quarta-feira, maio 01, 2019

Seres apaixonáveis

      “Porque nunca haverá mais lembrança do sábio do que do tolo; porquanto de tudo, nos dias futuros, total esquecimento haverá. E como morre o sábio, assim morre o tolo!” Eclesiastes 2.16

      O que move o ser humano? A paixão. Seja em que área for, física, intelectual ou espiritual. O prazer emocional que algo nos dá nos faz agir, mesmo que impulsivamente, mesmo desacatando a razão, mesmo sem aceitar que uma paixão só começa quando outra termina, outra que não durou muito, mas que tem que acabar para que outra se inicie. Paixão é essencialmente passageira tanto quanto o ser humano é viciado em criar novas paixões, para quê? Para manter-se vivo. A morte que todos os homens herdaram, após o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal ser provado, só pode ser ludibriada com paixão, paixão é uma gota de vida que pinga em nossos corações, de vez em quando, mas que nos faz acreditar que felicidade existe e que vale a pena continuar vivendo.
      Não pense os que se acham “espirituais”, seja lá o que isso signifique, que eles não são movidos por paixão, são sim, por quê? Porque o espírito, “ungido” ou não pelo Santo Espírito, não se manifesta no mundo material diretamente, ele precisa de um corpo físico, e esse só é movido pela energia de uma alma apaixonada. As revelações mais santas e profundas de Deus, a música mais tocante ou a pessoa mais interessante, despertam em nós um sentimento que reflete paixão em nossas almas. O que é unção? É paixão santa, digamos assim, e isso na melhor das circunstâncias, sob o ponto de vista espiritual. O olhar puro de um filho, a sabedoria sincera e benigna de um pai, a beleza estética da arte, o consolo de Deus, tudo isso nos desperta paixão.
      O que tem de errado com isso? Nada, se tivermos a clareza de entender a impotência humana de reter qualquer espécie de virtude, mesmo a mais alta e espiritual. Um casamento feliz e duradouro acontece quando se consegue manter paixão, quando ela pode ser renovada de tempos em tempos pela mesma pessoa, e creia, isso é possível, se nos casamos certo. Uma palavra tem poder num púlpito quando o pregador a diz com paixão, quem sente convence que vive, mesmo sem viver. Mas esse é o grande engodo da paixão, ela pode expressar teoria que nunca se transforma em prática, mesmo que o teórico, no ímpeto da paixão, acredite de todo o coração que vive o que diz ou que poderá um dia viver. Mas se o pregador se reapaixonar por Deus conseguirá praticar o que prega por mais tempo, o tempo da paixão.
      O melhor que se pode fazer, então, é se reapaixonar pelas mesmas coisas, aos que estão do lado de fora parecerá que somos fiéis a alianças e que não nos rendemos a vãs paixões, mesmo que só estejamos renovando paixão pelas mesmas coisas. Não nos iludamos, o que nos move não é nenhum poder sobrenatural espiritual, o homem é fraco demais, egoista demais, pecador demais, para ser canal direto de Deus, o máximo que ele consegue é ser espelho, e nem é um espelho perfeito, limpo, cristalino. O reflexo limitado do Espírito Santo na alma humana exagera algumas coisas, desvaloriza outras, mas, felizmente para todos nós, consegue compartilhar algo da pura essência da emanação do Altíssimo, suficiente para alimentar as almas humanas, sedentas de alguma paixão para seguirem vivendo. 

      “Porque toda a carne é como a erva, e toda a glória do homem como a flor da erva. Secou-se a erva, e caiu a sua flor; mas a palavra do Senhor permanece para sempre.” I Pedro 1.24-25

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