terça-feira, agosto 09, 2011

Cantar ou voar? (conto)

Em uma floresta havia um pássaro. Ele voava como nenhum outro pássaro. Voava alto e não se cansava. Conseguia ir para muito longe e sempre podia voltar à sua origem, quando desejava. Por ter essa facilidade, ele pouco parava para conviver com os outros pássaros. Os outros ficavam por muito tempo nas árvores, cantando, alegrando os animais da floresta. Ele não tinha tempo para isso, queria voar, queria ser livre. Bem, era isso o que os animais achavam sobre ele, “ele ama a liberdade, não tem tempo para ficar aqui com a gente e cantar, orgulhoso, deve se achar melhor que nós”. Mas a verdade era outra, o pássaro simplesmente não conseguia cantar, por isso ele estava sempre em movimento. Ele não admitia isso, dizia que ficar lá parado, com os pássaros, só cantando, era muito chato, mas o que ele tinha era vergonha de que os pássaros soubessem que ele não podia cantar, por isso estava sempre voando para longe.
Uma noite, o eterno criador da natureza, da floresta, dos pássaros e de todos os animais, apareceu para ele em sonho e lhe perguntou: “Pede-me o que quiser e eu te darei, mas aviso, pensa bem no que vai me pedir, porque só terá direito a um pedido, e eu o realizarei exatamente do jeito que você me pedir”. Em sonho, o pássaro respondeu ao criador: “Eu quero cantar, quero muito, bem melhor que os outros pássaros, quero isso mais que tudo na vida”. O criador então lhe respondeu: “Continue dormindo em paz, pela manhã, quando acordar, terá o teu pedido respondido”.

Quando o pássaro acordou, ele caminhou até a ponta do galho em que dormia, onde outros pássaros costumavam ficar para cantar. Quando os pássaros o viram, eles disseram: “Olha quem está aqui, entre nós, o senhor liberdade, aquele que vive voando, se exibindo, que nunca fica em nosso meio, cantando com a gente”. O pássaro estava com muito medo, pensava no sonho que tinha tido. Os pássaros ficaram todos em silêncio, como que aguardando a sua resposta. Com a voz ainda trêmula ele começou a cantar, incrédulo, achou que não sairia nada, somente o barulho desafinado de sempre. Mas qual foi a sua surpresa quando ele percebeu que conseguia cantar, mais ainda, cantava muito bem. O criador de tudo tinha lhe concedido o desejo, agora ele podia cantar, e melhor do que todos. Os pássaros ficaram maravilhados com o canto dele, ficaram ouvindo-o com muita atenção. Não só eles, mas todos os animais da floresta vieram até a árvore onde ele estava e ficaram quietos, ouvindo seu recital.

        Algum tempo depois, os pássaros tiveram sede e fome, um a um foram levantando voo, buscando água e comida. Até que o pássaro ficou sozinho, ainda assim continuou cantando. Todavia, num determinado momento, ele também ficou com fome e sede. Quase que mecanicamente, sem pensar, ele se lançou do galho e abriu as asas. Contudo, para sua surpresa, ele não conseguia movimentar as asas para que elas pudessem fazê-lo voar. Ele ainda conseguiu, desajeitadamente, planar até o chão, por pouco não se machucou. Lá embaixo, sozinho, já que todos os animais tinham saído para fazer suas refeições, ele ainda tentou novamente voar. Tentou e tentou, mas nada, não conseguia voar. Andando então, ele pode, com muito esforço, obter comida, e chegar a um lago, para saciar sua sede.

O tempo passou e o pássaro percebeu que simplesmente não conseguia mais voar. Para facilitar sua vida, ele começou a dormir perto do lago. Comia o que achava por lá e o que os outros pássaros deixavam, como sobra de suas refeições. Mas mesmo assim, debilitado, naquele local impróprio, já que longe do alto das árvores os pássaros ficavam mais expostos aos animais que os caçavam, ele continuava a cantar, e como era belo seu canto. Os outros animais perceberam que ele estava preso naquele lugar, perto do lago, perceberam também que ele não voava mais. Tinham dó dele e o ajudavam, trazendo-lhe alimento. Assim foi a vida daquele pássaro por algum tempo.
Em uma noite, durante o sono, o criador de todas as coisas, veio falar com o pássaro, disse ele: “Por que está abatido pássaro?”, respondeu o pássaro: “Do que me adianta cantar tão bem, se eu não posso mais voar? Posso cantar, mais do que os outros pássaros, mas não consigo me alimentar, dependo do favor dos outros”. Então respondeu o criador: “Não se pode ter tudo o que se quer na vida, principalmente algo importante. Você voava mais que os outros pássaros, então pediu para cantar mais que os outros. O melhor é ter equilíbrio, não usar a liberdade para se afastar dos amigos, dos parentes, mas parar e cantar um pouco com eles, não o melhor canto do mundo, mas o suficiente para alegrar os animais. Liberdade demais rouba a alegria, alegria demais nos prende, e tira a liberdade”. O pássaro então perguntou: “E o que eu faço agora?”. Respondeu o criador: “Pare de cantar um pouco e aprenda a voar. Você não voará como voava antes, mas se for esforçado, com o tempo voará o suficiente para poder se alimentar, saciar tua sede, e ter a tua independência”.

O pássaro entendeu que não podia ter as duas coisas. Entendeu também que isso nem era necessário, o melhor era ter a dose certa de liberdade e de alegria, de solidão e de companhia, de sossego e de trabalho. Mas o mais importante que o pássaro aprendeu, foi que o que fazia com que ele quisesse voar melhor e cantar melhor, era somente vaidade. Essa vaidade não estava dando nada de bom para ele, só o deixava sozinho. Ela só o afastava dos outros pássaros, tornava-o arrogante. Com humildade e coragem, ele conseguiu achar o equilíbrio na vida.

"Pois Deus não nos deu espírito de covardia, mas de poder, de amor e de equilíbrio." II Timóteo  1:7  

Um comentário:

  1. Ficou excelente esse conto.
    Não podemos querer tudo na vida, mas aprender a valorizar aquilo que possuímos e agradecer a Deus por tudo o que tem nos dado.
    Beijos
    Cláudia

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