1. O rio da união
“Um só Deus e Pai de todos, o qual é sobre todos, e por todos e em todos vós. Mas a graça foi dada a cada um de nós segundo a medida do dom de Cristo.” Efésios 4.6-7
Não julguemos mal ninguém, muito menos os que se dão ao trabalho de vivenciar uma religião com fidelidade pura e boa sinceridade. Nem todos os seres humanos acham no cristianismo ferramenta eficiente para conduzir ao aperfeiçoamento moral, e consequentemente, à vida digna neste mundo e “céu” no outro. Mesmo muitos que se autodenominam cristãos poderiam ter vidas mais limpas e felizes se buscassem outras ferramentas. Isso não significa que Jesus não seja único e excelente, mas significa que os que o seguem devem ser únicos e excelentes por causa disso, em amor, tolerância, justiça, santidade e humildade. Contudo, a verdade da conexão espiritual de cada ser com Deus, só conheceremos de fato na eternidade.
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O texto que segue é mais que obra de ficção, são simbologias espirituais por trás de um conto, num estilo literário no qual Jesus era mestre, a parábola. Pela misericórdia de Deus escrevi essa “estória” sem racionalizar muito, a base foi coisa de quinze minutos, parei depois com mais calma para apurar a linguagem e acrescentar detalhes, esses foram iluminações que o Espírito Santo me deu sobre a inspiração inicial. Nas próximas cinco postagens farei explicações das simbologias, mas muito mais pode ser aprendido se meditarmos sobre a “estória”. Espero abençoá-los com o texto.
1.1. Ilusão ou realidade?
É nossa existência neste mundo, realidade ou ilusão? Uma metáfora para nos ensinar o que de fato importa no universo? Pode ser só um sonho passageiro que o divino cria para que seres inferiores sejam instruídos. Não suportaríamos a verdade, não estamos preparados para ela, assim, como crianças, somos atraídos com doces para fazermos as coisas certas, ainda que em nossa infantilidade achemos que nosso principal propósito neste mundo seja pegar doces. Se for uma ilusão, seria igual em todos os mundos do universo? Ainda que a realidade seja só uma, os sonhos podem ser diferentes em cada mundo. Isso na verdade nem importa para o divino, contanto que os seres aprendam a lição.
1.2. Experiências diferentes
Em algum lugar do universo, após um período em que as chuvas deixaram de ser constantes e suficientes, que levou a zero o nível de águas nas cisternas, três homens tiveram sede. Sabiam, através de um mito antigo, que havia um rio de águas limpas e frescas próximo à sua cidade, assim resolveram procurar o rio. O primeiro homem, pobre e dependente de seu trabalho diário para sobreviver, foi o primeiro a achar o rio. Chegando ao rio levou as mãos em forma de concha às águas, depois à boca e matou sua sede. Ele entendeu que sempre que tivesse sede, para não depender das chuvas tão raras, teria que ir até o rio e tomar agua, fez outras viagens com sua família para que esses tivessem água.
O segundo homem, mais rico, sabendo do rio, quis pagar outros homens para irem ao rio e trazerem a água, mas o esforço de levarem baldes os levava a consumir a água dos baldes e assim quando retornavam já não tinham água para o homem rico. O homem resolveu então ir ele mesmo ao rio, mandou fazer uma caneca de ouro adornada com pedras preciosas, assim ia ao rio, matava sua sede e ainda podia trazer uma caneca cheia de água. Fez outras viagens com membros de sua família, para os quais também mandou confeccionar luxuosas canecas. O rico temeu, achou que a água do rio poderia acabar, assim pôs soldados na saída da cidade que impediam que outros homens fossem buscar água.
O terceiro homem, conhecedor de tecnologia, mais íntimo da ciência, teve uma grande ideia, construir um sistema de canos que levaria a água do rio até o lugar onde morava. Para tal fez uma aliança com o homem rico, disse que entregaria água por um preço, cobraria um valor e dividiria o lucro com o rico. Com o tempo todos passaram a usar o sistema de transporte de água, e com o tempo grande parte das pessoas esqueceu-se da existência do rio. Contudo, depois de algum tempo o sistema de transporte de água parou de funcionar, os construtores haviam morrido, as pessoas não sabiam como construir um novo sistema, assim com chuvas raras o povo ficou novamente sem água e ainda mais cético.
1.3. O jeito simples é o certo
Um quarto homem resolveu acreditar no antigo mito, que a água vinha de um rio e era farta e de graça, assim, iniciou uma jornada para descobrir o lugar. Os tempos eram ainda mais difíceis, entre a cidade e o rio, um terrível e seco deserto havia se formado. Os destroços do antigo sistema de canos ajudou um pouco, mostrando o caminho, mas justamente na parte mais próxima ao rio ele tinha sido totalmente invadido pela natureza. Finalmente o homem chegou ao rio, matou sua sede e teve uma ideia, chamar o povo para morar nas margens do rio, assim todos poderiam ter água sem grandes esforços. Contudo, essa mudança tinha um preço, muitos deveriam deixar seus palácios e construir residências próximas ao rio.
Para não sujar ou interferir no rio, as casas deveriam ser pequenas. Os ricos se revoltaram, não queriam perder o status que tinham por serem donos de palácios, assim resolveram ficar, mas antes tiveram permissão de irem até o rio e pegarem grandes quantias de água para acumularem em cisternas. O povo do rio deixou claro que a cidade construída nas margens do rio estava disponível para que os ricos morassem nela, desde que obedecessem a regra da igualdade. Contudo, só uma coisa foi proibida, caso quisessem continuar na cidade longe do rio, a construção de um novo sistema de canos para transportar a água. Os ricos estariam por conta da própria sorte, só teriam a água armazenada e a pouca chuva que caía.
Com o tempo, o povo do rio prosperou, de maneira igual para todos, não havia em seu meio pobres ou ricos. Já os ricos da cidade empobreciam e sofriam, sabendo disso, o povo do rio teve compaixão, mandou mensageiros, com alguma água, para convencer o povo da cidade para que viesse morar com eles. Os primeiros mensageiros foram mortos e a água que levaram foi roubada. Mas o povo do rio, em seu grande amor, não desistiu, mandou novos mensageiros, a segunda leva foi roubada e aprisionada, usada para cavar poços profundos, que entregava uma água salobra e de pouca quantidade ao povo da cidade. Finalmente, depois de um tempo, após vários mensageiros não retornarem, o povo do rio parou de enviá-los.
1.4. No tempo colhe-se os frutos
Muitos do povo da cidade longe do rio morreram, pais orgulhosos viram filhos e idosos definharem, assim, após muitos anos de sofrimento e humilhação um pequeno grupo de sobreviventes tomou uma decisão, iria até o rio, pediria misericórdia ao povo de lá, que recebessem os sobreviventes ainda que como escravos, mas que lhes permitissem usar as águas do rio. A distância não era grande, mas devido ao estado debilitado que se encontravam, a viagem durou muito mais que deveria. Todavia, quando estavam no meio do caminho, avistaram, vindo em direção a eles, o povo do rio, então, eles temeram, pensaram, “nos matarão, a todos, se vingarão de todos os mensageiros que matamos e encarceramos”.
Os remanescentes dos ricos orgulhosos surpreenderam-se quando, aproximando-se, o povo do rio os recebeu com cântaros de água limpa e fresca e com largos sorrisos nos rostos. O povo do rio ajudou o povo debilitado da cidade a chegar à cidade do rio, lá os viajantes cansados receberam casas para morar, iguais às dos que lá já moravam. Os ricos, agora empobrecidos pelo próprio orgulho, disseram: nós não merecemos essas casas, fomos cruéis com vocês e vocês nos recebem com honras? O povo do rio respondeu: nós já vencemos a vingança e a cobiça, só queremos viver em paz com todos, vocês sempre foram nossos irmãos, mas distantes, que precisaram de mais tempo para entender as mais altas relevâncias da vida.
Entre os sobreviventes do povo da cidade, havia especialistas em tecnologia, mais talentosos que o povo da rio, a necessidade aperfeiçoa a ferramenta. O povo da cidade não sobreviveu porque não conhecia a ciência, mas porque era orgulhoso, não reconhecia que todo o seu conhecimento não muda leis básicas da natureza, como clima, falta de chuvas, distâncias geográficas ou superfície do solo. Quando aprendeu a lição, tornou-se humilde, assim pôde ajudar o povo do rio, que sempre foi rico em humildade e amor, a realizar um sonho que tinha e que pelas próprias capacidades não podia realizar, ajudar outras cidades longe do rio, construindo sistemas de encanamento de água. União entregou a força maior.
1.5. Amor, fruto da verdade
Novos e aperfeiçoados sistemas de canos assim como cisternas mais eficientes foram criados, mas as cidades que recebiam esse auxílio recebiam também a informação que a água vinha de um rio que o povo inicial que habitou suas margens tratava como sagrado. Os que recebiam a água encanada não deveriam se ensoberbecer com a autonomia, mas serem gratos pela ajuda dos outros povos e pelo rio. As residências nas margens do rio eram limitadas, senão prejudicariam o rio, mas à medida que os que lá moravam faleciam sobravam casas que podiam receber habitantes das cidades longe do rio. Eram selecionados para tal aqueles que tinham vidas mais corretas, de maneira a incentivar as pessoas a serem melhores.
Cada cidade longe do rio que era ajudada, à medida que seus habitantes podiam morar com o povo do rio, acrescentava à cidade do rio novos talentos e capacitações. Dessa forma, à medida que o tempo passava novas técnicas permitiam aumentar as residências nas margens do rio, sem prejudicá-lo. Com o tempo a cidade do rio se tornou a única cidade do mundo conhecido por aqueles povos, todos vivendo de maneira justa, sem pobres ao extremo, nem ricos exagerados, todos reunidos numa missão, conservar o rio e distribuir gratuitamente água para o maior número de pessoas. Aquilo trouxe uma sensação de solução, contudo, o ser humano deve seguir trabalhando, ainda que evolua de trabalhos pesados para mais sutis.
Se não houver trabalho há tempo para enganos, assim, quando a vida estava boa para todos, um homem, descendente do rico da caneca de ouro da primeira cidade, apareceu dizendo: o rio é o que nos mantém vivos, devemos reverencia-lo. Essa palavra convenceu muitos, esses com o tempo se tornaram arrogantes, achando-se melhores por se colocarem como guardiões do rio. Mas outro homem, descendente do primeiro homem que tinha tomado a água do rio com as mãos, após observar silenciosamente o líder e os que se reuniam ao redor dele, se levantou e disse: o rio, como a natureza e os seres humanos, têm um criador, esse merece reverência; o rio, apesar de importante, é criatura como tudo, precisa de respeito, não de adoração.
1.6. Muito além do rio
Na verdade, o rio não era uma divindade, mas um motivo usado pelo divino para unir todos os seres humanos em paz e justiça, se as pessoas soubessem e praticassem isso desde o início não faltariam chuvas para todos, ou poços com águas mais próximas. Finalmente, as pessoas mudaram seus olhares, pararam de olhar para o rio, e olharam para o alto, além do céu visível, para o divino, o criador de todas as coisas. Então entenderam que a existência vai além das cidades da Terra, vai para o universo, para outros planetas, então, compreenderam que a água mais importante não está no solo, na matéria, mas no céu, no plano espiritual, então, saciados da água física estavam prontos para a água espiritual.
2. Experiências diferentes
“Porque isto é também como um homem que, partindo para fora da terra, chamou os seus servos, e entregou-lhes os seus bens. E a um deu cinco talentos, e a outro dois, e a outro um, a cada um segundo a sua capacidade, e ausentou-se logo para longe.” “Porque a qualquer que tiver será dado, e terá em abundância; mas ao que não tiver até o que tem ser-lhe-á tirado.” Mateus 25.14-15, 29
Acostumados dentro de igrejas cristãs, católicas, protestantes tradicionais ou evangélicas pentecostais, podemos achar que nossa experiência com Deus é a única que é eficiente, para obter o favor de Deus em nossas vidas neste mundo e o conhecimento da verdade espiritual maior. Penso que isso era mais percebido assim há um tempo atrás, eu, que me converti numa igreja Batista tradicional, nos anos 1970, sentia igrejas como ilhas cercadas por muros. De vinte, trinta anos para cá, a realidade secular da vida levou crentes a interagirem melhor com não crentes, não condenarem tanto, principalmente por causa da área afetiva, nas questões familiares e sexuais, que têm misturado todos.
Ainda que se ouça nos púlpitos, por exemplo, que homossexualidade e divórcio são pecados, na prática mais cristãos têm experiências próximas com isso, assim julgam menos os que também as vivem no mundo, fora de igrejas. O tempo tem tornado muitos cristãos mais humildes e mesmo mais sábios, mas ainda existem muitos legalistas, que por tentarem viver uma crença que não é de Deus, ainda que achem que seja, não conseguem e se tornam falsos moralistas e hipócritas. Isso explica tantos protestantes apoiarem politicamente a extrema direita, que fala em defender valores da tradição judaico-cristã para a família, mas que tem prática de vida diferente, e às vezes oposta.
Uma coisa é certa, como evangélicos achamos que nossa experiência de conhecimento de Deus pela Bíblia e pelo Cristo, é melhor que as outras. Bem, ainda que eu saiba e experimente que Jesus é diferente de qualquer outro fundador de religião ou líder espiritualista, sei que as igrejas cristãs em sua grande parte não são embaixadoras fidedignas dessa exclusividade, que, como tanto digo aqui, são construções humanas e corruptas, ainda que sobre o nome poderoso de Jesus. Contudo, muitos cristãos não aceitam que Deus, por exemplo, ouça e cuide de muitos que o buscam em religiões orientais ou dentro de centos espíritas, para muitos cristãos isso é simplesmente coisa do diabo.
Na parábola “O rio da união” três homens beberam da água de um mesmo rio, mas de formas distintas. Um usou as mãos, esse foi o mais simples, utilizou uma forma direta, mas cansativa, mais solitária, mas também a mais pura. Um segundo homem usou uma caneca luxuosa, esse mostrou uma veneração à água, mas também confeccionou uma maneira de transportar a água, mas será que a água precisa ser venerada ou levada, não é melhor que cada um tenha uma experiência pessoal com ela? O terceiro homem criou um sistema, que ao mesmo tempo que beneficiou mais pessoas, afastou as pessoas da fonte original da água, o rio, e deu lucro a alguns.
Durante séculos, principalmente a civilização ocidental, acostumou-se ao “sistema de encanamento” católico, protestante e pentecostal. Os tais “sistemas” levaram as pessoas a receberem a vontade de Deus por tanto tempo por doutrinas, dogmas, rituais e textos sagrados religiosos, que desaprenderam a se relacionarem com Deus diretamente pelo Espírito Santo, aliás, para muitos o jeito mais eficiente de receberem dádivas de Deus é dentro de catedrais e igrejas, participando de missas e cultos. Não nego a importância de religiões, mas para iniciar as pessoas na verdade, não para afastá-las dela, a verdade é que igrejas se tornaram meios de controle e enriquecimento de homens.
3. Jeito simples é melhor
“E o que estava assentado sobre o trono disse: Eis que faço novas todas as coisas. E disse-me: Escreve; porque estas palavras são verdadeiras e fiéis. E disse-me mais: Está cumprido. Eu sou o Alfa e o Omega, o princípio e o fim. A quem quer que tiver sede, de graça lhe darei da fonte da água da vida. Quem vencer, herdará todas as coisas; e eu serei seu Deus, e ele será meu filho.” Apocalipse 21.5-7
Podemos passar tanto tempo fazendo algo do jeito que nos ensinaram, que acabamos achando que esse é o único jeito de se fazer algo. Não nego que precisamos começar de algum jeito, por isso os ensinamentos em amor que recebemos de pais são importantes. Mas eles devem formar base para novos conhecimentos e experiências, que recebendo nossos questionamentos pessoais podem se constituir em piso para uma construção mais completa e duradoura. As bases legítimas nunca são destruídas ou desprezadas, porque elas resistem ao tempo, isso se aprendemos com seus princípios, com sua essência, mais que com suas formas. É preciso coragem para ver além da cobertura, muitas vezes lindíssima, do bolo.
O cristianismo tem o Cristo como base, não o judaísmo, o catolicismo ou o protestantismo, sobre ele devemos construir nossa experiência pessoal, aprofundando-nos mais em Deus pelo seu Santo Espírito. A ideia parece simples, mas não é para crianças sociais, intelectuais, morais e espirituais, e é útil que seja assim. O mundo espiritual é diverso, oferece o Cristo e seu altíssimo Espírito, mas também miríades e miríades de outros seres espirituais, nem todos eles bem intencionados e ferramentas do bem, ainda que administrados pelo bem. Por isso tantas orientações extremistas na tradição judaico-cristã sobre espíritos, mediunidade, vida após a morte e mesmo sobre o próprio criador do universo.
Na parábola “O rio da união”, um quarto homem, depois de ver o sistema de encanamento ser destruído pelo tempo, resolveu acreditar e se empenhar numa jornada pessoal e solitária, descobrir onde estava o rio, origem da água que saciou a sede de tantos com abundância. Contudo, já preparado pelo tempo e pronto para administrar o conhecimento de forma mais iluminada, ele não só descobriu o local do rio, como propôs a melhor maneira de acessar a água, estando próximo dela o tempo todo. Jesus fez isso pelo ser humano há quase dois mil anos, ainda que a Igreja Romana alegue ser dona exclusiva de um sistema que conduz o ser humano à pura água espiritual.
A luz se protege, não precisa de homens para protegê-la, o Espírito Santo se guarda, não precisa que ninguém legisle a seu favor. O que está preparado acha o conhecimento mais alto de Deus, consequentemente é alimentado por uma palavra pura que entrega paz e é força para vencer o mal que cada ser humano carrega dentro de si, vencendo o interior o mal exterior perde sua força. Na parábola do rio da união todos poderiam residir nas margens do rio, mas com um espírito diferente, sem injustiça, e não é que os que não quisessem isso fossem proibidos de alguma forma, mas suas escolhas teriam consequências, implicariam em não terem mais acesso à água do rio, pelo menos enquanto quisessem permanecer nessas escolhas.
Entendemos porque o evangelho diz que ricos têm mais dificuldade em entrar no reino de Deus. Não entendemos ricos só como prósperos materialmente e neste mundo, mas como donos de algum bem ou capacidade que os levam a acharem-se melhores por si sós, assim a se afastarem de Deus e dos homens. Muitos são ricos em dinheiro, mas outros em ciência, e outros ainda em religiosidade, todos esses podem num determinado momento afastarem-se do amor de Deus e da humildade com os homens. O homem se perde quando acha que já tem todas as respostas, ainda que sejam respostas baseadas em princípios religiosos, ainda que sejam respostas que um dia tiveram base na Bíblia.
4. No tempo colhe-se o fruto
“Disse-lhe o jovem: Tudo isso tenho guardado desde a minha mocidade; que me falta ainda? Disse-lhe Jesus: Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, e segue-me. E o jovem, ouvindo esta palavra, retirou-se triste, porque possuía muitas propriedades. Disse então Jesus aos seus discípulos: Em verdade vos digo que é difícil entrar um rico no reino dos céus.” Mateus 19.20-23
O marxismo original, a mídia atual e o cristianismo desviado, querem o mesmo, estabelecer um reino “de Deus” na Terra, ainda que usando coisas diferentes, diabo, ciência ou ótica equivocada da vontade Deus (e não estou relacionando as coisas). Todos esses se enganam, todos, ainda que com facetas positivas e mesmo úteis a Deus, querem reinos humanos e físicos, afastando-se do reino espiritual de Deus. Sendo reino humano propõe, usa e defende, armas materiais, não espirituais, prepotência, frieza e até violência, ainda que só ideológica. O reino de Deus é espiritual e como tal usa ferramentas morais, amor, santidade, humildade, justiça, paz, que constróem o espírito no interior dos homens, não só no corpo físico e na aparência externa.
Na parábola “O rio da união” não pense que as pessoas que não quiseram morar perto do rio com igualdade de direitos, eram necessariamente pessoas más, não, a maioria era gente que só não queria abrir mão dos direitos que tinham conquistado até então, direitos que muitas delas tinham conseguido com trabalho honesto e persistente. O ponto aqui não é o mal aparente e óbvio, que lesa alguém de maneira explícita, mas o orgulho, que muitas vezes reside íntima e discretamente nos corações. Orgulhoso é essencialmente alguém inseguro, que confia mais nos homens e no que esses veem, que em suas qualidades morais interiores e no que Deus vê, assim há orgulho mesmo no religioso.
Ah, o tempo, ele é a principal ferramenta nas mãos do Altíssimo Deus. Por isso o mundo material foi criado, por isso Deus colocou espíritos eternos presos por algum em tempo em corpos físicos, para que o ser fosse confrontado com a morte, com o sofrimento, com as consequências de suas escolhas. É a magia do tempo que nos permite sentir de forma mais profunda o pecado, ver nossa existência sendo encerrada, vendo nossas forças, nossa saúde, nossas paixões sendo diluídas, entendendo que não somos deuses eternos, que podemos ter um fim. Só recebemos vida eterna depois que morrem, não nossos corpos, mas nossos orgulhos. Cristo morreu não por ter orgulho, mas para que nós fôssemos libertos do nosso orgulho.
Na parábola “O rio da união” o tempo teve seu bom fruto nos ricos que ficaram na cidade longe do rio, tanto que ainda que tenham aprendido a lição, estariam satisfeitos mesmo com menos que mereciam. De fato, os humildes que aprendem a lição têm essa disposição, não são mais insatisfeitos ainda que tenham muito, mas mesmo com pouco sentem que têm mais que precisam, por isso recebem de Deus glória eterna. Como já foi dito aqui, não basta fazer certo, temos que fazer do jeito certo, a coisa certa abençoa os outros, mas fazer do jeito certo abençoa quem faz. O jeito certo é o amor, esse acha na humildade a paz, na glória de Deus a recompensa. Não basta ser religioso, cristão ou patriota, é preciso ser humilde para ser espiritual.
Uma palavra aos mais velhos, que frutos temos colhido no tempo? Cansaço, amargura, decepção, solidão, descrença, desvio religioso, hipocrisia? Ou achamos a paz que permanece, somos misericordiosos com os outros porque provamos a nossa parte de misericórdia de Deus, temos paciência para amar e assim temos poucos amigos, mas com os quais podemos contar, mesmo entre parentes próximos? A bênção está perto do rio, morando humildemente nas suas margens, pondo-se a orar em cada madrugada para beber diretamente do Santo Espírito a água mais pura e poderosa, sabendo o que tantos não sabem, não por teorias de conspiração, em interpretações escatológicas equivocadas, mas pela palavra de Deus que é vida eterna.
5. Amor, fruto da verdade
“Tu crês que há um só Deus, fazes bem, também os demônios o crêem e estremecem, mas ó homem vão, queres tu saber que a fé sem as obras é morta?” “Vedes então que o homem é justificado pelas obras, e não somente pela fé.” Tiago 2.19-20, 24 “Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três, mas o maior destes é o amor.” I Coríntios 13.13
Amor abre, abraça, assim, une e adiciona tornando o todo mais forte. Nas trevas há ausência de amor, ainda que se ache para isso desculpa num “Deus” que julga e condena os que andam longe dele, mas isso é uma mentira, ninguém está longe de Deus, nunca, não pelo que depende de Deus. Sem amor há cisões, seitas, divisões, conflitos, guerras, violência, desrespeito com o diferente. Sem amor a ideologia de alguns é imposta para todos, assim há uma contradição, ainda que se ache que se faz uma união, faz-se uma divisão, não para que cada um creia quando, onde e como possa, mas naquilo que alguns creem. No amor também há uma contradição, mas boa, ela divide para unir, entrega liberdade para que todos sejam semelhantes.
Em amor luta-se pelo direito mesmo daquele que não quer o amor. No amor espera-se, pacientemente, ainda que silenciosamente pelo que se afasta, consciente de que esse se afasta, mas crendo e orando para que haja volta. O tempo só pode ser administrado do melhor jeito com amor, porque aí ele será tempo de morte da semente na terra para que depois brote e viva como uma linda árvore frutífera. Tristemente muitos que se dizem cristãos atualmente negam as ferramentas e as virtudes mais altas de Deus, amor paciente e o tempo, querem tudo aqui e agora, achando-se merecedores disso por se dizerem cheios de fé, como se fé bastasse, assim apoiam líderes enganadores, se enganam porque se tornaram enganáveis.
Não basta crer, a obra maior é o amor. O quarto homem da parábola “O rio da união”, assim como os habitantes da cidade nas margens do rio que ele fundou, entenderam que o mais importante nem era a água, mas o amor. Se fosse a água, teria bastado o sistema de encanamento que o terceiro homem construiu. Nem só a fé num Cristo, atualmente numa posição espiritual altíssima, bastou a uma humanidade que gerou religiões cristãs que queriam manipular e lucrar. É preciso praticar obras usando como exemplo a vida do Cristo homem. A humanidade passou do momento “fé num Deus único”, mas ainda não foi aprovada no quesito “amar como Cristo” para estar perto desse Deus.
Os habitantes das margens do rio abriram as águas para todos, e quando muitos entenderam que estar unidos com semelhantes era melhor, os talentos e diferenças de muitos deixaram a sociedade mais forte. Cristãos precisam de budistas, como budistas precisam de afro-espíritas, como afro-espíritas precisam de muçulmanos, como muçulmanos precisam de cristãos, só para citar alguns exemplos, e todos esses precisam de cientistas, como cientistas precisam de todos os religiosos. Se alguém se achar mais dono da verdade mais alta que outros, que guarde essa presunção para si e para Deus, isso pode nem ser algo errado, mas que mostre em obras de amor essa superioridade aos outros, com humildade, não com arrogância.
A humanidade é linda pelas diferenças, como é a natureza em sua diversidade animal e vegetal, e essa beleza material é prova da sofisticação de um Deus espiritual. Um Deus espiritual Altíssimo cria espíritos de todas as matizes, de forma muito mais complexa que muitos protestantes acham, cegos dentro das quatro paredes de seus templos, cantando hinos centenários aos domingos. Somos chamados para fora, não para dentro, como alguns já entenderam, mas como os mesmos não entenderam, para ficar lá fora, não para fazer escravos e voltar para dentro. Não fora de igrejas, mas fora do orgulho, só então estaremos dentro do amor de Deus. Fé em Deus importa, mas sem amor será água vendida e manipulada por homens.
6. Muito além do rio
“Mas o dia do Senhor virá como o ladrão de noite; no qual os céus passarão com grande estrondo, e os elementos, ardendo, se desfarão, e a terra, e as obras que nela há, se queimarão. Havendo, pois, de perecer todas estas coisas, que pessoas vos convém ser em santo trato, e piedade, aguardando, e apressando-vos para a vinda do dia de Deus, em que os céus, em fogo se desfarão, e os elementos, ardendo, se fundirão? Mas nós, segundo a sua promessa, aguardamos novos céus e nova terra, em que habita a justiça.” II Pedro 3.10-13
A última prova será a mais difícil, e muitos se preparam de maneira errada para ela. A última parte da parábola “O rio da união” mostra que o trabalho moral do ser humano, assim espiritual, é longo. Num momento quando tudo pareceu estar bem, as pessoas caíram numa tentação, que ainda que parecesse uma graduação espiritual, não era uma iluminação, era um retrocesso. Alguns se acharam mais espirituais que os outros e tentaram adicionar algo à pureza da vida. Deus não precisa de advogados, mas usa testemunhas. Ao que se dá nome limita-se. Na espiritualidade muita coisa definida como dogma é só uma limitação material e humana a algo espiritual e divino.
O ser humano tem um desejo difícil de ser superado, ser dono exclusivo de algo, e eis outra contradição humana. O homem quer ser exclusivo, mas para ter algo que outros valorizam, só se valoriza algo que se experimentou como algo bom, portanto algo que não é exclusivo. Atualmente muitos querem postar fotos em redes sociais para exibirem-se como quem aproveita a vida fazendo ou sendo algo diferente, mas quando mais de um quer se postar assim, para ser valorizado por pares, não se faz ou é mais algo exclusivo, mas igual. Só tem um jeito de realmente sermos exclusivos, do jeito espiritual, sendo o que Deus nos criou para ser, mas para isso temos que nos libertar da carência de aprovação de seres humanos.
Na parábola quando todos estavam felizes tendo mais ou menos a mesma coisa e sendo mantidos por um único bem maior, o rio, alguns ficaram insatisfeitos. Foram tentados pela vaidade de serem diferentes, achando que nisso teriam uma atenção maior de homens que os outros. Quando olhamos demais para baixo é porque deixamos de olhar para cima, quando exigimos demais de homens é porque não estamos pedindo a Deus e nos satisfazendo com o que ele dá. Em Deus não há insatisfação, mas há num falso deus ou na ociosidade. Ser espiritual é estar espiritual, uma diferenciação que a língua portuguesa nos permite, assim ser espiritual é estar em movimento para o alto, em constante trabalho para melhorar.
Voltemos agora à afirmação feita no início desta reflexão: a última prova será a mais difícil. Muitos cristãos se preparam para os últimos tempos achando que grandes provas de fé serão como foram as provas do cristianismo primitivo, com ameaça física de tortura e morte. O ser humano já passou desse ponto, as provas hoje são mais ideológicas, são mentais e psicológicas, sociais e morais, não direta e explicitamente materiais. Hoje ações e palavras são coibidas, não com espada e cárcere, mas com leis e cancelamentos em redes sociais, a perseguição é virtual. Muitos cristãos se dizem prontos para morrer pelo evangelho, mas não resistem diante de dislikes e perda de inscritos em páginas e canais da internet, as coisas mudaram.
O rio da parábola era só algo para conduzir as pessoas para provarem algo melhor em suas existências, algo que as faria melhores como sociedade: viverem unidas com igualdade. Contudo, quando esse propósito fosse alcançado as pessoas não ficariam sem objetivo. O muito além do rio estava no alto, mas não no alto físico, nos satélites, planetas, estrelas, sistemas solares, galáxias, estava no alto espiritual. Como humanidade, quando chegaremos nesse ponto, quando o problema não será mais água, comida, saúde, educação, arte, cuidado com o planeta Terra, enfim com o rio, mas com a vida eterna? Todavia, antes disso, a humanidade passará por uma grande prova, para a qual muitos cristãos não estão prontos.
José Osório de Souza, 30/01/2023
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