segunda-feira, agosto 03, 2020

Cristianismo cobrado (parte 1/7)

 Cobrança é necessária?

      “O espírito do homem é a lâmpada do Senhor, que esquadrinha todo o interior até o mais íntimo do ventre.
  Provérbios 20.27

     Vivemos um momento, que já começou há algum tempo, onde “é proibido proibir” (como diz a canção de Caetano Veloso ainda dos anos 1960), nem podemos dizer com certeza que isso é o desejo da maioria das pessoas, eu penso que nem é, mas é o que a mídia e outras organizações, que querem se colocar no papel de sacerdotes, ocupando o lugar das religiões, principalmente do cristianismo, pregam. Várias questões podem ser levantadas sobre isso, como por exemplo, quem é mais cobrado, as crianças ou os adultos? Ou então, cobrança é necessária? Quando dizemos cobrança, aqui nos referimos principalmente à cobrança moral, a exigir das pessoas uma referência de certo e errado, a dar liberdade para se fazer as coisas. Todos podem fazer tudo? Algumas coisas? Quem o que estabelece limites? A mídia, as organizações internacionais, as religiões, o cristianismo, Deus? Deus é um ou muda de pessoa para pessoa?
      Civilidade implica em se viver o melhor possível em sociedade, se cada um de nós vivesse só em uma ilha não precisaria de regras, de leis, de limites, mas isso se estivesse desprovido de todo tipo de referência moral interior, e acima de tudo, de espiritualidade, de Deus. Ainda sozinho, um ser humano criado pelo meio social se sente cobrado e cobra, de si mesmo. Uma criança é considerada inocente moral porque não teve seu corpo e sua psique ainda no desenvolvimento físico máximo, o que ela faz não é considerado errado pelo simples fato dela ser criança. Assim, mesmo que dediquemos mais tempo para ensiná-la, principalmente nas áreas social e moral, não pesa sobre ela castigos legais mais sérios, ao mesmo tempo que se for uma criança “normal” (dentro do que se é possível ser normal e do que signifique isso), ela não fará coisas sérias demais para ser julgada pelas leis dos adultos, ela é inocente. 
      Um adulto é mais cobrado? Sobre isso também há dois lados, é mais cobrado e desobediências criminais podem ter sérias consequências, mas se ele for “normal” (e estamos de novo usando esse termo tão relativo e impossível de ter um significado absoluto) terá mais condições, mais informações, mais preparo para viver em harmonia com um grupo de pessoas sem que caia na disciplina da cobrança. Mas esbarramos nesta reflexão em alguns conceitos complicados de serem definidos, como “deus”, normal e liberdade, quanto mais ligados a conceitos amplos os termos são, mais difíceis são de serem definidos, talvez porque eles não devam ser definidos, só aceitos (ou cridos). O “deus” de cada um, cada um deve respeitar, mesmo que não seja o mesmo “deus”, e cristãos, aceitem isso com humildade, existem muitos “deuses” e mesmo o mais alto deles respeita-os no tempo e no espaço, assim não sejamos mais reais que o rei. 
      A liberdade de cada um, cada um deve permitir, desde que não agrida a sua liberdade, e para isso muitas vezes pode bastar não estar no lugar que pessoas que querem liberdades diferentes da nossa estejam, ou limitar essa liberdade a um meio onde só estejam pessoas com uma liberdade em comum, isso é civilizado. Obviamente crianças, inocentes, seres ainda não amadurecidos e com independência de escolha, devem ser protegidos das liberdades estranhas enquanto são ensinados na liberdade de quem os cria, que também precisa respeitar a liberdade da criança que um dia será um ser maduro e independente. Agora, normal, quem é normal? Ninguém, mas ser normal também se encaixa no conceito de liberdade, aliás ser livre é ter direito de ser pessoal, sem compromisso com normalidade estabelecida, mas aí somos limitados pela vida em grupo e pelo direito de outros também viverem suas normalidades.
      Contudo, preciso compartilhar um entendimento pessoal que tenho sobre cobrança, baseado em minha vida com Deus através de Jesus e pelo Espírito Santo. Ainda que um homem fosse criado sozinho em uma ilha, sem interferência do meio social, seja físico ou psicológico, ele teria dentro de si um espírito, que caminha com ele de eternidade à eternidade, de antes de seu nascimento (de sua encarnação) até depois de sua morte física, o “juízo”. Esse espírito procura por Deus, deseja o altíssimo, precisa de referências de luz e trevas, de bem e mal, de certo e errado, esses conceitos levam o homem a querer se amar, amar os outros e amar a Deus. Assim chegamos a um nível superior da cobrança, que não é humana, passageira, relativa, social, material, mas espiritual, divina, eterna, absoluta. Como eu disse no início desse parágrafo, esse é um entendimento pessoal, esteja à vontade para concordar ou não.
      Sobre o texto inicial, há algo no homem que testemunha a eternidade, a espiritualidade, o divino, isso o tempo todo, é o espírito humano. Podemos negá-lo, afirmar que cientificamente não se pode provar sua existência? Talvez, mas não podemos deixar de afirmar que existe uma parte no ser humanão, que vai além de corpo, de carne, de sangue, músculos, ossos, nervos, membros, órgãos e cérebro, que não podemos saber exatamente o que é, mas que existe. É o que faz valer a afirmação filosófica “penso, logo existo”, é o que nos diferencia dos animais irracionais, é nossa identidade, é o que se expressa artisticamente, mas é o que também produz e interage com os “religares”, as ligações com o espiritual. Essa parte do ser humano é um pedaço da eternidade em nós, do pai de todos os espíritos, é essa parte que nos empurra para uma espiritualidade mais alta e que nos cobra, não com dor ou estupidez, mas delicada e mansamente, como um sussurro, baixo, mas firme e claro, como sempre é a genuína voz de Deus. 

“O cristianismo está sendo cobrado”,
uma reflexão dividida em sete partes,
acompanhe nos próximos dias as outras partes
para melhor entendimento de todo o assunto,
José Osório de Souza, 31/05/2020

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