segunda-feira, outubro 10, 2022

Bíblia, palavra de Deus? (71/92)

      “Porque eu testifico a todo aquele que ouvir as palavras da profecia deste livro que, se alguém lhes acrescentar alguma coisa, Deus fará vir sobre ele as pragas que estão escritas neste livro; e, se alguém tirar quaisquer palavras do livro desta profecia, Deus tirará a sua parte do livro da vida, e da cidade santa, e das coisas que estão escritas neste livro.” Apocalipse 22.18-19

      A chamada de atenção do texto acima, apesar de ser usada como orientação para toda a Bíblia, está no livro de Apocalipse e se refere especificamente ao livro de Apocalipse, mesmo porque quando João a registrou não existia a Bíblia como a conhecemos hoje, muito menos o novo testamento. O livro de Apocalipse é um texto com profecias sobre o final dos tempos, um livro único, logo precisava de uma exortação forte e clara para que ninguém distorcesse de alguma forma as informações nele contidas. Mas usar a exortação como lei genérica é exemplo de como textos bíblicos podem ser usados por homens para defender seus interesses. Mas será que todas as palavras ditas inspiradas por Deus e contidas no cânone bíblico, seguem essa orientação, foram mantidas íntegras, de acordo com as fontes originais? Mesmo que tenham sido, será que as fontes entenderam certo a palavra de Deus no momento que a registraram? Até que ponto a Bíblia é palavra fidedigna do único e verdadeiro Deus? 
      Uma grande maioria de cristãos tem uma fé cega na Bíblia, a aceita como palavra fidedigna de Deus, cada versículo, cada capítulo, cada livro, para muitos tudo isso é uma verdade escrita diretamente pela mão de Deus. Sobre o novo testamento, por exemplo, muitos acreditam que após Jesus subir e o Espírito Santo descer em Pentecostes, apóstolos e discípulos registraram suas experiências diretamente com o Cristo em manuscritos, criando os evangelhos, depois outros escreveram as cartas para as igrejas que se formavam e para outras pessoas, desses textos foram feitas cópias fiéis, primeiro à mão e depois pela imprensa, para que desse material tivéssemos o cânone bíblico atual, ainda que com diferenças entre a versão católica e a protestante. É um raciocínio simplista que usando como álibi a providência divina, que conforme muitos guardou todo o processo, desconsidera o livre arbítrio e todas as interferências que podem transformar as informações que o homem recebe e passa em frente para outros homens.
      A coisa não foi tão simples assim, e desde já deixo uma declaração: apesar de não ter sido bem assim, Deus, em sua misericórdia, permitiu que fosse registrado o suficiente da verdade original para que a humanidade conhecesse a missão superior e singular de Jesus. O mais importante está na Bíblia, e os que de fato querem Deus, não religiões humanas, podem achá-lo, mesmo numa Bíblia que não reflete exatamente o que disse e fez Jesus. Quem analisa a vida sob um ponto de vista científico, quem estuda história, arqueologia, paleontologia, psicologia etc, entende que os homens são frutos do meio e do tempo, dessa forma, ainda que tenhamos recebido um ensino verdadeiro há trinta anos atrás, as relevâncias que deram a ele há trinta anos, há vinte anos, há dez anos e hoje, são distintas. Mudamos no tempo influenciados pelos acontecimentos do momento, por isso mudam as relevâncias que damos a um ensino, assim poderemos rever textos e atualizá-los conforme nosso presente. 
      Durante o primeiro século, por exemplo, muitas coisas ocorreram com o povo judeu convertido ao cristianismo, eventos políticos, religiosos, filosóficos, sociais, incluindo a dispersão do povo judeu em 70 d.C., que deu a muitos cristãos novas expectativas pelas promessas do evangelho. Assim, um texto bíblico que ainda estava sendo escrito à mão, sem muito de científico, pode ter sofrido influência em suas relevâncias, para satisfazer os anseios presentes do povo. Outro fato que influenciou o registro das palavras originais de Jesus e as cartas às igreja, foi a filosofia grega, rejuvenescida pela escola de Alexandria no primeiro século. Devemos também levar em conta que a Septuaginta, versão da Bíblia hebraica em grego koiné (língua franca do Mediterrâneo oriental pelo tempo de Alexandre, o Grande), traduzida entre os séculos III a.C. e I a.C. em Alexandria, que tornou-se a versão do antigo testamento para os primeiros cristãos, também contém discrepâncias em relação aos textos hebraicos originais.
      Na história da igreja católica, papas e concílios interferiram por séculos no cânone bíblico, onde a versão Vulgata de São Jerônimo (escrita entre os séculos IV d.C. e V d.C.) foi a Bíblia oficial por muito tempo, mudando partes conforme conveniências para manipular seus adeptos, na maioria um povo humilde e sem cultura. Mas mesmo a lucidez protestante, que priorizou metodologia mais científica para traduzir a Bíblia, buscando traduzir as fontes mais antigas possíveis, nas línguas originais, não dando a importância que a Igreja Católica dá à Vulgata só pela tradição, no máximo usará cópias, ainda que mais antigas, escritas por homens de seu tempo, não um texto escrito diretamente por Jesus. É importante citarmos os manuscritos do Mar Morto, encontrados entre as décadas de 1940 e 1950 nas cavernas de Qumran em Israel, que contêm as cópias mais antigas de alguns textos bíblicos: 
      “Porções de toda a Bíblia Hebraica foram encontradas, exceto do Livro de Ester e do Livro de Neemias... Os Manuscritos do Mar Morto são de longe a versão mais antiga do texto bíblico, datando de mil anos antes do que o texto original da Bíblia Hebraica, usado pelos judeus atualmente... Embora os rolos demonstrem que a Bíblia não sofreu mudanças fundamentais, eles também revelam, que é possível até certo ponto, que houvessem versões diferentes dos textos bíblicos hebraicos usadas pelos judeus no período do Segundo Templo, cada uma com as suas próprias variações. Com exceção principalmente do livro de Isaías, os fragmentos preservados nestes manuscritos possuem algumas variações, que os diferenciam do texto massorético na grafia e na fraseologia” (Fonte Wikipedia). 

Leia nas duas postagens anteriores
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as outras partes da reflexão 
 “Verdades sobre a Bíblia”
José Osório de Souza, 18/02/21

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