domingo, setembro 05, 2021

Por que cristãos apoiam a direita? (1/3)

      “Respondeu Jesus: O meu reino não é deste mundo; se o meu reino fosse deste mundo, pelejariam os meus servos, para que eu não fosse entregue aos judeus; mas agora o meu reino não é daqui.João 18.36

      Que guerras importam neste mundo? Não me refiro a conflitos que utilizam de violência para conquistar e submeter, mas a lutas civilizadas por direitos, essas são lutas que importam, de forma laica, não aliadas a certas escolhas que são pessoais, como religião e sexualidade. Governo político numa sociedade civilizada não é para um grupo, nem para a maioria e nem para minorias, mas para todos. O desafio da democracia é esse, administrar um convívio respeitoso entre diferenças, por isso um grupo impor sobre os outros suas escolhas é inaceitável, mesmo que seja um grupo cristão. 
      Bem, esse é o mundo ideal, já o céu ideal fica por conta da crença de cada um. Parece simples e sensato, contudo, muitos evangélicos têm apoiado o atual presidente numa ligação simbiótica, fortalecendo-se mutuamente e tentando pela política prevalecer um cristianismo equivocado no mundo. O povo cristão sempre foi perseguido, nisso não há anormalidade, é só efeito natural de trevas se opondo à luz sob o ponto de vista espiritual. Contudo, muitos cristãos, não digerindo bem essa perseguição, represaram mágoas, que ficaram caladas, mas vivas, só esperando o momento de irem à forra. 
      Esses cristãos acharam alguns argumentos que lhes dão razões para apoiarem a direita extremista que se levantou nos últimos anos no Brasil, vamos refletir sobre alguns. O primeiro deles é que essa direita apoia valores morais e sociais da chamada tradição judaica-cristã, como ser contra o aborto, a favor de costumes tradicionais de família e sexualidade etc. O segundo argumento é que a tal direita se opõe ao comunismo, originalmente ateu, ainda que o comunismo acreditado por muitos cristãos nem exista mais, hoje a esquerda tem como bandeira principal luta por minorias, diversidade e ecologia. 
      O terceiro argumento é baseado numa interpretação equivocada que se faz sobre as revelações do fim dos tempos, e que só é parte de muitas heresias que já circulam pelas igrejas há algum tempo. Essa interpretação pode ver o anti-cristo bíblico na China e o número (ou sinal) da besta num chip na vacina para a Covid 19. Nisso não se sabe quem veio primeiro, se o ovo ou a galinha, se evangélicos apoiam o presidente porque ele diz acreditar nessas teorias de conspiração, ou se o presidente diz crer nessas teorias porque evangélicos que o apoiam creem e ele tem interesse neles como eleitorado. 
      O quarto argumento é que no governo federal atual não há corrupção, por isso o apoio que muitos deram a ele quando se colocou como antítese da esquerda corrupta, que comandou o país por mais de uma década, apoio que a princípio muitos deram, não só cristãos, por não terem outra opção de voto, eu mesmo dei esse crédito inicial ao atual presidente. A c.p.i. da pandemia pode derrubar esse argumento, provando ter havido interesse de lucro na negociação de certas vacinas, mesmo que fabricantes de outras vacinas tenham oferecido vendas por preços melhores e com entregas mais rápidas. 
      Muitos evangélicos creem que as terras que a nação de Israel tinha no antigo testamento são dela por concessão divina, e que em algum momento lhe serão devolvidas. Assim, tudo que se coloca contra Israel e contra o cumprimento dessa promessa, incluindo a reconstrução do templo de Jerusalém e retorno integral desse aos judeus, está contra Deus. Essa interpretação faz legítima a luta de muitos evangélicos por essa causa. Essa é uma bandeira que a direita norte-americana já levanta tradicionalmente e que foi abraçada pelo atual presidente, eis o quinto argumento que une esse líder a muitos cristãos.
      O sexto argumento é o negacionismo científico, que no meio cristão já tem tradição, da perseguição a Galileu à demonização do darwinismo. Aos negacionistas basta crerem em alguns poucos “médicos” desconhecidos que dizem o que eles querem ouvir, para desacreditarem no que muitos médicos, infectologistas, cientistas e profissionais reconhecidos dizem, que deve haver isolamento social, uso de máscara e vacinação para ao menos diminuir os riscos da contaminação do coronavírus. Além disso acham que todos esses sérios profissionais fazem parte de uma teórica conspiração contra a direita.
      É preciso mais fé para crer na mentira que na verdade. No catolicismo idólatra o homem se deixa ser explorado por um falso cristianismo, ainda que resignadamente sofra com isso, e talvez nisso até haja certa piedade. Mas o protestantismo mercantilista consegue que o homem seja explorado por um falso cristianismo e aprecie isso. Muitos evangélicos não querem libertação da exploração, querem ser exploradores também, para então serem prósperos materialmente. Nessa política suja, cristãos se envolvem, quando entenderão que essa guerra não é deles e que o reino de Jesus não é deste mundo? 

Leia nas próximas postagens
a 2ª e a 3ª parte desta reflexão.
José Osório de Souza, 18/08/2021

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