quinta-feira, novembro 19, 2020

50. Espiritualidade de graça

Espiritualidade Cristã (parte 50/64)

      “Porque a palavra da cruz é loucura para os que perecem; mas para nós, que somos salvos, é o poder de Deus. Porque está escrito: Destruirei a sabedoria dos sábios, E aniquilarei a inteligência dos inteligentes. Onde está o sábio? Onde está o escriba? Onde está o inquiridor deste século? Porventura não tornou Deus louca a sabedoria deste mundo? Visto como na sabedoria de Deus o mundo não conheceu a Deus pela sua sabedoria, aprouve a Deus salvar os crentes pela loucura da pregação. I Coríntios 1.18-21

      Muitos não entendem o conhecimento profundo que existe no princípio “pela graça sois salvos, por meio da fé, e isto não vem de vós, é dom de Deus” (Efésio 2.8), muitos acham, e infelizmente baseados em equívocos que os próprios cristãos criam e creem, que isso é um jeito de enfraquecer o homem para que outros homens, em nome de Deus, possam controlá-lo. Aliás, muitos dizem que o cristianismo é a velha ordem mundial, no qual um teocentrismo negacionista impede a humanidade de evoluir cientificamente e socialmente, e isso pode até ser verdade em relação ao falso cristianismo criado por religiosos sem escrúpulos, não em relação ao cristianismo original. A verdade do ensino de Paulo não tem o objetivo de enfraquecer ou subjugar o homem, mas de liberta-lo, abrir seus olhos espirituais para a luz mais alta, num plano onde as referências materiais não funcionam. 
      Entretanto, mesmo os que entendem essa verdade, acabam usando-a para se acomodarem, assim, o que deveria ser o começo acaba sendo o final. Temos uma caminhada a fazer, mas não para receber a verdade, mas para crescer nela, e é isso que dá à existência prazer e sentido. Muitos, contudo, estão mais ocupados em ganhar dinheiro para sobreviverem, e nada de errado tem nisso, não num mundo injusto onde poucos dominam e exploram muitos. “Aprofundar-se na espiritualidade? Não tenho tempo”, dizem, assim querem resultados rápidos, pedir a Deus e receber, agradecerão ao Senhor por isso, mas sem perderem muito tempo. Isso parece dar pouco a um Deus que tanto dá? E é, mas Deus ama os homens, todos eles, mesmo uma maioria que não tem tempo para ser espiritual. Por isso o evangelho é acima de tudo uma prova do amor de Deus pelos homens, homens que pouco tempo têm para Deus. 
      Vou dizer algo que talvez muitos cristãos não aceitem, cristãos com um poder aquisitivo mais alto, que podem ter uma qualidade de vida melhor, e que têm tempo não só para trabalhar, mas também para adquirir cultura: a Bíblia é a versão elementar da verdade mais alta de Deus, enquanto que textos religiosos de outras crenças e óticas metafísicas, são versões avançadas de verdades abaixo da mais alta de Deus. Alguns podem não aceitar isso porque têm tempo e vontade de se aprofundarem na Bíblia, assim tentam descobrir nela conhecimentos que outros não têm, mas estudar com mais afinco um livro de fundamentos não faz o livro mais profundo, mas esse não é o ponto aqui. O ponto é que Deus ama o homem, assim, para salvá-lo, disponibilizou o conhecimento da salvação de um jeito que qualquer homem pudesse entender, sem que tivesse mais tempo ou erudição para se aprofundar nele.
      Por isso certas religiões seduzem os que se acham mais sábios, mais cultos, por isso esses mesmos criticam o cristianismo como uma religião de ignorantes, por isso eruditos se perdem mais facilmente e os simples se salvam com mais facilidade, por isso Paulo diz em I Coríntios 1, “destruirei a sabedoria dos sábios e aniquilarei a inteligência dos inteligentes”. A Bíblia pode ser o básico, mas é suficiente, e talvez o possível para a grande maioria de seres humanos do mundo atual, e creiam, em certas coisas o homem não evoluiu muito, ainda é o mesmo de quase dois mil anos atrás, assim a Bíblia ainda é atual. Jesus sempre é atual, isso nunca vai mudar, mas a aplicação do evangelho na moral, nos costumes, na família, na sexualidade, nos direitos políticos, isso precisa mudar, mas só mudará quando o homem se aprofundar em sua espiritualidade, e mais, na espiritualidade mais alta do cristianismo.
      Amor, isso define melhor a Deus que erudição teológica, luz, isso explica melhor o Senhor que conhecimentos ocultos, simplicidade, isso representa mais a sabedoria de Deus que complexos rituais religiosos. Deus é amor, é luz e é simples, para que os simples tenham acesso a ele e tenham paz. Do que vale todo o conhecimento se não há paz no coração? O amor de Deus traz paz, eis o início e o fim da espiritualidade, o resto é trevas, é o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, e isso está abaixo dos mais altos lugares celestiais em Cristo. Graças a Deus que nos ama, glória a Deus que se faz homem para que os homens o entendam, se abaixa sem se rebaixar, louvores ao altíssimo, que ainda que esteja lá em cima, nos acha pelo seu Santo Espírito e nos ensina, coisas inefáveis, que não merecemos saber, mas que ele compartilha com filhos do seu amor em Cristo.

      “Então disse: Eis aqui venho, para fazer, ó Deus, a tua vontade. Tira o primeiro, para estabelecer o segundo. Na qual vontade temos sido santificados pela oblação do corpo de Jesus Cristo, feita uma vez. E assim todo o sacerdote aparece cada dia, ministrando e oferecendo muitas vezes os mesmos sacrifícios, que nunca podem tirar os pecados; Mas este, havendo oferecido para sempre um único sacrifício pelos pecados, está assentado à destra de Deus, Daqui em diante esperando até que os seus inimigos sejam postos por escabelo de seus pés. 
      Porque com uma só oblação aperfeiçoou para sempre os que são santificados. E também o Espírito Santo no-lo testifica, porque depois de haver dito: Esta é a aliança que farei com eles Depois daqueles dias, diz o Senhor: Porei as minhas leis em seus corações, E as escreverei em seus entendimentos; acrescenta: E jamais me lembrarei de seus pecados e de suas iniquidades. Ora, onde há remissão destes, não há mais oblação pelo pecado.” 
Hebreus 10.9-18

      No texto inicial, como presente nas epístolas paulinas de maneira geral, o escritor faz a defesa do evangelho como estabelecedor de uma aliança melhor e eterna de Deus com os homens através da obra de Cristo. Depois que Cristo concluiu sua obra não há mais necessidade de sacrifícios de animais para que os homens possam receber perdão, basta a eles que creiam no nome de Jesus. Isso pode ser aplicado também a tantas outras substituições que os homens tentam fazer para a obra de Cristo através das religiões, mesmo nos dias de hoje, substituições que sempre negam um princípio básico da maneira de Deus agir, sua graça. Se tantas coisas Deus dá ao homem de graça, muito mais a salvação, e não é só por generosidade, mas porque não existe outro jeito. O homem não pode, pelas próprias forças, se salvar, se existe evolução espiritual que depende de tempo e trabalho humano, ocorre depois que ele é salvo, não para ser salvo. 
      Algo que choca muitas religiões com relação ao cristianismo, pelo menos em relação ao cristianismo que o protestantismo tentou resgatar, é o conceito da graça de Deus. Como tantas vezes já foi dito, e que define a diferença entre cristianismo e outras religiões, o evangelho é Deus buscando o homem, enquanto as outras religiões são o homem buscando a Deus. Quando o homem se coloca como protagonista sempre quer, de alguma maneira, glória para si, aplauso pelo seu trabalho, por isso a espiritualidade buscada por ele sempre custa preços. Vemos isso no catolicismo, que desviado do cristianismo original, criou ritos, cerimônias e sacramentos. Quando o Espírito Santo falta o homem tenta fazer o trabalho, que simule espiritualidade e alie ao culto alguma sagração, por isso o catolicismo se tornou uma religião pesada e morta, que acaba separando o homem da graça mais pura de Deus.
      Rituais são encenações aos quais são aliados poderes religiosos, onde se procura refazer um acontecimento, através de teatrialização, para reviver a capacitação dada pelo evento original. Por exemplo, quando se encena na Quaresma a “Via Crúcis”, o "Caminho da Cruz" ou “ Via Sacra”, referente ao trajeto percorrido por Jesus carregando a cruz do Pretório ao Calvário, pode ser um rito, se as pessoas crerem que podem obter algo através dessa encenação. Contudo, uma diferença importante do genuíno cristianismo, é que ele não precisa de rituais, o novo testamento não deixou orientação para eles, basta crer na obra final de Jesus. O batismo nas águas e a ceia são mais eventos sociais, testemunhos públicos da fé, momentos para se ter comunhão com os que comungam a mesma crença, eles não possuem qualquer poder espiritual ou concedem qualquer benefício de salvação ou perdão.  
      Quem precisa reviver o passado para achar forças ou motivos para crer é porque não tem no presente algo vivo e capaz que mantenha viva sua fé, sem o Espírito Santo utiliza-se rituais, repletos de pompas e circunstâncias. Rituais impressionam emocionalmente e fortemente as pessoas e fazem com que elas se sintam parte de algo maior e importante. Infelizmente muitas denominações evangélicas atuais, que se desviam do verdadeiro evangelho, têm provado a falta do verdadeiro Espírito e também têm inventado rituais, principalmente baseados na religião israelita do antigo testamento. Isso sempre glorifica mais o homem, que se sacrifica, que cumpre uma “promessa”, que participa fielmente de uma série de vigílias, que jejua por um grande número de dias ou que tem fé suficiente para alcançar uma graça. Mas graça não se compra nem se troca, só se recebe, é de gratuita. 
      Quando Deus busca o homem, a glória é de Deus, mas não porque ele exija isso ou precise disso, é simplesmente porque ele é Deus e Deus sempre merece todo o louvor. O louvor que damos a Deus não exige de nós trabalho, ao contrário, é prazeroso, nada alimenta mais o espírito humano que adorar o Deus altíssimo. Adoração confere ao homem uma intimidade espiritual com um Deus pessoal que muitas religiões não podem dar, não podem dar porque não têm o direito de dar e não têm o direito de dar porque não têm Cristo. É justamente a adoração a porta para experiências espirituais mais profundas, quantos não receberam dons espirituais, tiveram suas primeiras experiências com línguas espirituais estranhas, louvando a Deus com liberdade. Assim, a graça de Deus nos leva a louva-lo, o louvor abre a porta para os dons, e os dons são o início da mais profunda espiritualidade cristã.
      É maravilhoso como Deus nos atrai de um jeito simples, que nos realiza por completos, intelectual, emocional e espiritualmente, de graça por amor e através da fé, sem ritos, sem protocolos mágicos complicados, sem sacrifícios, algo possível a todo ser humano que passou da “idade da inocência”, seja qual for seu nível intelectual, financeiro ou etário. Mesmo que o verdadeiro evangelho nos leve a abrir mãos de vaidades e prazeres, ele o faz do jeito certo, nos respeitando e tirando de nós o nosso melhor, e isso, repito, é como Deus trabalha, não as religiões, incluindo as cristãs. Deus não pede sacrifícios de ninguém, e se parece sacrifícios o é aos que amam mais o mundo e a si mesmos que as virtudes. Se o “diabo” é um senhor cruel e mentiroso, cobra preços altos, faz muitas exigências, e na verdade não dá nada em troca, Deus dá de graça porque Cristo já pagou o preço, com a própria vida, dá muito mais que merecemos ou imaginamos e para sempre.

Espiritualidade Cristã
é um estudo dividido em 64 partes,
por favor, se possível, leia todas as reflexões 
para melhor entendimento do assunto abordado.
José Osório de Souza, 30/09/2020.

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