terça-feira, fevereiro 26, 2019

Preconceito X Humildade

      Confesso, ainda sou preconceituoso, julgo pela aparência, por um estereótipo que gravei na minha cabeça, sem conhecer de fato a pessoa. Preciso deixar aqui esse depoimento, e como músico, convivendo com músicos, e já com algum tempo de vida, às vezes ainda tiro conclusões precipitadas sobre as pessoas, talvez justamente por achar que já sei alguma coisa. Na música, uma coisa é o diferencial para quem quer exercer o ofício, talento natural, esse quesito não é adquirido com o tempo, não pode ser comprado com dinheiro nem com a maior força de vontade do mundo, ou a pessoas nasce com talento, ou não. Pode acontecer do talento aflorar mais à medida que a pessoa amadurece como ser humano, arte é virtude da alma, e fica melhor à medida que a alma ganha liberdade, mas ainda assim o potencial já estava com a pessoa desde seu nascimento.
      Assim, não julgue um músico pela aparência, mesmo pela cultura ou formação acadêmica. Existe gente que teve acesso a muito estudo, incluindo o musical, como à escola de piano erudito, cujo currículo passa de dez anos de estudo pesado, mas ainda assim gente com pouco talento mesmo que com muita técnica. Músico com talento não precisa de estudo, pode nem ler partitura, mas tem o que chamamos de “ouvidos”, ouve e sabe o que está acontecendo e executa no instrumento, discerne notas, escalas, acordes, encadeamentos, ritmo, arranjo etc. Ouve e sai tocando, sem precisar decodificar partitura, e além de reproduzir o que outros criaram, compõe obras originais e rearranja. É claro que quando o talento encontra o estudo, quando além de ouvidos o músico tem conhecimento da teoria musical, de harmonia, de partitura, o músico atinge seu apogeu. 
      Contudo, já encontrei gente simples, e mais que simples, humilde de fato, a qual eu não dei a princípio muito valor como músico, sim, devido a simples preconceito, por achar que pessoa com este estereótipo não deve ser bom músico e com aquele, deve, nesse julgamento pra pior já me dei mal e passei vergonha. Ocorre também que pessoas realmente geniais podem ser verdadeiramente humildes, não se impõem por aparência nem por palavras, você só vai saber que elas têm muito talento quando as vir atuando, tocando o instrumento. A verdadeira e melhor humildade não se nasce com ela, e ter um jeito tímido e discreto não significa de fato ser humilde, mas o músico em especial é de uma classe bem humilhada, principalmente em nosso país (e em nossas igrejas), tem que ser humilde para sobreviver. 
      Não me refiro a esse músico que vemos na mídia, na TV, na internet, esse pode ser celebridade, mas não ser artista (e uso o termo artista na melhor das óticas, referindo-me a alguém que de fato produz arte), muitos podem ser famosos, mas nem terem talento musical, assim pode até parecerem humildes, mas não serem. Não estou generalizando, mas infelizmente atualmente existe uma obsessão muito grande para ser celebridade (e muito nas igrejas evangélicas), e muitos fazem qualquer negócio, “vendem a alma”, para terem fama (ou se vendem e perdem a pureza do evangelho como “artistas” gospel). 
      O músico da noite, contudo, como chamamos esse profissional marginal que não aparece na mídia, aprende que precisa sobreviver de seu trabalho, que a competição é desleal, e que humildade é preciso para seguir de cabeça erguida e com portas abertas. É nesse tipo sofrido de profissional onde achamos gente muito talentosa, com uma aparência bem diferente das celebridades midiáticas, e que se não estivermos com a mente e o coração abertos podemos interagir com preconceito, com julgamento ruim, e sermos envergonhados. A lição é, cuidado, não defina alguém sem conhecê-lo profundamente, ainda que para quem tem sabedoria de vida em Deus, bastem alguns instantes para ver a qualidade do caráter de uma pessoa.

      “Os propósitos do coração do homem são águas profundas, mas quem tem discernimento os traz à tona.” Provérbios 20:5

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