirituais, mas também podemos querer fé assim para termos acesso a coisas materiais sem termos que nos esforçar por isso. Mas existem montanhas, e essas são as mais importantes, que não pedimos, Deus simplesmente as autoriza em nossas vidas, e se ele faz isso é porque sabe que podemos com elas. Mas podemos para fazê-las sumir, do nada, como por magia, só por fé? Nem sempre, às vezes é para darmos a volta, ou subirmos e descermos, trabalhando mais e crescendo no tempo. 
      A experiência de Habacuque parece-nos ter sido essa, uma montanha havia em sua vida, para a qual Deus não lhe deu fé para mover, mas fé para esperar, e eis uma terceira forma de encararmos grandes problemas. Algumas dificuldade não desaparecem num instante, após uma oração de fé, mas Deus também não nos orienta a pôr pés na estrada para subirmos, descermos, ou darmos a volta, o Senhor simplesmente manda-nos esperar. Nada que o profeta fizesse faria a figueira florescer, a vide dar fruto, as ovelhas voltarem, mas ainda assim ele estaria feliz. 
      Talvez a montanha do profeta não fosse a falta de coisas, mas a falta de alegria, muitas vezes só nos livramos da tristeza quando nos encontramos numa situação onde isso não faz diferença. Muitas vezes fazemos chantagem, ainda que inconscientemente, com a vida e mesmo com Deus, queremos exibir nossa tristeza como um troféu, deixando claro que a culpa dela existir não é nossa, assim nos colocando como vítimas. Nesse equívoco jogamos em Deus e na vida a responsabilidade para mudar nossos destinos, já que achamos que foram eles, não nós, a causa de nossas tristezas. 
      Essa montanha só desaparece quando aprendemos a ser felizes com o que somos e temos de verdade, e eis a segunda coisa necessária para vivenciarmos a experiência de Habacuque, aprender a viver com o mínimo. Uma lição difícil, mas que nos coloca num nível espiritual de maturidade, pois desapega-nos da matéria e das aparências e nos leva a valorizar a essência espiritual, qualidade mais que quantidade. Por isso o profeta pôde dizer “eu me alegrarei no Senhor… o Senhor Deus é a minha força… me fará andar sobre as minhas alturas”.
      Quem é feliz com o mínimo é leve, não precisa mover a montanha, rodea-la por baixo, ou escala-la e depois descê-la, muito menos aguardar passivamente, mas pode flutuar e passar. No mundo material? Não, no espiritual, faz isso dentro de si, e ninguém precisa ver, só Deus. As montanhas mais importantes que Deus autoriza em nossas vidas necessitarão da fé maior, essa fé não faz montanhas se moverem, faz nossos espíritos se moverem. Eis o mistério que Habacuque conhecia, por isso ainda que lhe faltasse tudo no mundo ele era feliz e grato a Deus. 

18/05/22

O humilde acha o amor (2/2)

      “Mas deixarei no meio de ti um povo humilde e pobre; e eles confiarão no nome do Senhor.” Sofonias 3.12

      Os seres humanos não encontram a humildade da mesma maneira, alguns precisam ganhar para achá-la, outros precisam perder, generalizar dizendo que a pobreza conduz à humildade não é correto. Contudo, com certeza o homem acha com mais facilidade a humildade na falta, simplesmente porque nessa condição ele não tem outra maneira para ser feliz, caso contrário permanecerá revoltado contra tudo podendo ser levado à violência e à criminalidade. Mas muitos são humildes na abastança, e nesses, onde a humildade não é obrigação, mas opção, é que ela pode ser útil para muitos. 
      O que pouco tem e é humilde abençoa a si mesmo, principalmente na área material, mas o rico humilde pode ser instrumento de benefício material para muita gente, e ainda assim não sentir-se maior por isso, se for humilde só se verá como instrumento do amor de Deus. Infelizmente a maioria de nós não está preparada para ser rica, por isso, se desejarmos de fato agradar a Deus e servir o próximo, o Senhor terá que nos manter com rédeas curtas, com pouco e sempre dependentes dele. O Senhor, todavia, pode não ter outra opção que não nos empobrecer, para sermos humildes e acharmos seu amor. 
      A humildade verdadeira deixa alegria no coração do homem, não é virtude experimentada com tristeza, ainda que o trabalho inicial para achá-la seja de aceitação de erros e limitações e isso, sim, pode nos levar a certa contrição. Mas a tristeza inicial, se correta, se sincera, se com o objetivo de se apresentar ao verdadeiro Deus com respeito e temor, é só para assentar nossa alma, tranquilizar nossas ansiedades, controlar nossos egoísmos, curar nossas invejas e vaidades, depois o ser se alegra. Por quê? Porque vê que está na luz do Altíssimo e consegue enxergar toda a verdade sobre si mesmo.
      Ao homem de bem a verdade alegra, ele sabe que orgulho é engano, e ainda que dê algum prazer é só por um pouco, por isso quem de fato quer a presença de Deus vem para a luz para achar a humildade pessoal. Quem não quer inventa desculpas, até religiosas, para manter arrogância e malícia, esses não têm paz de fato, não se permitem ser tocados pelo amor de Deus. O humilde quer ser mais humilde, pois a luz fica cada vez mais clara e revela mais sobre ele, o arrogante se exalta nas trevas, sobrecarrega-se de trabalhos, tenta inutilmente criar uma falsa luz, querendo ofuscar a luz do Altíssimo.
      Há pessoas que passam a vida levantando-se e caindo, e achando que caem por causa das injustiças do mundo ou mesmo pelas ciladas do diabo, não entendem que quem as está derrubando é o próprio Deus. Com que propósito? Para que aprendam a ser humildes. Muitos são fortes na queda, se acham mais virtuosos por isso, e portanto mais merecedores de honras, quando na verdade são só rebeldes arrogantes. Por que alguns têm que passar finais de vidas em longos períodos internados em hospitais, sofrendo antes de morrer? Para achar a humildade e experimentar o amor de Deus.
      Muitos levaram a vida fugindo do amor de Deus, e quem foge do amor de Deus foge também do amor das pessoas, portanto são solitários e amargos. Fizeram isso por não quererem se mostrar como humildes aos homens, humildade implica em não ter a aparência de glória que o mundo admira, o status social, os bens, o frequentar restaurantes e hotéis chiques, o uso de roupas caras, a posse de carros luxuosos. Abrir mão de tudo isso não é fácil, e muitos conseguem viver sem abrir mão e resolvendo em suas cabeças que são bons cristãos, ainda que baseados no que tentam ter sem a aprovação de Deus. 
      Nisso a tal “teologia da prosperidade” ganha adeptos, teto para rebeldes arrogantes e materialistas, não para os humildes e espirituais. Então temos que nos contentar com pouco? Sim, se esse for o plano de Deus para nossas vidas, e isso não é ter uma vida material indigna, mas é só aprender a ser feliz com menos. Ah, meus queridos, quando vamos entender que isso não nos faz menores, mas maiores. Maiores no reino de Deus! Mas isso é para quem busca a glória do reino de Deus, quanto aos que querem a glória do mundo, terão que viver sem paz e sem amor, temendo a morte ainda que ricos.  

Leia na postagem de ontem
a 1ª parte desta reflexão
José Osório de Souza

17/05/22

O amor acha o humilde (1/2)

      “Ainda que o Senhor é excelso, atenta todavia para o humilde; mas ao soberbo conhece-o de longe.Salmos 138.6

      Quando o amor de Deus encontra a nossa humildade a paz é estabelecida, o caminho para a vida eterna se abre e entendemos o motivo maior da existência. É algo misterioso, como seres humanos não podemos dizer quem toma a iniciativa em primeiro lugar, o mais correto seria dizer que ambos, o ser humano e Deus, fazem isso ao mesmo tempo. Procurando ser espiritual e conforme a visão do cristianismo tradicional poderíamos dizer que a iniciativa é de Deus, Jesus homem foi isso, uma iniciativa de Deus para fazer algo que os seres humanos não poderiam fazer, dar um meio e um exemplo. 
      Mas se verificarmos que Jesus não veio milhares de anos antes, em algum momento da história logo após o pecado original mítico do primeiro casal no Éden, entenderemos que foi necessária alguma iniciativa do ser humano, preparando-o intelectual, moral e espiritualmente, para receber a iniciativa de Deus em Cristo. O cristianismo tradicional coloca responsabilidade demais em Deus e tira responsabilidade do homem, enfatiza a graça e a fé e diminui o valor de obras e trabalho moral. Sim, Deus pode tudo, mas só realiza tudo quando o ser humano faz por merecer, através de fé e obras.
      A nós neste mundo não compete entender certas coisas, principalmente porque isso não tem utilidade, se fosse para nós entendermos teríamos condições para isso e isso seria útil de alguma forma (e penso que quando for útil teremos condições). O que nos compete? Humildade, e uma das faces da humildade é aceitar limites, principalmente os físicos, emocionais e intelectuais, dessa forma, os que envolvem diretamente nossa vivência no mundo material. Existem limites espirituais neste mundo? Sim, mas menos que muitos pensam, mas também desde que se tenha humildade. 
      Quem quer se aproximar do plano espiritual já tem no mínimo noção que ele existe, e que se relacionar com ele é algo importante, portanto já possui alguma espiritualidade, não é ateu ou materialista, mas essa espiritualidade não é necessariamente a melhor. A melhor espiritualidade deseja Deus, seu amor, sua paz, sua vida, não só responder curiosidades sobre o mundo dos espíritos e entidades ou fazer alguma espécie de troca de favores com o mundo espiritual, para essa boa espiritualidade é imprescindível a humildade. É muito importante entendermos isso: falta de humildade nos afasta de Deus. 
      O humilde ainda que tenha acabado de pecar, busca a Deus, ainda que esteja emocionalmente confuso, persiste em buscar a Deus, e mesmo que esteja bem materialmente e afetivamente, procura a presença de Deus, sabendo que ela é melhor, é perene, e que as outras satisfações ou falta delas, são temporárias. O humilde teme a Deus em todas as situações e respeita todos os seres, humanos e espirituais, não quer usar nem desprezar ninguém, mas amar e servir. Essa humildade acha o amor de Deus e experimenta paz, então, põe-se no caminho do Espírito que conduz a Jesus onde há vida eterna. 
      A coisa mais poderosa e importante do universo ocorre quando um ser humano humilde se encontra com o amor de Deus, há uma explosão de luz que consola imediatamente o ser estabelecendo uma paz única. Esse encontro, que é espiritual, pode, contudo, não ser fácil, isso por causa da matéria, do nosso corpo físico, dos nossos limites. O ser humano deve persistir para achar dentro de si a humildade mais sincera e verdadeira, como quem procura uma pepita de ouro em meio a rochas mais duras. Mas imediatamente após achar será tocado pelo amor do Altíssimo e tudo o mais mudará
     Ainda que o Senhor é excelso, ainda que esteja numa posição espiritual alta de santidade impar e de poder soberano, ele atenta para o humilde, mesmo que a mente do Senhor esteja distante, muito mais que imaginamos, suas mãos estão próximas do humilde (perdoem as simbologias dos termos mente e mãos), mas ao soberbo conhece-o de longe, do arrogante tanto a mente quanto as mãos do Senhor estão distantes. Isso não impede Deus (com sua mente) de conhecer o arrogante, de amá-lo e de aguardar pacientemente que ele se torne humilde e se deixe tocar por suas mãos amorosas. 

Leia na postagem de amanhã
a 2ª parte desta reflexão
José Osório de Souza

16/05/22

Pecar é fácil, se arrepender, não

      “De onde vêm as guerras e pelejas entre vós? Porventura não vêm disto, a saber, dos vossos deleites, que nos vossos membros guerreiam? Cobiçais, e nada tendes; matais, e sois invejosos, e nada podeis alcançar; combateis e guerreais, e nada tendes, porque não pedis. Pedis, e não recebeis, porque pedis mal, para o gastardes em vossos deleites. Adúlteros e adúlteras, não sabeis vós que a amizade do mundo é inimizade contra Deus? Portanto, qualquer que quiser ser amigo do mundo constitui-se inimigo de Deus.” 
      “Sujeitai-vos, pois, a Deus, resisti ao diabo, e ele fugirá de vós. Chegai-vos a Deus, e ele se chegará a vós. Alimpai as mãos, pecadores; e, vós de duplo ânimo, purificai os corações. Senti as vossas misérias, e lamentai e chorai; converta-se o vosso riso em pranto, e o vosso gozo em tristeza. Humilhai-vos perante o Senhor, e ele vos exaltará.” 
Tiago 4.1-4, 7-10

      O contexto do texto bíblico inicial é simples e direto: pecado. Quantas vezes nos vemos sem vontade de orar, sem prazer em buscar a Deus, nos achando mesmo sem fé? Em situações assim nossas cabeças podem fazer longas viagens, tentando achar o motivo de nosso intenso desânimo, mas a razão é uma só: pecado. O que é pecado? Você e eu sabemos muito bem o que é, tudo que nos afasta de Deus. O texto começa justamente fazendo a pergunta cuja resposta explica o motivo de nos vermos muitas vezes sem disposição para sermos espirituais, “de onde vêm as guerras e pelejas entre vós?”, a resposta é, “não vêm disto, a saber, dos vossos deleites, que nos vossos membros guerreiam?”. 
      Não adianta inventar moda, nos afastamos da luz de Deus quando pecamos, pecamos porque gostamos de pecar, ninguém peca porque é ruim, mas porque é prazeroso, ninguém bebe, usa drogas ou comete adultério porque é desagradável, mas porque agrada o corpo. A mesma coisa com iras e invejas, agredimos com ações ou palavras e expressamos desejo pelas coisas dos outros porque é gostoso, melhor que reprimir é desabafar. Isso que estou dizendo parece óbvio, mas mesmo inconscientemente muitas vezes nos portamos negando isso, somos amigos do mundo e inimigos de Deus, por isso demoramos para assumir o pecado, confessa-lo, deixá-lo, e só então termos vitórias em tantas coisas. 
      Acontece o que o texto descreve, “cobiçais e nada tendes, matais e sois invejosos e nada podeis alcançar”, a questão é simples, só um prazer pode ocupar nossas almas de cada vez, se adquirimos o prazer do corpo não há espaço para termos o prazer do espírito, nossa alma não comporta os dois ao mesmo tempo. Mas o pecado, mesmo depois que seu passageiro prazer passa, ainda permanecerá ocupando nossa alma enquanto não for devidamente tratado, tratar o pecado, contudo, pode não ser tão rápido como foi adquirir o prazer que ele entrega. O texto diz “senti as vossas misérias e lamentai e chorai”, é preciso esforço paciente para limpar nosso interior para que o Santo Espírito esteja à vontade nele. 
      Uma vez impressionado pelo pecado nosso mundo interior inverte os valores, para mudar isso temos que nos convencer que a paz que o pecado deu é enganosa, tem que haver libertação de vício, vício dá mais que prazer temporário, cria um caminho errado para o prazer, é esse hábito que tem que ser desfeito dentro de nós. Por isso o texto diz “converta-se o vosso riso em pranto e o vosso gozo em tristeza”, temos que inverter a “chavinha”, sentir profundamente o pecado e buscar intensamente uma nova disposição mental. Se isso não ocorrer nosso arrependimento será só de boca para fora, não nos convencerá e não permitirá que tenhamos uma experiência espiritual real que nos dê a paz maior.
      “Chegai-vos a Deus e ele se chegará a vós, alimpai as mãos, pecadores e vós de duplo ânimo”, isso resume o ensino. Se nos sentimos distantes não é porque Deus se afastou, mas porque nós nos afastamos, Deus nunca se afasta de alguém. Nos purifiquemos, com profundidade e intensidade, com lágrimas, não com alegria ou frieza. Contudo, aprendamos com a lição, duplo ânimo (a N.V.I. diz mente dividida, a versão Nova Almeida Atualizada, indecisos) é característica de homem imaturo, que acha que pode ficar pulando de um lado para outro, que não leva a sério o tempo de sua passagem no mundo, nem a Deus e seu plano para nos fazer seres humanos que amem e pratiquem virtudes eternas. 

15/05/22

Deus não precisa de luvas

      “O Senhor dos Exércitos jurou, dizendo: Como pensei, assim sucederá, e como determinei, assim se efetuará. Quebrantarei a Assíria na minha terra, e nas minhas montanhas a pisarei, para que o seu jugo se aparte deles e a sua carga se desvie dos seus ombros. Este é o propósito que foi determinado sobre toda a terra; e esta é a mão que está estendida sobre todas as nações. Porque o Senhor dos Exércitos o determinou; quem o invalidará? E a sua mão está estendida; quem pois a fará voltar atrás?Isaías 14.24-27

      Deus não precisa de luvas, mas os homens criam luvas para Deus, as religiões. Quando muitos acham terem acesso à palavra direta de Deus têm apenas adaptações, interpretações, não é a mão pura de Deus, mas algo que fica entre a mão e os homens. Uma mão pode ser usada com luva, mas com limites, a pele não está diretamente em contato com o que é manipulado, é o material da luva que está e esse não tem a sensibilidade e a flexibilidade da mão. Deus não precisa de intermediários para tocar os homens, nem os homens precisam de algo que lhes adapte o toque de Deus, mas são os próprios homens que criam luvas. 
      O problema mais sério, contudo, talvez nem seja a criação e o uso de luvas, mas as luvas não terem noção que são luvas, se acharem as próprias mãos, ou pior, até melhores que as mãos. Que as religiões ainda que comecem puras se degeneram com o tempo, isso é fato, e ocorre com todas, ninguém se iluda. O cristianismo, ainda que fundado sobre Jesus, revelação e redenção mais plenas do Altíssimo, também se corrompeu. O protestantismo não purificou o catolicismo a ponto da mão pura de Deus ser apresentada ao homem, ele apenas limpou uma surrada e suja luva, deixando-a menos grosseira, mas ainda uma luva. 
      Como as luvas são criadas? Devagar, como parte do processo de degeneração da religião original, mas o que gera a primeira versão de uma, ainda fina, é a institucionalização da fé. O cristianismo é a crença que mais gerou luvas justamente por ser a crença que pode experimentar a ação mais alta de Deus. Quando os homens viram que Jesus era um “produto” muito bom, que povos e reis se convertiam a ele, eles foram tentados e sucumbiram, quiseram lucrar com isso. Se afastaram de Deus e dessa forma não tiveram mais direito à mão, então criaram uma religião, com o mesmo formato, com função semelhante, mas só luva. 
      A luva por si só, ainda que seja de fios de prata, cravejada com esmeraldas, aparentemente até mais bela que uma mão, é vazia, não tem vida. Em sua misericórdia Deus até veste certas luvas e as usa para abençoar os homens, ainda que de luvas ele aja com limites, não seus, mas da fé de homens que não creem puramente nele, que não querem a mão, só a luva. Contudo certas luvas, apesar de terem o formato perfeito de uma mão genuína, não podem ser mais minimamente usadas por Deus, no lugar do Santo Espírito manipula tais luvas espíritos malignos e enganadores, que dizem ser Deus, mas são seres imitadores. 
      Os homens se acostumam com luvas, com o toque delas, com suas pomposas aparências, e muitos ao verem a mão de Deus a menosprezam, duvidam que seja mais poderosa que a luva. Felizmente outros, que com boa sinceridade procuraram nas luvas a Deus, percebem com o tempo a ineficácia das luvas, que elas são obras de homens, que ainda que se pareçam com a mão de Deus não os abençoa como eles precisam, assim passam a clamar pela mão viva e maravilhosa do Senhor. Deus é paciente, amou e ajudou no que pôde, mesmo dentro de limitadas luvas, mas sorri quando o homem desperta e o deseja mais que religião.