quarta-feira, outubro 14, 2020

14. Espiritualidade e unção

Espiritualidade Cristã (parte 14/64)

      “Tu, pois, toma para ti das principais especiarias, da mais pura mirra quinhentos siclos, e de canela aromática a metade, a saber, duzentos e cinqüenta siclos, e de cálamo aromático duzentos e cinqüenta siclos, e de cássia quinhentos siclos, segundo o siclo do santuário, e de azeite de oliveiras um him. E disto farás o azeite da santa unção, o perfume composto segundo a obra do perfumista: este será o azeite da santa unção.
      E com ele ungirás a tenda da congregação, e a arca do testemunho, e a mesa com todos os seus utensílios, e o candelabro com os seus utensílios, e o altar do incenso. E o altar do holocausto com todos os seus utensílios, e a pia com a sua base. Assim santificarás estas coisas, para que sejam santíssimas; tudo o que tocar nelas será santo. Também ungirás a Arão e seus filhos, e os santificarás para me administrarem o sacerdócio.” 
Êxodo 30.23-30

      Unção, como esse termo tem sido usado atualmente em muitas igrejas evangélicas, mas o que é unção? Quando alguém de fato está ungido por Deus, e sendo assim, usado por Deus e vivendo, na prática e não só nas palavras, como um ungido de Deus? Para muitos, no meio cristão, algo que está diretamente relacionado com a mais alta espiritualidade é a unção, se acham que alguém está ungido então concluem que com certeza esse alguém é uma pessoa muito espiritual. A definição do dicionário diz que unção é “ato ou efeito de ungir, de aplicar óleo consagrado numa pessoa”, ou o “ato ou efeito de untar, de esfregar com unto, gordura, untadura, untura”, assim o termo unção está ligado ao uso religioso do óleo. 
      A passagem bíblica mais reveladora sobre unção é a de Êxodo 30, onde Deus dá a Moisés a receita para produzir o óleo que seria usado na unção dos objetos e locais do templo assim como dos sacerdotes, “principais especiarias, da mais pura mirra quinhentos siclos, e de canela aromática a metade, a saber, duzentos e cinqüenta siclos, e de cálamo aromático duzentos e cinqüenta siclos, e de cássia quinhentos siclos, segundo o siclo do santuário, e de azeite de oliveiras um him”, isso para criar “o perfume composto segundo a obra do perfumista”, o óleo. Nas medidas atuais seriam mais ou menos assim as proporções: 5,75 kg tanto de mirra quanto de cassia, 2,88 kg tanto de canela quanto de cálamo, e 4 litros de azeite. 
      Vejamos as características dos elementos que compõem esse óleo. A Mirra é uma planta espinhosa, medicinal e usada como cicatrizante, anestesia e no tratamento rejuvenescedor. A canela aromática (cinamomo) além de medicinal, pode ser usada no alimento e tem um cheiro marcante. O cálamo aromático (ou cana cheirosa ou jasmim azul) é uma planta pequena, aquática e rara, é usada para purificação da água que é consumida, mas também tem indicação como cicatrizante, seu cheiro é agradável, assemelha-se a tangerina, mas seu sabor é amargo e picante. A cássia (ou chuva-de-ouro) ao mesmo tempo limpa, ornamenta e perfuma o ambiente. O azeite é o óleo da oliveira, ele reduz o risco de infarto.
      Assim, o óleo têm características diferenciadas, é feito de elementos especiais, não são encontrados com tanta facilidade, são especiarias, são elementos que exalam cheiros agradáveis e únicos, é perfumado e feito com plantas aromáticas. O que dá o corpo ao óleo é o azeite de oliva, que confere ao produto uma consistência gordurosa, líquida mas insolúvel na água, que faz com não seja derramado com facilidade, permanece por mais tempo sobre a superfície. Por isso o termo untado a óleo, e não molhado, a água, por mais pura que seja, não tem cheiro e facilmente escorre e seca. Todas essas características do óleo israelita para unção são metáforas para a unção espiritual do Espírito Santo.
      O óleo nos passa ideia de limpeza, e em se tratando de coisas espirituais, de santidade, mas é mais que isso, se a metáfora fosse só essa bastaria lavar as coisas religiosas com água limpa. Ele tem um cheiro forte e agradável, isso nos passa a ideia de uma limpeza que é compartilhada, todos no mesmo espaço ou próximos sabem quando alguém usa perfume, pelo cheiro. Em termos espirituais nos fala de uma santidade feliz, alegre, exultante, que transborda o “perfumado” (o ungido) e que compartilha sua experiência com os outros. Repetindo a metáfora da água, também usada para identificar o Espírito Santo (“água viva” em João 4.10-14), ela alimenta o que a prova, mas numa experiência mais discreta e pessoal. 
      Mas além da limpeza e do cheiro, o óleo tem uma cor, brilhante e dourada, como o ouro, o que confere realeza a quem o usa, em termos espirituais isso no remete a Deus, o ungido foi tocado por Deus, quem tem essa experiência não a esquece facilmente, fica marcado com ela. Novamente comparando, a água vai e seca com mais facilidade, o óleo não, fica na superfície, não some tão depressa, e além disso, o óleo da unção tinha efeitos fisicamente curativos. Dessa forma entendemos que a unção do Espírito Santo santifica, diferencia socialmente, abençoa os outros e também cura as feridas emocionais. Para entendermos tudo isso temos que nos lembrar das três áreas que compõem o ser humano.
      Com certeza a unção de Deus mexe com nossos sentimentos, mas ela é muito mais que emocionalismo, sentimentos vêm e vão, e facilmente cedem lugar a seus opostos, o efeito emocional da unção de Deus é diferente. Como em tudo na experiência com Deus através de Cristo, fé é a chave, assim a verdadeira unção nem sempre nasce de um momento em que estamos felizes, ao contrário, pela fé podemos experimentar uma unção de Deus num momento de extrema tristeza e solidão, onde tudo contribui para que não nos sintamos bem. Mas ainda assim, o Espírito Santo vem e nos encontra, nos enche, nos alimenta, não, meus queridos, é muito mais que sentimento da alma, é unção, o santo óleo espiritual do Altíssimo.

      “Oh! quão bom e quão suave é que os irmãos vivam em união. É como o óleo precioso sobre a cabeça, que desce sobre a barba, a barba de Arão, e que desce à orla das suas vestes. Como o orvalho de Hermom, e como o que desce sobre os montes de Sião, porque ali o Senhor ordena a bênção e a vida para sempre.” Salmos 133

      “Um novo mandamento vos dou: Que vos ameis uns aos outros; como eu vos amei a vós, que também vós uns aos outros vos ameis. Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros.” João 13.34-35

      Existe uma unção no mundo, a “unção do mundo”, e ela é bem forte, artistas a têm, com ela eles hipnotizam multidões em estádios e na internet, com ela eles cantam, dançam, tocam, com um carisma diferenciado. Essa unção baseia-se na alma, uma emoção humana usada com muita inteligência e manifestando-se através de talentos naturais do corpo, como oratória, canto, técnica musical, poética etc. Essa unção tira do ser humano o máximo que ele pode ser e fazer sem o Espírito Santo, o diabo pode ou não ter alguma ingerência direta nela, e na verdade isso nem importa, se não é de Deus, sempre dá glórias ao diabo. Essa unção é tão forte que seduz mesmo homens em púlpitos de igrejas cristãs. 
      A verdadeira unção nasce num espírito tocado diretamente pelo Espírito Santo de Deus, não nasce na alma, seja por emoção, por mais alegria e euforia que se sinta, ou de conhecimento, por mais profundos que sejam, também não nasce no corpo, por cantar, bater palmas, dançar ou correr. O espírito ungido, e ungido pelo Espírito Santo não por outros “espíritos”, entrega à alma pensamentos e sentimentos ungidos, assim entendimentos e emoções são efeitos da unção genuína de Deus, não causas. A alma por sua vez manifestará no corpo, por sons, imagens, outros sentidos e movimentos, os efeitos de fato ungidos pelo Santo Espírito de Deus, com equilíbrio e bom senso. 
      Será que todas essas evidências podem ser notadas em muitos que chamamos de ungidos atualmente? Alguns cheiram forte, mas um perfume barato que ainda que agrade no início depois enjoa, nos repugna e até nos dá dores de cabeça, esses até controlam seus corpos, mas não suas línguas, falam e falam, mas nada de fato profundo. Outros até demonstram uma “consistência oleosa duradoura” em suas “unções”, mas depois que expõem fisicamente seus êxtases não seguram mais nada de espiritual, a lembrança que teremos deles é apenas de gente escandalosa, sem domínio próprio, mais com vontade de exibir uma espiritualidade (falsa) como vaidade, que testemunhar de Deus. 
      Meus queridos, todos nós temos direito a infantilidades espirituais, crianças devem ser respeitadas e cuidadas, muitos de nós quando experimentamos dons pela primeira vez nos encantamos e podemos até perder um pouco o controle. Por isso experiências de busca do batismos do Espírito são mais adequadas de serem feitas em cultos mais íntimos, de preferência só com os cristãos já estabelecidos, não em cultos evangelísticos. Sim, na Bíblia as pessoas provavam dons na conversão e em cultos abertos, mas hoje em dia não é sabido agir assim, deixemos as crianças, mesmo espirituais, serem crianças, mas isso no tempo das pessoas serem crianças, e sempre orientado-as a amadurecerem. 
      A resposta é não! Muitos que se apresentam como “ungidões”, que muitos aplaudem como ungidos, não o são, ainda que preguem e cantem com uma emoção, com uma convicção, que nos impressione emocionalmente muito fortemente. Muitos não imaginam a qualidade moral das vidas íntimas que muitos “gospel famosos” têm de fato, o que fazem depois de participarem de cultos como estrelas máximas, e nem queiram saber, é nojento. Para discernir o critério é sempre um, pelos frutos vos conhecereis (Mateus 7.20-23), o falso não ficará de pé na congregação, não para sempre, o tempo o revelará, mas os justos não devem esperar pelo tempo, devem buscar em Deus discernimento e confrontar esses falsos ungidos já! 
      A mais forte e pura unção nos leva à mais elevada espiritualidade, e como vimos neste estudo, “Por que ser espiritual?”, a mais elevada espiritualidade deixa santidade, paz e amor, depois que nos posicionamos nela, então nos leva a temer a Deus de uma maneira única. Esse temor exige de nós discrição, não exposição, nessa disposição queremos nos calar, não falar, desaparecer, não aparecer, para que Deus seja adorado, mais ninguém. A mais elevada espiritualidade nos permite conhecimentos espirituais sérios, e isso não se revela assim facilmente, a qualquer um, na verdade a espiritualidade mais alta se guarda na mente e no coração, como a pedra mais preciosa, o primeiro passo para ela é a verdadeira unção. 
      O Salmo 133, contudo, entrega um ensino singular, interessante como o óleo da unção é comparado à comunhão que se pode ter com irmãos, sejam esses irmãos de sangue, em Cristo ou amigos queridos, ainda que não cristãos oficiais. Isso nos remete diretamente às palavras de Jesus nos evangelhos, quando ele ensina que o amor seria a marca de seus seguidores, bem, se unção não nos conduzir a uma espiritualidade que nos leve a amar, para nada serve. Quando pensamos em unção como amor, pensamos em algo que não serve só para nos beneficiar, nos mostrar, mas abençoar os outros, honrar os outros e servir aos outros, Jesus como homem encarnado vivia essa unção, uma unção que não escandaliza, mas ama.

      “Porque para Deus somos o bom perfume de Cristo, nos que se salvam e nos que se perdem.” II Coríntios 2.15

“Espiritualidade Cristã”
é um estudo dividido em 64 partes,
por favor, se possível, leia todas as reflexões 
para melhor entendimento do assunto abordado
José Osório de Souza, 30/09/2020.

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