sábado, novembro 23, 2019

Quem pode se proteger da morte?

      “E andou Enoque com Deus, e não apareceu mais, porquanto Deus para si o tomou.Gênesis 5.24

      Você pode não gostar do Gugu Liberato, dos programas que ele fez, do estilo dele, mas uma coisa todos temos que admitir, ele foi importante na TV brasileira, foi muito importante na cultura do povo brasileiro, fez parte do entretenimento televisivo de muita gente, está em nossas memórias, e sempre como um símbolo de alegria. Era uma pessoa carismática, dessas que as câmeras amam, que brilham na tela, era amado e respeitado por muitos e sempre nos passou a imagem de alguém carinhoso, delicado, gentil. Você, crente, não seja preconceituoso, medindo o trabalho desse homem como de mau gosto, como indecente em alguns momentos, saiba que ele reflete a realidade de uma parte majoritária da população brasileira, e ele não ganhou tudo que ganhou sem motivos legítimos. Gugu Liberato mereceu tudo que teve em quase quarenta anos de trabalho na TV, tudo, o universo é sempre justo. 
      Aos 60 anos, depois de décadas de uma carreira vitoriosa no SBT, ele tinha um programa na Record, mas morava nos E.U.A., com os três filhos e a mãe de seus filhos, podemos dizer que já estava usufruindo de tudo o que plantou, morando numa casa nova, e com certeza nem precisaria mais trabalhar para o resto da vida. Então, numa quarta-feira, dia 20 de novembro de 2019, querendo consertar um ar condicionado, subiu ao sótão sem saber que o chão não poderia suportar o peso, caiu de uma altura de quase quatro metros e bateu a cabeça num móvel. Foi levado ao hospital e depois de 48 horas, na sexta-feira, dia 22, sua morte cerebral foi anunciada. Rápido demais? Fora do tempo demais? Estúpido demais? Mas a morte veio, e mesmo ele, com toda a fama, poder aquisitivo, com toda a segurança que buscava no estado da Flórida nos Estados Unidos, não pode se proteger dela, não pode prevê-la. 
      Por quê essa morte me tocou tanto? Porque de alguém que já está bem velho, doente, ou que até tem uma personalidade mais sombria, mais fechada, ou uma atividade mais escondida, nem notamos muito quando se vai, ainda que toda morte seu doída para alguém. Mas o Gugu era todo luz, todo vida, todo sorriso, todo energia, jovial ainda que sexagenário, desses que nos parece que nunca vai partir desse plano, e de repente, de um jeito estúpido, repito, num acidente doméstico, longe do trânsito das ruas, fora de aviões que sempre nos parecem estarem se movendo em espaço que não lhes pertence, ainda que quedas de avisões sejam estatisticamente menores, longe da criminalidade das cidades brasileiras, das guerras civis ou não, onde tanto risco se corre, de repente ele cai, sozinho, e se acidenta de um jeito irreversível. Tantos se expondo de maneiras perigosas escapam da morte, Gugu não escapou.
      Nesses momentos nós pensamos sempre a mesma coisa, eu preciso dar mais valor à vida, preciso me cuidar mais, mas também não deixamos de repensar o óbvio, a única verdade inexorável da vida: ela é curta e ninguém escapa da morte. Eu penso que morte se constrói, durante toda a vida, cada escolha, cada atitude, cada palavra, cada amor e cada ódio, cada sonho e cada desilusão, coloca um pedaço numa porta chamada morte. A morte não se adquire por inteira e de uma só vez, mas aos poucos, ocorre que quando ela está pronta ela se abre, bem a nossa frente, seja lá onde estivermos, sem que tenhamos chance de fechá-la. Quanto tempo levamos para construir essa porta? Isso varia, de pessoa para pessoa, depende de todas as coisas que fizemos durante toda a nossa vida. Algumas mortes nos parecem pegar de surpresa? Pois a Deus não pega, quando ela vem é porque ela é necessária.
      A verdade é que somos escravos do tempo, ou daquilo que achamos que ele é, mas o tempo de Deus é diferente, aliás Deus não tem tempo, pra ele é sempre presente, pois ele não envelhece nem planta para colher depois. Viver bem cada momento, cada instante como se fosse o último? Não se culpar pelo passado, nem se preocupar com o futuro? Isso tudo até pode ser sábio, mas ainda é se ocupar do tempo, o melhor é se ligar ao Senhor de tudo, até do tempo. Ligado em Deus nada nos pega de surpresa e o Senhor sempre nos dirá o que fazer para viver bem cada momento e não ter uma partida desse plano estúpida. Deus sabe de cada um, conhece lá no fundo o coração de todo ser humano, conhece a verdade, o que somos de fato, nossas prioridades. Deus sabe se nossos corações amam aquilo que de fato importa nessa existência e que nos preparará para o melhor, e não para o pior, da eternidade.
      Quem pode se proteger da morte? Ninguém, nem o pobre, nem o rico, nem o famoso, nem o desconhecido, nem o erudito, nem o desinformado, mas todos, todos nós podemos nos aproximar de Deus, a tempo. A maior prova de amor de Deus para conosco é que ele compartilha a eternidade e a espiritualidade mais alta conosco, reles mortais, se nós quisermos, se nós buscarmos, se nós permitirmos. Mas será que somos nós de fato que fazemos alguma coisa, que recebemos algo por algum mérito? Eu penso que não, penso que tudo parte e se encerra em Deus para depois nascer de novo de um modo fantasticamente superior e inédito, que nós nem podemos imaginar. Por algum motivo, que é preciso que seja mistério para todos nós nesse tempo, temos um destino para amarmos (ou não) a Deus, esse entendimento não é para todos, os que amam a Deus, contudo, sabem que amam porque Deus os amou primeiro. 
      A morte nos coloca em contato direto, sem a fumaça da existência encarnada, com esse mistério, que se inicia antes de tudo com algo absolutamente novo. Ainda que autores bíblicos falem de céu e inferno, de paraíso e perdição, tentando comparar valores espirituais com referências materiais, ainda assim nós não podemos fazer ideia do que é a morte e do que encontraremos depois, tanto perto quanto longe de Deu (se é que é possível estar longe do amor de Deus para sempre, talvez só longe de se deixar ser amado...). Deus não se afasta de ninguém, são as pessoas que se afastam dele, e se isso for feito de maneira muito decisiva não só levaremos isso para a existência pós-morte mas também apresaremos a morte. Por quê? Porque para que deve existir vida se não for para andar com Deus? Contudo, os que andam muito com Deus, como Enoque, nem a morte provam. 
      Se o Gugu Liberato está perto ou longe de Deus agora em sua existência puramente espiritual só Deus sabe. O que podemos fazer neste momento é com relação aos vivos na carne, isso nos é autorizado, comunicação de vivos com vivos e todos com Deus através de Cristo. Assim, sejamos sensíveis à vida, às experiência dos outros, aprender com erros alheios nos protege de termos que aprender com os nossos próprios, que dói muito mais. Mas tenhamos humildade para assumir nossos erros, nos arrependermos, pedirmos perdão e desejarmos seguir sem cometê-los de novo. Tenhamos coragem de fazer as melhores escolhas, e as melhores escolhas é sermos fiéis com as alianças que fazemos. Não percamos a esperança em Deus, não desistamos de Deus, e se o buscarmos no Espírito Santo sempre acharemos forças para crer e adorar a Deus. Quem vive certo, em nome de Jesus, terá uma boa morte, eu creio. 

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