Muitos, de início, podem fazer uma pergunta: por que devo reavaliar minha igreja, ela está fazendo tudo certo? Pois é, o primeiro problema que enfrentamos para reavaliar igrejas e pastores é o fato de muitos cristãos hoje em dia não terem a mínima ideia do que deve ser uma igreja e um pastor, segundo a vontade de Deus, que deem a eles o alimento espiritual verdadeiramente do Espírito Santo, e isso acontece mesmo que muitos acreditem ser ungidos, íntimos de Deus, aliás isso ocorre mesmo com pregadores e líderes. Por que as pessoas não têm noção?
Porque há algum tempo, mesmo a doutrina bíblica tradicional protestante, deixou de ser ensinada na maioria das igrejas, principalmente nas mais frequentadas no Brasil, assim, sem Bíblia, não se tem informação sobre o que é igreja e o que é pastor. Esses ensinos foram substituídos por música e heresias, por longos períodos de “adoração”, por cultos ao dízimo e por discursos sobre prosperidade material e milagres. Enfim, tudo o que refletimos até aqui nessa série de reflexões “Reavaliemos nossas crenças”, tomou o lugar da orientação que levaria cristãos a entenderem o que é de fato uma igreja.
As palavras finais de Jesus antes de ser preso, em João 17, texto também conhecido como “oração do adeus” ou “oração sacerdotal de Cristo”, definem os cristãos, como nascem, como vivem no mundo e para onde irão após a morte, estabelecem a doutrina fundamental da igreja cristã e a sua missão, vou recortar da passagem alguns versículos (mas se possível leia todo o capítulo).
“Jesus falou assim e, levantando seus olhos ao céu, disse: Pai, é chegada a hora; glorifica a teu Filho, para que também o teu Filho te glorifique a ti; Assim como lhe deste poder sobre toda a carne, para que dê a vida eterna a todos quantos lhe deste. E a vida eterna é esta: que te conheçam, a ti só, por único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste.“ (1-3): Jesus declara a legitimidade de sua obra, foi iniciativa de Deus, realizada por Deus em Cristo homem na Terra e entregando homens a Deus, começando por ele, que voltou ao céu como Cristo Deus. Jesus mostra a autoridade ímpar que a religião que ele fundou tem (o versículo tema do “Como o ar que respiro” está contido nessa passagem).
“Manifestei o teu nome aos homens que do mundo me deste; eram teus, e tu mos deste, e guardaram a tua palavra. Agora já têm conhecido que tudo quanto me deste provém de ti; Porque lhes dei as palavras que tu me deste; e eles as receberam, e têm verdadeiramente conhecido que saí de ti, e creram que me enviaste. Eu rogo por eles; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus.” “Dei-lhes a tua palavra, e o mundo os odiou, porque não são do mundo, assim como eu não sou do mundo. Não peço que os tires do mundo, mas que os livres do mal. Não são do mundo, como eu do mundo não sou. Santifica-os na tua verdade; a tua palavra é a verdade.” (6-9, 14-17): Jesus afirma que suas palavras foram dadas a ele por Deus e ele as dá aos homens, deu em pessoa enquanto encarnado, e depois de ressuscitado dadas pelo Espírito Santo. Jesus ensina que existe uma diferença clara entre os que recebem sua obra e os que não recebem, entre os salvos e os do mundo, Jesus divide a humanidade em dois grupos, mas Jesus revela que os do mundo odiariam os da igreja, como a ele odiaram.
“E não rogo somente por estes, mas também por aqueles que pela sua palavra hão de crer em mim; Para que todos sejam um, como tu, ó Pai, o és em mim, e eu em ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste.“ (20-21): Jesus revela que sua obra não se encerraria no primeiro século, nas vidas de seus contemporâneos, mas estaria disponível a todos, através da igreja e pelo Espírito Santo, mas Jesus dá uma característica singular de seus seguidores, que os diferenciaria dos não salvos, a união.
Diante do 17º capítulo de João chegamos a três perguntas que precisamos fazer ao cristianismo atual:
- ele tem a autoridade exclusiva da única religião fundada na terra pelo próprio Deus?
- ele de fato se diferencia do mundo e das outras religiões, correndo mesmo o risco de ser odiado?
- ele une os cristãos?
As respostas às três perguntas, infelizmente, nos conduzirão à necessidade de fazermos reavaliações sobre nossas igrejas, responsáveis pelo atual cristianismo no mundo. O cristianismo se adaptou demais, e tudo que se adapta se altera para sobreviver, mas será que o verdadeiro cristianismo de Cristo precisaria se adaptar? Jesus disse, “não peço que os tires do mundo, mas que os livres do mal”, esse é o mistério que só a verdadeira igreja de Cristo pode viver, ser pura no meio do impuro, fazer diferença sem se adaptar, ainda que entregando uma maneira única de transformação.
Mas muitos se desviaram do verdadeiro cristianismo, ainda nos primeiros séculos, quiseram o mundo e seus valores, seu poder, sua aprovação, e não os valores do Deus altíssimo ensinados pelo Espírito Santo. Assim, para terem o que não precisariam ter, ser o que não precisariam ser, se adaptaram e nisso perderam a autoridade do evangelho puro. Esconderam-se debaixo do manto da autoridade humana, de poderes humanos, que ainda que usassem ícones do verdadeiro cristianismo, passaram a cultuar só a forma, a cruz, a palavra morta, as figuras dos apóstolos, os lugares históricos onde os cristãos primitivos viveram.
Contudo, a mentira nunca se basta, precisa de mais e novas mentiras para continuar existindo, assim nasceu e se estabeleceu a Igreja Católica, sobre a qual o protestantismo fez uma reforma, mas ainda mantendo em suas doutrinas muitas das mentiras. O cristianismo primitivo, da primeira igreja, de Pedro, de João, de Paulo, foi esquecido. A autoridade, a diferença e a união, se perderam, ainda que tantos cristãos hoje em dia tentem reivindicar essas virtudes que Cristo disse que seriam as de sua genuína igreja.
Autoridade espiritual se tem quando se recebe, não de homens, mas de Jesus que a recebeu de Deus, “porque lhes dei as palavras que tu me deste”, disse Cristo. Essa palavra pura é a que salva, cura e pode fazer o que tantos chamam de milagres, contudo, só tem direito a essa palavra quem é de fato diferente do mundo, não diferente de acordo com referências humanas, sejam religiosas, sejam em costumes externos ou culturais. Alienação social pode ser insanidade, não reflexo de uma vida diferente em Cristo, seja como for o diferente em Cristo não é apreciado pelo mundo.
Nesse ponto algo precisa ficar bem claro, diferente em Cristo é ser como Cristo era, e Cristo não era odiado por ser escandaloso, inacessível, por dizer o que pensava sempre, para todos, querendo sempre gritar a última palavra como dono da verdade, se mostrando como “santarrão”. Jesus muitas vezes se calava e se retirava, Jesus era acessível e não tinha preconceitos, Jesus andava com pecadores e participava de festas (e bebia vinho, diferente de João batista, Lucas 7.33-34). Jesus era na aparência comum e não fazia nenhuma questão de ser diferente, mas era diferente no coração e nos frutos, por isso tinha autoridade.
E sobre união? “Que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste”? Talvez a característica mais conhecida do cristianismo hoje seja a desunião, quantas denominações, quantas igrejas, quantos ministérios, quantas seitas, quantas cisões, e ainda assim todos dizem ter a autoridade do Espírito Santo. Por que tantas diferenças? Bem, as pessoas são diferentes, fazer caber todas, com diferenças de cultura, de nível financeiro, de nível intelectual, de características emocionais (introvertidas, extrovertidas, centradas), num só lugar, numa só igreja, é de fato impossível.
“Porque também o corpo não é um só membro, mas muitos. Se o pé disser: Porque não sou mão, não sou do corpo; não será por isso do corpo? E se a orelha disser: Porque não sou olho não sou do corpo; não será por isso do corpo? Se todo o corpo fosse olho, onde estaria o ouvido? Se todo fosse ouvido, onde estaria o olfato? Mas agora Deus colocou os membros no corpo, cada um deles como quis. E, se todos fossem um só membro, onde estaria o corpo? Assim, pois, há muitos membros, mas um corpo. E o olho não pode dizer à mão: Não tenho necessidade de ti; nem ainda a cabeça aos pés: Não tenho necessidade de vós.” I Coríntios 12.14-21
Contudo, é justamente essa vontade de viver só com quem pensa igual, uma escolha com certeza mais fácil, é que leva as igrejas a serem corpos deformados, monstros, não organismos completos e aptos a viverem bem. Mãos gostam de mãos porque é mais fácil viver com iguais, assim mãos formam uma igreja de mãos, de fato uma igreja especialista, em mãos, mas eu pergunto, um corpo só com mãos pode andar, ou pode andar bem? Não, lhe faltam pés. Mas os pés, por sua vez, fazem a mesma coisa, formam um corpo só de pés, especialista em pés, que podem andar, mas que não conseguem manusear bem as coisas, lhe falta mãos para pegar.
Assim, temos igrejas com excelentes teólogos, mas que desprezam os dons espirituais e a palavra revelada, temos igrejas cheias de dons, mas que não conhecem com profundidade a palavra escrita na Bíblia, por quê? Porque teólogos protestantes, em muitos casos, não conseguem conviver com os pentecostais, que falam em línguas espirituais estranhas. Organismos completos e unidos? Não, guetos de monstros, corpos desfigurados, desequilibrados, nos quais o Espírito Santo clama com gemidos inexprimíveis e não é ouvido.
É importante que entendamos que conviver juntos como um corpo não é só fazer parte da mesma igreja e se respeitar educadamente, é preciso que de fato ideias, doutrinas, atitudes, sejam compartilhadas e inter-relacionadas. Uma mão não funciona sozinha, ela precisa de sangue que vêm do coração, de comandos que vêm do cérebro, e de um braço para ligá-la ao corpo. Espiritualmente entendemos isso tendo teólogos estudando a Bíblia racionalmente, mas atentos às profecias, que são entregues por profetas que buscam aprovação delas pela Bíblia estudada pelos teólogos.
Todos têm que ouvir todos e aprender com todos, ainda que tendo cada um chamadas vocacionais, dons espirituais, aptidões humanas, experiências e formações diferentes. Viver como corpo de Cristo, a metáfora perfeita nos ensinada por Paulo sobre a igreja, não é fácil, para ninguém, é preciso temor a Deus e humildade, para se saber que por mais que nos apliquemos em nosso trabalho, o outro também faz o mesmo. Dessa forma ninguém deve se julgar melhor ou maior que o outro, mas todos membros, diferentes, mas importantes, do mesmo corpo cuja cabeça é Cristo.
Contudo, além da desunião que prefere viver só com pares, ênfases doutrinárias divergentes, onde mandam as heresias, também dividem igrejas. A prioridade da igreja cristã, dada por Cristo, é uma, salvar gente, pregar o evangelho que muda vidas. Mas quantos batismos a grande maioria das igrejas faz atualmente por mês? Hoje em dia muitas nem têm batistério, mas um grande palco para músicos e pregadores itinerantes, em templos que são mais salas de espetáculos que locais santos onde o Cristo que salva é pregado, são só teatros onde se paga shows com dízimos.
A igreja que tem a autoridade dada por Cristo, que é diferente e que é unida, virou só mais uma empresa de homem querendo morder um pedaço do mercado que são os corações de homens que só querem uma religião para se livrarem de culpas e fugirem do diabo. Mal sabem que o diabo está no meio deles, sentado na cadeira ao lado, cantando, batendo palmas, satisfeito por não precisar mais tirar as pessoas dos templos para que se desviem.
Ter uma igreja com real autoridade de Jesus, a dada a ele pelo próprio Deus, uma igreja de fato diferente de tudo que o mundo e o diabo representam, uma igreja que une todo tipo de ser humano, do intelectual ao de serviço braçal, do hétero ao homoafetivo, do branco ao negro, do pobre ao rico, ter essa igreja que estava no coração de Jesus quando ele fez a oração sacerdotal, só depende de mim e de você. Orar por isso, cobrar isso de líderes e de demais irmãos, não aceitar heresias e manipulações, e acima de tudo, buscar uma vida cristã que dê frutos, de santidade, de libertação, isso, muito mais que dízimos e música, entrega ao Deus altíssimo uma adoração agradável.
Igrejas evangélicas atuais e seus pastores pode ser o ponto mais importante que devemos reavaliar, já refletimos bastante sobre isso aqui no “Como o ar que respiro”, seguem links de algumas reflexões:
Nesta reflexão, reavaliemos os pastores, não poderia deixar passar esse estudo sem pensar sobre eles, líderes das igrejas que tanto reavaliamos nessa série de reflexões, os maiores responsáveis pelo que o cristianismo representa no mundo hoje. Bem, o “Como o ar que respiro” já fez muitas reflexões sobre o assunto, mas desta vez senti que seria mais construtivo, ao invés de listar defeitos de muitos, estudar as virtudes de um, Paulo, o teólogo-apóstolo-missionário-evangelista e pastor. Depois do próprio Cristo, Paulo é nosso melhor exemplo sobre o que deve ser um pastor de acordo com o coração de Deus. Para isso vários textos me vieram à mente, principalmente aqueles que Paulo dá orientações diretas a pastores.
O capítulo 18 do livro de Atos dos Apóstolos (se possível leia-o na íntegra), por exemplo, relata a vida corrida de Paulo atrás de um único objetivo, pregar a palavra de Deus. Nessa passagem nos é informado que Paulo tinha um ofício secular, fazia tendas, outro exemplo da qualidade de homem de Deus que era, ainda que missionário em tempo integral não queria pesar para os outros, financeiramente (Atos 18.3). Contudo, o texto que ficou em meu coração são treze versículos de II Timóteo 4, uma verdadeira carta de despedida do apóstolo, que revela a humanidade desse excepcional homem de Deus, um registro não só do que ele orienta a outros fazerem, mas que revela como ele era, o que sentia, o que fazia.
Dizem que o estudo bíblico mais técnico é o que é feito seguindo os fundamentos da exegese, sim, somos gratos a homens estudiosos que usam princípios científicos para nos esclarecerem a Bíblia, que conhecem com profundidade história, geografia, línguas antigas etc, e nos permitem saber de detalhes que uma leitura mais leiga não permitiria. Contudo, será que o Espírito Santo inspirou homens a escreverem os livros bíblicos para que só os teólogos conseguissem entender? Não. A Bíblia foi escrita para que mesmo uma leitura descompromissada com princípios de hermenêutica pudesse abençoar qualquer um. A Bíblia original não é comentada, o Espírito Santo e um pouco de sensatez bastam para qualquer um entendê-la.
Darei, todavia, alguns dados históricos sobre a segunda carta de Paulo a Timóteo: Paulo escreveu em Roma, estando em sua segunda prisão aguardando sua execução, provavelmente em 64 d.C., Timóteo estaria em Éfeso e viria a Roma. Apesar de Paulo ser um fundador itinerante de igrejas, não um pastor fixo numa congregação, numa cidade, as orientações que ele dá nas epístolas são ensinos pastorais, visam a vida diária das ovelhas nas igrejas e no mundo, e alertam bastante sobre ensinos errados do evangelho. As duas cartas a Timóteo e a carta a Tito são especialmente chamadas de
cartas pastorais pois dão orientações, não a grupos de pessoas, como as demais de Paulo, mas a líderes com responsabilidades pastorais.
“Porque eu já estou sendo oferecido por aspersão de sacrifício, e o tempo da minha partida está próximo. Combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé. Desde agora, a coroa da justiça me está guardada, a qual o Senhor, justo juiz, me dará naquele dia; e não somente a mim, mas também a todos os que amarem a sua vinda.” II Timóteo 4.6-8
Para um homem que fez tanto pelo evangelho, deveria haver nele desejo de ter alguma recompensa, mas a conclusão de Paulo ao sentir que sua carreira estava terminando é, “estou sendo oferecido por aspersão de sacrifício”. Que diferença de tantos pastores que com quarenta e poucos anos se acham no direito de terem uma vida mais tranquila financeiramente, uma casa boa, um carro mais caro, um salário alto, direito de fazerem boas viagens de férias, enfim, direitos de colherem neste mundo frutos materiais. Do quê? De uma obra que deveria ser puramente espiritual, pastoreio de ovelhas, pregação do evangelho que salva e cura almas.
Paulo chegou ao final de seu combate com a fé guardada, não vendida, não adaptada ao mundo, não desviada da pura doutrina de Cristo. Paulo só via a coroa da justiça que receberia no céu, não queria outra coisa, não almejava mais nada. Um homem sem ilusões? Sim. Sem bens? Sim. Mas em paz por saber que fez o que Deus queria que ele fizesse. Paulo, não “bispos”, não “donos de ministérios poderosos”, não “pastores com posicionamentos políticos”, mas alguém que obedeceu a Deus até o fim, esse sim é alguém que devemos “invejar” (usando a melhor interpretação dessa palavra), alguém que devemos ter como modelo, alguém a ser imitado.
“Procura vir ter comigo depressa, Porque Demas me desamparou, amando o presente século, e foi para Tessalônica, Crescente para Galácia, Tito para Dalmácia. Só Lucas está comigo. Toma Marcos, e traze-o contigo, porque me é muito útil para o ministério. Também enviei Tíquico a Éfeso.” “Alexandre, o latoeiro, causou-me muitos males; o Senhor lhe pague segundo as suas obras. Tu, guarda-te também dele, porque resistiu muito às nossas palavras. Ninguém me assistiu na minha primeira defesa, antes todos me desampararam. Que isto lhes não seja imputado.” II Timóteo 4.9-12, 14-16
Paulo era um ser humano e precisava de seres humanos para realizar a obra de Deus, bem, todos que precisam, de alguma maneira, de seres humanos, padecerão decepções, Paulo não foi isentado disso. Paulo abre o coração para Timóteo, reclama de alguns que o abandonaram, solicita que o discípulo venha o quanto antes vê-lo. Paulo está preso aguardando a morte, mas seu coração vive o evangelho. Atualmente, somos ensinados de púlpito por muitos pregadores, que buscam referência para espiritualidade em anulação emocional, um princípio tão católico, e que postam-se, ainda que muitos com sinceridade, como super-homens, que estão bem com todos e não se importam com os que lhes fazem mal. Isso só gera hipocrisia, e achando-se curados muitos nem buscam cura.
Paulo dá nome aos bois, “Demas me desamparou, amando o presente século”, “Alexandre, o latoeiro, causou-me muitos males”, “ninguém me assistiu na minha primeira defesa”, parece que só Lucas estava com ele naquele terrível momento. De fato, quando estamos no alto da aprovação pública, muitos nos acompanham, mas quando as injustiças do mundo nos aprisionam e tentam nos matar, muitos nos abandonam, chegam mesmo a dar razão aos injustos por nos fazerem mal, mentindo dizem que se estamos sofrendo é porque merecemos, ainda que nunca tenham se aproximado de nós para saberem de fato a verdade, ou ao menos a noção versão. Não sabemos o certo de porque tantos deixaram Paulo só, mas ele demonstra claramente que sofria com isso.
“Mas o Senhor assistiu-me e fortaleceu-me, para que por mim fosse cumprida a pregação, e todos os gentios a ouvissem; e fiquei livre da boca do leão. E o Senhor me livrará de toda a má obra, e guardar-me-á para o seu reino celestial; a quem seja glória para todo o sempre. Amém.” II Timóteo 4.17-18
Deus nunca nos abandona! Nunca!! Mas isso é para os que sabem que a companhia de Deus basta, já que para muitos, ainda que Jesus esteja ao lado deles, eles se desesperam, se fazem de vítimas, culpam os homens. Quem odeia demais é porque buscou amor demais nas pessoas erradas, o amor se transforma em ódio com facilidade. Só se desilude quem se ilude, mas quem tem os olhos firmes em Deus, aprendeu que ele tem o principal para que estejamos em paz sempre, em qualquer situação. Paulo sabia disso, estava preparado para seu fim, o fim de um genuíno seguidor de Cristo. Muitos conseguem trilhar um longo caminho com Deus, mas quando chegam no final, na última prova, desistem, negam tudo, e deixam de conhecer o melhor de Deus.
O objetivo de Deus é sempre se mostrar através de nossas vidas, muitas vezes ele faz isso nos dando vitória e livramento, mas nosso maior testemunho de Deus pode pedir de nós um grande sacrifício, de Jesus foi a crucificação, de Paulo a condenação à prisão e à morte. Estamos preparados para obedecer a Deus até as piores consequências? De verdade? Cuidado, não nos iludamos com este mundo, mas não nos iludamos com um falso evangelho tão pregado atualmente, que ensina que Deus sempre dá o melhor para seus filhos neste mundo em todas as circunstâncias. Sim, eu creio que ainda que condenado à morte de alguma maneira Deus livrou Paulo de uma morte pior, de alguma maneira Deus deu forças a ele para passar por aquilo com dignidade.
“Quando vieres, traze a capa que deixei em Trôade, em casa de Carpo, e os livros, principalmente os pergaminhos.” II Timóteo 4.13
A Bíblia não especifica como Paulo morreu, há outros relatos de que ele teria sido decaptado e não crucificado de cabeça para baixo como Pedro, teria recebido um tratamento “melhor” por causa de sua cidadania romana. Final trágico para um homem tão importante? Pois é, isso é a realidade do verdadeiro evangelho, não a posição de imperador em meio a luxos que têm papas do Vaticano, nem a prosperidade material que tantos donos de ministérios evangélicos têm ou gostariam muito de ter atualmente. Que bens Paulo queria perto de si em seus últimos dias? O versículo 13 de II Timóteo 4 fala a respeito, que eu deixei por último porque para mim é um dos registros mais lindos e reveladores da Bíblia.
Livros, registros de outros autores pelos quais Paulo tinha alguma afeição? (Uma versão do Antigo Testamento?). Pergaminhos, anotações feitas por ele? (Ou outros textos como dicionários?) Não sabemos, mas eram importantes para ele. Mas tinha um peça de roupa, uma capa (alguns estudiosos dizem que podia ser uma capa de livro), lembrando que Atos 16.8-11 registra que Paulo saiu meio às pressas de Trôade. Se for uma roupa podemos achar justificação no fato de Paulo poder estar preso num cárcere úmido e frio. Sejam o que forem, são poucos bens, poucas necessidades, simples urgências do plano físico para um homem que viveu a espiritualidade cristã em seu nível mais alto, o verdadeiro pai da igreja cristã.
Nesta reflexão, dividida em duas partes, pensemos sobre chamadas. Todos temos de alguma maneira vocações para servir a Deus neste mundo, seja na área afetiva, isso é, na família, seja na área profissional, na sociedade, ou na área espiritual, através das igrejas. O texto a seguir é a primeira parte da reflexão sobre vocação espiritual, nela somos chamados como indivíduos, como líderes de grupos e como líderes de grupos maiores, isso é, de igrejas, pensemos esse último tipo de chamada, a feita para pastores.
“E disse-lhes: Ide por todo o mundo, pregai o evangelho a toda criatura. Quem crer e for batizado será salvo; mas quem não crer será condenado.” Marcos 16.15-16
Deus age com inteligência, diferente do que o ditado “Deus não chama os preparados mas prepara os chamados” diz, ele chama espiritualmente os preparados intelectualmente, ainda que tenha que prepará-los espiritualmente. Exemplo disso é Paulo, mesmo preparado intelectualmente teve que ser preparado espiritualmente para se tornar um apóstolo. Já Pedro, estava preparado espiritualmente, foi apóstolo direto de Cristo, mas sem preparo intelectual teve um ministério mais restrito, seja na abrangência geográfica, seja como escritor dos fundamentos evangélicos. Paulo viajou mais como missionário e escreveu mais como teólogo, assim quem acha que cultura não importa, tem na chamada de um homem com passaporte romano, com formação acadêmica grega e com autoridade religiosa judaica, uma negativa (Atos 23.3).
Paulo foi o homem certo para desempenhar a vontade de Deus naquele tempo e naquele mundo, assim como foi Pedro. Contudo, ainda que para servirmos em e através de igrejas seja a vocação espiritual quem estabeleça a chamada, ninguém ache que basta fé e unção. Deus usa as duas coisas, aptidões humanas que nascem com a gente e que são aprimoradas por experiências intelectuais e profissionais seculares, somadas a dons e vocações espirituais, recebidos à medida que andamos com Deus. Paulo tinha o preparo intelectual para desempenhar a chamada que Deus tinha para ele, e Pedro o preparo intelectual para a chamada que Deus tinha para ele, Paulo não tinha que tentar fazer o trabalho de Pedro, nem o contrário, assim como Pedro não deveria se sentir melhor que Paulo pode ter uma chamada diferente, nem o contrário.
Deus chama todos para que reflitam sua luz no mundo, mas as chamadas são diferentes, tanto quanto as pessoas são. Uma chamada é mais importante que a outra? Uma tem um nível espiritual mais alto que o nível de outra? Não, todas são importantes e todos somos chamados para termos uma comunhão plena com Deus, o que difere são nossos dons, nossas habilidades e nossas experiências, que podem nos ajudar a compartilhar essa comunhão, seja com um grupo menor ou com um maior. Deus chama respeitando tudo isso, de modo que cada um dê o seu melhor no lugar e no tempo certo para abençoar melhor os outros. Obviamente o que tem um grupo maior sob liderança deverá ter o conhecimento adequado para além de servir espiritualmente, administrar áreas do mundo material, principalmente a financeira.
Muitos, contudo, pensam ter chamada espiritual de Deus, quando na verdade são só seres humanos carentes de atenção, tentando convencer a si mesmos que estão certos. Como aliamos a vontade maior de Deus para pregarmos o evangelho com palcos, ainda que o chamemos de altares e púlpitos, como acreditamos que ser espiritual é ser reconhecido publicamente. Essa é uma visão do cristianismo atual, não das religiões orientais, mas também não a de Cristo encarnado. O texto inicial cita o “ide” de Jesus, uma ordem que Cristo deu nas ultimas palavras à Igreja, querendo obedecê-lo com sinceridade muitos tentam ser Pedro ou Paulo, contudo, entendem só a parte da quantidade, de ter ministérios poderosos com templos cheios de membros, não entendem a espiritualidade melhor provada no solitário anonimato.
Querendo quantidade, não qualidade, vemos hoje em dia um evangelho vendido barato, em todas as esquinas, oferecido fácil e sem obrigações, pérolas vendidas a porcos a troco de dízimos. Os “pastores“ que vendem esse “evangelho” sentem-se especiais, orgulhosos de suas chamadas, são esses, evangélicos? Sim, mas no fundo a grande maioria quer um ministério grande como o do Vaticano, deixou a Igreja Católica mas continua louca para ser igual a ela, com o mesmo poder. Na eternidade? Não, no mundo, e muitos Jovens que sentem chamada missionária atualmente também querem isso para si mesmos, não querem ser Pedros ou Paulos, muito menos como Cristo, só ambicionam ser outros “Macedos”, “Hernandes” e “Malafaias”. Por isso reavaliar chamada pastoral é uma necessidade tão urgente, identificar o erro na raiz.
Se um homem tivesse tido base familiar melhor, cuidado mais carinhoso de pais e próximos ou sofrido intervenção de amigos colocando-o sob cuidados psicológicos, milhões de vidas talvez não tivessem sido terrivelmente massacradas, o nome desse homem é Adolf Hitler. Sim, coisas importantes, sejam para o bem ou para o mal, foram feitas no mundo, deixando homens famosos, poderosos, ricos, só para satisfazerem uma necessidade de auto-afirmação ou compensarem inseguranças e falta de amor de um indivíduo. Se soubéssemos de detalhes sobre a vida, principalmente familiar, de muitos líderes, cientistas e empresários, faríamos essa constatação. Líderes religiosos não fogem disso, aliás, desbalanceados psicologicamente têm predileção especial por religião, principalmente por uma que se diz dona da verdade.
Às vezes, após buscarmos a vontade de Deus com a igreja, em humildade e obediência, sem que tenhamos obtido uma certeza, uma busca solitária pode ser a saída. Em algumas situações a palavra final de Deus só conhecemos orando sozinhos. Homens usados de maneira diferenciada pelo Senhor, para missões decisivas, foram chamados na solidão, e assim foram seus ministérios, conduzidos exclusivamente sob a aprovação de Deus. Com Jacó foi assim, fugindo de seu irmão, com José foi assim, odiado por seus irmãos, com Moisés foi assim, exilado no deserto longe tanto da parentela egípcia de criação quanta da de sangue israelita. Interessante como familiares podem ser nossos maiores inimigos, os que menos entendem nossas chamadas, Jesus no final foi crucificado por escolha dos judeus, não dos romanos.
A maioria de nós, todavia, hoje é chamada dentro de denominações evangélicas, sob lideranças estabelecidas, assim nos coloquemos debaixo de orientação dos mais experientes, isso é sábio e livra de armadilhas que podem ser armadas por nós mesmos. Para isso precisamos estar em igrejas idôneas, sob pastores sérios homens de Deus, que também achamos buscando no Senhor. O importante é não termos pressa para desempenhar nossas chamadas, não para aparecer diante de homens em igrejas, antes, sejamos diligentes, sim, para viver uma vida agradável diante de Deus, no dia a dia, como pessoas comuns. Não caiamos no engodo da vaidade de desejar títulos eclesiásticos, achando que isso nos torna especiais para Deus, o Senhor não se importa com isso, ele busca os que o obedecem mesmo que ninguém saiba ou veja.
“A sabedoria clama lá fora; pelas ruas levanta a sua voz. Nas esquinas movimentadas ela brada; nas entradas das portas e nas cidades profere as suas palavras: Até quando, ó simples, amareis a simplicidade? E vós escarnecedores, desejareis o escárnio? E vós insensatos, odiareis o conhecimento? Atentai para a minha repreensão; pois eis que vos derramarei abundantemente do meu espírito e vos farei saber as minhas palavras.
Entretanto, porque eu clamei e recusastes; e estendi a minha mão e não houve quem desse atenção, Antes rejeitastes todo o meu conselho, e não quisestes a minha repreensão, Também de minha parte eu me rirei na vossa perdição e zombarei, em vindo o vosso temor. Vindo o vosso temor como a assolação, e vindo a vossa perdição como uma tormenta, sobrevirá a vós aperto e angústia.
Então clamarão a mim, mas eu não responderei; de madrugada me buscarão, porém não me acharão. Porquanto odiaram o conhecimento; e não preferiram o temor do Senhor: Não aceitaram o meu conselho, e desprezaram toda a minha repreensão. Portanto comerão do fruto do seu caminho, e fartar-se-ão dos seus próprios conselhos. Porque o erro dos simples os matará, e o desvario dos insensatos os destruirá. Mas o que me der ouvidos habitará em segurança, e estará livre do temor do mal.”
Provérbios 1.20-33
Muitos interpretam o termo sabedoria que aparece no livro de Provérbios, como algo só espiritual, mas será que o pleno temor de Deus contempla só a comunhão direta entre o Senhor e o homem através do Santo Espírito? Não, temer a Deus abrange todas as esferas da vida humana, em todos os planos, no corpo, na alma, no espírito, na interação entre homens, com a natureza, além de com o mundo espiritual. A apologia que Salomão (e possivelmente outros escritores que também escreveram o livro de Provérbios) faz da sabedoria não se refere só à sabedoria moral, social e religiosa.
Salomão é célebre por ter tido um entendimento singular da existência humana, sabedoria que recebeu de Deus (I Reis 3.1-15), ele também se refere à ciência, à medicina, à química, à física, à matemática e a tudo o mais que permite ao homem dominar este planeta e seguir civilizado e evoluindo. Nesta reflexão, dividida em duas partes, pensemos sobre o valor do estudo, da formação acadêmica, do conhecimento científico e da intelectualidade, na vida não só do homem em geral, mas também do cristão, tudo incluído, como entendemos, na sabedoria orientada na Bíblia, segue a primeira parte.
Bom estudo, melhor oportunidade de trabalho, maior influência no mundo, testemunho mais abrangente, essa é uma cadeia natural de coisas conquistadas neste planeta do jeito correto, com esforço, com melhores escolhas, com status quo mais alto e com sabedoria para usufruir isso tudo com justiça social e respeito com a natureza. Uso da ciência com inteligência e boa formação acadêmica é o que faz o homem um verdadeiro rei neste mundo, conquistando e dominando da maneira certa, não com violência ou egoísmo, mas com lucidez e conhecimento (já refletimos um pouco sobre o tema desta reflexão em “
Intelectualidade não é pecado...”).
Você já pensou se o homem não tivesse pecado originalmente (seja lá o que isso signifique de verdade, além dos mitos), como seria este mundo? Em que nível científico estaríamos, o quanto de outros planetas e sistemas solares já teríamos visitado? Muitos acham que um homem sem pecado viveria o céu na terra, mas não é assim que funciona, o céu é puramente espiritual. A criação material foi algo muito especial de Deus, se o mundo espiritual fosse suficiente Deus não precisaria criar o plano físico, a Terra, o Sol, a Lua, as estrelas, a natureza, os animais, o ser humano. Sem o pecado a vida no mundo seria algo único, nunca provado pelos anjos. O que Deus tinha em mente para um plano físico sem pecado?
Será que haveria morte física? Lembre-se que pelo livro de Gênesis os homens viviam muito tempo antes do dilúvio, dilúvio que também foi outra consequência do pecado do homem. Por outro lado, entendemos pela Bíblia que originalmente era proibido ao homem comer só da árvore do conhecimento do bem e do mal, já o fruto da árvore da vida só foi proibido depois que o homem comeu o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal (Gênesis 2.9,16-17), assim talvez, sem pecado, o homem pudesse viver eternamente encarnado. Quanto desenvolvimento a humanidade não alcançaria em pouco tempo, e tudo com temor a Deus, com justiça social e respeitando a natureza.
O que de fato são as árvores de Gênesis? O que representam? Se referem a dois poderes que os humanos almejam muito, conhecimento e longevidade. Mas que conhecimento é esse, moral, espiritual, científico? “Então disse o Senhor Deus: Eis que o homem é como um de nós, sabendo o bem e o mal; ora, para que não estenda a sua mão, e tome também da árvore da vida, e coma e viva eternamente, O Senhor Deus, pois, o lançou fora do jardim do Éden, para lavrar a terra de que fora tomado.” (Gênesis 3.22-23). Como tudo nos capítulos iniciais de Gênesis, essa passagem tem vários mistérios, Deus referindo-se a si mesmo na primeira pessoa do plural e a única informação bíblica sobre o que é a árvore da vida.
Uma coisa é certa, num plano físico sem pecado não haveria qualquer embate entre fé e ciência, entre matéria e espírito, nessa realidade a evolução intelectual do ser humano não o levaria a uma arrogante posição de duvidar de Deus, antes permitiria que ele conhecesse as verdades de Deus encarnado. Os mistérios do universo seriam mostrados sem véus, entenderíamos a mente de Deus neste mundo, ainda que com trabalho e com tempo, mas seria uma experiência diferente, que sequer podemos imaginar hoje. Mas por que ciência tornou-se sinônimo de oposição a Deus? Por causa do pecado dos ateus, sim, mas também por causa da ganância de líderes evangélicos que para manterem o controle escravizam ovelhas à ignorância.