O que eu chamarei, a partir de agora, de “adoração instrumental”,
não é simplesmente fazer o acompanhamento instrumental para hinos e cânticos, também não é executar hinos e cânticos no instrumento, enquanto a pregação da palavra está sendo feito, é mais que isso. Em primeiro lugar é importante que se entenda qual é o trabalho do homem e qual é a função que somente Deus pode desempenhar. A eficácia de como somos
usados, depende inicialmente das ferramentas que temos. Essas ferramentas, aprendê-las,
é algo humano, claro, sempre feito debaixo da graça de Deus, mas é um trabalho
que compete a nós.
As ferramentas dos músicos são as técnicas, não somente a leitura
do código e a destreza nas teclas, cordas, sopros e baquetas, peculiares aos
músicos que somente leem partituras, mas também são os clichês harmônicos,
rítmicos e melódicos, que um músico que tem a facilidade para pegar a música de
ouvido, possui. Esses clichês são colecionados à medida que se estuda e que se
ouve, principalmente, música de qualidade, as raízes da arte musical, mais dos
que as misturas e fusões de estilos, que já são releituras.
Bem, de posse de todas essas ferramentas, podemos usá-las. Na
música instrumental, o jazz, o blues, o soul, dentre outros estilos, são
linguagens que se prestam à música de improviso. Utilizar clichês mais
sofisticados, no tempo e no lugar certo, dará à improvisação qualidade e
originalidade. Música de improvisação, o jazz, por exemplo, costuma-se dizer
que é música para músicos, só os profissionais, na maior parte das vezes,
conseguem ver relevância e desfrutar da criação feita em tempo real. Com
certeza, esse é o tipo de música é mais prazeroso para aqueles que tocam, e
sim, elas honram ao homem, já que o colocam no limite de sua inventividade. É
claro que na hora e no lugar certos, não existe nada de errado com isso.
Contudo, e isso tenho descoberto há alguns anos, essa improvisação
pode ser usada na adoração, então o instrumental passar a ser mais que
acompanhamento para o vocal, mas adoração em si, podendo ser usado de forma
poderosa e eficaz para exaltar a Deus, liberar o Espírito Santo, derramar a
poderosa presença do Senhor sobre as pessoas. Mas como separar improvisação
instrumental, jazz, de adoração instrumental, ferramenta espiritual?
Quem primeiro fez isso, nos tempos modernos, e ainda faz até hoje,
foram os negros das igrejas evangélicas norte-americanas. O blues e o soul
nasceram dessa “spiritual music”. Contudo, podemos acrescentar a esses estilos
americanos, o estilo de cada região e país. Mas é importante que se saiba que
essas técnicas, são apenas ferramentas. Elas somente poderão ser usadas para a
adoração quando o músico, munido de todas essas ferramentas, tiver uma real
experiência de conversão, consagração e batismo no Espírito Santo.
Tentarei agora dar algumas dicas práticas de como utilizar a
improvisação musical na adoração, usarei termos que serão entendidos por músicos
com algum conhecimento teórico, portanto, perdoe-me pelos termos técnicos.
Os intervalos musicais e as escalas criam climas emocionais
diferentes e bem definidos. A maneira mais simples de entender isso é ouvindo
duas tríades (acordes de três notas), uma maior e uma menor (a diferença está
no terceiro grau desses acordes, na maior, o terceiro grau é maior, na menor, o
terceiro grau é menor). Qualquer pessoa com o mínimo de cuidado sensitivo (não
usei o termo talento, pois acredito que todos têm capacidade para sentir a música,
como acontece com a arte em geral, nem todos podem entender, mas todos podem sentir)
perceberá que a tríade maior passa um clima de alegria, enquanto que a tríade
menor, um clima de tristeza, de melancolia. A mesma coisa, em termos de notas
soltas, ocorre com a escala diatônica maior e com a menor.
(J. S. Bach (músico alemão, cravista, organista, compositor,
cantor, regente e criador de instrumentos, Eisenach, 31 de março de 1685 —
Leipzig, 28 de julho de 1750) fez um estudo minucioso dos 24 tons, 12 maiores e
12 menores, compartilhando esses vários climas que escalas diferentes criam,
essa experiência está registrada nos livros Cravo Bem Temperado, volume 1 e 2,
veja mais sobre isso no link).
Contudo, os acordes não se limitam às tríades, depois disso temos
as tétrades, onde o sétimo grau, menor e maior, é adicionado. Depois podemos
diminuir o quinto grau, acrescentar a nova, a décima primeira, a décima
terceira, e assim vai. Multiplicam-se as possibilidades de acordes e os climas
que eles criam. Isso tudo organizado em cima de escalas e de progressões,
fabricam frases musicais que reunidas criam uma música.
Esse conhecimento técnico e sensorial da musical, debaixo do poder
do Espírito Santo é que pode produzir uma adoração instrumental. Veja que sem
uma experiência poderosa com o Espírito Santo de Deus, repito, sem um temor do
Senhor, sem estar num espírito de oração e de consagração, a técnica de
improvisação será somente jazz. Contudo, temos experimentado nesses últimos
dias aqui nas igrejas evangélicas brasileiras, esse tipo de ministração para
acompanhar a palavra pregada. Nessa função acrescentamos à adoração
instrumental mais uma característica: sincronismo com a palavra que o Espírito
Santo está pondo na boca do pregador, obviamente, sincronismo espiritual.
Não existe qualquer espécie de competição ou de predominância da
música, ela caminha junto com a palavra pregada, como caminham o dom de línguas
estranhas e o dom de tradução dessas línguas. Eu me encorajaria a dizer que a
música poderia ser a “língua estranha”, a linguagem mais emocional, de
mistérios, e a palavra, a sua tradução. Nessa ótica confundem-se e se mesclam,
causa e consequência, assim como a música responde à palavra, a palavra é
inspirada pela música. Bem, quem é glorificado e compartilhado, de maneira
maravilhosa neste contexto, é o Espírito Santo de Deus. As pessoas são
abençoadas com uma interação completa entre emoção, razão e espiritualidade.
O grande segredo é fazer o instrumento conversar com as pessoas,
responder musicalmente aos apelos e ênfases da pregação. Quando o clima for de
derrota, de tristeza, usamos, por exemplo, escalas e acordes menores, quando for
de alegria, escala e acordes maiores. Quando a palavra evoluir, expressando uma
situação onde Deus atua e a condição melhora, podemos subir de tom, ou
simplesmente de altura. O reforço de notas graves mais espaçadas, e o uso de
repetições rápidas de notas agudas, também podem servir para aprovar um clima
criado pelo Espírito Santo.
Algumas progressões, simples e repetitivas, também podem
acompanhar determinados ambientes que o Espírito está criando pela palavra,
como ficar transitando entre os acordes no II grau menor e no III grau menor, criando
uma tensão temporariamente não resolvida. Não é preciso tocar uma música
inteira, apenas as progressões de acordes. Na verdade, na minha experiência, a
harmonia tem prioridade sobre a melodia, já que a melodia está sendo feito pelo
solista que é o pregador.
A simples execução de intervalos também pode recriar musicalmente
o ambiente que o Espírito Santo está produzindo. Uma 3ª maior que evolui para
uma 4ª justa, depois para uma 5ª justa, podem bastar para acompanhar o clima,
isso feito através de arpejos. Usei aí o termo certo: recria e não disputa ou
atrapalha. É claro, como já disse antes, quando a interação é prefeita, causa e
consequência, palavra pregada e música que acompanha, se misturam, e um passa a
inspirar o outro.
O instrumentista, porém, quando tocando com o pregador, nunca deve
perder a visão de acompanhador, a mesma coisa acontece quando alguém está
traduzindo línguas estranhas. Como em tudo na casa Deus, deve haver ordem e
decência, orientadas pela sabedoria do Espírito Santo.
Mas o que o instrumentista, na verdade, está fazendo, é dizer um
amém, um “glória a Jesus”, um “obrigado Senhor” ou um “tenha misericórdia de
nós, oh Deus”, através das sonoridades de seu instrumento. Aquilo que ele
poderia dizer com os lábios, diz com seu instrumento musical, a música se torna apenas um eco, um reflexo. Por isso é prioritário
que antes de músico ele seja um adorador, um instrumentista espiritual, já que
a música será apenas um eco daquilo que ele está deixando que o Espírito Santo
fale em seu coração. Adorar instrumentalmente é falar em mistérios através das
notas musicais.
Na experiência que tenho tido com o Espírito Santo, também tenho
sentido que os encadeamentos e tipos de acordes podem ser simples, certas
sofisticações, principalmente de acordes diminutos, não são usadas com tanta
frequência. Por outro lado, o baixo pedal, manter uma nota mais grave enquanto
os acordes variam, também é um recurso interessante e eficaz.
Tentei dar algumas dicas práticas, mas não tentei definir
fórmulas, isso não é espiritual, isso poderia ser manipulação emocional. O
segredo é estar no Espírito, manter-se ligado a Deus, prestando muita atenção
à pregação, e então dar liberdade aos dedos e ao coração para experimentar
emocionalmente a palavra que está sendo ministrada.
Esse texto é um material introdutório sobre o assunto, e concordo
que se trata de um assunto extremamente subjetivo. Seu entendimento só será
feito diante de uma experiência real, o ideal é estarmos ao vivo, num mesmo
lugar, em oração, “tangendo nossas harpas” e assistindo o mover do Espírito
Santo através da boca dos homens e da sonoridade musical.
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Zé, seu texto reforça e me faz compreender exatamente aquela afirmação do pintor Pablo Picasso.
ResponderExcluir"Primeiro você tem que aprender todas as técnicas. Depois de perfeitamente absorvidas, você tem que esquecê-las para poder fazer arte". Na música é assim: só depois que o ferramental técnico-teórico estiver em suas entranhas, você pode deixar de se preocupar com ele e se concentrar no fazer musical.
Exatamente Du, mas o que poderia definir o texto, que fala de música como instrumento de adoração, é que ela deve ser apenas um eco daquilo que o coração está experimentando da comunhão com Deus, que ao invés de se manifestar em palavras se manifesta em sons e ritmos, em musicalidade, obrigado pelo comentário.
ResponderExcluirEste caro irmão e artífice das teclas e das palavras é realmente uma inspiração para mim. Deus te abençoe meu caro, excelentes, eruditas e profundas considerações.
ResponderExcluirObrigado, meu amigo e competente músico, e acima de tudo, um adorador, saudades.
ResponderExcluirLendo e aprendendo ! top .
ResponderExcluir...como foi dito, esse assunto é muito subjetivo, a intenção não foi estabelecer fórmulas para manipulação dos sentimentos humanos, músicas diferentes tocam de maneira diferente pessoas diferentes, eu compartilhei minha experiência, mas existem sons e emoções comuns nos homens, principalmente em se tratando de música feita em Deus e para Deus, onde existe a presença única do Espírito Santo de Deus.
ResponderExcluirPaz Zé! Muito gostaria, se você pudesse, discorrer mais sobre este assunto.
ResponderExcluirPois o serviço como adorador através da música instrumental em minha vida começou a partir deste texto.
Se for possível, e Cristo assim quiser e permitir, te peço que ensine mais em seu blog sobre este assunto específico: O Improviso na Adoração
Shalom
sim, esse assunto é muito profundo, e alguns ainda não entendem, já que é sobre algo que se passa entre a tênue linha que divide alma de espírito, ambos inclinados pelo Espírito Santo, eu amo esse assunto, a música sendo ferramenta nas mãos de Deus de um jeito pleno, as ferramentas artísticas são humanas, cabe ao homem aprender mais e mais para aumentar seu repertório musical, contudo é o Espírito Santo que usa essas ferramentas, se o homem deixar, em temor e em santidade, o resultado é algo maravilhoso, que provaremos em sua totalidade na eternidade... sim, precisamos falar mais sobre esse assunto, obrigado, Davi
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