segunda-feira, setembro 12, 2022

A quem queremos convencer? (43/92)

      “E Jesus, movido de grande compaixão, estendeu a mão, e tocou-o, e disse-lhe: Quero, sê limpo. E, tendo ele dito isto, logo a lepra desapareceu, e ficou limpo. E, advertindo-o severamente, logo o despediu. E disse-lhe: Olha, não digas nada a ninguém; porém vai, mostra-te ao sacerdote, e oferece pela tua purificação o que Moisés determinou, para lhes servir de testemunho. Mas, tendo ele saído, começou a apregoar muitas coisas, e a divulgar o que acontecera; de sorte que Jesus já não podia entrar publicamente na cidade, mas conservava-se fora em lugares desertos; e de todas as partes iam ter com ele.Marcos 1.41-45

      Ouvimos com frequência pregadores dizendo que nossas ações devem corresponder às nossas palavras. Não ser hipócrita é praticar o que se fala, mas quem consegue isso? Na maioria das vezes os que mais falam são os que mais têm boas coisas a dizer, portanto com mais coisas a viver. Isso não é sempre, há alguns que falam sempre e sem medo, mas só falam bobagens, portanto, o que falam condiz com o que vivem, esses acham que gostar de falar dá legitimidade para se dizer qualquer coisa. Contudo, um modo de atenuar a hipocrisia é falar menos, assim seremos menos cobrados, isso pode ser mais fácil que não praticar tudo que falamos. Quem fala se compromete, quem pouco fala, pouco se compromete (Provérbios 17.28). 
      Os outros precisam saber de tudo que pensamos? Não. Principalmente em termos de espiritualidade é melhor calar que falar. Muitos cristãos creem o contrário, principalmente evangélicos, por se verem como donos da verdade que livra todos do inferno, acham que devem tentar convencer as pessoas a acreditarem como eles acreditam. Não acham que estão importunando ninguém com isso, mas ajudando, mas na verdade estão importunando, e muito a muitas pessoas, eles mesmos, estão dando a juízes mais argumentos para que esses lhes cobrem em algum momento. Esses juízes estão neste mundo, também estarão no outro, mas mais que isso, estão dentro de nós. Falar demais pode ser uma tentativa de convencer juízes interiores. 
      No mundo atual as pessoas estão obcecadas para compartilhar suas vidas, a facilidade de acesso e de compartilhamento e a beleza das molduras entregues pelos filtros das redes sociais, levam muitos a crer que os quadros são maravilhosos e importantes. As pessoas estão sendo enganadas, manipuladas para que gerem espaços onde elas, de graça, ajudam a vender produtos. As pessoas trocam suas privacidades por fama, mas não percebem que são só marionetes nas mãos dos poderosos donos de Facebook, Instagram, Youtube, Twitter etc, e esses só querem lucros financeiros. Algo perigoso nesses negócios é que eles não respeitam limites nacionais, são globais, se acham acima do bem e do mal, de governos e de autoridades. 
      Quem resiste à fama, ao prazer de saber que é visto e admirado por muitos, de ter reconhecimento no mundo? Jesus resistiu, ele sabia os perigos de certas coisas serem conhecidas. O primeiro perigo foi o mais óbvio, sua missão despertaria a inveja de líderes religiosos judeus que poderiam lhe fazer mal por isso. Cristo sabia que não poderia ser livrado de seu fim, não se pode esconder a luz para sempre, mas o segredo deveria ser mantido para que o tempo de Deus se cumprisse. Enquanto isso Jesus ensinava os discípulos, cujas memórias construiriam o que mudou a humanidade depois, os textos bíblicos. Jesus era um homem de ação, suas palavras eram efeito disso, mas elas teriam uma missão no futuro por isso precisou de tempo. 
      Outro perigo de deixar público certos conhecimentos é jogar pérolas aos porcos, deixar saber quem não está preparado para saber que portanto entenderá errado e contribuirá mais para à incredulidade que para a fé. No texto bíblico inicial o homem relatou uma cura física, quem não fica feliz com uma cura assim? Mas ele não foi sábio, em primeiro lugar porque desobedeceu uma orientação de Jesus. Quando Deus fala, ainda que não entendamos, mesmo que discordemos com boa argumentação, devemos obedecer. Deus não vê só o aqui e agora, mas todos, tudo e sempre, o Senhor sabe as consequências de uma informação nos complicados sistemas do universo, das relações humanas, dos poderes e escolhas de homens e outros seres. 
      Não falar algumas coisas porque as pessoas não estão preparadas para certas coisas é ato de amor. Podemos estar protegendo as pessoas delas mesmas, de pecarem, caso recebam certas informações, e não me refiro só a mistérios espirituais, falo de coisas triviais de nossas vidas materiais. Sejamos responsáveis, não só alertando os outros de perigos caso não façam as coisas certas, mas também impedindo-os de cometerem erros de julgamento sabendo de coisas que não podem administrar de maneira sadia, moral e espiritualmente. O silêncio protege, não só a nós como aos outros. Se muitos acham que falar é melhor que fazer e outros pensam que fazer é melhor que falar, orar a Deus deve preceder tudo, ações e palavras. 
      Falar demais encurta o tempo, impede Deus de agir com paciência, quando falamos demais ocupamos tempo e atenção que alguém deveria estar dando a Deus. Sem paciência com os outros ou com o que achamos que precisamos receber dos outros, queremos resultados rápidos. Mas Deus trabalha no silêncio, e de maneiras que não podemos sequer imaginar. Deus é espírito, o Espírito é intraduzível pela matéria, essa só pode fazer esboços grosseiros dele. Oração vale mais que discursos, se feita com intenção correta, amor e iluminação, porque ela se coloca no mundo espiritual, com ferramenta espiritual atuando nas pessoas de maneira espiritual. Orar não apressa nada, e se fazemos isso em espírito, o pouco valerá por muito. 
      Quando oramos, em todos os níveis, emocional, racional e espiritual, saímos convencidos do que somos, do que queremos, do que temos que receber e do que Deus quer nos dar. Essa satisfação anula toda carência e insegurança que nos levam a querer convencer os outros de algo que nada tem a ver com os outros. A oração emocional pode desaguar em choro, e podemos estar precisando muito chorar. A oração racional nos faz verbalizar as questões, entendermos intelectualmente nossa vida no que é possível, é exercer inteligência e ver soluções. Mas é na oração plenamente espiritual, onde o Espírito Santo não é só meio passivo, mas participante ativo, quando exercemos os dons espirituais, onde recebemos a paz maior. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário