domingo, outubro 30, 2022

Adivinho, profeta, médium (91/92)

      “O espírito do Senhor Deus está sobre mim; porque o Senhor me ungiu, para pregar boas novas aos mansos; enviou-me a restaurar os contritos de coração, a proclamar liberdade aos cativos, e a abertura de prisão aos presos” Isaías 61.1   

      “A palavra adivinhar vem do latim divinare, que significa prever o futuro. Em latim, divinare tem o sentido de conseguir predizer o que vai acontecer. Essa previsão podia ser feita à sorte ou pela dedução, mas normalmente era uma previsão feita com ajuda sobrenatural. A palavra divinare vem de divinus, que significa divino, pertencente ou relativo a um deus. Também podia significar algo sagrado, com caraterísticas dos deuses (como ser maravilhoso) ou alguém inspirado por um deus, como um adivinho ou um profeta. Os adivinhos afirmam conseguir fazer previsões e descobrir coisas ocultas porque recebem mensagens de seres sobrenaturais, como deuses. Divinus vem da raiz divus, que significa deus ou divindade, um ser sobrenatural com poderes especiais. Divus também podia significar divino.”

      Comunicação com Deus, com deuses, com anjos, com demônios e com espíritos, nunca foi só intelectual, onde se lê algo e se obedece. Essa relação implica numa presença sobrenatural inteligente no ser humano, que abre os sentidos espirituais, para que uma informação seja levada ao plano espiritual e outra seja recebida desse plano. Isso é ponto passivo, as perguntas são: o que é essa presença, uma só, várias, são boas, são más? O que é permitido e o que não é? Sendo proibido, por que é? Levantarei alguns questionamentos nesta reflexão sobre experiências com “espíritos”. 
      Na Bíblia, o termo adivinho tem vários sentidos, referindo-se às práticas de profecia ou mesmo de lançar sorte. Entendemos como adivinho o que recebe uma informação desconhecida por meios místicos ou aleatórios. No antigo testamento homens como Daniel, decifradores de sonhos e visões, eram adivinhos legitimados pela Bíblia como do Deus verdadeiro. Esses recebiam informações, principalmente sobre o futuro de Israel e das nações vizinhas, por contatos com Deus, com tipos diferentes de anjos e com aquele ser especial, “o anjo do Senhor”, que fala por Deus em primeira pessoa.
      O termo também é usado para quem tinha acesso a informações por espíritos de mortos, ou espíritos de adivinhação, oráculos ou deuses, esse último termo usado para espécies variadas de seres espirituais. Essa prática, a necromancia, pode incluir também o termo médium, surgido no século XIX no espiritismo kardecista, substituindo o termo deuses por espíritos de mortos. O afroespiritismo também pratica adivinhação, seja pelo jogo de búzios no Candomblé, seja pelo transe mediúnico por pães e mães de santo na Umbanda, nessas práticas se diz receber informações de entidades espirituais.
      Um cristão mais conservador pode dizer que em igrejas carismáticas há o Espírito Santo e esse não adivinha, fala a verdade por meio de servos de Deus, assim o oposto para ele também é válido, que toda manifestação espiritual que ocorre em outros lugares são do diabo, e essas, sim, adivinhações. Além dos búzios, outros meios podem ser usados para revelarem a vida das pessoas, como a astrologia, que faz a adivinhação estudando a posição de planetas e astros em datas de nascimentos, e como o Tarô (ou cartomancia), que faz adivinhações por meio de cartas aleatórias de um baralho especial.
      Ainda que cristãos, de maneira geral, generalizem as coisas, aqueles que conhecem as práticas não cristãs, diferenciam adivinhadores sérios de meros oportunistas, interessados em ganhar dinheiro explorando a curiosidade das pessoas e o encantamento humano pelo místico. Mas não é assim também nas igrejas cristãs, onde há profetas sérios e oportunistas? Muitas vezes uso aqui textos bíblicos como palavra indubitável de Deus para nossas vidas, mas outras vezes, como nessa, cito as posições doutrinárias de cristãos sobre um assunto, para depois reavalia-las, entenda essa reflexão como suposições. 
      As citações bíblicas compartilhadas no final deste texto são quatro referências diferentes sobre os termos adivinhação e adivinho. Levítico 20.27 é a Lei de Moisés, proibindo veementemente prática de comunicação com espíritos por meio de médiuns, e condenando esses a uma morte terrível. Ezequiel 13.6-8 fala da má prática de adivinhação feita por israelitas e em nome de Deus. Reconhecemos que é adivinhação humana e não palavra de Deus porque o texto diz que tais adivinhos dizem coisas que não acontecerão, que Deus não os mandou dizer, e que portanto são vaidades e mentiras.
      Já I Coríntios 12.3-4, 8-10 ensina sobre dons espirituais no novo testamento, e nesse caso precisamos entender algo importante. A simples forma não confere legitimidade para que o conteúdo seja de Deus. É preciso haver verdadeira palavra do Senhor compartilhada por seres humanos em comunhão com Deus. Falar alguns termos conhecidos em línguas espirituais estranhas, e quem é do meio sabe a que me refiro, iniciar uma profecia com “assim diz o Senhor”, ou encerrá-la com “fiquem em paz”, dizer que teve um sonho ou uma visão “diferente”, nãos basta para que sejam palavras de Deus.
      O texto de Isaías 3.1-5, contudo, é interessante, nele o termo adivinho é citado junto de outros, que definem diferentes posições sociais, militares, religiosas em Israel, incluindo a de profeta, sem que haja distinção ou recriminação. Ele diz que todos serão igualmente tratados por Deus com falta de sustento e de liderança. Isso nos passa a ideia que adivinhação era algo comum naquele tempo. Será que a criminalização da prática era geral, ou só para a errada? Seja como for, contato com mundo espiritual é algo complexo, pode ser perigoso e muitas vezes é ineficiente para conduzir a virtudes morais. 
      Veja que não estou sendo extremista, dizendo que toda manifestação espiritual que não ocorre em igreja cristã não é do Espírito Santo e é do diabo, usando como álibi a passagem de Levítico 20.27, dentre outras, que proíbe de forma extrema a prática do que a Bíblia chama de adivinhação, e que inclui a moderna mediunidade. Contudo, afirmo que por Jesus as coisas são menos complicadas e menos arriscadas, assim, acredito que muitos espíritas deveriam simplificar suas crenças e se converterem ao cristianismo primitivo, mas também creio que muitos evangélicos deveriam abrir suas mentes.

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      “Quando, pois, algum homem ou mulher em si tiver um espírito de necromancia ou espírito de adivinhação, certamente morrerá; serão apedrejados; o seu sangue será sobre eles.” Levítico 20.27

      “Viram vaidade e adivinhação mentirosa os que dizem: O Senhor disse; quando o Senhor não os enviou; e fazem que se espere o cumprimento da palavra. Porventura não tivestes visão de vaidade, e não falastes adivinhação mentirosa, quando dissestes: O Senhor diz, sendo que eu tal não falei? Portanto assim diz o Senhor Deus: Como tendes falado vaidade, e visto a mentira, portanto eis que eu sou contra vós, diz o Senhor Deus.” Ezequiel 13.6-8

      “Portanto, vos quero fazer compreender que ninguém que fala pelo Espírito de Deus diz: Jesus é anátema, e ninguém pode dizer que Jesus é o Senhor, senão pelo Espírito Santo. Ora, há diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo.” “Porque a um pelo Espírito é dada a palavra da sabedoria; e a outro, pelo mesmo Espírito, a palavra da ciência; e a outro, pelo mesmo Espírito, a fé; e a outro, pelo mesmo Espírito, os dons de curar; e a outro a operação de maravilhas; e a outro a profecia; e a outro o dom de discernir os espíritos; e a outro a variedade de línguas; e a outro a interpretação das línguas.” I Coríntios 12.3-4, 8-10

      “Porque, eis que o Senhor, o Senhor dos Exércitos, tirará de Jerusalém e de Judá o sustento e o apoio; a todo o sustento de pão e a todo o sustento de água; o poderoso, e o homem de guerra, o juiz, e o profeta, e o adivinho, e o ancião, o capitão de cinquenta, e o homem respeitável, e o conselheiro, e o sábio entre os artífices, e o eloqüente orador. E dar-lhes-ei meninos por príncipes, e crianças governarão sobre eles. E o povo será oprimido; um será contra o outro, e cada um contra o seu próximo; o menino se atreverá contra o ancião, e o vil contra o nobre.” Isaías 3.1-5

Leia na postagem de amanhã
a 2ª parte desta reflexão

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